O comitê que atribui os prêmios Nobel da Paz, conhecido pelo seu pendor reacionário, decidiu este ano premiar a Organização para Proibição das Armas Químicas (Opaq). Na curta história desta organização há um episódio com particular significado: o afastamento do seu primeiro diretor por pressão dos EUA. A maior potência imperialista entendeu que a seriedade com que desempenhava as suas funções constituía um obstáculo à utilização da acusação sobre “armas de destruição massiva” como pretexto para a sua ação agressiva. A Opaq que o comité Nobel premiou é a obediente instituição que essa pressão gerou.

A Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ), que ganhou o prémio Nobel da Paz deste ano, teve um brasileiro – o diplomata José Maurício Bustani – como seu primeiro director-geral.

Bustani, atualmente embaixador em Paris, foi demitido da OPAQ em 2002 num episódio polémico, um ano antes da invasão do Iraque pelos Estados Unidos. Natural de Porto Velho (Rondónia), Bustani assumiu a direcção da OPAQ em 1997, ano em que a organização foi criada. Em 2000, foi reeleito por unanimidade e teve a sua gestão elogiada pelo então secretário de Estado americano, Colin Powell. No entanto, um ano antes da invasão do Iraque, o brasileiro ficou no centro de uma disputa com os Estados Unidos que levou à sua demissão.

Bustani defendia a adesão à organização do Iraque, então sob o comando de Saddam Hussein, como medida que abriria caminho para inspecções de armas no país. Mas os Estados Unidos disseram que as inspecções acabariam sendo demasiado lenientes.

Representantes dos Estados Unidos acusaram o brasileiro de má administração à frente da entidade. Mas especialistas defenderam a gestão de Bustani e acusaram os Estados Unidos de se opor à sua tentativa de ampliar o alcance da OPAQ para incluir países como o Iraque e a Líbia, à época com regimes hostis ao governo americano.

Em entrevista à BBC Brasil em julho de 2002, meses após o seu afastamento, Bustani acusou os Estados Unidos de promover um esvaziamento da entidade e de proteger os países ricos com grandes indústrias químicas, concentrando as suas inspecções no Hemisfério Sul, onde as empresas químicas não são tão importantes.

Críticos de seu afastamento disseram na época que os Estados Unidos estariam insatisfeitos com as tentativas de Bustani de promover inspecções em instalações militares americanas com rigor idêntico ao das inspecções em outros países signatários da convenção internacional contra armas químicas.

Bustani chegou a recorrer à Organização Internacional do Trabalho (OIT) contra o seu afastamento, considerado irregular pelo tribunal administrativo da entidade.

A OPAQ está atualmente a coordenar a destruição do arsenal de armas químicas da Síria.

O comité do Nobel justificou a escolha com base no “extensivo trabalho da entidade para eliminar armas químicas”.
A agência, que tem base em Haia e é apoiada pela ONU, foi estabelecida para acompanhar a aplicação da convenção de 1997 sobre armas químicas.

Recentemente enviou inspetores para acompanhar o desmantelamento do estoque de armas químicas da Síria. Em agosto um ataque com gás sarin nos subúrbios de Damasco matou mais de 1.400 pessoas.

O prémio inclui 8 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 2,7 milhões) em dinheiro.