Há, a meu ver, erros de ambos os lados. Do lado do governo deveria ter havido uma negociação com os grupos sociais que se sentem ameaçados e com os movimentos ambientalistas contrários à obra. A questão dos impactos ambientais não deve ter tratamento apenas burocrático. No caso das usinas de Santo Antonio e Jirau no Rio Madeira — cujos impactos sob certos aspectos, relativamente à potência instalada, são até maiores do que os de Belo Monte — chegou-se a bom termo após muitas discussões.

As exigências ambientais foram atendidas até certo ponto e as objeções foram respondidas.

Não se chegou ao impasse atual.

Por outro lado, há muitos equívocos nas críticas. A área inundada não é grande como alegam. Ela se restringe praticamente à inundação que o rio já faz na sua variação sazonal de largura. Em comparação a outras hidrelétricas, ela com 516 km2 é bem menor que Itaipu com 1.300 km2. A usina de Balbina, no Amazonas, tem menos de 0,1 W por m2, a de Belo Monte terá 24,8 W por m2. Ao contrário, um problema é a redução da água em um longo trecho do curso de água, o que preocupa moradores ribeirinhos.

Belo Monte será uma usina a fio d’água, ou seja, não terá reservatório para acumulação como fazem as hidrelétricas antigas do sistema interligado brasileiro.

Reduziram-se os impactos, mas o preço a pagar foi a perda da capacidade de regularizar a vazão, reduzindo a energia gerada. A potência máxima de Belo Monte é 11,2 GW e a média é 4,5 GW. A relação desses dois valores dá o fator de capacidade de cerca de 40%, bem menor que os de Jirau e Santo Antonio. Embora estas também sejam a fio d’água, o Rio Xingu tem maior variação de vazão que o Rio Madeira.

Entretanto, a maioria das hidrelétricas no país tem fator de capacidade não muito acima de 50%. Logo a comparação deve ser com esse valor. A operação de Belo Monte não pode ser vista isoladamente, pois ela estará no sistema interligado, no qual há transmissão de energia de uma região a outras.

Quando Belo Monte gerar com 11 GW permitirá guardar água em reservatórios de outras usinas que reduzirão sua geração. E essa água guardada permitirá gerar energia adicional nessas usinas quando Belo Monte tiver com pouca água. Isso não é bem compreendido em geral.

Uma afirmação equivocada é que o país não necessita de mais energia. O programa Luz para Todos se propôs a atender cerca de 12 milhões de brasileiros que não tinham energia elétrica. Ademais, 20 milhões de pessoas que entraram no mercado compram aparelhos elétricos, aumentando a demanda. O consumo per capita de energia elétrica no Brasil não só é muito menor que o dos países desenvolvidos, ele é menor que os de alguns países sul-americanos.

Além disso, o crescimento econômico implica aumento da demanda. Mudar a estrutura da indústria intensiva em eletricidade é correto, mas exige outra correlação de forças políticas.

É importante evitar a construção de termoelétricas a óleo e a diesel que vinha crescendo, contribuindo mais para o aquecimento do planeta, além de produzirem energia cara. Mas se deve investir em tecnologias alternativas.

Outra crítica feita por empresas é ao preço da energia, que ficou em R$ 78/MWh. Ele é possível desde que a taxa de retorno seja moderada, como é natural em obras públicas e a participação das empresas do grupo Eletrobras devia ser majoritária, impedida por um dispositivo que era destinado à sua privatização e nunca foi revogado.

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Diretor da Coppe/UFRJ

Fonte: jornal O Globo