O historiador Selônio conta que quando o imperador Vespasiano ordenou a reconstrução do Capitólio romano no século I, um artesão propôs a ele a utilização de máquinas que levariam de forma rápida e barata as colunas de pedra até o alto da colina. O imperador teria recusado a oferta, respondendo: “Que me seja permitido dar de comer aos mais pobres.” Atualmente, diante da maior onda de desemprego desde a Grande Depressão de 1929, o mundo parece estar ainda dividido entre os que raciocinam como o artesão romano e os que pensam como Vespasino.

Entre os dois há, evidentemente, a história das lutas proletárias e suas teorias. Se considerarmos apenas o período desde a Revolução Industrial, quando se agudiza a luta de classes, veremos que muita coisa mudou na forma de combater as causas do desemprego. Na Inglaterra do início do século XIX, que emergia como a grande potência econômica do planeta, os trabalhadores — incluindo crianças — eram acorrentados às máquinas e trabalhavam 14, 16 horas por dia. Essa realidade mudou, por meio da organização dos trabalhadores. Contribuíram para isso, fundamentalmente, as teses de Karl Marx, Friedrich Engels e Vladimir Lênin.

Contribuíram também os ludistas, os socialistas utópicos — e mesmo Taylor, Fayol e Ford. Estabeleceu-se a tríade “8 horas de trabalho, 8 de sono e 8 de lazer” como padrão para os trabalhadores do século 20. Entre 1950 e 1970, diz o historiador Eric Hobsbawn, o mundo viveu seus anos de ouro: o desemprego manteve-se em níveis relativamente baixos, a expectativa de vida aumentou no mundo inteiro, a produção de alimentos e bens manufaturados quadruplicou. Foi também o período em que os trabalhadores obtiveram suas maiores conquistas no mundo capitalista — em grande parte, embaladas pelos ventos que sopravam de Moscou —, inimagináveis pelo proletariado europeu descrito por Marx e Engels no século XIX.

No Brasil, a história também mostra que os trabalhadores sempre atuaram em estreita ligação com o desenvolvimento econômico e social. Chegamos ao século XXI, num país que está longe de ocupar posição de vanguarda na economia mundial, com uma legislação trabalhista avançada — e, por isso, alvo de ataques. No fundo, o que eles advogam, bem ao gosto da elite brasileira, é uma relação entre capital e trabalho na qual os trabalhadores são tratados não como seres humano, mas como insumo ordinário. A batalha em torno desse ponto, portanto, ganha contornos ideológicos de grande profundidade.

Hoje somos um país em que a jornada de trabalho é uma das mais extensas do mundo. Um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) de 2000 mostra que 71% da população economicamente ativa trabalham mais de 40 horas por semana, sendo que para 39% a jornada é de pelo menos 45 horas. Quem ficou empregado teve suas atribuições aumentadas e passou a trabalhar muito mais. Quem saiu foi obrigado a procurar alternativas menos rentáveis e mais cansativas, na busca de brechas no mercado informal.

Hoje, ganha corpo o debate que põe de um lado aqueles que defendem a tese do “menos horas, mais postos de trabalho” e de outro os que defendem a tese do “menos leis, mais empregos”. Essa batalha em defesa da primeira tese é decisiva porque se contrapõe à precarização das relações trabalhistas — que inevitavelmente eleva a jornada de trabalho, como demonstra o estudo do IBGE — e à forma chamada de “banco de horas”.

A história das lutas dos trabalhadores brasileiros é um maná de ensinamentos e um rico patrimônio político das forças políticas progressistas. Boa parte dessas conquistas veio quando a revolução industrial brasileira dava seus primeiros passos e outras chegaram no leito das memoráveis lutas pelo fim da longa noite de terror que caiu sobre o país com o advento do golpe militar de 1964 — consagradas na Constituição de 1988. E graças a elas o capitalismo no Brasil foi obrigado a adotar uma lógica menos selvagem em alguns períodos da nossa história.

A busca de uma saída para esse impasse passa inevitavelmente pela consolidação de uma frente nacional de forças amplas e diversificadas. Para tanto, temos uma tarefa importante e imediata: elevar nossa atuação política, de massas, à condição de força decisivamente influente. Na realidade, a consolidação desse projeto esbarra na existência de estruturas econômicas e sociais historicamente impostas pelos círculos financeiros internacionais e oligarquias monopolistas. Só a luta de classes militante será capaz de abrir caminhos para o êxito dessa alternativa.