No rumo dos que contestam a avassaladora onda de negação do socialismo e de apologia do capitalismo, esta obra apresenta instigantes contribuições. Conforme alerta o autor, “este livro é uma defesa do marxismo, embora feita de um ponto de vista que a maioria dos intelectuais marxistas consideraria excêntrica”. Muitas de suas opiniões são polêmicas, até “excêntricas”, mas reforçam o campo dos que lutam com a lógica burguesa – o que já é um grande feito nestes tempos bicudos.

Nos primeiros capítulos, Callinicos se debruça sobre a evolução dos regimes do Leste europeu, em especial da União Soviética, para “negar que a agonia do stalinismo importe na falência da tradição revolucionária fundada por Marx”. Para ele, o que morreu no Oriente não foi o socialismo, ainda que degenerado, mas sim sua negação. Daí a esperança de que “esse colapso pode, por conseguinte, permitir que a autêntica tradição marxista volte à luz do dia”.

Apesar da crítica contundente ao “período Stalin”, sob uma ótica de viés trotskista, sua análise se diferencia de outras marcadas pelo unilateralismo. Mesmo que a contragosto, ele aponta fatores objetivos que contribuíram para o fiasco das primeiras experiências socialistas. Em vários trechos, ressalta as “circunstâncias históricas que promoveram a transformação da democracia soviética em um regime autoritário” – que não significa qualquer absolvição à “monstruosa distorção stalinista”.
No capítulo seguinte, o livro questiona o chamado “triunfo do Ocidente”. Detona idéias tão em voga na atualidade como a de que não há nenhuma alternativa ao capitalismo liberal-democrático e que esse sistema passará por uma nova era de progresso. Callinicos retoma a velha tese de Marx sobre a queda da taxa de lucro como a principal causa das crises econômicas do capital. Os dados e argumentos são demolidores e servem também para bombardear qualquer ilusão com a social-democracia – identificada por ele como cúmplice do “avanço neoliberal” no mundo.

No final, após apontar os descaminhos do Leste europeu e rechaçar a “nova ordem” capitalista, o autor apresenta algumas reflexões estimulantes sobre a construção do socialismo. Neste ponto, enfrenta questões delicadas e decisivas, como a da relação entre mercado e planificação, o nó da democracia socialista, e outras. E sempre de maneira polêmica, como a travada com Alec Nove sobre o “socialismo de mercado” e com Norberto Bobbio sobre os limites da democracia liberal.

Como conclusão, Callinicos reafirma sua opção socialista. “Em São Paulo e em Varsóvia, em Joanesburgo e em Londres, em Seul e em Moscou, no Cairo e em Nova Iorque, as mesmas opções básicas são colocadas. Deixamos o mercado vencer, com todas as desastrosas consequências que isso terá para o bem-estar da humanidade e, talvez, para a sobrevivência da terra? Vamos procurar humanizá-lo, como a social-democracia vem tentando fazer, sem sucesso, desde os primórdios do século? Ou vamos lutar para substituir a anarquia e a injustiça do capitalismo por um sistema social baseado no controle coletivo e democrático dos recursos do mundo pelos trabalhadores?”

“Deve estar bem claro que prefiro a terceira dessas alternativas e que acredito que o marxismo clássico represente o melhor caminho para concretizá-la. ‘Melhor’ não significa perfeito. Há, sem dúvida, muitas perguntas que os socialistas revolucionários têm ainda que responder ou responder satisfatoriamente. Não obstante, o marxismo clássico é a única tradição que possui recursos teóricos e políticos necessários para enfrentar as questões com que ora nos deparamos”.