Samuel Pinheiro Guimarães, o brasileiro
Durval de Noronha Goyos Jr. escreve sobre a morte do embaixador Samuel Pinheiro Guimarães.
Por Durval de Noronha Goyos Jr.
Faleceu em 29.01.2024, em Brasília, aos 84 anos de idade e após longa doença, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, o principal formulador da política externa brasileira das últimas décadas, um destacado pensador e professor. Além da Nação, também eu perdi um próximo amigo, que é mencionado mais de 40 vezes em minha autobiografia.
Samuel formou-se em Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde aprendeu os fundamentos legais, dos quais jamais se separaria, e logo ingressou na carreira diplomática. Ele não apenas ocupou cargos de alta relevância nas relações exteriores brasileiras, mas também fez contribuições extraordinárias em posições subalternas e como
formulador da doutrina diplomática do País.
Já em 1985, Samuel Pinheiro Guimarães, então um jovem diplomata, foi o responsável pela redação do acordo denominado Programa de Integração e Cooperação Econômica Brasil/Argentina, que foi o embrião do MERCOSUL. Esta iniciativa não apenas promoveu a paz no cone sul da América e também se constituiu no pivô da política econômica da região. Ele jamais se afastou do MERCOSUL e foi um interlocutor privilegiado dos nossos vizinhos, que o respeitavam pela capacidade de raciocínio, pela coragem e pela honestidade pessoal.
Quando os EUA quiseram neutralizar o MERCOSUL e aprofundar suas garras na região, com a proposta da chamada ALCA, o embaixador Samuel que era diretor do centro de pensamento estratégico do Itamaraty, o Instituto de Pesquisas em Relações Internacionais, corajosamente se lançou numa campanha, da qual participei, a demonstrar os riscos da iniciativa. Por sua patriótica ação, foi demitido pelo chanceler do presidente Fernando Henrique Cardoso, o patético Celso Lafer, tido por Moniz Bandeira como o pior da História.
No início de 2003, já eleito presidente, Lula convidou o embaixador Samuel para assumir a posição de secretário-geral do Itamaraty, segundo posto, no qual reinstalou a dignidade e a decência na política externa brasileira. Ele a orientou com base nas posições expressas em suas obras Quinhentos Anos de Periferia, de 1995, e A Política dos EUA
para o Mundo e Para o Brasil, de 2000. Em 2010, ele assumiu o posto de ministro chefe da secretaria de Assuntos Estratégicos, no qual coordenou um importante estudo estratégico para o País e a América do Sul, até o ano de 2022.
Já no governo Dilma, o embaixador Samuel assumiu, em janeiro de 2011, o cargo de Alto Representante do MERCOSUL, anteriormente denominado de presidente, onde lutou com dificuldades pela falta de recursos, mas era incentivado pelos representantes dos países membros, pela lucidez de suas posições e importância de suas iniciativas. Demitiu-se
da posição em meados de 2012 e passou a se dedicar a atividades acadêmicas, culturais e políticas. Em 2003, ele havia prefaciado o meu livro Tratado de Defesa Comercial.
Quando assumi a posição de presidente da União Brasileira de Escritores (UBE) em 2015, convidei o embaixador Samuel para conselheiro da entidade, que já lhe havia conferido o prêmio Juca Pato. Ele permaneceu na posição por 5 anos, enquanto duraram os meus mandatos, com outros grandes nomes da cultura brasileira como Moniz
Bandeira, Cláudio Willer, Aldo Rebelo, Fábio Lucas, Regina Gadelha, Maria Maia e Walter Sorrentino. Ali combatemos o fascismo e juntos assinamos a primeira denúncia contra Jair Bolsonaro perante o Tribunal Penal Internacional.
Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, o Brasileiro (30.10.1939 + 29.01.2024).
Durval de Noronha Goyos Jr. é Jurista e escritor. Ex-presidente da União Brasileira de Escritores (UBE).