Sua alma foi dissecada pela pesquisadora Maria Victoria de Mesquita Benevides no livro A UDN e o udenismo. Uma frase de Afonso Arinos de Mello Franco já na abertura revela que o movimento nasceu heterogêneo, mesclando personalidades de esquerda com velhos carcomidos da República Velha. “Havia duas direitas antidemocráticas aninhadas na UDN: uma que detestava a herança varguista e aspirava a ditadura militar por motivos políticos, e outra que tendia também para a ditadura militar, mas por reacionarismo econômico e hostilidade ao progresso social”, dizia ele.

Ao longo de sua trajetória, grupos foram deixando a organização que se esmerou na arte da trapaça, da falsidade, do golpismo. Em torno dela foram se agrupando militares de direita, empresários reacionários, religiosos fascistas e a mídia. Suas propostas nunca foram aceitas pelas massas — das eleições ocorridas no período democrático, entre 1945 e 1964, ganhou apenas quando Jânio Quadros foi candidato. Mas ele não era um udenista convicto e abandonou as principais propostas do movimento direitista.

Essa organização essencialmente elitista plasmou um programa de governo que, por mais edulcorado que fosse, não teria como ser aplicado em um sistema democrático. O recurso do golpismo surgiu como alternativa. Bateram nessa tecla até que romperam os diques da democracia o tomaram o poder a mão armada em 1964. Passada a tormenta da ditadura, na qual o movimento ganhou o nome de Aliança Renovadora Nacional (Arena), marcada por retumbantes fracassos da teoria udenista, suas idéias se reorganizaram em siglas distintas até se juntarem na dupla PSDB-PFL(DEM) e afundarem ainda mais o país durante o regime neoliberal.

Crimes não faltaram nessa trajetória. Além das torturas e assassinatos durante o regime militar, eles impediram que o país acelerassem a marcha do progresso por meio de golpes, quarteladas, campanhas sórdidas da mídia e manobras parlamentares. Esse sistema tumultuou a vida do país a tal ponto que ainda hoje garantias constitucionais mínimas do Estado de Direito não são respeitadas. Quem acompanha a campanha de José Serra com olhos abertos vê claramente que ela não respeita os mais elementares fundamentos do Estado democrático — como a laicidade do poder público, a inviolabilidade da honra, o respeito à dignidade das pessoas.

Compreender esse processo histórico é compreender a gravidade que representa uma vitória da direita nas eleições de domingo. O Brasil certamente daria um gigantesco passo atrás. Seria o resgate dos ideais da Republica Velha — pré-Revolução de 1930 —, o fortalecimento de uma tendência política elitista originária na colônia e plasmada pela constituição e evolução do pensamento udenista. O Brasil avançou, aos trancos e barrocos, contra esse pensamento e se transformou em uma grande nação. A volta do udenismo seria a volta daquela República chinfrim, de bananas, que marcou época antes de 1930, na ditadura militar e no regime neoliberal.