Fui afastado do cargo que ocupava aqui em Xangai no Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), mais conhecido como Banco do Brics. Escrevo em plena mudança, em meio a caixas e caixotes. Estou voltando para o Brasil, depois de mais de dez anos no exterior.

Fico feliz, pois dez anos já eram demais. Há tempos pensava na volta, pois estava insatisfeito com o rumo que o NBD vinha tomando. Amigos e familiares diziam, unânimes: “Fica na China, o Brasil está péssimo”. Mas o Brasil, mesmo “péssimo”, é melhor do que a maioria dos países. Os brasileiros é que nem sempre estão à altura do Brasil.

Estou triste, entretanto, pela maneira como fui afastado do banco que ajudei a criar. Mais do que qualquer outro integrante do NBD, estive envolvido, a fundo, no processo que levou à criação do banco e do fundo monetário do Brics. Sonhávamos criar um banco global que estabelecesse novos padrões no financiamento do desenvolvimento.

A minha desestabilização começou por iniciativa de alguns funcionários do governo brasileiro. Destacou-se na operação um certo Marcelo Estevão, assessor do ministro da Fazenda, sujeito atabalhoado que, segundo me disse um ministro de Estado, é motivo de chacota em Brasília. Mas não vou gastar pólvora com ximango.

O líder da operação foi o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn. Mal conheço o Goldfajn, mas, por motivos não totalmente claros, ele meteu na cabeça que precisava forçar a minha saída. Saiu dos seus cuidados como autoridade monetária para liderar uma verdadeira perseguição contra mim.

Para me demitir havia, porém, uma dificuldade. Tinha mandato até 2021 e não podia ser simplesmente afastado. Era preciso demonstrar que eu quebrara o código de conduta do banco.

Colocaram então pressão sobre o presidente do NBD e induziram-no a abrir contra mim dois processos administrativos. O primeiro teve origem na minha recomendação de demitir um funcionário brasileiro, Sergio Suchodolski, que tivera desempenho pífio no período probatório.

Esse funcionário foi instado a entrar com queixa contra mim, com alegações de assédio moral. A acusação não prosperou, pois não havia evidências. A única coisa indubitável era a péssima atuação do tal brasileiro.

O que prosperou foi uma segunda acusação: a de que eu teria atentado contra o código de conduta em alguns artigos publicados nesta coluna. A acusação era ridícula. Mas o advogado contratado pelo banco para investigar o assunto concluiu que em alguns poucos artigos eu quebrara a neutralidade política e comentara assuntos político-partidários.

Não havia base para tal conclusão, que desmontei por escrito, mas a questão dos artigos era mero pretexto.

Enfim, passou. Ficou uma sensação de decepção e sonho interrompido. É um sonho perfeitamente possível esse de criar um novo banco de desenvolvimento de alcance global, lançado por países emergentes, que poderia em alguns anos rivalizar com o Banco Mundial e outros bancos controlados pelos países desenvolvidos.

Mas os sinais que o NBD está dando, inclusive na forma como me tratou, sugerem que esse sonho dificilmente se realizará. Só uma nova administração poderá revigorar o banco e colocá-lo no rumo sonhado. Talvez o futuro da instituição esteja nas mãos do Brasil, que indicará o seu próximo presidente em 2020.

Paulo Nogueira Batista Jr. foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento e diretor executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países

Publicado no Blog do Noblat