Krugman: sua proposta faz sentido, mas a cautela com que fala é sinal de que sabe dos possíveis problemas implícito

Os “estimulati” – ordem rival, na qual Krugman é reverenciado – argumentavam que, com desemprego tão elevado, a única forma sensata de agir seria gastar mais e cortar as taxas de juros em direção às fronteiras do zero e mais além. Austerianos e estimulati disseram horrores uns dos outros. Com a crise perdendo força, os sermões dos defensores de estímulos econômicos, no entanto, não atraíram muita atenção, enquanto, em lugares como o Reino Unido, os partidários da austeridade encontravam sua audiência.

Poucos anos depois, a população grega se revolta contra o feroz aperto orçamentário, a França elege seu primeiro presidente socialista desde 1995 e os Estados Unidos se preparam para uma eleição sob a sombra de um índice de desemprego de 8,1%. Krugman escolheu um bom momento para lançar uma discussão bastante convincente contra a adoção prematura de medidas de austeridade fiscal na sequência de recessões profundas.

Krugman o faz com um estilo extraordinariamente fluido para um ganhador do prêmio Nobel de economia, apresentando seus argumentos com a ajuda de referências à cultura pop, como John Ford e Calvin, e de comparações como o “Fed Borg” (mistura do Banco Central americano, o Federal Reserve, com a raça alienígena de “Jornada nas Estrelas”), a “fadinha da confiança” e os vigilantes do “bônus”. “End This Depression Now!” (algo como, Acabem com esta Depressão, Agora!) é um livro curto que mostra sinais de ter sido preparado às pressas, tendo como fonte de matéria-prima o blog de Krugman no “The New York Times” – os mesmos economistas são apresentados repetidamente em diferentes capítulos, por exemplo -, mas é vigoroso e de fácil leitura.

Os argumentos básicos de Krugman seguem mais ou menos a seguinte linha: milhões de desempregados vêm sofrendo e gerando um custo social terrível nos Estados Unidos, porque a economia carece de demanda. O governo pode criar demanda com seus gastos; o Fed pode criar demanda reduzindo as taxas de juros. Há poucos motivos para temer que os gastos provoquem uma crise de endividamento. As autoridades, portanto, deveriam lidar logo com isso e acabar com esta depressão agora.

É possível argumentar de outra forma, e alguns economistas o fazem, mas a maior parte das evidências dos últimos anos sugere que Krugman, basicamente, está certo. Se o alto desemprego fosse estrutural, a inflação já teria começado a subir. O rendimento dos bônus do Tesouro foi para baixo, embora o volume de endividamento tenha aumentado. Há um predomínio de estudos asseverando que, quando as taxas de juros estão em zero, os gastos do governo exercem grande influência sobre a economia.

Krugman usa 11 capítulos para explicar rapidamente o que há de errado com as economias dos Estados Unidos e da região do euro. Critica as políticas de reação à crise adotadas até agora, que considera equivocadas, e ataca adversários acadêmicos. Quando chega o momento em que ele apresenta sua solução, o leitor já está preparado para aceitar algo realmente drástico – talvez até algo como uma ressurreição da Agência de Obras Públicas (PWA, na sigla em inglês) dos anos 1930, criada por Franklin Roosevelt.

O que ele realmente quer, no entanto, é um trinca de soluções, bastante modestas e não inteiramente convincentes como programa para acabar com a depressão agora. Em primeiro lugar, Krugman sugere que se aplique um estímulo fiscal de US$ 300 bilhões por ano, para ajudar governos locais e estaduais que vêm demitindo professores e outros funcionários para equilibrar seus orçamentos. Faz sentido. A ideia poderia ser adotada rapidamente, com a garantia de que se evitassem desperdícios, e poderia propiciar a criação de vários milhões de empregos a um custo orçamentário líquido modesto. Exigiria, entretanto, uma mudança drástica no debate político, que os republicanos vêm orientando, com muito sucesso, contra “a dívida”.

Krugman também argumenta que o presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, deixou-se absorver por uma mentalidade de consciência coletiva, típica de banco central. Deveria, então, liberar-se e promover uma reviravolta geral, tendo como meta atingir uma inflação de 4%, em vez de 2%. Em teoria, isso encorajaria todos a gastar e investir mais agora, enquanto minaria o valor real das dívidas.

Há vários problemas práticos, no entanto. Um é a credibilidade do banco central. Eleve sua meta de inflação uma vez e ninguém vai acreditar quando você prometer que não vai voltar a fazê-lo. Os mercados provavelmente agregariam um prêmio de risco extra pela inflação nas dívidas de longo prazo – um custo imediato e real.

Outra questão é com que rapidez o Fed conseguiria chegar ao maior nível de inflação. A simples notícia de uma meta mais alta poderia até ser suficiente para levar os trabalhadores a exigir salários maiores, elevando, assim, os preços. Haveria, no entanto, a mesma probabilidade de o Fed ter que tentar versões ainda mais extremas de flexibilização quantitativa [injeções de recursos no sistema bancário] que apenas funcionariam bem à medida que a economia se recuperasse e a inflação elevada se tornasse menos desejável.

Em terceiro lugar, Krugman defende mais ações no setor imobiliário residencial, para ajudar as famílias que precisam pagar juros muito altos a refinanciar-se pelas taxas atuais. O governo Obama teve certo progresso nessa área, mas, sem a injeção de mais dinheiro público ou leis mais agressivas, difíceis de aprovar, é difícil ver alguma mudança que possa provocar uma diferença econômica significativa.

O livro de Krugman pode persuadir governos a limitar novas medidas de austeridade, e isso seria positivo. A cautela de suas propostas, contudo, sugere que ele sabe como seria difícil convencê-los a voltar a empenhar-se em esforços para acabar com a depressão. (Tradução de Sabino Ahumada)

 

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“End This Depression Now!”
Paul Krugman. Norton. 272 págs. US$ 24,95

Fonte: Financial Times, no Valor