“Há quase mil e seiscentos anos atuava no Império Romano um perigoso partido revolucionário. Esse partido minava a religião e todos os fundamentos do Estado; negava sem rodeios que a vontade do imperador fosse a lei suprema; era um partido sem pátria, internacional, estendia-se por todo o Império desde a Gália à Ásia e mesmo para lá das fronteiras imperiais. Durante muito tempo havia trabalhado subterraneamente, sob a terra. Todavia, depois de certo tempo já se considerava suficientemente forte para aparecer à luz do dia. Esse partido subversivo, que era conhecido pelo nome de cristãos, tinha também uma forte representação no exército; legiões inteiras eram cristãs. Quando lhes ordenavam que estivessem presentes nas cerimônias de sacrifícios da igreja oficial, para aí prestarem suas honras, esses soldados subversivos levavam o seu atrevimento tão longe que, como protesto, punham nos seus elmos distintivos especiais: cruzes. Mesmo os vulgares castigos dos quartéis, dados pelos seus superiores, não surtiam qualquer efeito. O imperador Diocleciano já não podia assistir tranquilamente ao minar da ordem, da obediência e da disciplina dentro do seu exército. Interveio energicamente porque ainda era tempo para isso. Emitiu uma lei contra os socialistas, quero dizer, contra os cristãos. Foram proibidas as reuniões de subversivos, os locais de reunião encerrados ou demolidos, os símbolos cristãos (cruzes etc.), proibidos, como na Saxônia atualmente o são os lenços vermelhos. Os cristãos foram declarados incapacitados para ocuparem cargos públicos, e nem sequer podiam ser cabos. Como a essa altura não se dispunha de juízes tão bem amestrados no respeitante à “reputação” de uma, como o pressupõe o projeto de lei contra a subversão do senhor Herr von Köller, proibiu-se sem mais rodeios os cristãos de defenderem os seus direitos perante o tribunal. Mas até esta lei de exceção não teve êxito. Os cristãos arrancaram-na dos muros, escarnecendo dela, e diz-se mesmo que deitaram fogo ao palácio do Imperador em Nicomédia, estando ele dentro. Este se vingou com a grande perseguição aos cristãos no ano 303 da nossa era. Foi a última no seu gênero. E foi tão eficaz que dezessete anos mais tarde o exército era composto predominantemente por cristãos e o autocrata de todo o Império Romano que se lhe seguiu, Constantino, chamado pelos padres o Grande, proclamou o cristianismo religião de Estado”.

*O título para este trecho do texto de Engels foi dado pelo editor.