Munchau traçou um quadro extremamente pessimista para a zona do euro no primeiro dia do seminário “O Brasil e o Mundo em 2022”, promovido pelo BNDES em comemoração aos 60 anos do banco. Também presentes ao evento, o economista Barry Eichengreen, da Universidade da Califórnia, em Berkeley (EUA), e o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, disseram acreditar que, dada a perspectiva de um desfecho muito negativo, os líderes políticos agirão a tempo de evitar uma catástrofe.

Munchau, porém, acredita que a ideia de que o desastre iminente levará os políticos a agir está errada. As divergências sobre como enfrentar a crise entre os países do Norte da Europa, especialmente a Alemanha, e os países do Sul são muito grandes. A avaliação de que a alemã Angela Merkel havia capitulado aos anseios da Espanha e da Itália na cúpula da União Europeia (UE), realizada no fim de junho, mostrou-se incorreta, ressaltou Munchau. A capitalização direta dos bancos, que aliviaria a situação das instituições espanholas, não vai ocorrer imediatamente. A união bancária vai demorar e não parece haver tempo para a espera, como deixa claro a disparada do rendimento dos títulos espanhóis.

Para Munchau, o grande problema hoje é a interação complicada entre a política e a economia. Grande parte dos economistas concorda com o diagnóstico sobre o que fazer para deter a espiral de piora da situação europeia, como destacou também Eichengreen. Para ele, é necessária a recapitalização direta dos bancos, uma atuação forte do BCE no mercado secundário de títulos, com algum tipo de mutualização das dívidas (com a emissão de “eurobônus”) e a retomada do crescimento, com menos ênfase em medidas de austeridade fiscal.
A questão é que os líderes europeus não conseguem chegar a um entendimento político sobre isso, disse Eichengreen, fazendo coro com Munchau. Ele acredita, porém, que o fantasma de uma catástrofe ainda exerce um poder de pressão significativo sobre os políticos. Desse modo, o medo do abismo ainda impedirá uma ruptura da zona do euro.

Munchau não compartilha dessa avaliação. “A ruptura do euro é inconcebível até o momento em que ela for inevitável.” Para ele, a saída da Grécia é hoje praticamente certa. “Eu acreditava que a Grécia poderia dar um calote dentro da zona do euro, mas o endurecimento por parte dos países do Norte da Europa torna isso muito difícil.” Munchau também vê um risco grande de saída de Portugal e Espanha. A saída da Espanha, segundo ele, teria impacto pior que a da quebra do Lehman Brothers.

A insistência na austeridade tem sido desastrosa, avalia Munchau, para quem é necessário parar imediatamente com os aumentos de impostos e cortes de gastos, que só reforçam o círculo vicioso de baixo crescimento e aumento da dívida. Essa aposta na austeridade a todo custo tem provocado problemas políticos e sociais complicados, como os seguidos protestos contra os pacotes de aperto fiscal que se observam em países como Grécia e Espanha. Nesse cenário, a manutenção da união monetária fica cada vez mais improvável. Munchau lembra que a saída da do zona do euro deve significar o não pagamento das dívidas denominadas na moeda europeia. Isso teria um efeito extremamente negativo sobre a economia global, com impacto sobre os bancos que carregam papéis europeus.

Coutinho, por sua vez, disse acreditar que as lideranças políticas europeias, à medida que um desastre se aproxime, “terminarão acelerando determinadas soluções”. Segundo ele, “a solução a curto prazo viria com uma união bancária e um papel mais amplo e mais firme do BCE no mercado de títulos”. Uma eventual saída da Grécia da zona do euro seria palatável, por ter sido anunciada com muita antecedência, disse Coutinho. “O problema real são as grandes economias, como a Itália e a Espanha.” Para ele, seria muito difícil para o sistema bancário, até mesmo alemão, absorver um problema envolvendo economias tão grandes como essas.
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Fonte: Valor