Essas eleições deverão definir se o sandinismo continuará governando por outros cinco anos ou se a história de 1990 se repetirá, quando outra ida às urnas abriu as portas para um período neoliberal de triste recordação para uma boa parte do país.

Naquela ocasião, o governo sandinista de então, resultado da vitória revolucionária de 1979 contra a ditadura somozista, estava à frente de um país devastado pela guerra imposta pelos Estados Unidos, que foi acompanhada pelo bloqueio econômico e pressões externas de todo tipo, também impulsadas por Washington. Para vencer a Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) nas urnas, a maioria das formações opositoras ressuscitaram em 1989 a União Nacional Opositora (UM), criada em 1966 para enfrentar Somoza e falecida um ano depois, à qual se integraram 14 partidos políticos, e Violeta Barrios de Chamorro foi nomeada como candidata presidencial. Em 25 de fevereiro de 1990 realizaram as eleições e, contra o que previam algumas pesquisas, a UM saiu vencedora com 54 por cento dos votos, e a partir daí foram presidentes do país Violeta Barrios (1990-1997), Arnoldo Alemán Lacayo (1997-2002) e Enrique Bolaños Geyer (2002-2007).

De acordo com diversos analistas, esses três governos neoliberais, além de jogar para baixo a imensa maioria das medidas de benefício popular, que no durante a guerra e do acosso externo haviam sido colocadas em prática pelos sandinistas na década dos anos 80, caracterizaram-se pela privatização acelerada, a corrupção e o saque dos cofres do Estado.

A isso podemos acrescentar que foi eliminada a gratuidade da atenção médica e da educação, abandonou-se a campanha de alfabetização e o índice de analfabetos, que havia sido notavelmente reduzido pelo primeiro governo sandinista, voltou a crescer de maneira significativa.

Enquanto isso, as limitadas riquezas do país se concentraram em uma elite privilegiada e a maior parte da população ficou mais pobre.

As eleições de 2006

Com esse panorama de fundo, para as eleições de novembro de 2006 coincidiram cinco formações políticas, lideradas pela FSLN, com Daniel Ortega Saavedra como candidato presidencial, e o empresário e político liberal Jaime Morales Carazo como vice-presidente.

Com a marca comum de opositores ao sandinismo, fizeram parte dessas eleições o Partido Liberal Constitucionalista (PLC), que levou José Rizo Castellón como candidato à presidência; o Movimento de Renovação Sandinista, MRS, (Edmundo Jarquín), e o Partido Alternativa por El Cambio, PAC, (Edén Pastora).

Além disso, o grupo integrado pela Aliança Liberal Nicaraguense (ALN) e o Partido Conservador, que apresentou Eduardo Montealegre Rivas como candidato presidencial, abertamente respaldado pelos Estados Unidos por intermediação de Paul Trivelli, o embaixador de Washington em Manágua, cujas ingerências nos assuntos internos nicaraguenses são já quase lendárias.

Mas dessa vez não ocorreu o mesmo que em 1990, nem também nas duas eleições seguintes, que deram o triunfo a Dona Violeta, a Alemán e a Bolaños, sucessivamente.

Pese à enorme campanha interna e externa desatada contra si, a FSLN emergiu vitoriosa nesta eleição com 37,99 por cento dos votos, o que levou Daniel Ortega novamente à presidência do país, e deu aos sandinistas 38 lugares dos 92 que compõem a Assembléia Nacional.

A segunda fase da Revolução Sandinista

O resto da história está mais fresco na memória.

Ortega assumiu o governo em 10 de janeiro de 2007 e nos mais de quatro anos decorridos desde então, na Nicarágua não apenas não se desatou uma guerra civil, como diziam alguns pessimistas, senão que é considerado hoje o país mais tranquilo e seguro da América Central, onde o exército e a polícia são baluartes da segurança cidadã e pilares no confronto ao narcotráfico e ao crime organizado.

Igualmente, as autoridades têm sabido evitar os efeitos da crise econômica global e a economia melhora de maneira sustentada, as empresas privadas parece se sentir à vontade com o governo e o clima interno estimula os investimentos estrangeiros, que aumentam a cada ano.

A educação e a saúde públicas voltaram a ser gratuitas, e retomou-se o programa de alfabetização, o que permitiu reduzir o índice de analfabetos de 22 por cento registrado em 2006, para 3,33 por cento no encerramento do passado ano, e se realizam intensos esforços para que toda a população atinja ao menos o sexto grau de escolaridade.

Unido a isso, o governo do presidente Daniel Ortega aplica numerosos programas de importante repercussão social, destinados a melhorar as condições de vida dos setores menos favorecidos, que na Nicarágua, o segundo país mais pobre da América Latina, constituem a grande maioria de seus quase seis milhões de habitantes.

Na política exterior, o governo tem reafirmado a independência, soberania e autodeterminação da Nicarágua e tem diversificado seus vínculos externos, a fim de eliminar a dependência quase absoluta dos Estados Unidos, e tem ratificado sua vocação progressista e a favor da unidade regional com sua integração à Aliança Bolivariana dos Povos da Nossa América (ALBA).

Tudo isso, unido à política de unidade e reconciliação nacional levantada pelo governo sandinista ao longo de seu mandato, atrai cada vez mais novos setores da população, enquanto ganha força a sensação de que somente a FSLN tem sido capaz de aplicar programas e medidas em benefício das grandes massas despossuídas.

No entanto, os setores tradicionalmente mais conservadores da sociedade e outros vinculados -e sustentados- com interesses estrangeiros, não se mostram dispostos a renunciar suas aspirações de voltar a governar a Nicarágua.

Para as eleições de 2011

Desde que começou a chamada segunda fase da Revolução, em 10 de janeiro de 2007, as formações políticas antisandinistas parecem ter tido total clareza na estratégia a seguir para voltar ao governo em janeiro de 2012.

Campanhas de todo o tipo ocorrem desde então para tratar de desqualificar o governo, por um lado, e ao presidente Daniel Ortega, por outro, com o respaldo da hierarquia católica e dos dois únicos jornais de circulação nacional e de outros meios de imprensa de rádio e televisão.

Tambémo, tentou-se bloquear o funcionamento da Assembléia Nacional e de outros poderes do Estado, com o objetivo de criar uma situação de caos e paralisar o país, o que finalmente terminou fracassando.

Junto a isso, realizaram desde muito cedo intensos esforços para reeditar a experiência de 1990 e conseguir a unidade da oposição, diante da certeza de que estão fragmentados para a eleição de 6 de novembro, não tendo a menor possibilidade de vencer.

Mas a oposição também não conseguiu seus objetivos nessa esfera, apesar dos insistentes chamados à unidade formulados nos palanques e nas salas de redação de alguns jornais, e, segundo se assegura, também da sede diplomática estadunidense.

Tudo parece indicar que têm primado, sobretudo, as ambições pessoais de líderes que, aparte da retórica empregada em seus discursos, não oferecem nada novo à população.

A fragmentação da oposição para a próxima eleição fez-se oficial no último 1º de março, data limite para a inscrição no Conselho Supremo Eleitoral (CSE) das alianças políticas candidatas a participar nas eleições.

Quatro grupos apresentaram sua documentação nesse dia no CSE, entre elas a Aliança Unida Nicarágua Triunfa, que a FSLN lidera, ao qual se uniram outros sete partidos e seis movimentos políticos, com Daniel Ortega como candidato presidencial. Outra está integrada pelo Partido Liberal Constitucionalista (PLC) e o Partido Conservador (PC), com o ex-presidente Arnoldo Alemán como candidato para um novo mandato à frente do governo, e uma terceira conformada pela Aliança pela República (APRE), o Partido Unionista Centro-americano (PUCA) e Partido Neoliberal (PALI).

O quarteto de alianças é completado pelo Partido Liberal Independente (PLI), que deu refúgio à denominada Unidade Nicaraguense pela Esperança (UNE), que a sua vez está integrada pelo Movimento de Renovação Sandinista (MRS) e o Movimento Vamos com Eduardo (MVCE) que lidera Eduardo Montealegre.

A UNE é um conglomerado político heterogêneo manobrado nos bastidores por Montealegre, que tem como líderes visíveis e candidatos à presidência e à vice-presidência do país ao octogenário empresário do setor de rádios Fabio Gadea Mantilla e ao dissidente sandinista e dirigente do MRS Edmundo Jarquín, respectivamente.

Gadea, que se caracteriza por seus frequentes e graves "lapsos" políticos em suas declarações públicas, é membro o PLC -ao que está obrigado a renunciar-, tem representado esse partido durante três períodos no Parlamento Centro-americano, e é consogro de Arnoldo Alemán, com quem tem netos comuns.

A UNE foi lançada em meados do ano passado por Montealegre, depois do fracasso de quase um ano de negociações buscando unidade com Alemán, na ilusão de agrupar ao redor dessa organização toda a oposição para enfrentar a FSLN nas urnas, um objetivo que está longe de ter se concretizado.

Além desses quatro grupos, na eleição de novembro próximo fará parte também, mas de forma solitária, a Aliança Liberal Nicaraguense (ALN), depois do fracasso das tentativas que fez para se unir, primeiro com a UNE e depois com o PLC.

Este partido levará como candidato para a presidência ao deputado Enrique Quiñones, e para a vice-presidência se especula a designação de um dirigente das igrejas evangélicas.

De acordo com o calendário estabelecido pelo CSE, em 18 de março deverão ficar inscritos oficialmente os candidatos de todas estas formações a presidente e vice-presidentes da República, e a deputados à Assembléia Nacional e ao Parlamento Centro-americano.

Neste panorama, ainda é cedo para prever os resultados nas eleições do próximo novembro e muita água deverá passar ainda debaixo das pontes, mas se se trata de antecipar previsões, tudo parece indicar que a aliança liderada pelos sandinistas tem muitas opções para crescer com o triunfo e que novamente Daniel Ortega esteja à frente do governo na Nicarágua.

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Fonte: Prensa Latina