Já é iminente para Mali, este país de 14,5 milhões de habitantes da África Ocidental (ex-colônia francesa), sua divisão em dois. Mais de 60% do território do país está ocupado por guerrilheiros armados da tribo Tuaregue, membros do “Movimento Nacional para a Libertação de Azawadi” (MNLA sigla em francês) e (NMLA sigla em iglês) e islamitas de organizações subsidiárias da Al Qaeda, os quais assumiram o controle do Norte do país e ocupam importantes cidades como esta histórica Tombouctou, a Gao (maior cidade do Norte) e, a Kidal, enquanto, na sexta-feira passada proclamaram a “Independência de Azawadi”, algo que provocou a forte reação negativa da ex- (e atual) colonialista França.

A ocupação do Norte do país por estas forças tão diferentes entre si provoca temor à população civil. Islamitas (envolvidos na última década ao tráfico de cocaína, haxixe e armas ao longo dos antigos caminhos comerciais do deserto de Saara), como os membros da organização “Defensores da Fé” (Ansar Dine) e da Al Qaeda do Magreb (AQIM) da África do Norte, aproveitaram a oportunidade que provocou o levante armado dos Tuaregues e participaram das operações contra o exército tático ocupando as cidades de Kidal e Gao e saqueando serviços públicos, armazéns de alimentos da Organização das Nações Unidas (ONU), hotéis. Bancos e templos religiosos. Assim, os novos “donos” tentam quebrar a moral dos habitantes de religiões diferentes, impondo-lhes, à força, a lei islâmica (saria).

Estranha aliança

Os tuaregues já ocuparam o Norte do país (rico em jazidas de urânio), acreditando que libertaram parte de sua pátria, que denominam Azawadi (que, além do Norte de Mali, compreende regiões do Sul de Argélia e do Noroeste de Niger). Contudo, considerável parcela de cidadãos do Norte de Mali não pertence à nômade tribo dos Tuaregues, não compartilha os objetivos do MNLA e, não deseja a divisão e a independência.

Sabe-se que, o movimento dos guerrilheiros do MNLA (que começou em 17/01/2012) como consequência indireta das evoluções na Líbia após a derrubada de Muamar Kadafi, mostrou que sua disposição autonomista aumentou quando vários tuaregues lutaram nas forças de Kadafi como mercenários, adquirindo experiência de combate, armas e dinheiro. Contudo, não se deve esquecer que, os autonomistas tuaregues rebelaram-se pelo menos três vezes no século passado (1916, 1919, 1962, 1964, 1991, 1992)…

Já os islamitas, além de sua agenda religiosa para imposição da “saria”, buscam criar uma base estável e permanente a fim de garantir a exclusividade no tráfico de drogas, armas e, no comércio de escravos, principalmente da Mauritânia, região mais ampla do deserto de Saara. Seu objetivo é incrementar seus lucros e financiar ataques contra outros países da região Centro-Oeste da África. Mas, simultaneamente, sua presença e suas ações constituem ótimo pretexto para os imperialistas neocolonialistas invadirem direta (por intermédio de Ecowas) ou indiretamente, sempre em nome de repressão ao terrorismo, a fim de garantirem sua participação na divisão do rico butim em petróleo, urânio, ouro, cobre, mercúrio, bauxita, granito, fósforo, minério de ferro e outros…

Quem é o golpista

A ocupação do Norte, foi antecedida pelo (conveniente) golpe de estado que derrubou o governo do presidente, Amadou Toumami Touré, que havia atrelado o destino de seu país com o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial (Bird) e, várias empresas multinacionais. Em 22 do mês passado, militares rebeldes, liderados pelo (treinado nos EUA), capitão Amadou Sanongo, deram o golpe. Mas…

Mas, o golpe foi desfechado, coincidentemente, um mês antes das eleições presidenciais no país e, ao que tudo indica, foi liderado pelo capitão Sanongo de comum acordo com os EUA. Sanongo recebeu primorosa educação militar em bases e escolas de fuzileiros navais nos EUA. De acordo com os jornais New York Times e Washigton Post, a educação militar de Sanongo foi iniciada quando, em 2004, ingressou no Centro de Instrução do Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA, em Quantico, na Virginia. Em seguida, foi treinado em operações de contra-espionagem no Fort Wuatsuka, no Arizona. Ainda, recebeu a instrução no Instituto de Defesa da Língua do exército dos EUA e, participou de exercícios de antiterrorismo até dezembro de 2010, no Marrocos e outros países da África do Norte. A propósito não é nada casual que Sanongo surgiu no dia seguinte do golpe ostentando no peito os distintivos do Corpo de Fuzileiros Navais dos (USMAC) e das Forças Especiais Seal dos EUA.

Em seguida, declarou-se presidente da “Comissão Nacional para o Retorno da Democracia e a Reconstituição do Estado (CNRDR). Acusou o corrupto governo de incapaz e traidor sem, obviamente, encontrar dificuldades para convencer a maioria – considerando que todos sabiam que, o presidente Touré havia há alguns anos liquidado e entregue a plutocratas estrangeiros as empresas estatais do país como a Empresa para o Desenvolvimento de Fiação e Tecelagem (CMDT), que havia usurpado dezenas de milhares de hectares de terras cultiváveis que, tradicionalmente, pertenciam a comunidades locais, para entregá-las a empresas estrangeiras de produção de biocombustíveis. Isto, sem esquecer que, a elite local saqueou as riquezas das minas de ouro que produzem 1/3 do total da produção da África e, as quais, hoje estão sendo exploradas por empresas estrangeiras como a Anglo Gold Asanti, IAM Gold, Raingold Resources e, outras.

Reações

O golpe de estado de Sanongo foi “condenado” pelos EUA que, “congelaram” a ajuda militar canalizada ao país. Também, a União Européia condenou o golpe de estado e, exigiu a imediata restituição da “democracia”, enquanto, o ministro de Relações Exteriores da França, Alan Zuppe, declarou que…”o governo da França não pretende intervir militarmente agora”.

Desempenhando papel mais dinâmico surgiu a Comunidade Econômica do Oeste Africano (Ecowas) que decretou uma barragem de sanções contra Mali, insinuando que não pretende falar com Sanongo. Já o presidente em exercício do organismo, Alasan Watara (presidente da Costa do Marfim) tentou criar impressão de provável invasão, ordenando que 2.000 soldados da Força de Intervenção Imediata permanecessem de prontidão. Mas, esta Força de Intervenção Imediata sequer existe…

Logo após, as sanções da Ecowas foram “sancionadas” pelo Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, criando um clima de pânico no país.

Ao que tudo indica, o capitão Sanongo está jogando um jogo perigoso por ordem e conta de seus mentores norte-americanos. Se finalmente permanecer no poder – embora não é reconhecido no exterior e no interior – será obrigado a negociar, oficialmente, a divisão do país, divisão esta que, conforme passam os dias torna-se – de fato – permanente.

Por enquanto, a situação no país permanece confusa. Os tuaregues ocuparam as bases militares do norte, hasteando sua bandeira, enquanto, os islamitas ocuparam cidades importantes como Tombouctou, queimaram as bandeiras de seus aliados, hasteando a própria, enquanto, pilham as casas dos moradores, aterrorizando-os e, tentando impor a “saria” à força. Assim, torna-se óbvio que a frágil aliança não resiste mais, fato que imperialistas neocolonialistas aproveitarão em breve.

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Fonte: Africa News Agency/Sucursal da África Ocidental, no Monitor Mercantil