Era uma vez a Ásia, terra de tigres que cresciam e afiavam as garras. Taiwan, Coréia do Sul, Cingapura e Hong Kong formavam as poderosas NIEs (Newly Industrialized Economies). Malásia, Tailândia, Indonésia e Filipinas eram as maiores economias do grupo Asean (Associacion of the South-East Nations). Do ponto de vista econômico, tudo parecia que estava bem, obrigado.

O ano de 1997 mudou aquela fotografia. A crise começou na Tailândia, com o “mercado” apostando contra o baht — a moeda local. Era a jugular da presa. Com um tigre caído, a insegurança se alastrou pela jângal. A crise ganhou proporções amazônicas quando os ataques se estenderam ao centro financeiro da Ásia, cercando o tigre que dominava aquelas paragens: Hong Kong e o seu dólar. Finalmente, ela chegou à Rússia e ao Brasil, catapultada a proporções planetárias e pânicas. Para não se afundar, o Brasil agarrou-se à tábua de salvação lançada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), fechando o primeiro acordo — renovado sucessivamente —, em novembro de 1998.

A crise que abalou o mundo iniciada em 1997 refletiu o modo como a maioria dos países arquitetou suas economias nos anos 1980 e 1990. O Brasil era um dos lugares em que a teoria de uma lógica do mercado financeiro funcionando como mão invisível, impedindo distorções localizadas, mais vicejou. Os “guardiões da moeda” da “era FHC” garantiam que o fluxo mirabolante de capital não falharia nunca em premiar os países que abrissem suas economias e promovessem “reformas estruturais”. Eles diziam que as decisões de compra e venda de papéis obedeciam a uma racionalidade baseada em análises objetivas sobre o potencial de crescimento de cada país.

Neologismo “malanismo”

O Brasil, portanto, precisava entrar nesse jogo com um modelo econômico “competitivo”. Nada de intervencionismos do Estado, nada de incentivos à produção. Essas eram as palavras de ordem dos neoliberais, que defendiam suas ideias como se fossem a interpretação da tábua de Moisés. Um deles, Gustavo Franco — que foi um arrogante presidente do Banco Central —, certa vez chamou Delfim Netto de “porta-voz do Parque Jurássico” para responder críticas sobre a apreciação cambial. Em outra, ele comentou a resistência dos portuários à privatização dos portos chamando os trabalhadores de “flanelinhas de navio”. Gustavo Franco era uma espécie de síntese da equipe econômica de Fernando Henrique Cardoso (FHC) e o presidente neoliberal o tratava como o porta-voz mais influente daquela política econômica.

Pedro Malan, o então ministro da Fazenda, era tão poderoso que certos círculos políticos chegaram a cunhar o neologismo “malanismo” para definir o que era a economia na “era FHC”. Em outubro de 1998, o então presidente da República, se aproveitando da crise que começou na Ásia, disse: “A opção é simples: fazer logo o ajuste (as reformas), enfrentando os sacrifícios necessários, e voltar a crescer o mais cedo possível. (…) O Estado se tornou incapaz de cumprir o seu papel no processo de desenvolvimento brasileiro.” “O Brasil precisa resolver seus problemas para tirar as dúvidas que, a cada crise externa, pairam sobre a nossa capacidade de manter o rumo”, disse ele. O país estava no centro do que o então presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, chamou de “a pior crise financeira do mundo nos últimos 50 anos”.

Na definição do jornal The New York Times, o Brasil constituía “a nova linha de frente na luta para conter a crise financeira internacional”. O receio era de que outros países pudessem ser contagiados por um eventual descarrilamento da economia brasileira. “Se o Brasil cair, a Europa e os Estados Unidos se converterão nos próximos campos de batalha”, escreveu o The New York Times. O medo de que o Brasil pudesse arrastar os países centrais para uma recessão chegou a ser tema de um seminário realizado em Washington pelo Center for Strategic and International Studies, entidade privada que congrega personalidades como os ex-secretários de Estado Henry Kissinger e Zbigniew Brzezinski. O nome do evento foi sugestivo: “Os próximos 90 dias — o efeito cachaça.”

Confiança externa

Nesse clima, a idéia do empréstimo do FMI era a de dar um reforço ao caixa brasileiro, condicionado a um programa de “ajuste fiscal”. O “malanismo” então passou a trabalhar na arquitetura do programa de arrocho nos investimentos públicos a fim de sobrar mais recursos para o pagamento dos serviços da dívida interna — o impopular superávit primário.

Ao assumir, a equipe econômica do governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva partiu desse ponto. Fez os cortes no orçamento, aumentou o superávit primário e os juros, e partiu para as “reformas”. Segundo o então ministro da Fazenda, Antônio Palocci, as medidas tinham a finalidade de “restaurar a confiança externa” para que o governo pudesse reduzir os juros. Desse modo, as indústrias poderiam produzir mais e a economia entraria num círculo virtuoso. O problema é que o governo corria o risco de promover um arrocho violento e ficar sem os resultados esperados.

Contudo, a não renovação do acordo com o FMI constituiu-se numa vitória do campo político que defendia o redirecionamento da política macroeconômica. O país, enfim, tinha a oportunidade de fazer valer as palavras do presidente Lula, segundo as quais o Brasil conquistou o direito de andar com as próprias pernas. Lula passou a fazer discursos consequentes ao dizer que a crise brasileira era complexa e dizia muito mais respeito às mudanças qualitativas que precisam ser operadas e aos imperativos da conjuntura internacional do que ao que poderia ou não fazer um presidente.

Primeiro enfrentamento

A saída de Pallocci — que foi derrubado não pelo que fez à frente do Ministério da Fazenda, mas pelo que representava para o presidente Lula — arejou o debate. Ele, como continuador da essência do “malanismo”, representava um setor da sociedade que colocava o governo em tensão permanente. Era um verdadeiro entrave aos projetos desenvolvimentistas e dificultava a viabilidade das políticas sociais. Não era, definitivamente, do campo progressista e nem mesmo do espectro centro-esquerda. A mudança de direção ajudou o governo a atravessar a crise política desencadeada pelo ataque midiático em 2005 com a farsa do “mensalão”.

A chegada de crise global em 2007 mostrou que o Brasil tinha musculatura para fazer o primeiro enfrentamento. Enquanto uns poucos senhores que perderam a compostura, e até mesmo a gravata e os botões das camisas no meio de um ataque de histeria coletiva — gritando “vendo”, arrancando os cabelos ou desmaiando perante os monitores que mostravam minuto a minuto como se evaporavam a honra, o prestígio e, sobretudo, o valor das ações dos líderes do mundo financeiro —, o governo brasileiro anunciava uma série de medidas, como a expansão da liquidez (maior disponibilidade de recursos de empréstimos), o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a extensão dos projetos sociais.

O espectro da crise, contudo, era assustador. Em artigo na revista África 21, Manrique S. Gaudin apresentou dados que demonstravam o início da pior crise do mundo capitalista desde aquela famosa quinta-feira, 24 de outubro de 1929, quando o crash da bolsa mais célebre do mundo, a de Nova Iorque, desencadeou a “Grande Depressão” — um longo período de recessão que, para devolver o sorriso ao mundo das finanças, foi preciso primeiro que a devastadora Segunda Guerra Mundial gerasse uma imensa procura de alimentos e crédito. As primeiras semanas de setembro de 2008 foram, segundo o artigo, o equivalente àquela quinta-feira do século passado.

Resgate privado

Desta vez, o furacão que começou a girar nos Estados Unidos levou os governos daquele país e da Europa a adotar o que um pouco antes seria classificado pela histeria neoliberal de “surto socialista” — a nacionalização de bancos, seguradores e entidades de crédito, no que se tornou o maior plano de resgate financeiro da história. Tratava-se, no entanto, de um “surto socialista” privado, de salvamento do particular, feito com recursos do Estado e do coletivo.

E ninguém exagerava ao falar do maior plano de resgate privado da história — para se ter uma ideia, os US$ 700 bilhões disponibilizados pelo presidente George Bush equivalem a 23 vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do Uruguai. Gaudin cita que só essa parte do plano de resgate — que incluiu aproximadamente outros US$ 300 bilhões ou mais — equivalia ao montante investido pelos Estados Unidos nos quase seis anos da sua guerra de ocupação do Iraque. Para salvar os bancos, cada cidadão dos Estados Unidos estava contribuindo com cerca de US$ 2 mil.

A fabulosa soma de dinheiro consumida na tentativa de controlar a crise seria traduzida, no futuro, em recessão e inflação mundiais. Previa-se um longo período de recessão e inflação, mas os efeitos imediatos já foram devastadores: cairam a procura e os preços das matérias-primas, reduziram-se as remessas que os imigrantes enviavam para as suas famílias nos países pobres e  milhares de trabalhadores foram suspensos temporariamente ou demitidos. Segundo estimativas das mais diversas origens, a crise teria consequências graves, como a diminuição do crédito externo, a depreciação das moedas nacionais e restrições de liquidez bancária. Haveria uma forte retração das exportações para os países centrais e uma baixa da cotação internacional das matérias-primas, tal como passou a ocorrer com o petróleo, a soja, o milho, o trigo e outros produtos agropecuários. 

Organismos supranacionais

A crise pôs em estado de alerta o sistema econômico latino-americano, os governos e a complexa trama de organismos supranacionais. Na primeira semana da crise, o establishment latino-americano optou por minimizar os seus efeitos. Gaudin lembra que não houve nenhum governo, especialmente os de economia mais forte, que não afirmasse, quase como uma repetição, que estava em condições de contrariar os efeitos nocivos da crise. Mas rapidamente tiveram que assumir a realidade.

Curiosamente, o primeiro a admiti-lo foi um banqueiro, Carlos Fedrigotti, ex-diretor geral do Citigroup. “A região tomou consciência de que no sistema financeiro internacional há elementos de excesso e riscos imprudentes e irracionais, que se parecem às probabilidades dos jogos de um cassino”, disse o banqueiro. O presidente brasileiro Lula usou a mesma imagem quando disse que os países pobres, que tinham feito um grande esforço fiscal para ter um período de crescimento, eram vítimas do cassino instalado no sistema financeiro dos Estados Unidos.

O mexicano Luis Téllez, ministro das Comunicações e talvez o melhor porta-voz do presidente Felipe Calderón, foi o mais direto de todos. “Os especuladores mataram-nos, a depressão que aí vem será monumental”, afirmou. O presidente colombiano Álvaro Uribe, um fantoche do presidente do regime norte-americano, também não pôde deixar de falar com realismo. “Sofreremos em temas tão sensíveis como o emprego e a pobreza, a desaceleração econômica será convertida em recessão e a recessão nos levará a ter mais desempregados e mais pobres”, afirmou. Manifestações como essas se espalharam pelo mundo.

Resposta de Cristina Fernández

Durante a Assembléia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em setembro de 2008, a crise foi o único tema. Na ocasião, os presidentes latino-americanos foram apertados em Nova Iorque pelos gestores das multinacionais, que exigiam respostas urgentes para saber como eles pensavam a crise. A presidenta argentina Cristina Fernández de Kirchner foi implacável. “O Primeiro Mundo, que nos pintava como ‘A Meca’, está caindo em pedaços e vocês perguntam-me se a Argentina tem um ‘plano B’ para enfrentar a crise? Senhores, sejamos francos! É preciso que vos fale seriamente: quem precisa de um ‘plano B’ são vocês, Estados Unidos e União Europeia, e podem consegui-lo se fizerem uma gestão responsável das vossas economias”, afirmou.

No fundo, a pergunta das multinacionais expressava o ideário neoliberal, para quem respostas como a de Cristina Fernández de Kirchner representam um desvio do rumo traçado pela política de “estabilização” que imperou como pensamento único na América Latina nos anos 1990. No Brasil, as medidas adotadas pelo governo foram taxadas pelos neoliberais como desvio, uma ameaça ao sagrado mantra da meta da inflação que só poderia ser cumprido com a manutenção da taxa Selic elevada e contenção do consumo. 

Seguir à risca a receita neoliberal, contudo, seria repetir o aguçamento daquela calamitosa teoria do bolo, levada a cabo nos anos de ditadura de 1964, que partiu o Brasil em dois países antagônicos. Dizia-se, com a habitual obviedade para encaixar um sofisma, que o bolo (a economia nacional) era um só e tinha de ser dividido em partes iguais. Não adiantava querer aumentar as partes enquanto o bolo fosse o mesmo. A análise monetária-culinária que faziam tinha como mandamento principal a contenção da inflação, sacrificando o desenvolvimento. E era ilustrada com um exemplo matemático — diziam que o bolo tem 100 unidades, logo deve ser dividido em partes que somam 100 ao final. Esta foi, por exemplo, a propaganda da “Lei de Responsabilidade Fiscal”, que blindou o superávit primário. Um engodo, está claro.

Diagnóstico simples

A teoria era a de que quando são destinadas 80 unidades para consumo e 40 para investimentos, o resultado de 120 era a inflação. Para eles, não havia outro caminho. Esta ladainha foi sempre repetida na “era FHC” — o então presidente da República chegou a dizer que a “Marcha dos 100 mil”, que inundou Brasília com um mar de gente para protestar contra a sua política econômica, era “ a marcha dos sem rumo”. Qual seria a alternativa? Segundo eles não havia, a não ser produzir superávit primário.

Ignoraram essa coisa simples de que fórmulas matemáticas não devem substituir o desenvolvimento de um povo que habita uma região cheia de riquezas naturais. A política econômica de um país não pode ser determinada por simples conceitos monetários. Esta auto-suficiência dos neoliberais esclarece muitas coisas dos problemas sociais e econômicos do Brasil. E sucita novas indagações sobre a atualidade do dilema infação e desenvolvimento — as opiniões divergentes continuam e o tempo ainda não lhe trouxe solução.

Eles ignoram também que não existe um diagnóstico simples e objetivo da inflação. A suposição da existência deste diagnóstico é o erro fundamental dos neoliberais — que tratam política econômica e a sua teoria monetária como a mesma coisa. O ex-presidente do BC na ”era FHC”, Gustavo Franco, certa vez afirmou que não discutia mais o dilema inflação-desenvolvimento porque, segundo ele, não era mais tema científico mas emocional e religioso. Mas muita coisa já ficou esclarecida nestes últimos anos do governo Lula.

A tecla de FHC

Uma delas é que o dilema inflação-desenvolvimento é o ponto fundamental da grande questão da economia brasileira sob a orientação desta teoria monetária. Já é alguma coisa saber disso. E já se sabe não apenas que esta é a grande questão como também que não existem uma ou duas causas determinantes tanto da inflação quanto do desenvolvimento. Há sim uma variada relação de causas e efeitos igualmente importantes, monetários e estruturais. E isso tornou-se claro depois da experiência dos neoliberais na ”era FHC”, quando todo o tempo foram afirmadas teses ditas únicas para a economia brasileira que chegaram a resultados melancólicos.

Com o desmentido de promessas feitas em tom de profecias, cresceram as evidências de que o país tomara o caminho errado. Mesmo os continuadores dessa política na primeira fase do governo Lula, com Palocci à frente, que empolgaram-se e sectarizaram-se na defesa de teses ”ortodoxas” — talvez por supor que estavam no exercício de um poder absoluto —, foram repudiados por todos os que não rezavam pela cartilha neoliberal. Eles incorreram na soberba do galo que pensa que o sol nasce porque ele canta. Segundo sua teoria, a gestão da economia só poderia dar resultados positivos se estivesse submetida às suas elucubrações e por isso cantavam para que o sol nascesse.

Ontem (18), FHC voltou a bater na mesma tecla. “Quando a inflação se inquieta, o povo se inquieta”, disse ele sobre a onda de protestos no país. Segundo o tucano, os protestos mostram a insatisfação do povo, que começa a sentir os danos causados pela volta da inflação. O presidenciável da direita, Aécio Neves, se manifestou no mesmo diapasão. “O Brasil róseo festejado na propaganda oficial, o Brasil sem miséria, de educação de qualidade, com as empresas públicas batendo recordes de produção, esse Brasil que nós dizíamos irreal, ficou claro que ele não existe”, vituperou.

O dilema de Tombini

O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, disse, também na terça-feira (18), que há indicações de continuidade da expansão da economia brasileira no segundo trimestre, após o crescimento de 0,6% registrado nos primeiros três meses do ano, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Tombini, que participou de audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal, reafirmou que o suporte à atividade tem sido e continuará sendo do mercado interno, pelo consumo das famílias, que se mantém constante e continuará assim pelo crédito, pelos programas de transferência de recursos públicos e pelo aumento da renda.

O presidente do BC disse que criam-se perspectivas de que nos próximos anos tenha aumento na taxa de investimento da economia, puxado pelos programas de concessões e pelos investimentos no petróleo. E reiterou que a instituição fará o que for preciso com a devida “tempestividade” para colocar a inflação em declínio e fazer com que ela prossiga nessa tendência. “O Banco Central está vigilante e fará o que for necessário para colocar a inflação em declínio no segundo semestre e fazer com que essa tendência prossiga no próximo ano”, disse..

Ele reafirmou que o BC passou a expressar preocupação com a inflação em janeiro deste ano e, desde então, mudou sua comunicação e indicou que elevaria a taxa básica de juros. Em abril, o Copom aumentou a Selic em 0,25 ponto percentual. Em maio, houve elevação de 0,5 ponto percentual e, atualmente, a Selic está em 8% ao ano. Segundo o presidente do BC, o combate à inflação contribuirá para fortalecer a confiança na economia.

Escolhas extremas

A fala do presidente do BC expõe claramente o dilema em que se encontra a equipe econômica do governo. Nos últimos dias, o mercado financeiro aumentou a pressão para que a política monetária seja confirmada no viés “ortodoxo”, reforçando o binômio juro alto-câmbio apreciado. Apesar das pressões, o governo tem demonstrado que seguirá por outro rumo. Numa apresentação feita em novembro de 2011 e intitulada “Além do Consenso de Washington”, o então secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, deu a senha das mudanças.

Segundo ele, “uma política pró-crescimento é consistente com a estabilidade macro, desde que se evitem escolhas extremas”. Por escolhas extremas, ele denominava aquelas que prevaleceram durante a maior parte do governo Lula, na “era Palocci”. Segundo, dali em diante, o tripé funcionaria da seguinte maneira: “Metas de inflação com redução na taxa real de juro e aceleração do crescimento; câmbio flutuante com acumulação de reservas internacionais e regulação dos fluxos de capital; metas fiscais com aumento nas transferências de renda e no investimento público.”

A crise na Europa, no entanto, é uma boa fotografia para se compreender onde o Brasil daria com essa receita dos neoliberais.  A crise da região do euro traz entranhada uma crise de legitimidade, porque as receitas de austeridade e “reformas estruturais”, assim como as formas de aplicação, são rejeitadas por muitos países.

Crise política

O descontentamento da população com a União Europeia (EU) alcança altos níveis e até agora inéditos. A Grécia está na ponta, com 81% dos cidadãos dizendo não confiar na UE. A seguir vem a Espanha, com 72%. O descontentamento chega até a países centrais, como a Alemanha, com 59%. Uma sondagem recente, do Pew Research Center, dos Estados Unidos, mostra declínio na confiança em todos os países da UE. Na França, caiu de 60% a 40% em um ano. Essa desconfiança, no entanto, não afeta o euro, que ainda goza de forte apoio nos países socorridos, como a Grécia, ou socorridos em parte, como a Espanha.

Reina na Europa uma crise política de grandes proporções, marcada pelo forte declínio dos grandes partidos nas pesquisas. As receitas que agora chegam aos cidadãos da UE — austeridade, sacrifício, produtividade, aumento de competitividade — criam rejeição frontal; e não se vê uma narrativa que volte a seduzir os europeus. A crise de governabilidade também é evidente.

O Brasil talvez precise de uma espécie de mutirão para mostrar à sociedade que o futuro não é, como dizem os neoliberais, um cenário já determinado, guardado fora de nosso alcance em uma caixa preta inescrutável. Não é uma fotografia já revelada, imutável. O futuro, pelo contrário, se constrói no presente. Os passos que damos é que vão inventando o caminho, como no provérbio. Esse jeito de entender o futuro torna possível a previsão: ela estaria baseada em análise e projeção lógica e não em mera adivinhação.

_____________

Editor do Portal Grabois