Por enquanto, a abordagem preferida parece ser insistir em mais do mesmo: grandes volumes de dinheiro oficial (de governos da área do euro, do Banco Central Europeu e do FMI) para “socorrer” a Grécia. Na realidade, até agora os principais beneficiários do “socorro” têm sido os credores privados do país. Desde 2010, o dinheiro oficial tem permitido que credores privados se livrem de seus empréstimos problemáticos à Grécia. Em outras palavras: está em curso uma gigantesca socialização de prejuízos.

O programa de ajustamento draconiano imposto à Grécia pelos credores oficiais vem funcionando muito mal. A economia entrou em recessão e o desemprego subiu rapidamente. A dívida pública alcançou aproximadamente 150% do PIB e tende a crescer — apesar do esforço de ajustamento que vem sendo exigido dos gregos. A resistência social e política ao programa econômico do governo cresce a cada mês que passa. A situação do país lembra muito a da Argentina há dez anos.

Um ponto em comum é a rigidez do sistema monetário (união monetária no caso da Grécia; currency board com dolarização parcial no caso da Argentina). Na impossibilidade de desvalorizar a moeda, o processo de ajustamento se mostra extremamente doloroso. Uma forma de ganhar competitividade seria forçar uma deflação de preços e salários (a chamada “desvalorização interna”). Mas isso exigiria uma recessão cavalar, solapando ainda mais o equacionamento das contas públicas. Além disso, a deflação elevaria a carga real da dívida, contribuindo para inviabilizar a Grécia do ponto de vista financeiro.

A insatisfação é geral na Europa. Numa ponta, os alemães não querem mais ajudar países “pródigos” ou “irresponsáveis” da periferia. Na outra ponta, gregos e outros periféricos se sentem massacrados por demandas insuportáveis de ajustamento.

Na Alemanha, prevalece também a percepção de que os credores privados da Grécia têm que assumir parte do ônus da crise. Mas a França e o Banco Central Europeu resistem de maneira feroz. Argumentam que qualquer tipo de reescalonamento ou reestruturação da dívida teria efeitos dramáticos em termos de contágio de outros países (Portugal e Irlanda, principalmente).

O dilema é real e agudo. Quanto maior a contribuição que se tentar obter dos credores privados, maior o risco de contágio e de instabilidade. Por outro lado, se os credores privados ficarem isentos de qualquer obrigação, a situação da Grécia pode se tornar insustentável. A essa altura, a rolagem voluntária da dívida grega é provavelmente impossível.

Os problemas distributivos decorrentes da abordagem adotada até agora vão ficando inadministráveis e invendáveis do ponto de vista político. Invendáveis na Grécia, invendáveis na Alemanha.

A turma da bufunfa tem um poder de pressão e até de chantagem verdadeiramente temível. Mas tudo tem limite.

A Grécia parece estar chegando no seu. Se não for encontrada uma solução razoável, o risco de colapso financeiro é real. E o pior é que, apesar de pequena, a Grécia pode arrastar grande parte da Europa com ela.

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Economista e diretor-executivo pelo Brasil e mais oito países no Fundo Monetário Internacional, mas expressa os seus pontos de vista em caráter pessoal

Fonte: O Globo