Isso porque imaginava-se que o dinamismo que caracterizou o ano de 2008 teria contribuído para destravar os investimentos em inovação pelas empresas brasileiras. Adicionalmente, já teria decorrido um intervalo de tempo suficiente para que fossem captados, mesmo que parcialmente, os possíveis efeitos positivos que a grande prioridade conferida já há alguns anos ao tema da inovação, tanto por políticas públicas quanto por iniciativas das lideranças empresariais, poderia desempenhar sobre os indicadores.

No entanto, ao menos em primeira análise, a nova edição da Pintec está mostrando um quadro pouco animador, para não dizer decepcionante. De acordo com a pesquisa, a taxa de inovação, isto é, a proporção de empresas que declararam terem introduzido pelo menos uma inovação no período 2006-2008, subiu para 38,4% ante 33,6% verificado no período 2003-2005. Aparentemente auspicioso, esse crescimento, porém, não foi acompanhado de igual expansão dos indicadores de esforço, que geralmente constituem medidas mais robustas da inovação. Assim, enquanto 5,6% das empresas realizaram atividades internas de pesquisa e desenvolvimento em 2005, essa proporção caiu para 4,2% em 2008. Os gastos totais com atividades inovativas despendidos pelas empresas da indústria de transformação, que eram de 2,8% do faturamento em 2005 retrocederam para 2,6% em 2008 enquanto a parcela da despesa destinada especificamente à P&D intra-muros ficou estacionada em 0,6% do faturamento.

Observando-se os dados segundo o porte das empresas, o quadro sugestivo de insuficiente engajamento do setor empresarial com a inovação se mantém. Entre 2005 e 2008, a proporção de empresas que se dedicaram a atividades de P&D caiu, respectivamente, de 3,9% para 3,4% das empresas de pequeno porte (com até 99 pessoas ocupadas); de 16,2% para 7,9% das empresas de médio porte (de 100 a 499 pessoas ocupadas); e de 44,9% para 36,3% das empresas de grande porte (com 500 ou mais ocupados). Ainda mais sugestivo é o indicador proporcionado pela evolução do número de pessoas ocupadas diretamente em atividades de P&D: enquanto o emprego na indústria de transformação cresceu 15,2% entre 2005 e 2008, o número de pessoas ligadas à P&D praticamente não se alterou, implicando uma queda da proporção de 0,80%, já muito baixa, vigente em 2005, para 0,69% em 2008. Desse contingente, o número de pessoas com pós-graduação, que era de 4.280 mestres e doutores em 2005 passou para 4.340 em 2008 – um aumento de 60 pesquisadores em três anos.

O forte crescimento da produção e tantas outras variáveis não influenciaram o desempenho inovador
Enfim, são muitos indicadores a apontar que o forte crescimento da produção, vendas, exportação, emprego e investimento fixo e tantas outras variáveis que marcou o ano de 2008 não se transmitiu ao desempenho inovador das empresas. Se atravessar os períodos de baixa do ciclo macroeconômico do passado pareceu determinante para desestimular as empresas a adotarem um comportamento tecnológico mais ativo, como tão claramente mostram as Pintec anteriores, o contrário não se mostrou verdadeiro: surfar a onda de crescimento industrial ocorrido no período coberto pela última edição da pesquisa não foi nem de longe suficiente para incentivar as empresas a reverterem esse comportamento.

Com relação à dimensão institucional, mesmo dando-se o devido desconto ao fato de que três anos é um intervalo de tempo claramente insuficiente para a avaliação de políticas de tempo lento de maturação como a política tecnológica, parece prudente ouvir desde já o que os números estão falando. A redução no engajamento das empresas nas atividades inovativas, a rigidez observada nos gastos com P&D, a contração do emprego de pessoal ligado a essas atividades, dentre outros indicadores coletados pela Pintec 2008, levam à percepção de que na determinação do esforço em P&D no Brasil é pequeno o componente "puxado pela demanda". Há boas razões para se crer que enquanto prevalecer a atual (ausência de) dinâmica, na qual o componente "empurrado pela ciência e tecnologia" mantém-se predominante na indução do progresso tecnológico, o salto para inovação tão ambicionado por governo e lideranças empresariais encontrará muita dificuldade para deslanchar.

A qualidade do levantamento e a riqueza de informações proporcionadas pela Pintec certamente darão margem a estudos aprofundados que serão de grande valia para orientar a construção de novas abordagens para o problema da inovação na economia brasileira. Como se vê, também no campo da inovação transformações de fundo na política em curso estão sendo requeridas.

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David Kupfer é professor do Instituto de Economia da UFRJ e coordenador do Grupo de Indústria e Competitividade (GIC-IE/UFRJ. /www.ie.ufrj.br/gic

Fonte: jornal Valor Econômico