Antes de esmiuçar o projeto que altera vários dispositivos do código penal brasileiro, o professor fez uma abordagem mais geral alertando para fatores que ele considera graves e ao mesmo tempo ineficientes, uma vez que não resultarão na redução da criminalidade. Uma delas é que o projeto reforça e amplia a lógica do encarceramento em massa, o que não traz naturalmente a redução da criminalidade. A outra é a introdução de vários instrumentos que flexibilizam as penalidades para o policial que matar em serviço, o que pode elevar ainda mais o número de mortes de pessoas pela polícia. Além disso, ele destacou que o projeto acaba com o processo judicial, o que viola garantias fundamentais dos indivíduos.

Na sua avaliação, “se este projeto for aprovado, ele não vai impedir nenhum crime, nenhuma morte no Brasil, e não vai impedir a corrupção”. Para Fabretti, esses argumentos utilizados para sustentar o projeto de Moro são insustentáveis, principalmente porque, chama a atenção: “Nenhum estudo de impacto das consequências que as mudanças propostas podem trazer para a segurança pública e para o direito individual foi realizado”.

Foram muito os pontos trazidos por Fabretti na sua exposição que demonstram as fragilidades e inconstitucionalidades da proposta. Entre eles, os vários dispositivos que dão aos juízes de primeira instância um poder excessivo na definição de penas, que inclusive colocam em perigo a própria existência do processo penal “praticamente todas as decisões dos juízes são auto-executáveis, independente da decisão do tribunal”. 

Outro elemento estranho ao código penal brasileiro que é incorporado no pacote de Moro é a negociação da pena, previamente ao processo. A prática, usada em países como os Estados Unidos, de tradição penal bem distinta da brasileira, é conhecida como plea bargain, uma justiça penal negociada. Na proposta do Moro, “que legaliza a prática da delação premiada adotada na Lava Jato”, salienta Fabretti, o acusado e o promotor podem negociar a pena de modo que o processo nem mesmo seja instaurado, desde que o réu assuma integralmente o crime. “A negociação de pena privativa de liberdade sem que haja um processo viola um direito fundamental”, avalia o professor de Direito Penal.

Há, também, os aspectos que foram classificados como os que conferem uma “licença para matar”, entre os quais as possibilidades de legítima defesa e os excludentes de licitude que podem reduzir a pena pela metade nos casos em que o crime “decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. Além destes casos, ele destacou também a alteração do código penal que passa a considerar legítima defesa o policial que mata o suspeito, antes mesmo de ser ameaçado.

No debate, dirigentes da FMG e participantes do colóquio contextualizaram a proposta de Moro dentro da conjuntura de avanço do conservadorismo e da crise do capitalismo, que na atual etapa tem na democracia e na defesa de direitos individuais um entrave para a sua superação. Nesse cenário, ressaltou Renato Rabelo, presidente da Fundação Maurício Grabois, é preciso buscar mecanismos de eliminação dos indesejáveis e por isso medidas para levar ao encarceramento em massa e aumentar as mortes nas periferias, principalmente da juventude negra. 

Para Rabelo, a luta para impedir a aprovação as propostas de Sérgio Moro deve estar no centro das preocupações políticas não só da esquerda, mas dos setores progressistas e democráticos da sociedade.