A 1ª Sessão do 12º Congresso Nacional da China, reunido nos dias 6-17/3/2013 foi encerrada com a aprovação dos nomes de Xi Jinping e Li Keqiang para os postos de presidente e premiê, e modificando a composição do grupo que comandou a China durante dez anos e iniciou uma nova era para o país. O mundo exterior e a maioria dos chineses ainda espera, ainda incertos sobre o que trará a nova era sob comando de Xi e de seus colegas de Politburo.

O discurso de Xi, de 25 minutos, para cerca de 3.000 membros do Congresso, dia 17/3/2013, pouco deixou entrever do que o novo presidente pensa sobre o futuro; tampouco trouxe qualquer luz sobre a natureza e o caráter da “Pax Sinica”. Mas em oito dos 17 parágrafos do discurso Xi referiu-se ao “Sonho chinês de Renascimento” – referência aos tempos gloriosos de dinastias passadas como Han (206 a.C-220 d.C.), Tang (618-907) ou Qing (1644-1912), quando a China prosperou economicamente e conseguiu unificar e incorporar vastas áreas territoriais.
Graças a esses desenvolvimentos, a China assumiu o título de “Império do Meio”, autodefinindo-se como o centro do universo, estabelecendo vasta rede de relações tributárias com seus vizinhos, sistema que ruiu e deixou de existir com a queda da dinastia Qing.
O “Sonho de Renascimento” de uma China poderosa é tema dos líderes chineses desde 1949. Durante os anos 1950s, Mao Tse Tung, recorrendo a medidas utopistas e pouco racionais, criou a campanha “Grande Salto Adiante”, com o objetivo de transformar a China, de economia agrária, em sociedade moderna, mediante a coletivização e a industrialização rápida. A campanha revelou-se economicamente e socialmente desastrosa; levou à Grande Fome; mostrou-se como Grande Salto para Atrás e empurrou a China até a beira do colapso social.
Em 1978, Deng Xiaoping iniciou reformas, com quatro modernizações ambiciosas, menos focado nas teorias, dando mais importância ao pragmatismo, ideia capturada em axioma que ganhou fama: “Pouco importa que o gato seja branco ou preto, desde que cace ratos”. As reformas econômicas de Deng converteram a China, de sociedade atrasada e isolada, em potência global – o que criou todas as condições favoráveis para que Xi, agora, se ponha a falar de um grande renascimento da nação chinesa.
Xi Jinping deixou falar também sua pessoal queda para grandes sonhos. Ao contrário da utopia de Mao, a visão de Xi é mais realista e mais firmemente baseada num senso histórico do passado da China e de um presumido grande destino, a partir de pelo menos quatro razões.
Primeiro, depois de ultrapassar o Japão e tornar-se a segunda maior economia do mundo em 2010, a China prossegue e mantém forte crescimento econômico. Se conseguir manter a taxa de crescimento dos últimos 20 anos, a China já será a primeira economia do mundo, à altura de 2030. A ênfase no Sonho de Renascimento, durante o governo de Xi, vista nesse contexto, tem o objetivo de relembrar a nação chinesa de seu passado glorioso.
Segundo, a visão de Xi, pelo que se pode inferir de seus comentários públicos, reflete a ideia de que por maior economia que seja ou venha a ser, nem por isso ficariam assegurados à China poder e status globais duradouros. Xi também parece pressentir que enfatizar o crescimento econômico e só o crescimento econômico – sem qualquer atenção a questões como a qualidade do desenvolvimento, a corrupção, as desigualdades de renda, poluição e outras – pode levar ao aumento de tensões sociais, enquanto a economia cresce. (…)
Xi não descarta nem desconsidera as realidades econômicas básicas. Atualmente, a economia chinesa corresponde a 9% do PIB global; e quando a China tiver ultrapassado os EUA como economia n.1 do mundo, o PIB chinês equivalerá a 20% do PIB mundial. Vários líderes nacionais chineses, dentre os quais Xi, parecem já se ter dado conta de que é resultado ainda pequeno, se comparado aos 58% com que a China contribuía para o PIB global durante a Dinastia Tang no auge do poder.
A China preservou o domínio no campo econômico até 1830, quando o PIB chinês equivalia a “apenas” 30% do PIB mundial. Esses números não impediram que a China fosse atacada e partida em vários cacos por potências ocidentais menores, durante o “Século da Humilhação”.[3] Aconteceu assim porque a China era grande estado, mas nação muito fraca, ainda não bem armada e que nada sabia das mais avançadas tecnologias que já circulavam pelo mundo.
Terceiro, enquanto os líderes chineses elaboram e desenvolvem detalhes do Sonho do Renascimento Chinês, os cidadãos chineses comuns elaboram e desenvolvem detalhes de seus próprios pequenos sonhos. Entre esses, o desejo de viver em país próspero e em sociedade democrática, sem corrupção, sem poluição e com acesso igualitário, para todos, aos benefícios do renascimento da economia chinesa.
Ainda não se sabe – essa é a grande pergunta – como os Sonhos de Renascimento do estado e do povo chinês poderão ser buscados e promovidos harmoniosamente. Xi chega ao poder no momento em que esses “pequenos sonhos” começam a encontrar os meios para gerar consequências políticas para a liderança chinesa.
Para concluir, a comunidade internacional tem boas razões para dar as boas vindas a uma China próspera e pacífica. O que os vizinhos da China não querem é esse Sonho de Renascimento usado como instrumento para fazer da China a força dominante no centro do sistema econômico e político internacional do século 21, impondo aos países vizinhos posição de semidependência, semelhante ao sistema passado, quando todas as riquezas das nações vizinhas corriam na direção da China, como afluentes ao rio principal.
A evidência de que Xi considera em profundidade o caráter das relações internacionais no século 21; e o se pode inferir que seja sua avaliação das relações entre China e países da periferia imediata dão a firme impressão de que a sensibilidade de todos esses laços e realidades estão sendo devidamente consideradas, no momento em que uma nova liderança política prepara-se para começar a gerir todas essas relações complexas.
* Hoang Anh Tuan é diretor-geral do Instituto de Política Externa e Estudos Estratégicos, da Academia de Estudos Diplomáticos do Vietnam.
[1] Ver 28/3/2013, “Xi e os partidos de esquerda”, em http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2013/03/xi-e-os-partidos-de-esquerda.html [NTs].
[3] Período que vai do início da 1ª Guerra do Ópio, em 1839, até o triunfo do Partido Comunista Chinês na guerra civil chinesa, em 1949. Durante esse período, o território sob efetivo controle político da China diminuiu a 1/3 do que fora; o sistema imperial milenar entrou em colapso; e o país foi varrido por levantes, invasões e guerra civil [NTs, com informações de http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.1976-5118.2010.01039.x/full].
Publicado em 4/4/2013, no Asia Times Online
http://www.atimes.com/atimes/China/CHIN-02-040413.html
Traduzido pelo coletivo Vila Vudu