A despeito das recomendações dos técnicos acerca da preocupante tendência de longo prazo do sistema Cantareira, a SABESP preferiu distribuir fartos dividendos na bolsa de Nova York que investir em novas captações, reservatórios e redução de desperdício. Nestas condições, a seca atípica do último verão demandaria um racionamento bastante rigoroso.

Para não ter de admitir uma medida tão impopular em período eleitoral, o governador e então candidato Geraldo Alckmin minimizou o problema, falou em alarmismo da oposição, e foi deixando que as reservas de água do Cantareira fossem se esgotando à espera das eleições. Só agora, passadas as eleições, somos informados que a água acaba em novembro se não chover abundantemente até lá. E só agora a imprensa paulista se dá conta da gravidade da crise e da responsabilidade do governo estadual.

Esta irresponsabilidade econômico-social e este estelionato eleitoral lembram muito outro episódio, aquele que permitiu a re-eleição em primeiro turno de Fernando Henrique Cardoso em 1998. Para manter o mito da paridade aproximada entre real e dólar, por meio dos altíssimos juros, o governo federal desequilibrou o balanço de pagamentos e deixou nossas reservas financeiras internacionais esvaírem-se. As reservas zeraram duas semanas após as eleições, o mito caiu com uma estrondosa crise cambial, o Brasil teve de ajoelhar-se mais uma vez ante o FMI, e Fernando Henrique Cardoso passou a amargar sua reconhecida impopularidade.

Se o governo tucano de Fernando Henrique Cardoso, catedrático por tantas universidades, pôde ser tão irresponsável com nossas reservas financeiras, se o governo tucano de Geraldo Alkmin, simpatizante da rígida moral da Opus Dei, pôde ser tão irresponsável com nossas reservas hídricas, é inimaginável o que poderá advir de um governo tucano do Aecinho do Vovô.

José Ricardo Figueiredo é professor da Faculdade de Engenharia da Unicamp.