O Capitalismo Monopolista de Estado
O Estado capitalista, segundo a definição de Stalin, é uma instituição destinada a organizar a defesa do país e a organizar a defesa da “ordem”, como também um aparelho de cobrar impostos. Quanto à economia propriamente dita, esta pouca coisa tem a ver com o Estado capitalista, e não se acha em suas mãos. Ao Contrário, é o Estado que se encontra nas mãos da economia capitalista.
Esta fórmula clássica define a essência da relação existente, nos países capitalistas, entre o Estado e a economia. O capitalismo monopolista de Estado não é senão a submissão absoluta do estado burguês à economia capitalista, e, portanto, aos monopólios, e não o contrário disto. É a interpenetração cada vez mais completa do aparelho do Estado e dos monopólios, enfim, a ditadura dos monopolistas mais poderosos.
A segunda guerra mundial elevou a um grau extraordinário de desenvolvimento o capitalismo monopolista de Estado nos principais países capitalistas, nos Estados Unidos e na Inglaterra. O fortalecimento da reação nos Estados Unidos e a ofensiva lançada pelos monopólios contra os direitos e o padrão de vida da classe operária traduzem diretamente a fusão sem precedente do poder político com os monopólios e a submissão do primeiro aos interesses dos últimos.
O imperialismo, segundo o camarada Stalin, caracteriza-se pelo poder absoluto dos trustes e das corporações monopolistas, dos bancos e da oligarquia financeira nos países industriais. Por isso mesmo o desenvolvimento do capitalismo monopolista de Estado vem atingindo o seu mais alto grau na atual época histórica, isto é, na época da crise geral do capitalismo.
Nascimento e Desenvolvimento
O que concorre para isso, antes de mais nada, são a concentração rápida da produção e a centralização do capital, fatores determinantes da monopolização. Em todos os setores essenciais da produção, os monopólios mais fortes asseguram para si um domínio absoluto; ao mesmo tempo, diminui o número dos principais monopólios em cada setor.
Por outro lado, o desenvolvimento do capitalismo monopolista de Estado, na época da crise geral do capitalismo, é acelerado pela agravação das contradições inerentes ao capitalismo; luta mais tenaz pelos mercados, pelas matérias primas e pelas esferas de investimentos de capitais, luta que intensifica cada vez mais brutalmente a contradição entre os grupos de monopólios dos diferentes países.
Sem dúvida, como observou Lenin, a constituição de monopólios é perfeitamente realizável mesmo utilizando meios de luta puramente econômicos. Entretanto, os monopólios — escreveu Lenin — não se limitam apenas aos meios econômicos, mas recorrem também continuamente aos meios políticos e mesmo a processos criminosos. Suprimem seus concorrentes, não só no mercado interno, como também no mercado externo. Somente a posse de um território lhes oferece uma garantia contra os concorrentes. Por esse motivo, os grupos de monopólios utilizam cada vez mais amplamente meios políticos em escala internacional, arrastando atrás de si o Estado, em sua luta pelos mercados, pelas matérias primas e pelas esferas de investimentos de capitais. Esse recurso aos meios políticos transforma-se, quando o mundo já está dividido em guerras mundiais.
As guerras mundiais, por sua vez, aceleram consideravelmente o desenvolvimento do capitalismo monopolista de Estado. Sob esse aspecto, dizia Lenin, ao falar da primeira guerra mundial: a guerra fez o que não tinha sido feito em 25 anos.
A guerra, entretanto, não é o único fator favorável ao desenvolvimento do capitalismo monopolista de Estado, embora seja o fator mais poderoso. Além da guerra, agem outros fatores, característicos da crise geral do capitalismo.
A crise geral do capitalismo é caracterizada por um agravamento sem precedente da contradição entre o crescimento das possibilidades de produção e a redução relativa do poder aquisitivo das massas trabalhadoras. O caráter anárquico da produção se agrava. Surge o desemprego maciço e crônico, a utilização dos capitais se revela insuficiente, e estouram crises econômicas mais e mais destruidoras. Foi assim que a crise de superprodução de 1929 a 1933 arrastou consigo a queda da produção que, no conjunto do mundo capitalista, chegou a 44%, sendo que essa percentagem foi ainda maior em certos países.
Essas crises anárquicas, o desemprego e a miséria das massas operárias e camponesas assustam os donos do mundo capitalista e faz com que temam pela manutenção do próprio fundamento do sistema capitalista. Daí provém seus desejos de recorrer à colaboração do aparelho do Estado burguês, a fim de atenuar as contradições mais agudas da economia capitalista e de fazer recair sobre os trabalhadores todo o peso da crise.
O desenvolvimento dos monopólios implica na maior exploração dos trabalhadores, na ofensiva contra seu nível de vida e, em geral, numa política reacionária. Isso, por sua vez, provoca uma resistência crescente da classe operária e de todos os trabalhadores e conduz a uma luta móis enérgica contra o capital, Os monopólios, por seu lado, para reprimir o movimento revolucionário e o movimento de libertação nacional nas colônias, recorrem mais amplamente ainda ao aparelho do Estado.
No seu livro, o “Estado e a Revolução”, Lenin escrevia: O imperialismo, época do capital bancário, dos gigantescos monopólios capitalistas e da transformação gradual do capitalismo monopolista em capitalismo monopolista de Estado, revela sobretudo um fortalecimento extraordinário da “máquina do Estado”, uma expansão sem precedente de seu aparelho burocrático e militar, em função do reforçamento das represálias contra o proletariado, tanto nos países monárquicos quanto nos mais livres países republicanos, o exército e a marinha são fortalecidos de forma extraordinária, não só em função da luta imperialista por uma nova partilha do mundo e da luta contra o movimento de libertação dos povos coloniais, mas também a fim de reprimir o movimento revolucionário no interior dos próprios países. O aparelho policial expande-se e começa a intervir incessantemente nas questões de produção, a ponto de muitas vezes se confundir com a administração das usinas. A própria direção das empresas toma freqüentemente, um caráter policial. Exemplo: a Alemanha fascista, onde o regime policial do trabalho forçado foi aplicado nas empresas da maneira mais completa.
O Estado burguês procura desarticular os sindicatos, a fim de desarmar a classe operária. A esse respeito é muito significativo a lei americana Taft-Hartley.
Entretanto, na época da crise geral, o capitalismo já não engloba o conjunto da economia mundial. Se a ruptura da frente única do imperialismo, isto é, a separação da Rússia do sistema capitalista mundial, foi o mais importante resultado da primeira guerra mundial — a separação, do sistema imperialista, de vários países do centro e do sudeste da Europa foi o resultado da segunda guerra. Formaram-se dois campos: de um lado, o do imperialismo e da reação; do outro, o do socialismo e da democracia. Como basta a existência da União Soviética e das novas democracias para insuflar nas massas trabalhadoras de todos os países o espírito de luta contra o capital monopolista, a facção dominante apressa-se febrilmente para tomar nas mãos toda a máquina do Estado e, antes de mais nada, os órgãos centrais do poder; açambarca a direção da política externa e interna e toma inteiramente sob seu controle o exército, a marinha, o aparelho policial, assim como a propaganda ideológica.
O Controle do Aparelho Governamental Pelos Monopólios
A primeira premissa do capitalismo monopolista de Estado, isto é, da submissão absoluta do Estado burguês ao capitalismo, é o domínio econômico dos monopólios no interior do país.
O capitalismo monopolista de Estado surge quando a concentração da produção e a monopolização atingiram determinado nível. Tomemos o exemplo da Alemanha. A primeira guerra mundial tinha acelerado o desenvolvimento dos monopólios alemães. Desde essa época, a concentração da produção e a centralização do capital tinham tomado grande amplitude. Esse processo continuou com a inflação e mais tarde, durante a crise econômica de 1929 a 1933, criando a base de um rápido desenvolvimento de todas as formas de associação monopolista.
Alguns grandes trustes e konzerns representaram, desde então, o papel decisivo nos ramos principais da produção. Na siderurgia foi o Truste do Aço que monopolizou mais da metade da produção total dos metais ferruginosos. A indústria química era dominada pelo truste “I. G. Farbenindustrie”, cujo capital ultrapassava a metade de todos os capitais investidos nesse ramo. Certos produtos (corantes, carburante sintético, etc.) eram inteiramente monopolizados pela “I. G. Farbenindustrie”. Na indústria eletrotécnica, dois monopólios — A.E.G. e Siemens — assumiram papel dominante e forneciam, somente eles mais de 80% de toda a produção nesse setor. 76% de toda a produção de hulha eram controlados, de 1929 a 1930, pelo “Sindicato Renano do Carvão”. A Sociedade Anônima Renana-West-faliana fornecia 72% de toda a produção de energia elétrica.
Como se vê, o processo da monopolização estava tão adiantado na Alemanha que cada um dos ramos essenciais da produção era dominado por um ou dois monopólios. Os reis dos diferentes ramos da economia, ligados uns aos outros por participações mútuas, formavam o núcleo da oligarquia financeira que controlava toda a economia alemã. Na véspera da tomada do poder pelos hitleristas, contavam-se, na Alemanha, cerca de vinte grandes industriais e banqueiros, que eram os verdadeiros donos do país.
Nos Estados Unidos, a concentração da produção e a centralização do capital, assim como a monopolização que daí decorre, aceleraram-se entre as duas guerras, principalmente em conseqüência da crise econômica de 1929 a 1933. Na véspera da segunda guerra mundial, a massa principal da produção industrial nos Estados Unidos estava monopolizada, em quase todos os setores, pelas grandes companhias, em média quatro em cada ramo de produção. 58% de todos os produtos alimentícios, 62% de toda a produção da indústria de madeira, de papel e de petróleo, 95% da indústria de borracha e de máquinas eram controlados, em cada um desses ramos, por quatro grandes companhias.
A indústria era então dirigida por 200 das maiores corporações, cujos capitais atingiam a cerca de 70 bilhões de dólares, ou seja perto de 45% dos capitais de todas as sociedades não financeiras. Mas o verdadeiro domínio sobre a indústria era exercido por um círculo ainda mais estreito de grandes industriais e financistas, entre os quais se acham principalmente Rockefeller, Morgan, Dupont de Nemours, Mellon, Vanderbilt e Ford(1).
A segunda guerra mundial deu novo e poderoso impulso ao processo de concentração e ao crescimento dos monopólios. As lucrativas encomendas de guerra e os lucros extraordinários beneficiaram principalmente os grandes monopólios. Segundo cifras oficiais, as encomendas de guerra registradas pelos diversos departamentos do governo americano, creditadas a 18.539 firmas, entre junho de 1940 e setembro de 1944, ultrapassaram o montante de 175 bilhões de dólares. Entretanto, foram as 100 corporações maiores que receberam a parte do leão nesse montante: 117 bilhões de dólares, ou seja 67% do total. Poder-se-ia supor que as grandes corporações transmitissem às pequenas firmas uma parte considerável dessas encomendas. Mas um inquérito sobre as 252 corporações maiores demonstrou, em 1943, que elas não retransmitiam a outras empresas senão 34% das encomendas primitivas, isto é, um terço, dividido da seguinte maneira: 17,5% tinham passado para outras grandes firmas, e somente 24,5% às pequenas.
Em definitivo, as grandes firmas executavam 70% do total das encomendas, e as pequenas apenas 30%(2). A massa principal dos gigantescos lucros de guerra afluiu, assim, para os grandes monopólios.
A guerra teve também como resultado não só um novo fortalecimento dos grandes monopólios, mas ainda a ruína de vários milhares de pequenas empresas. Só na indústria de transformação, cerca de 120.000 pequenas firmas fecharam as portas durante a guerra. A preponderância das grandes empresas no conjunto da produção aumentou por isso mesmo. Em 1939, na indústria de transformação, as pequenas empresas, isto é, as empresas de menos de 500 operários, ocupavam 51,7 do total dos operários; mas em 1944, ocupavam apenas 38,1(3).
Considerando esse rápido progresso da monopolização, o círculo dos detentores do poder econômico se estreitou ainda mais.
O progresso da concentração da produção e da centralização do capital lança as bases da dominação dos monopólios no campo político. A luta pelas alavancas de comando do Estado e pela posse de tal ou qual posto na administração torna-se cada vez mais acesa entre os grandes monopolistas. Simultaneamente, os monopólios dominantes, tomados em seu conjunto, tentam o assalto cada vez mais completo ao aparelho do Estado, que submetem às suas cobiças e que querem identificar com sua própria existência. É precisamente essa fusão do Estado burguês com os monopólios associados entre si que caracteriza, segundo Lenin, o capitalismo monopolista de Estado.
Nos países burgueses, os monopólios capitalistas não controlam apenas a atividade dos governantes, mas decidem de sua composição. Na época do imperialismo, são as grandes sociedades financeiras que determinam a composição dos governos e lhes controla as atividades. Quem não sabe, escreve Stalin, que em nenhuma potência capitalista pode ser formado um gabinete contra a vontade dos grandes lobos financeiros; basta exercer uma pressão financeira para que os ministros sejam expulsos de seus postos, como que fulminados por um raio. Esse é o verdadeiro controle do Governo, o controle por parte dos bancos, e não o suposto controle por parte dos parlamentos.
Um Exemplo Típico: Os Estados Unidos
Esse poder absoluto dos monopólios, o papel decisivo que representam na formação do grupo político dirigente e o controle que exercem sobre sua atividade podem ser observados durante todo o desenrolar da história recente dos Estados Unidos. O livro de Ferdinand Lundberg “As 60 famílias americanas”(4) apresenta um grande número de exemplos expressivos dos diferentes processos de que os monopólios se utilizam para controlar o aparelho do poder político e sua atividade. Os presidentes dos Estados Unidos, expõe Lundberg, são, em regra geral, as criaturas, e, para falar com propriedade, os instrumentos de um pequeno grupo de monopolistas. Theodore Roosevelt foi uma criatura de Morgan; Taft uma criatura de Rockefeller. O presidente Mac Kinley foi um instrumento da “Standard Oil” e de algumas outras companhias. É impossível — observa Lundberg — entrar na Casa Branca sem o consentimento das famílias dominantes.
Ferdinand Lundberg notava, já em 1938, que, embora imiscuindo-se nos negócios políticos, os monopolistas preferiam manter-se na sombra e agir através de pessoas, intermediárias, seus procuradores e homens de confiança. Eram esses últimos que entravam no governo, ocupavam os postos diplomáticos mais importantes e tinham a máxima influência sobre os partidos políticos. Desde que o impulso do capital financeiro internacional — escreveu Lundberg — conferiu uma importância vital a certos postos diplomáticos. . . quase todos os embaixadores em Londres, Paris, Tóquio, Berlim, Roma, etc., foram homens de confiança de Morgan, Rockefeller, Mellon e outros magnatas das finanças. Na maioria das vezes, a pressão não era exercida de maneira direta e aberta, mas por meio de manobras ocultas: corrupção, financiamento das eleições, chantagens, etc.
Tal era a situação dos Estados Unidos antes da segunda guerra mundial. Durante e após a guerra, tendo aumentado o poderio dos monopólios americanos, acentuou-se então sua intromissão nos negócios do Estado. Atualmente, seus representantes penetram abertamente nos mais importantes setores do aparelho central do Estado. No governo de Truman, todos os postos de comando são açambarcados pelos lobos industriais e financeiros. Harriman, Snyder, Forrestal, Simington e outros ministros americanos são grandes figurões de Wall Street.
Conforme escreve Walton na revista New Republic, os banqueiros, que já dominam numerosos setores do governo de Truman, puderam, ultimamente, penetrar também no Departamento de Estado. E tiveram tanto sucesso que conseguiram impor sua própria política exterior reacionária e agressiva. No Departamento de Estado, como nas representações diplomáticas no estrangeiro, os principais postos se acham agora diretamente ocupados pelos grandes financistas do mundo dos monopólios. Assim, Lovett, sócio da firma “Brown Brothers and Harriman”, é suplente do secretário de Estado, e Saltzman, antigo vice-presidente da Bolsa de New-York, é adjunto desse último; Douglas, presidente do conselho de administração da grande sociedade de seguros “Mutual Life Insurance”, é embaixador em Londres; Grady, presidente de uma grande companhia de navegação, é embaixador na Índia, o banqueiro nova-iorquino Griffith é embaixador na Polônia, etc.
O açambarcamento dos principais postos governamentais pelos monopolistas é acompanhado, segundo Walton, por uma eliminação impiedosa, até nos menores postos, dos funcionários governamentais que sustentaram o “New Deal” de Roosevelt. Isso, praticamente, equivale a uma fusão mais completa dos órgãos do poder político com os monopólios, a uma vontade mais determinada do capitalismo monopolizador dos Estados Unidos de estabelecer abertamente sua denominação política.
O Açambarcamento da Renda Nacional Pelos Monopólios
Na aparência, o desenvolvimento do capitalismo monopolista de Estado apresenta-se como uma intervenção do Estado na economia para “controlá-la” e “coordená-la”.
Nas condições do imperialismo, o Estado burguês oprime as massas trabalhadoras e levanta, sob forma de impostas, consideráveis meios financeiros. Mas só os gasta no interesse único da malta dominante dos monopolistas. A opressão fiscal torna-se, assim, um meio suplementar de exploração dos trabalhadores e de enriquecimento para os monopólios. Pelo subterfúgio do orçamento, o aumento dos encargos fiscais permite ao Estado capitalista concentrar em suas mãos, em certos períodos e principalmente em tempo de guerra, uma parte importante da renda nacional. É assim que nos Estados Unidos as receitas provenientes dos impostos e das taxas aumentaram oito vezes, de 1940 a 1945. Graças a esse aumento brutal dos impostos, duplicado pelo lançamento de empréstimos internos, o governo americano teve a possibilidade de gastar, durante a guerra, no quadro do orçamento, mais de 50% da renda nacional(5).
Mas não é só em tempo de guerra que uma parte tão elevada da renda nacional é drenada para as mãos do Estado. Caracterizando-se os Estados imperialistas pela expansão de seu militarismo, seus orçamentos militares permanecem, na época da crise geral do capitalismo, muito elevados, mesmo em “tempo de paz”, paz contudo relativa, durante a qual se desenvolveu as guerras coloniais e sua repressão, e quando se reinicia a preparação de novas guerras mundiais.
Assim foi que, na Alemanha fascista, as despesas se elevaram, em 1937, a 13,5 bilhões de marcos, em 1938 a 25 bilhões, em 1939 a 30 bilhões, ou seja, respectivamente, 19,%, 31,2% e 33,3% da renda nacional.
Quanto aos Estados Unidos, o orçamento militar de 1947-48 elevou-se a 11 bilhões de dólares, ou seja 34% das despesas totais, correspondendo ainda a onze vezes o total do de 1937-1938. O projeto do orçamento 1948-49, submetido por Truman ao Congresso, prevê, no título das despesas militares, a mesma soma de 11 bilhões de dólares. Mas prevê, além disso, uma despesa de sete bilhões para o que é chamado, na respectiva rubrica, “negócios internacionais e financiamento”, isto é, para o apoio militar aos satélites dos Estados Unidos e o avassalamento de outros países. Em conjunto, isso representa 46% de todas as despesas orçamentárias.
A parte mais importante do orçamento militar destina-se à compra de armamento e de peças de equipamento para as forças armadas e as instalações militares, assim como para o financiamento das empresas privadas que executam suas encomendas. Em 1944, por exemplo, os Estados Unidos despenderam, nessas rubricas, 55,6 bilhões de dólares, ou seja 61,% de todas as despesas militares do Estado(6). Graças a esse emprego dos recursos orçamentários, o Estado pode assegurar aos monopólios enormes lucros. Ele “regulamenta” os salários e “estabiliza” o mercado do trabalho, promulgando leis contra as greves e instaurando, nas empresas, um regime de trabalho forçado Os monopolistas nada têm a objetar contra tal “regulamentação”, que lhes assegura saídas e lucros, subsídios e concessões, ao mesmo tempo que o apoio do Estado para uma exploração sempre crescente da classe, operária e de todos os trabalhadores em geral.
Outra parte do orçamento militar de um Estado burguês é destinada à construção de fortificações e de outras obras de objetivo militar, assim como de usinas de armamento do Estado. Durante a guerra, de 1941 a 1945, o Estado americano gastou nessas obras de construção 29,3 bilhões de dólares, dos quais 15,5 bilhões para a construção e o equipamento de empresas industriais(7). Quanto aos reis da indústria, esse sentiam-se pouco inclinados a investir capitais durante a guerra, temendo não poder utilizar as novas instalações após o fim das hostilidades. Durante a segunda guerra mundial, a parte dos investimentos privados na indústria não ultrapassou 20%; logo, o Estado forneceu 80% de todos os capitais investidos na construção e no equipamento das empresas industriais. Assim, fica provado que o Estado capitalista, ao mesmo tempo que assegura aos monopólios lucros elevados, toma para si todo o risco dos novos investimentos.
Durante a guerra, os investimentos do Estado “regulam” a reprodução do capital em detrimento dos trabalhadores e no interesse dos monopólios. Mas o mesmo fenômeno se produz também depois da guerra, cedendo o Estado aos monopólios, por preço vil, grande número de suas empresas. Nos Estados Unidos foi isso o que aconteceu, tanto depois da segunda guerra mundial quanto da primeira. Antes do fim do conflito, já o governo americano tomara a decisão de vender ou de alugar suas empresas “não indispensáveis do ponto de vista militar”. Mais tarde, várias grandes empresas do Estado foram vendidas aos monopolistas. A grande usina metalúrgica de Genebra, no Estado de Utah, que custara 191 milhões de dólares ao Estado, foi vendida à “United States Steel Corporation” por 47,5 milhões, ou seja, por um quarto de seu valor. A Sociedade “National Tube” comprou por 4,8 milhões de dólares um equipamento do valor de 12 milhões, instalado à Custa do Estado na usina da sociedade Harry.
As Nacionalizações e Seu “Prolongamento”
Da mesma forma, quando um Estado burguês nacionaliza, às vezes., certos bancos, certas empresas ou ramos de indústria, essas nacionalizações nunca se fazem em detrimento dos monopolistas, mas, ao contrário, em seu interesse. Elas não ferem as relações de propriedade e não lesam os interesses dos proprietários, que recebem uma generoso recompensa, como, por exemplo, na Inglaterra. Na maioria das vezes, nacionalizam os ramos que já não asseguram benefícios compensadores ou trabalham com prejuízo. Tal foi o caso da indústria hulheira inglesa, em que o governo trabalhista, indo em auxílio dos reis do carvão inglês, salvou-lhes os capitais e desobrigou-os da necessidade de renovar o equipamento envelhecido das minas.
Não é somente em tempo de guerra que certas empresas ou partes de empresas se tornam propriedade do Estado. Isso também se produz em outras épocas críticas para os países capitalistas. A operação acha-se facilitada pela própria forma das sociedades por ações. Assim, durante a crise econômica de 1929 a 1933, o governo alemão salvou da falência os grandes banqueiros e plutocratas, comprando importantes lotes de ações de seus trustes e sociedades: Truste do Aço, Dresdner Bank, Deutsche Bank, Kommerzienbank, Agências Marítimas Hapag, Norddeutscher Lloyd, etc. Algumas empresas, como os transportes, são às vezes nacionalizados pelo Estado capitalista por motivos estratégicos.
Nada poderia demonstrar melhor a rigorosa subordinação das nacionalizações aos interesses dos monopólios nos países burgueses, do que as restituições freqüentes das empresas nacionalizadas a seus antigos proprietários, restituições que se efetuam mal desaparecem ns razões iniciais da nacionalização. Procede-se, então, pura e simplesmente, ao retorno à propriedade privada. Tal foi o caso, na Alemanha, logo depois da subida de Hitler ao poder. O Estado fascista devolveu aos monopólios importantes lotes de ações do Truste do Aço, do Deutsche Bank e de certas outras firmas, que o Estado comprara durante a crise econômica. Passada a crise, já não existindo a necessidade de “nacionalizar”, o Estado burguês procede à desnacionalização.
Sejam quais forem suas formas, a “regulamentação” da economia pelo Estado em regime capitalista tem por finalidade, invariavelmente, a satisfação dos interesses dos monopolizadores e, por conseqüência, uma fusão cada vez mais íntima do Estado com os monopólios. Os organismos de “regulamentação” e de “controle” são um meio extremamente cômodo para conseguir a contribuição do aparelho do Estado, com vistas a aumentar os lucros dos monopolizadores.
A fusão do aparelho do Estado com os monopólios traduz-se pelo assalto dos monopolistas aos cargos dirigentes dos principais organismos “reguladores” criados pelo Estado, e, por outro lado, pela participação do Estado na administração dos trustes, das sociedades por ações, etc. Assim, nos Estados Unidos, a pessoa colocada à frente do “Departamento de Direção da Indústria”, criado em 1941, não foi outra senão o presidente do truste de automóvel “General Motors”, Knudsen; a direção dos serviços essenciais desse departamento foi confiada a Stettinius, presidente do Truste do Aço, a Biggers, presidente da Companhia Ferroviária “Chicago, Berlington e Quincey”, aos representantes de Rockefeller, de Morgan, de Mellon e de outros monopólios. Entre o pessoal desse departamento, contavam-se, no início de 1942, nada menos de 255 pessoas que só recebiam um salário simbólico — 1 dólar por ano — e 631 pessoas que não recebiam qualquer salário. Os chefes ou representantes dos diferentes trustes e grandes companhias não tinham, evidentemente, necessidade de “salário”.
Criou-se, dessa maneira, uma situação que o jornalista americano Stone caracteriza nos seguintes termos: Quando o governo desejava adquirir equipamento elétrico, calçados ou borracha, na maioria das vezes tinha o prazer duvidoso de ter de se dirigir a uma pessoa do mesmo ramo da indústria, quando não da própria firma com que o Estado iria tratar(8).
O assalto sobre os organismos oficiais da economia de guerra permitia aos monopolistas colocar suas firmas nos melhores condições para explorar a conjuntura da guerra e. realizar os maiores lucros
possíveis.
Era sem dúvida em razão de sua qualificação “profissional” que os grandes monopolistas ocupavam cargos dentro do próprio coração do aparelho de Estado. Assim é que Werlin, diretor do maior konzern alemão da indústria automobilística, “Daimler-Benz”, foi nomeado inspetor geral dos auto-transportes alemães. Os hitleristas têm, certamente, direito ao título de precursores na realização da “união pessoal”, isto é, da fusão das funções de chefe de empresa e de funcionário de Estado. Na economia, o “Fuhrer-prinzip” foi aplicado em toda a escala. Não só nas grandes empresas industriais, mas, de modo geral, em todas as usinas e em todas as oficinas, o empreiteiro tinha o título de “fuhrer” o que lhe conferia plenos poderes como representante do Estado.
Vejamos um exemplo surpreendente que mostra a que ponto podia chegar, durante a guerra, a fusão do aparelho do Estado com o dos monopólios: o presidente do truste inglês “Imperial Chemical”, Mac Gowen, declarava na Câmara de Comércio de Glasgow, no início de 1944, que 2.500 pessoas pertencentes à direção desse truste estavam, naquela época, contratadas a serviço do Estado. Evidentemente, Mac Gowen julgava necessário, ao mesmo tempo, acentuar que essa situação não era de forma alguma determinada pelo desejo do truste de influir, segundo seus próprios interesses, nos serviços do governo, mas “unicamente pela impossibilidade em que se achava o Governo de encontrar, fora das grandes firmas, pessoas possuindo a aptidão e a experiência necessárias para dirigir grandes operações”.
O Conluio “Socialista” Com os Monopólios
O desenvolvimento do capitalismo monopolista de Estado surge, assim, como a fusão do Estado e dos monopólios, com a subordinação cada vez mais completa do Estado à economia, isto é, aos monopólios. Nos países imperialistas, o Estado moderno é o órgão de um punhado de monopolizadores que dominam tanto a economia quanto a política. Esse Estado é a representação e o instrumento dócil dos monopolizadores.
Os ideólogos da burguesia procuram mascarar, por meio de toda sorte de “teorias” falaciosas, o caráter de capacidade próprio do Estado imperialista, nos seus empreendimentos internos e externos. Sustentam que o Estado burguês exprime o interesse de todo o povo, que exerce sua ação a favor das massas populares, que a “regulamentação” e a “planificação” lhe permitem pôr um fim à anarquia capitalista e eliminar as taras inerentes ao sistema capitalista.
São os pseudo-socialistas da IIª Internacional que pregaram e pregam ainda essas “teorias” com maior zelo. Durante a primeira guerra mundial, os lacaios do imperialismo no campo da social-democracía austro-alemã eram unânimes em gabar o capitalismo monopolista de Estado alemão e em interpretá-lo como um “socialismo de guerra” ou um “socialismo de Estado”. Apresentavam o Estado imperialista alemão como um instrumento capaz de realizar a “reforma socialista”. O próprio Governo — escrevia então Lensch — é obrigado o pôr um fim ao livre jogo das forças capitalistas, intervindo profundamente na vida econômica, fixando o teto dos preços, procurando regular a produção e o consumo. . . Que outro nome, se não o de socialismo, pode-se, em principio, dar a tal organização da vida econômica, que substitui a anarquia capitalista, e isso no interesse da comunidade?(9).
O mesmo ponto de vista era sustentado por Karl Renner e os outros social-chauvinistas.
Lenin expressou o seguinte julgamento sobre as declarações dos pseudo-socialistas alemães do tempo da primeira guerra mundial:
Que é o Estado? É a organização da classe dominante —— por exemplo, na Alemanha, a organização dos junkers e dos capitalistas. Dai se depreende que aquilo que os Plekhanov alemães (Scheidemann, Lensch, etc.) chamam “socialismo de guerra” é, na realidade, o capitalismo de guerra monopolista de Estado, ou, mais simplesmente e mais claramente, as galés militares para os operários, a proteção militar dos lucros para os capitalistas. . . O erro mais espalhado é a afirmação burguesa reformista que pretende que o capitalismo monopolista ou o capitalismo monopolista de Estado já não é mais o capitalismo, que já pode ser chamado “socialismo de Estado” e assim por diante”. Com o passar do tempo, o desenvolvimento do capitalismo monopolista de Estado continuou a ser mascarado pelas declamações sobre o “socialismo”. Sabe-se que os fascistas alemães pretendiam edificar nada mais nada menos do que o socialismo e se intitulavam “nacional-socialistas”. Na realidade, o “socialismo” fascista não era senão o capitalismo monopolista de Estado sob sua forma mais agressiva, e os hitleristas não eram senão os cães de guarda dos monopolistas alemães. Hoje, o capitalismo monopolista de Estado inglês arvora, também ele, a bandeira do socialismo.
Na realidade, os trabalhistas ingleses que assumem o governo do Estado executam a vontade dos imperialistas ingleses e americanos; constroem com suas próprias mãos o edifício do capitalismo monopolista de Estado inglês. É claro que eles também não dispensam as “digressões teóricas”. É o que explica o barulho que a imprensa inglesa faz em torno da “planificação” e da “regulamentação” da economia, da nacionalização da indústria, da supressão do desemprego, etc. O Estado imperialista inglês — pretendem os trabalhistas — age no interesse do povo inteiro e é capaz de transformar o capitalismo em socialismo.
Conclusão
Os apologistas do capitalismo esforçam-se por provar que o Estado burguês pode dominar, regulamentando-as, as leis anárquicas do mercado e operar uma planificação, sem renunciar, bem entendido, à propriedade capitalista.
Na realidade, o Estado burguês é incapaz de introduzir na economia os “princípios da planificação”, porque longe de manter nas mãos a economia, ele próprio está entregue à anárquica economia capitalista.
Sob o regime da “regulamentação” pelo Estado, a concorrência toma formas sempre mais ásperas. No interior do grupo dominante dos monopolistas, trava-se uma luta pela partilha do bolo oferecido pelo Estado: encomendas lucrativas, subvenções, preços altos, saída para o consumo. Ferozes, os monopolistas disputam uns aos outros a influência sobre o aparelho do Estado, os cargos ministeriais, as funções de maior interesse na administração, inclusive os organismos de “regulamentação”. Em suma, um combate de morte é travado pela malta dominante dos monopolistas contra as pequenas empresas e as médias, e contra as demais empresas que estão fora de sua órbita, e, nesse combate, os tubarões do capital monopolizador apóiam-se no poder do Estado burguês. O Estado é, assim, uma força que, longe de atenuar a luta entre os concorrentes, só serve para atiçá-la.
Uma expressiva manifestação da anarquia econômica durante II guerra foi o câmbio negro, que tomou extraordinária extensão em todos os países capitalistas beligerantes. Representava um meio, entre outros, de torcer as medidas de regulamentação tomadas pelo Estado. Uma parte importante das matérias primas escoava para o mercado negro, embora estivessem racionadas pelo Estado em razão de sua penúria e eram as grandes firmas, elas próprias, que tomavam a iniciativa dessas operações. O chefe do Departamento da produção de guerra nos Estados Unidos, Nelson, revelou, em 1942, que numerosas empresas industriais formulavam pedidos fictícios de matérias primas, para revendê-las em seguida a preços ilícitos.
Os lucros dos capitalistas americanos aumentaram durante a guerra em proporções extraordinárias. Atingiram 424% da média anual de 1936-39 nas usinas de carne em conserva, 772% nas empresas têxteis, 1046% nos grandes armazéns 1500% nas usinas de couro.
Mas, além de seus lucros enormes, os monopolistas americanos ainda se aproveitaram largamente das subvenções do Estado. Em julho de 1946, as subvenções concedidas pelo presidente Truman para a produção de carne em conserva elevavam-se a 595 milhões de dólares, quando o total dos lucros das companhias interessadas tinha atingido 153.193.000 dólares em 1944, contra 22.392.000 em 1939.
Diante desses fatos, é perfeitamente absurdo afirmar, como o fazem com a maior seriedade deste mundo certos economistas burgueses, tais como o inglês Clark, que “o desejo do capital de realizar lucros elevados já não representa um papel importante nas condições da economia de guerra”(10).
Os fatos aí estão para demonstrar que a corrida para os lucros é o móvel da produção capitalista, tanto em tempo de guerra quanto em tempo de paz.
Notas:
(1) “Economic Concentration and World War II”, pág. 19 — Relatório apresentado ao Senado dos Estados Unidos, 1946.
(2) “Economic Concentration and World War II”, págs. 32 e 33 — Relatório apresentado ao Senado dos Estados Unidos, 1946.
(3) “Economic Concentration and World War 11”, pág. 24 — Relatório apresentado ao Senado dos Estados Unidos, 1946.
(4) Ferdinand Lundberg — “America. 60 Families” The Citadel t, 1938, New York.
(5 ) Da revista “Economie mondíale et politique mondiale”, 1946, n.° 12, Suplemento estatístico, paga. 24 e 30.
(6) Da revista “Economia Mondiale et politique mondiale”, 1946, n,° 12. Suplemento estatístico, pág. 31.
(7) Da revista “Economie mondiale et politique mondiale”, 1946, n.° 12, Suplemento estatístico, pág. 31.
(8) Stone — “Business as usual”, New York, 1941.
(9) P. Lensch — “Die deutsche Sozialdemokratie und der weltkrieg”, pág. 63.
(10) Clarck — “Economic Effort of War»,. London, 1940.