Dean Baker
Por Mary Stassinákis, no Monitor Mercantil

É o que sustenta o economista norte-americano Dean Baker, co-fundador do Centro de Pesquisas Econômicas e Políticas de Washington Ele é contra o plano de Obama para a salvação dos bancos através da compra dos títulos tóxicos e garante que isso não só não trará resultados como atingirá o capital político do novo presidente dos EUA.
A seguir, nesta entrevista, suas contundentes respostas.

O senhor foi um dos economistas que previram a atual crise econômica. Pensamentos e reações à parte, por que homens como o senhor não foram incluídos no grupo econômico de Obama?

O presidente Obama tem relações estreitas com a indústria financeira. A indústria financeira não quer ver alguém que considere este setor como a principal fonte do problema econômico do país em uma posição de influência no governo Obama.

O senhor, Krugman e Stiglitz têm severas reservas e fortes críticas contra o último plano econômico do governo Obama para a salvação dos organismos financeiros. Quais são os piores aspectos deste plano?

O plano é, na realidade, um subsídio indireto dos contribuintes aos bancos falidos. Inclui um sistema complicado por intermédio do qual as compras dos títulos tóxicos pelos investidores serão subsidiadas pelo governo.

É difícil alguém dizer qual é exatamente o pior aspecto do plano. Economicamente, é tresloucado e injustificado (os bancos e os investidores sairão ganhando no final, seja qual for a evolução da situação), e é quase certo que resultará em grandes perdas para os contribuintes, pois existirão centenas de bilhões em empréstimos estatais que serão utilizados para a compra de títulos tóxicos, empréstimos estes que jamais serão resgatados.

O sistema criará, também, uma situação na qual os administradores de capitais (as aves de rapina dos capitais mútuos especulativos) bem postos poderão ganhar bilhões de dólares. Realmente não sinto que devemos continuar subsidiando os bilionários.

Também é provável que o problema não seja corrigido. Mesmo com os subsídios estatais, é possível que muitos dos empréstimos tóxicos dos bancos não sejam comprados. Adicionalmente, os bancos estão verificando que os resgates dos empréstimos estão indo, diariamente, de mal a pior.

A explosão galopante do desemprego e as grandes quedas nos preços das casas não quebram somente recordes históricos de não resgate dos empréstimos hipotecados, mas também em todos os outros tipos de empréstimos de consumo, e até de empréstimos para as pequenas empresas.

Enquanto os consumidores tinham a possibilidade de tomar empréstimos graças ao crescente valor de seus imóveis, resgatavam as prestações dos outros empréstimos. Mas agora que esta possibilidade desapareceu, não conseguem resgatar os empréstimos de consumo.

A bolha do mercado de imóveis comerciais também despenca, levando a uma fonte de dívida tóxica completamente nova. Em poucas palavras, os bancos zumbis estão quase certos de que permanecerão bancos zumbis mesmo após o plano Geithner.

Aquilo que precisamos fazer é acabarmos com estes bancos zumbis, concentrarmos e reconstruirmos o setor financeiro. O plano Geithner atrasará esta reforma, e poderá até impedi-la totalmente.

Finalmente, como questão política, o plano Geithner provavelmente se revelará muito prejudicial para o presidente Obama, e os banqueiros e os investidores de capitais mútuos especulativos enriquecerão com este plano.

Estes homens são pouco mais populares do que os pedófilos. O presidente Obama chegará a perder grande parte de seu capital político por causa da percepção que, aos poucos, predominará: a de que ele está com eles.

Está em curso uma queda de braço pública entre o senhor e Krugman. De que se trata, exatamente?

Tenho sustentado que a razão básica da recessão é a derrocada do mercado habitacional e a repercussão que esta perda de riqueza teve sobre o consumo. A queda de consumo, a partir do momento que estourou a bolha habitacional, ainda permanece menor do que poderia se esperar, com base nas avaliações disponíveis da dimensão de reação da riqueza deste mercado.

Krugman tem enfatizado a repercussão da derrocada financeira. Assim, prioriza a necessidade de corrigir o sistema bancário. Considero a correção do sistema bancário algo desejável, mas não acho que seja um fator principal neste estágio da recessão.

Os homens com bom histórico de crédito não encontram nenhuma dificuldade para contrair empréstimos para casas, para cartões de crédito, para empréstimos de estudantes e outras formas de crédito ao consumidor. O mesmo vigora para as empresas com avaliações de crédito sólidas.

Os indivíduos e as empresas com credibilidade menor têm problema, mas isso ocorreria mesmo que o sistema bancário estivesse totalmente capitalizado. Os bancos não emprestam dinheiro a indivíduos ou bancos com risco de crédito alto quando a economia está em queda.

Em consequência, desejaria ver um bom plano para sanear o sistema bancário, mas não vejo que exista uma necessidade tão urgente como vê Krugman.

Qual é a avaliação do senhor sobre a atual situação da crise? Recentemente, Obama declarou que as perspectivas para a economia mundial estão melhorando. O senhor está de acordo?

Não, a situação continuará se agravando. Ainda estamos em meio à uma grande recessão. Nos EUA, os preços das casas continuam afundando, as empresas continuam demitindo trabalhadores em ritmos nunca vistos, o governo federal e os governos estaduais demitem funcionários públicos e os investimos recuaram 20% em comparação com o ano passado.

Em outros países, a crise já atinge os níveis da crise nos EUA, por causa da queda das exportações e do correspondente estouro de bolha imobiliária em seus mercados.
Ainda demorará muito até que a economia mundial atinja o fundo do poço. Se tivermos sorte, o ritmo de queda se retardará. Mas é quase impossível que tanto a economia norte-americana quanto a mundial não vivenciem uma recessão galopante dentro do segundo trimestre e recessão contínua no terceiro e quarto trimestres deste ano. O cenário mais pessimista é vermos alguma recuperação da economia no início do ano que vem.

Qual é a avaliação do senhor sobre o gerenciamento da crise pela União Européia?

Até agora, pelo menos, a União Européia se mostrou absolutamente disfuncional em relação ao gerenciamento da crise. O fracasso para conseguir qualquer acordo para um essencial pacote de apoio econômico garante uma recessão prolongada e uma recuperação lenta.

Além disso, o fato de o Banco Central Europeu manter a taxa de juros em 1,25% é surpreendente. Sinceramente, na União Européia ainda se preocupam com a possibilidade de a inflação escapar?

A exemplo dos EUA, a Europa deveria fazer o possível para tonificar suas economias, mas, por causa das linhas divisórias nacionais e sua percepção ideológica distorcida, grande parte dos líderes europeus parece recusar até a existência da crise.
Sob este ponto de vista, a comparação com os EUA é impressionante. Nos EUA, existe um acordo em todo o espectro político para a necessidade de intervenção essencial que tonifique a economia, mesmo que existam discordâncias em relação a forma de tonificação.

A China começou a se preocupar com a dívida norte-americana e o valor do dólar. Também apresentou a proposta de criação de uma nova moeda mundial em substituição ao dólar. Isto é uma boa idéia? Quais são as perspectivas de os EUA aceitarem esta proposta?

Não creio que a China realmente esteja preocupada com o valor do dólar. Os chineses não são tolos. Sabem por muitos anos que mantêm o valor do dólar alto com as compras de dólares que realizam.

Aquilo foi uma política consciente (na realidade, o governo dos EUA havia pedido à China para que cessasse de apoiar o dólar). Assim, a China sempre soube que perderia dinheiro pelos seus investimentos em dólar.

Os comentários públicos dos líderes da China devem ser interpretados como uma intervenção política. Muito provavelmente, querem destacar sua pretensão de possuir um papel maior de liderança nas questões econômicas internacionais.

Considerando a dimensão da China e a força de sua economia, não vejo nenhuma forma que possa evitar que a China desempenhe um papel maior no proscênio internacional. E será melhor que isto aconteça. A concorrência – de um modo geral – é algo muito bom.

A economia capitalista mundial está muito distante de uma situação de equilíbrio. Que medidas transitórias devem ser tomadas para o sistema funcionar de acordo com as necessidades do Século XXI – aumento da população mundial, desigualdade crescente, mudanças climáticas, falta de água e assim por diante?

Há muito a ser feito, e a ordem do dia é consideravelmente diferente em cada país e região. Nos EUA devemos concluir o desenvolvimento de um Estado de Previdência Social, com um sistema nacional de assistência médico-hospitalar e outros direitos para os cidadãos e os trabalhadores.

Internacionalmente, devemos pelo menos tomar as primeiras medidas para reduzir as emissões de gases poluentes do efeito estufa.

Seria também um grande passo à frente se parte do pacote de recuperação desta recessão incluísse um verdadeiro compromisso de ajuda para o desenvolvimento da África e para vários países do Hemisfério Sul. Foi um escândalo o fato de o capital fluir dos países pobres para os países ricos na última década.

Finalmente, considerando que a crise atual provém de um grande déficit de demanda, uma forma de criar a demanda necessária é proporcionar aos países pobres os meios de adquirirem bens e serviços dos países ricos.

Seria também uma grande vitória para a humanidade se o setor financeiro pudesse se domesticar e voltasse a atender as necessidades da economia produtiva. Nas melhores épocas, este super-estufado setor é uma fonte considerável de esbanjamento econômico.

Quando a especulação financeira é lançada no ar, como está ocorrendo na crise atual, os resultados são realmente catastróficos.