A Missão Abbink constitui para o nosso povo a grande prova de que as classes dominantes brasileiras estão cada vez mais distanciadas dos interesses nacionais e preferem por isso recorrer ao apoio estrangeiro.

Na sua presença entre nós temos, assim, a confirmação do grande ensinamento que o camarada Prestes nos transmite em “Como Enfrentar os Problemas da Revolução Agrária e Anti-Imperialista”, ao afirmar:

“Impotentes e desesperados, sentindo cada vez mais ameaçados seus velhos privilégios, os homens das classes dominantes, classes cujo papel histórico terminou e cuja existência já se tornou hoje um obstáculo ao desenvolvimento da Nação, separam-se dela e vão buscar fora de suas fronteiras um apoio estrangeiro para defesa daqueles privilégios caducos e condenados”.
Com efeito, já há bastante tempo o governo de Dutra, cada vez mais agachado diante dos tubarões da América do Norte e do governo de Truman, vem procurando atrair para o Brasil a participação do capital monopolista ianque nos empreendimentos nacionais.

Semelhante forma de agir do governo brasileiro, ao mesmo tempo que indica uma vergonhosa traição aos interesses nacionais, revela a sua incontestável incapacidade para a solução dos nossos principais problemas.

Há pouco mais de um ano era a visita do Secretário do Tesouro americano, Mr. Snyder, que vinha ao Brasil, a convite de governo de traição nacional da Dutra. Pois bem, foi dessa visita que resultou o envio da Missão Abbink ao Brasil. Naquela ocasião, Dutra pessoalmente entregou um memorandum confidencial a Mr. Snyder solicitando ao governo americano, conforme confessa “O Jornal” de 22-7-48, fosse para aqui enviada uma missão americana

“a fim de estudar com uma equipe brasileira uma fórmula que resolvesse positivamente tanto os problemas relacionados com o desenvolvimento do Brasil como os que dizem respeito às necessidades de expansão do capital americano”.
O resultado é que a Missão Abbink teve de esperarsomente o tempo necessário à cassação dos mandatos dos comunistas para surgir no Brasil com todo a sua vasta equipe de magnatas americanos, pisando em nosso solo como numa colônia dos Estados Unidos.

A chegada daMissão Abbink coincide com o aumento da subordinação do governo brasileiro ao imperialismo americano e com uma penetração sem precedentes dos Estados Unidos e do capital monopolista ianque em nosso país.

A subordinação do governo de Dutra à política expansionista dos círculos dirigentes americanos já se tornara visível na Conferência de Bogotá. Entretanto, depois da capitulação vergonhosa dos representantes do Brasil nesse conclave, o governo brasileiro levou a um ponto jamais alcançado sua subordinação ao governo de Truman e aos interesses ianques.

É este o motive por que a Missão Abbink dá as ordens e o governo de Dutra obedece. Mr. Abbink e os magnatas norte-americanos, apoiados pelos seus lacaios nacionais, exigem não somente a liquidação de quaisquer barreiras comerciais, alfandegárias ou fiscais, mas também maiores garantias para o capital estrangeiro investido no Brasil.

Mais do que isso, a Missão Abbink quer ver posto em prática o desejo dos americanos de fiscalizarem e controlarem seus capitais e exige uma porcentagem anual de retirada dos lucros maior do que a permitida por nossas leis.

Persistindo nesse intento, a Missão Abbink pretende fazer uma nova investida com o tratado dos 27 itens, que encontrou reprovação geral da opinião pública brasileira ao ser apresentado ao país.

Voltam, assim, os americanos o insistir na tese da reciprocidade, um dos principais sustentáculos desse insolente tratado imperialista, Terrivelmente prejudicial ao Brasil é evidente que ela só trará como resultado facilitar e aprofundar a penetração do imperialismo americano em nossa Pátria. Seria algo como a reciprocidade de tratamento entre dois lutadores, um com luvas de boxe e outro de mãos amarradas. Cumpre dizer que essa tese imperialista é muito do agrado do governo brasileiro. Por isso mesmo a Missão Abbink tem os pés e as mãos inteiramente livres para sustentar que o capital norte-americano deve ser tratado em pé de igualdade com o capital nacional.

Visitando o Brasil, Mr. Snyder frisara que um categorizado agente da Vaccuum Oil Co. também de passagem pela nossa terra, havia sintetizado numa frase, por sinal bastante cínica, o espírito predominante nos setores mais responsáveis e influentes da finança americana:

“Colocai no alto do Pão de Açúcar um painel com os seguintes dizeres — os capitais estrangeiros e nacionais serão equiparados em seus direitos e deveres — e não faltará mais dinheiro para o desenvolvimento econômico do Brasil”.
É essa tese, tão calorosamente defendida pelos imperialistas ianques em Bogotá, que se procura, com tanto entusiasmo ajustar ao desonrado argumento da nosso falta de recursos técnicos e financeiros para a exploração das riquezas nacionais.

Nas classes dominantes brasileiras a Missão Abbink tem encontrado suficiente subserviência para a admissão de semelhantes teses. Enquanto os homens das classes dominantes e o governo brasileiro curvam a cabeça, tudo cedendo ao imperialismo só para não perder aquilo que, no justo dizer do camarada Prestes, não passa de privilégios caducos e condenados, a Missão Abbink executa à risca a sua linha de conduta.

Mr. Abbink não visita o Brasil em caráter particular. Recebeu uma incumbência do governo de Truman, que é o representante dos grandes trustes e monopólios ianques. Foi o governo americano quem nomeou essa Missão, uma autêntica Missão americana, que só os mais descarados lacaios do imperialismo ainda pretendem disfarçar como comissão mista brasileiro-americana. A orientação que ela vem seguindo é, portanto, a do governo americano, não podendo haver diferença entre os objetivos que a Missão Abbink persegue e as declarações feitas por Snyder e Mc Cloy no Rio, Marshall em Quintandinha ou Pawley em Bogotá.

Todos eles afirmaram sempre que uma prioridade absoluta havia sido determinada para o chamado restabelecimento econômico da Europa e que o governo ianque não tem nenhum interesse de fazer empréstimos aos governos sul-americanos. Se estes quisessem teriam de contentar-se com capitais privados, mas nas condições já exigidas de igualdade de tratamento com os capitais nacionais.

Essa nova tática do imperialismo americano, o camarada Prestes desmascarou-a no seu trabalho “Como Enfrentar os Problemas da Revolução Agrária e Anti-Imperialista”, afirmando tratar-se da:

“nova forma de penetração que vem sendo cada vez mais utilizada pelo capital financeiro dos Estados Unidos nos países coloniais e semi-coloniais, de empresas mistas ou de “investimento conjunto” de capitais locais e norte-americanos”.
Ela não exclui, porém, os empréstimos públicos e a empresas particulares, segundo os outras formas tradicionais de penetração imperialista. A única diferença é que agora os imperialistas americanos se recusam a fazer empréstimos de governe a governo, quando se tratar de países sul-americanos.

Mas isso se explica principalmente no caso do Brasil, já considerado como “quintal” da América do Norte. Seu governo está suficientemente encabrestado ao governo do “colosso americano” e já não se torna preciso submetê-lo por meio de empréstimos do governo dos Estados Unidos. O essencial para o imperialismo é tomar conta literalmente de todo o país, liquidar com toda a sua soberania e independência econômica, e isso é tarefa para os capitais privados norte-americanos, capitais que, de resto pertencem aos grandes bancos oficiais ianques, como o Export Import Bank, ou aos grandes trustes e monopólios de destacada participação e influência no governo americano.

O governo Dutra, por sua vez, incapaz de resolver qualquer problema nacional ou popular, servo fiel do governo americano, vai lhe apresentando uma a uma as suas pretensões e conformando-se a cada solução que lhe dá o governo de Truman.

No memorandum entregue por Dutra a Snyder, quando este visitou o Brasil o ano passado, não só pleiteava a vinda da Missão americana; também o Ministro da Fazenda Correia e Castro, num esquema econômico, solicitava ao governo ianque o empréstimo de 300 milhões de dólares. Visava o governo brasileiro com esse empréstimo pagar sua dívida externa e cobrir os sucessivos “deficits” orçamentários.

O esquema foi levado ao presidente Truman, mas os Estados Unidos não concordaram com o empréstimo de governo para governo. O Governo americano manifestou-se favorável à aplicação de capitais particulares no Brasil. E preferiu despachar a Missão Abbink para cá mesmo num momento em que Dutra e seu governo diziam não estar ainda preparados para atender a todos os seus desejos e prestar-lhe contas de tudo, como era devido aos seus patrões.

Os homens das classes dominantes conformaram-se, contudo, à expectativa de poderem contar eventualmente com capitais privados norte-americanos.

Com esses precedentes, a Missão Abbink vem ao Brasil impor as suas condições. Quer verificar quais são as possibilidades para inversões de capitais particulares norte-americanos. Não visa fornecer qualquer empréstimo, como pretendiam os homens das classes dominantes, mas somente determinar em que espécie de negócios poderão os americanos tirar mais vantagens para a sua política expansionista e de domínio mundial.

Entretanto os fatos estão se incumbindo de mostrar que — sem perder de vista o interesse de Mr. Abbink pelo minério de ferro brasileiro, a soda cáustica, os adubos, o controle do nosso comércio exterior, bem como da agricultura e de nossas finanças, ou seja de toda a nossa economia, para o que desejam e exigem os americanos o levantamento de todos os recursos nacionais — as pretensões da Missão americana se encontram no nosso petróleo.

Um órgão da imprensa reacionária, insuspeito como “O Jornal”, em sua edição de 22-7-48, ao anunciar a vinda da Missão americana, procurava saber até que ponto sua presença entre nós poderia resultar na satisfação das necessidades econômicas do Brasil. E concluía afirmando:

“Essa satisfação dependerá das proporções em que o Brasil se mantiver disposto a abrir o sinal verde para o capital americano, principalmente com referência aos direitos que esse reclama de participar na exploração de nossas fontes de petróleo, em todas as suas fases”.
“Sabe-se também — acrescentava o mesmo órgão — que já por ocasião de sua visita ao Brasil, o Sr. John Snyder frisou claramente o vivo interesse americano pelo aproveitamento mais rápido de nosso petróleo”.
O grande interesse da Missão Abbink, de um lado, pelo petróleo e, de outro, pela aplicação em igualdade de condições dos capitais privados norte-americanos nos empreendimentos de nosso pais, indica que estamos em face de uma seriíssima ameaça à nossa soberania. Ela é agravada pela traição do governo de Dutra, que tem ido tão longe em sua subserviência aos interesses norte-americanos a ponto de aceitar e pleitear a concorrência do capital americano na formação de um Banco Central, destinado a controlar todo o sistema financeiro do Brasil.

Os homens das classes dominantes se manifestam satisfeitos, por sua vez, com os propósitos da Missão, e há até os que como o conhecido agente ianque Valentim Bouças se antecedem a Mr. Abbink na defesa do sistema de empresas mistas. Facilitam, assim, a obra do imperialismo que

“visa com isto — como diz Prestes — além da vantagem inegável de absorver o capital financeiro de outros países e manobrar com toda a sua vida econômica, encobrir o caráter estrangeiro da exploração, nela envolver a própria burguesia local e conseguir sua proteção, como já vem acontecendo em nossa Pátria com diversas empresas norte-americanas de que são sócios os principais homens de governo, parlamentares, ministros, como o próprio sr. Correia e Castro, e os Morvan, Daniel de Carvalho, etc.”
A verdade é que a Missão Abbink, pelo seu caráter de órgão supervisionador de todos os nossos recursos, e pela sua ascendência sobre o governo de traição nacional de Dutra, além dos propósitos que alimenta de controlar nossa economia através do capital americano e apoderar-se de nosso petróleo, constitui uma ponta de lança do imperialismo americano no caminho da recolonização do Brasil. Estamos em face de uma ação concreta dos círculos dirigentes norte-americanos, intervindo descaradamente em nossos negócios internos em escala muito maior do que lograra fazer o antigo embaixador Berle às vésperas do golpe reacionário de 29 de outubro ou o seu sucessor Pawley ao estimular a campanha anti-comunista do governo de Dutra.

Por outro lado, a Missão Abbink, mercê das pesadas obrigações que impõe ao país e das terríveis exigências feitas em troca da inversão do capital americano, representa mais um fator de agravamento das miseráveis condições de vida e da exploração imperialista em nossa Pátria .

Todavia para o governo brasileiro e os homens das classes dominantes a atuação ou interferência da Missão Abbink em nossos negócios é não somente desejável como também tolerada e digna de estimulo. É que — conforme assinala Prestes em seu trabalho, relembrando uma oportuna lição de Marx — eles já não podem disfarçar a dominação de classe com o uniforme nacional.

As grandes massas, porém, cujo sentimento anti-imperialista cresce dia a dia, vão se sentindo cada vez menos dispostas a tolerar a traição e a inépcia do governo. Em tais condições, a intervenção das massas trabalhadoras vai se tornando mais e mais necessária para repelir as investidas dos imperialistas e seus agentes dentro do país. E é, sem dúvida, no grande movimento em defesa do nosso ouro negro e contra o Estatuto do Petróleo que se está cristalizando uma vasta frente única anti-imperialista, que bem traduz os sentimentos das grandes massas brasileiras em oposição ao domínio americano no Brasil.

A presença da Missão Abbink, seus objetivos determinados na posse de nosso ouro negro, sua aliança aberta com os mais conhecidos agentes ianques partidários do Estatuto entreguista do Petróleo, aguçam o ódio dos patriotas e das vastas massas contra os exploradores norte-americanos.

Essas condições facilitam o amplo movimento de todos os patriotas e das vastas massas para repelir a Missão americana.

A luta contra o Estatuto do Petróleo, já agora inseparável da luta contra a Missão Abbink, constitui, pois, o grande ponto de apoio para derrotar as pretensões imperialistas.

Eis por que, em face da Missão Abbink, nosso papel, como comunistas, está em sabermos ocupar nosso lugar à frente das massas, terrivelmente exploradas pelo imperialismo americano e subjugadas pelo governo de Dutra, orientando-as e dirigindo-as em suas lutas.

O certo é que a luta contra a Missão Abbink deve ganhar rapidamente as massas. Reconquistando a praça pública, passando às demonstrações e a ações de massas, com formas de luta mais vigorosas, reforçando desse modo a luta contra o Estatuto do Petróleo, o povo brasileiro será capaz de expulsar a indesejável Missão Abbink, apesar de todo o apoio que ela vem recebendo do governo de traição nacional de Dutra.

                                                        ******************************************

“O estudo da história do PC(b) da URSS nos enriquece com a experiência da luta dos operários e dos                                                                                                           camponeses do País Soviético pelo socialismo”.

                                                                                 Da “História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS
                                                                                                                                                                  edição Vitória.