Nas travessias aéreas, Armando e Thiago disputavam uma guerrilha de marchinhas e canções. Quem sabia mais jardineiras, auroras e chiquitas bacanas? Havia ainda os diálogos entrecortados por citações de Machado de Assis. De memória.

– Primeiro, andei de barco. Depois, andei de carro, para pegar o avião e ouvir a fala macia do meu amigo. Estive com ele há dez dias, falei no ouvido dele. Agora, vou pegar o mesmo voo. Só que dessa vez não vou ouvir mais a fala suave do meu amigo. Vou vê-lo dormindo pela última vez.

Armando Nogueira morreu a um dia do aniversário de Thiago de Mello, que completa 84 anos neste 30 de março. "Ele não era o melhor amigo, não. Era o amigo principal, era o amigo completo", proclama o vago mago, como o definiu Pablo Neruda.

Há doze dias, no hospital Copa D'Or, o poeta de Barreirinha recitou o poema "Cotovia", de Manuel Bandeira, no ouvido de Armando:

"- Alô, cotovia!
Aonde voaste,
Por onde andaste,
Que saudades me deixaste?"

"Ele reconheceu minha voz e abriu o olho esquerdo", descreve Thiago de Mello, perto de desligar o telefone: "Adeus, companheiro!".

E adeus, Armando Nogueira.

***

Por que não terminar de ler o poema de Manuel Bandeira, na despedida do cronista de "Na grande área"?

"Cotovia"

– Alô, cotovia!
Aonde voaste,
Por onde andaste,
Que saudades me deixaste?

– Andei onde deu o vento.
Onde foi meu pensamento
Em sítios, que nunca viste,
De um país que não existe…
Voltei, te trouxe a alegria.

– Muito contas, cotovia!
E que outras terras distantes
Visitaste? Dize ao triste.

– Líbia ardente, Cítia fria,
Europa, França, Bahia…

– E esqueceste Pernambuco,
Distraída?

– Voei ao Recife, no Cais
Pousei na Rua da Aurora.

– Aurora da minha vida
Que os anos não trazem mais!

– Os anos não, nem os dias,
Que isso cabe às cotovias.
Meu bico é bem pequenino
Para o bem que é deste mundo:
Se enche com uma gota de água.
Mas sei torcer o destino,
Sei no espaço de um segundo
Limpar o pesar mais fundo.
Voei ao Recife, e dos longes
Das distâncias, aonde alcança
Só a asa da cotovia,
– Do mais remoto e perempto
Dos teus dias de criança
Te trouxe a extinta esperança,
Trouxe a perdida alegria.

(Manuel Bandeira)

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Jornalista Armando Nogueira morre no Rio de Janeiro

O jornalista Armando Nogueira morreu nesta segunda-feira, na cidade do Rio de Janeiro. Aos 83 anos, o torcedor do Botafogo foi vítima de um câncer que já o afligia desde 2007. A morte ocorreu em seu apartamento na Zona Sul da capital carioca, às 7h (de Brasília). O corpo será velado nesta segunda, às 14h (de Brasília), no Salão Nobre do Maracanã. O enterro será na terça, às 11h, no Cemitério São João Batista. Um dos pioneiros do telejornalismo no Brasil, Nogueira trabalhou grande parte de sua carreira na Rede Globo. Na emissora, ocupou o cargo de diretor da Central Globo de Jornalismo.

Nascido no Acre, Armando Nogueira tem grande parte de sua história ligada ao Rio de Janeiro, para onde se mudou quando tinha 17 anos. Formou-se em Direito, mas passou a trabalhar com Jornalismo desde 1950, quando conseguiu o emprego no jornal Diário Carioca. Permaneceu no jornal por 13 anos e ganhou destaque ao narrar, em primeira pessoa, o atentado ao jornalista Carlos Lacerda, inimigo declarado de Getúlio Vargas.

Nogueira trabalhou também nos jornais Diário da Noite e Jornal do Brasil e na Rádio Bandeirantes, além das revistas Manchete e O Cruzeiro. Chegou à Rede Globo em 1966 e foi responsável por implementar o telejornalismo na emissora, quando ficou 25 anos a frente do Jornal Nacional e do Globo Repórter.

Depois, Nogueira passou a se dedicar ao jornalismo esportivo. A ligação entre o jornalista e o futebol é antiga. Armando Nogueira cobriu todas as Copas do Mundo a partir de 1954 e todos os Jogos Olímpicos desde 1980. Escreveu dez livros, todos sobre esportes. No final de sua carreira, trabalhou no Sportv e na rádio CBN

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Fonte: Terramagazine