A 5 DE JUNHO de 1947, o secretário de Estado dos EE. UU. pronunciou um discurso na Universidade de Harvard que abriu na história das relações internacionais de após guerra um capítulo dos mais originais, conhecido sob o nome de «plano Marshall». Muito se tem escrito a respeito desse plano. Além de numerosos artigos em jornais e revistas, também lhe foram consagradas volumosas publicações oficiais nos dois lados do Atlântico. Na América e em alguns países europeus, este plano tomou um lugar extraordinariamente grande no cenário político, velando as questões mais sentidas. Em volta deste plano as paixões se desencadeiam, forjam-se legendas; assiste-se à algazarra que, nas «democracias ocidentais», tem a finalidade de criar uma aparência de participação do povo na solução dos problemas mais importantes do Estado, quando na realidade estes problemas são resolvidos sem sua participação, desprezando sua vontade e contrariamente aos seus interesses vitais. Para fazermos, até certo ponto, o balanço da história do plano Marshall é necessário examinar os fatos, sem atender à onda de verbosidade incessante, cujo objetivo é, quase sempre, encobrir em vez de esclarecer o fundo da questão.
                                          I — Plano de Subjugação Econômica e Política da Europa 

EM SEU discurso na Universidade de Harvard, Marshall proclamou sob uma forma muito geral e vaga a vontade dos Estados Unidos «ajudarem o mundo europeu a trilhar o caminho da reconstrução». Declarou que «a iniciativa deve partir da Europa» e que, previamente, «deve ser realizado um acordo entre os países europeus em relação às necessidades resultantes da situação criada e ao papel que estes países assumirão para que seja realizada em conseqüência qualquer medida que possa ser efetuada pelo governo dos Estados Unidos».

O curso ulterior dos acontecimentos é sabido. No fim de junho e início de julho de 1947 realizou-se em Paris uma conferência dos ministros dos Negócios Estrangeiros da União Soviética, da Inglaterra e da França, convocada por proposta dos governos inglês e francês para examinar as questões da ajuda americana aos países europeus em conexão com o discurso de junho pronunciado por Marshall. Durante esta conferência manifestaram-se claramente duas concepções diferentes dos problemas do reerguimento de após guerra e da cooperação internacional.

O ponto de vista soviético foi de que a ajuda econômica dos Estados Unidos só poderia contribuir para o reerguimento dos países europeus se não fosse acompanhado pela ingerência nos negócios internos dos povos da Europa, por atentados à sua soberania nacional e à sua independência econômica. Acrescentamos que, segundo a tese soviética, o papel decisivo na reconstrução de após guerra cabe ao esforço próprio de cada país, não devendo ser a ajuda estrangeira senão um fator acessório.

Os delegados da Inglaterra e da França à conferência dos três ministros dos Negócios Estrangeiros em Paris, adotaram uma atitude diametralmente oposta. Desde o início, declararam que a ajuda de além-Atlântico seria o «fator decisivo» do reerguimento econômico dos países europeus. Daí se concluía pela necessidade da «direção» americana em relação à Europa. A Inglaterra e a França assumiram o papel de mandatários de Washington para os negócios europeus. Suas propostas concretas previam a criação de um «comitê diretor» investido de poderes amplos em matéria de intervenção nos negócios internos dos países da Europa.

Demonstrando o conteúdo real desse plano, Molotov declarou a 2 de julho de 1947 na Conferência de Paris:

«Desta forma, a questão da ajuda econômica americana, a respeito da qual, para cúmulo, nada se sabe ao certo no momento, serviu de pretexto aos governos britânico e francês para exigir a criação de uma organização nova, superior aos países europeus e intervindo em seus negócios internos, indo esta intervenção até a determinação do sentido em que deverão se desenvolver os principais ramos da indústria nos ditos países. Além disso, a Inglaterra e a França, com os países seus aliados, pretendem uma posição dominante nesta organização ou, como diz o projeto britânico, no «comitê diretor» para a Europa».
Era um segredo de Polichinelo o fato de que Bevin e Bidault, assim como os políticos de Washington, que puxavam por detrás os barbantes, contavam que a Conferência de Paris terminasse sem resultado. Mal acabou esta conferência, já os representantes da Inglaterra e da França desenvolviam ruidosa atividade para a criação do «comitê diretor» e para formar um bloco dos países europeus que estavam dispostos a seguir o caminho da submissão às ordens do estrangeiro. Nove países democráticos (a URSS e outros Estados do Centro, Este o Suleste europeus) recusaram tomar parto nesta empresa duvidosa, manifestamente incompatível não só com sua soberania, como também com a simples dignidade dos povos amantes de sua liberdade e que rejeitam as pretensões de quem quer que seja ao domínio mundial.

Foi outra a atitude dos meios dirigentes dos países da Europa ocidental. Rivalizando em zelo, declararam-se prontos a aceitar quaisquer condições impostas pelos «protetores» americanos. Ainda o plano Marshall estava em estado embrionário e já Bevin, Bidault e seus correligionários políticos o qualificavam de base do reerguimento econômico da Europa. Os dirigentes da política dos países do Oeste europeu extasiaram-se diante do «desinteresse» e da «generosidade» dos Estados Unidos. Os socialistas de direita apressaram-se a identificar o plano Marshall como medida autenticamente socialista. Não há outro Deus fora do dólar, e Marshall mais Bevin são os seus profetas: eis a palavra de ordem, sob a qual se agruparam todos os marshalistas ortodoxos.

Os governos de dezesseis países europeus comprometeram-se com a marshalização. Vejamos o que representa este número. Encontramos aí Irlanda, e o Luxemburgo, países que têm menos habitantes do que um subúrbio médio de qualquer grande capital européia.

Não se encontram nas fileiras dos participantes do plano Marshall muitas dos países e povos que lutaram contra o fascismo: a Polônia, e a Tchecoslováquia. Em compensação, Portugal fascista e a Turquia ultra-reacionária, que ainda recentemente eram cúmplices de Hitler, são o ornamento de honra da família da «cooperação européia». Em nome da Grécia, tomam parte no plano Marshall os fantoches monarco-fascistas da camarilha anti-nacional, Tsaldaris-Sophoulis, a serviço de Washington. Foi também reservado para Franco um lugar de honra. Quanto ao admitir que ele partilha da família dos dezesseis, é pura questão de tática e não de princípio.

Um décimo sétimo membro da organização está representado desde o início pelo Estado fantoche, reacionário e militarista, que as autoridades de ocupação americanas, inglesas e francesas, estão em vias de criar na Alemanha ocidental e para o qual o plano Marshall reserva um dos primeiros lugares, ou mesmo o primeiro.

Vários indícios, durante, o ano de. 1948, demonstram que os países escandinavos, bem como a Suíça, participam sem grande entusiasmo no plano Marshall e que entre os dezesseis, em dois grandes países, a França e a Itália, a política de marshalização encontrou a firme resistência das massas populares em primeiro lugar, da classe operária organizada, dos sindicatos, dos seus partidos políticos de massa.

A darmos crédito aos defensores do plano Marshall, o único obstáculo à felicidade perfeita da humanidade consistiria na atitude desfavorável da União Soviética assim como dos Partidos Comunistas de todos os países em relação a esse tão elogiado plano. É verdade que os cidadãos da URSS, da mesma forma como os elementos realmente democráticos e progressistas de todos os outros países desaprovam o plano Marshall. Mas, não é esta desaprovação, a causa dos vícios de origem do plano. Ao contrário, os vícios originais do plano Marshall é que causam esta desaprovação.

O plano Marshall não é absolutamente um plano de ajuda econômica dos Estados Unidos, que a guerra enriqueceu, aos países que a guerra cruelmente sacrificou. Uma ajuda desse gênero seria completamente justa. Mas esta não é a finalidade do plano americano.

O seu objetivo é submeter os países da Europa Ocidental, econômica e politicamente, aos monopólios da América, fazê-las renunciar à sua independência e sua soberania para satisfazer aos magnatas dos EE. UU.

Do ponto de vista econômico, o plano Marshall significa: controle americano da indústria, do comércio externo, do sistema monetário e das finanças nos países da Europa Ocidental; significa a transformação destes em mercado para os produtos americanos que não têm compradores em seu país e em fornecedores de matérias primas que faltam aos Estados Unidos; significa compressão, em conseqüência, dos ramos essenciais da indústria, da Europa Ocidental e crescente desemprego; agravação da situação já extremamente difícil das massas trabalhadoras.

Do ponto de vista político o plano Marshall significa a divisão, o desmembramento da Europa, e cria, sob a supremacia dos Estados Unidos, um bloco político e militar de países do Oeste europeu, dirigido contra a URSS e os países de democracia popular. Transforma a parte ocidental da Europa em base estratégica de agressão americana. Significa a divisão e o desmembramento da Alemanha, e faz da parte ocidental deste país o grande arsenal econômico e uma base militar de aventuras imperialistas dos monopólios da América. Impõe aos países europeus, como «modo de pensar americano», formas de vida política que lhes são estranhas e que significam domínio ilimitado dos monopólios, grande capital todo poderoso, poder absoluto, mal encoberto, da reação e o obscurantismo na vida política e social, declara guerra a todos os elementos progressistas sob a capa da cortina de fumaça do “anti-comunismo” tomada de empréstimo aos hitleristas.

Tudo isto, em seu conjunto, significa de fato a supressão da independência e da soberania nacional dos países que participam do
plano Marshall.

A vida arranca impiedosamente a máscara aos novos «protetores» da humanidade, que seguem as instruções de Washington. Fatos sempre novos confirmam a apreciação que os verdadeiros defensores da democracia e da paz fazem sobre o plano Marshall. 

                                               II — Reduzem-se os Créditos  

       NÂO É POR acaso que os políticos americanos e seus sócios da Europa batizaram sua obra de «plano». Só esse nome, assim como um outro título pomposo, o de «Programa de Reerguimento da Europa», mostram que se pretendeu abusar da aspiração das massas
populares a uma base econômica sólida. Desejaram criar a impressão
que um elemento de ordem e de estabilidade seria introduzido no mundo da anarquia e desordem capitalistas.

O sistema econômico anárquico, absurdo, e caduco, que se baseia
na propriedade privada de monopólios todo poderosos, destrói impiedosamente a esperança das pessoas simples a posse de uma existência por pouco que seja tolerável e segura. Constatam toda a estupidez dum regime sob o qual, a despeito de uma quantidade mais que suficiente de mão de obra, de matérias primas e de empresas industriais, faltam as mercadorias, e aumentam o desemprego, a miséria e a fome. Por outro lado, o mundo inteiro vê as imensas vantagens da direção planificada da economia nacional na URSS e os êxitos indiscutíveis dos países que conseguiram fugir à órbita imperialista e seguiram pelo caminho da democracia popular. As frases sobre a beleza do espírito de empreendimento e da iniciativa privada não têm mais nenhuma atração para as dezenas e centenas de milhões de pessoas das quais toda iniciativa, e todos os empreendimentos estão limitados, de boa ou má vontade, à dolorosa busca de um ganha-pão qualquer.

Mas o fato é precisamente que todas as afirmações daqueles que falam em acabar com a anarquia econômica, introduzir princípios justos e planificados na vida econômica da sociedade, continuarão a ser apenas palavras, a menos que sejam mentira consciente, enquanto dominarem os interesses cúpidos dos monopólios capitalistas, enquanto as massas trabalhadoras não forem donas de sua própria vida, enquanto forem simples instrumento nas mãos dos ávidos campeões do lucro ilimitado. A história do plano Marshall prova isto de forma eloqüente.

Há tempos afirmava-se que bastava aos países europeus saírem do quadro estreito de seus interesses nacionais, sacrificarem uma parte de sua soberania, sentirem-se «membros da comunidade européia», elaborar um programa comum de reconstrução e apresentarem à América um pedido circunstanciado de subsídios e créditos em dólares. Nesse caso, asseguravam os apóstolos do plano Marshall, o programa de reerguimento da Europa será sancionado pela divindade de além-Atlântico, o dólar, e constituirá uma base sólida da vida por alguns anos. A chuva de dólares começaria a fecundar sistematicamente o solo cansado do velho mundo e este solo poderia de novo alimentar os famintos. A graça do dólar desceria sobre os fieis que acreditassem na filantropia desinteressada dos monopolistas americanos e duraria até que estivesse realizado todo o programa de reconstrução européia.

A vida decepcionou cruelmente aqueles que estavam dispostos a acreditar em semelhantes fábulas. Compreenderam isto desde o início.

A conferência dos dezesseis, realizada em Paris no verão de 1947, ofereceu ao mundo um espetáculo mais do que triste. Os delegados dos governos europeus, esquecendo a honra nacional e perdendo o sentimento elementar de pudor, proclamaram insistentemente suas necessidades e pediram os dólares. Finalmente, depois de longas controvérsias e cálculos complicados, a conferência determinou as necessidades dos dezesseis países à ajuda americana, por quatro anos, em 29 bilhões de dólares.

Mas esta soma, não foi aceita do lado de lá do Atlântico. Clayton, especulador em algodão dos Estados do Sul, então sub-secretário de Estado, correu por via aérea a Paris. De novo o mundo inteiro foi testemunha de um espetáculo humilhante: por ordem de Clayton os delegados dos dezesseis países europeus reduziram rapidamente suas pretensões para 20 bilhões e 600 milhões, soma que Washington também achou exagerada. O comitê Harriman, criado pelo presidente Truman, rosnou ainda e fixou a soma do programa quadrienal de ajuda americana em 17 bilhões de dólares. Foi também esta soma que figurou na mensagem presidencial ao Congresso.

A fase seguinte das dores de parto do plano Marshall começou quando a questão foi levada ao Congresso americano.

O programa de ajuda, chamado provisório, por um período de três meses, foi ratificado, mas o plano ficou em estudo, desde o princípio de1918, nas comissões e nas duas Câmaras do Parlamento. Foi examinado calmamente, sem pressas. Os representantes do Departamento de Estado prometeram a seus clientes europeus fazerem votar o projeto de lei antes de 1º de abril. Mas ainda em junho os debates continuavam.

Os congressistas que tanto se apressam em votar qualquer projeto reacionário, por exemplo, a lei Taft-Hartley, ou o projeto Mundt, não deixaram de ressaltar que não estavam com pressa de salvar os europeus falidos. Limitamo-nos a lembrar que a comissão senatorial dos negócios estrangeiros que abordou o plano Marshall a 8 de janeiro, só terminou seu exame a 5 de fevereiro. Contudo não se pode dizer que esses debates tenham sido totalmente inúteis. Foi durante o exame do plano que surgiram muitos dos seus lados curiosos. Tomou-se conhecimento como os meios governamentais dos Estados Unidos concebem os objetivos e as tarefas.

O governo Truman convidou o Congresso a examinar o plano quadrienal. Mas os congressistas não seguiram essa recomendação. Resolveram limitar-se a estabelecer a importância da soma a pagar no primeiro período, estipulando que, para o futuro os pagamentos dependeriam da conduta dos países europeus. Então o governo pediu a concessão de 6 bilhões e 800 milhões para os 15 primeiros meses. Mas a comissão senatorial dos negócios estrangeiros recomendou que se limitasse ao pagamento de 5 bilhões e 300 milhões de dólares para o primeiro ano, inclusive as somas para a famosa «ajuda» militar à Grécia, à Turquia e à China.

Em fins de março o projeto de ajuda aos países estrangeiros chegou à Câmara dos Deputados. Um dos poucos deputados progressistas, o democrata Sadowsky de Michigan, que votara contra o plano Marshall, qualificou o mesmo, de:

«mentira de 1.º de abril, brincadeira trágica para o povo americano e para os povos pacíficos do mundo inteiro».
Provavelmente nem mesmo Sadowsky supunha até que ponto tinha razão. A comédia dramática não acabou de modo nenhum no dia 1.º de abril. Para falar a verdade, ela apenas começou.

Maus profetas, realmente, aqueles admiradores ilimitados do plano Marshall que, a exemplo do jornal democrático-liberal alemão «Montags Echo» se apressaram em declarar, no início de abril, que ao aprovar o projeto de «ajuda» à Europa, os Estados Unidos tinham provado que seu aparelho legislativo «sabe agir rapidamente». Por seu lado, o «Daily Herald» trabalhista, escrevia servilmente que o plano Marshall «não é um empréstimo e sim um investimento do povo americano no futuro da Europa». Mesmo o «Daily Express», que por vezes julga com isenção as «dádivas» de além Atlântico, se humilhava todo ao gabar a «generosa e nobre atitude do povo americano e de seu Congresso».

Em breve todos esses vassalos do dólar americano tiveram a possibilidade de constatar a exatidão do velho ditado que aconselha «não confundir rapidez com precipitação». A tinta com que foram escritas essas linhas servis ainda não tinha secado, e já os adiamentos recomeçaram intermináveis,

O infeliz projeto da lei continuava a navegar entre as comissões de créditos da Câmara dos Deputados. Esta diminuiu em um quarto as concessões. A soma de 5 bilhões e 300 milhões de dólares, adotada no início, passou para 4 bilhões por 15 meses.

Devem se notar os argumentos bem característicos apresentados sobre o assunto pelo presidente da comissão de créditos, o republicano Taber, deputado do Estado de New York. Fez uma crítica violenta do plano Marshall, vago demais, segundo ele:

«Não existe plano Marshall, disse; nada mais há do que uma expressão usada nas conversações, e observamos que os que mais vociferam a favor do plano são os que menos sabem à seu respeito».
Segundo Taber, constatou-se durante as sessões da comissão que os funcionários governamentais não dispõem de dados concretos nos quais possam basear suas previsões no que se refere às necessidades dos países participantes do plano.

Os discursos de Taber e de seus colegas da comissão de créditos provocaram viva emoção.

Marshall, tomando a palavra, na comissão de créditos do Senado, declarou que a redução dos créditos pode fazer, fracassar todo o seu programa; que enfraquecia «a confiança dos europeus nos Estados Unidos». A comissão senatorial escutou suas exortações. Aprovou a abertura dos créditos que se elevam a 4 bilhões de dólares por 12 meses, enquanto que a comissão da Câmara dos Deputados assinava a mesma soma por 15 meses. Finalmente, houve um acordo entre as duas Câmaras do Congresso: os 4 bilhões devem ser gastos em 15 meses, mas podem ser consumidos em 12 se o procurador para a realização do plano Marshall e o Presidente julgarem necessário.

O efeito da redução dos créditos foi muito sensível. Esta decisão provocou amarga decepção na Europa. O «Times» escrevia:

«Qualquer que seja a decisão definitiva, os prognósticos econômicos e as resoluções na Inglaterra partirão de agora em diante do fato de que a concepção Taber representa e continuará a ser uma força com a qual se deve contar».
Certos jornais escreveram que a decisão da comissão Taber foi um «banho frio». Outros declaravam que o negócio começava a parecer bluff. «Le Monde», órgão semi-oficial, perguntava num arranco de retórica: quem poderá dizer depois disto que no ano próximo o Congresso não torpedeará definitivamente o plano Marshall?

Os «protetores» da Europa resmungam, confusos, que a decepção provém da ignorância dos europeus, pouco conhecedores da complexidade do Congresso americano. É verdade que esta complexidade, está cheia de artifícios e chicanas. Mas não é esta a causa principal da desilusão. O Congresso com todos os seus métodos e adiamentos infinitos a propósito do plano Marshall, é o instrumento dócil do campo dirigente dos Estados Unidos que busca fins políticos bem determinados. Tratar-se de humilhar, de confundir mais ainda os países europeus que participam do plano, de perpetuar suas preocupações, sua inquietação, de torná-los ainda mais «razoáveis».

Mas, pela mesma razão, fica patente o caráter demagógico das promessas que os agentes do plano Marshall, especialmente os ministros dos negócios estrangeiros da Inglaterra e da França, prodigalizaram tanto a gosto na Europa. Confirma-se, assim, que é inútil esperar que este plano possa constituir uma base com um mínimo de solidez para quaisquer previsões econômicas. É uma ilusão acreditar que o plano Marshall tenha contornos definidos. Na realidade este programa de expansão americana está fartamente municiado dos atributos de um imoderado reclame americano, do bluff americano. Com efeito, em que resulta a solidez, a duração prometida, se a sorte do plano no seu conjunto e cada um dos seus algarismos em particular dependem dos cálculos que mudam conforme a conjuntura dos cavalheiros de indústria americanos (assustados com o espectro da crise próxima), das manobras eleitorais dos congressistas, da demagogia descarada de uma imprensa venal e de outras causas semelhantes? Fatores, estes, pouco respeitáveis e que, além disso, não podem ser previstos.

                                                      III — A Onipotência de Mr. Hoffman

AFORA o «banho frio» da redução dos créditos aos países da Europa Ocidental em via de marshalização, foi igualmente proposto um cataplasma quente: as condições americanas da «ajuda».

Com ofim de realizar o plano Marshall os Estados Unidos criaram um aparelho que tem à frente homens de confiança dos monopólios americanos. O ex-secretário do Comércio, Harriman, foi encarregado de os representar no Comitê de Cooperação Econômica Européia de Paris. De fato, Harriman tornou-se ministro americano na Europa Ocidental. Mesmo nos Estados Unidos foi criada uma direção de «ajuda» americana, tendo como administrador o antigo presidente do truste da indústria de automóveis Studebaker, Mr. Hoffman.

O administrador do plano Marshall foi investido de poderes muito amplos. Antigamente dizia-se como gracejo, sobre o Parlamento inglês, só existiu uma coisa que ele não podia fazer: transformar um homem em mulher. Esta restrição talvez desapareça no caso de Hoffman.

Para demonstrar a extensão dos poderes do administrador, será útil citar alguns, trechos recolhidos da imprensa, completamente favoráveis ao plano Marshall. Por exemplo, o periódico americano «United States News, and World Report» publicou a 27 de fevereiro de 1948, sob o título «Que recebem os Estados Unidos por sua ajuda aos outros países», uma notícia onde se destaca:

«O administrador deste programa deve tornar-se de fato o dirigente das relações de negócios internacionais. Poderá, por exemplo, dizer à França se deve consertar as estradas de ferro ou as auto-estradas. Cabe-lhe decidir se devem ser mecanizadas as explorações agrícolas. Indicará quem primeiro deve receber os materiais para a indústria carbonífera, se for o caso da Inglaterra ou do Ruhr. E, poderá imediatamente paralisar o afluxo dos dólares nestes ou naqueles países se não se conformarem com as condições apresentadas por ele. O caráter do comércio internacional será fixado por suas decisões. Terá o direito de dizer onde se deve comprar a madeira se for o caso da Finlândia, da Suécia ou do Canadá; a qual trigo — canadense ou americano — se deve dar a preferência nos mercados do dólar; qual dos países — o Brasil ou os Estados Unidos — deve fornecer o algodão para as fábricas têxteis da Europa».
Verifica-se que Hoffman não pode se queixar de não ter bastante poder. Deve-se notar especialmente que o Congresso tomou cuidado em conferir ao administrador direitos especiais para garantir a divisão da Europa e interpor uma barreira econômica entre o Oeste e o Este. O projeto de lei votado a respeito do plano Marshall, na Câmara dos Deputados, contém um artigo que visa limitar o comércio dos países em via de marshalização com a União Soviética e com os outros paises da Europa Oriental:

«Recomenda-se ao administrador para que recuse aos países participantes do plano, na medida em que isto for praticamente possível, o fornecimento de mercadorias ou produtos que sirvam para a fabricação de artigos destinados a qualquer país da Europa que não partícipe deste plano, caso os Estados Unidos, no interesse de sua segurança nacional, não conceda licenças de exportação dessas mercadorias e produtos para os ditos países».
Um outro artigo do projeto estipula que no caso em que o administrador «julgue do interesse nacional dos Estados Unidos proibir a exportação de determinadas mercadorias para um país que se ache parcialmente ou inteiramente na Europa e não participe do plano», os funcionários do governo, ou os organismos aos quais o presidente dará poder para proibir a exportação de equipamentos, meios de produção de material de guerra, etc., «deverão tomar as medidas que se fizerem necessárias para proibir a exportação destas mercadorias para esse país».

Caso característico: estas cláusulas restritivas foram propostas pelo deputado Mundt, autor do projeto de lei, reacionário ao extremo, que pretendia interditar o Partido Comunista e que é considerado pelo grande público como de tipo puramente fascista. Ao apresentar suas emendas, Mundt deu a entender claramente que as mesmas são dirigidas contra a União Soviética e contra os países de democracia popular do Este europeu.

No início de junho de 1948 o todo poderoso tutor Hoffman comunicou a cada um dos dezesseis países da Europa os projetos de acordos (bi-partites). E reconheceu com uma franqueza digna de elogios, segundo jornalistas bem informados, que os Estados Unidos têm a intenção «de receber o máximo em troca de nossos dólares». Os acordos deviam ser assinados antes de 3 de julho. Os países que, neste prazo, não tivessem assinado o acordo seriam excluídos automaticamente do «programa de reerguimento da Europa».

0 texto dos acordos não foi publicado. Mas os jornais dos países europeus e principalmente da França e Inglaterra lamentaram-se amargamente que tenham sido ultrapassadas as previsões pessimistas dos políticos europeus, que no entanto tiveram ilusões. O comentarista diplomático da agencia Reuter comunicava a 9 de junho que estes projetos «foram considerados inaceitáveis, sob sua forma atual, por cada um dos dezesseis países».

Na opinião desse mesmo comentarista, são as seguintes às principais objeções:

1 — O tom dos projetos é considerado em toda parte imperativo
em excesso. Segundo Daniel, correspondente do «New York Times» em Londres, os projetos de acordos elaborados em Washington foram considerados pelos delegados dos países que participam do plano Marshall como «contratos rígidos, redigidos por um jurista inflexível».

2 — Os compromissos propostos aos países europeus revestem um caráter unilateral e não recíproco. Citamos a titulo de exemplo a seguinte circunstância essencial. Os países da Europa que participam do plano Marshall devem tomar compromissos pro quatro anos enquanto que a questão da participação dos Estados Unidos será decidida anualmente pelo Congresso. Por outras palavras, os pretendentes americanos ao domínio mundial aplicam abertamente o seu método predileto: estão dispostos a perpetuar a inquietação dos contratantes europeus, seu receio do ver cessar o afluxo de dólares, de que tanto necessitam.

3 — O projeto prevê uma intervenção aberta dos Estados Unidos
nos negócios internos dos países europeus, uma intervenção que ultrapassa os limites do que os delegadas americanos conseguiram impor a estes países na conferência internacional de Havana para o comércio e o uso da mão de obra. Ora, as recomendações desta conferência não foram ratificadas por nenhum dos países, que dela participaram.

4 — O projeto confere à América direitos inaceitáveis, visando impor aos países europeus a desvalorização sem nenhuma reciprocidade.

Os dois últimos pontos requerem algumas explicações.

No que se refere às condições do comércio internacional, o fato é que os americanos, conforme é notório em numerosas informações da imprensa, reservam para si o direito de exigir de qualquer dos participantes do plano Marshall o estabelecimento de tarifas mínimas, e de um modo geral, uma orientação determinada de sua política comercial. Os jornais ingleses lamentam que este acordo a respeito do plano Marshall venha abalar ainda mais as relações com os domínios e entravar o comércio britânico no Extremo Oriente.

«Os ingleses, declara Daniel, correspondente do «New York Times» em Londres, consideram que esta condição incluí uma tentativa de introduzir os princípios de livre concorrência, previstos nos estatutos da Organização Internacional de Comércio, o que excede o quadro da lei do plano Marshall, lei que se limitava a indicar que os países participantes devem cooperar em matéria de enfraquecimento das barreiras comerciais».
O sentido real da livre concorrência reclamada pelos americanos já é conhecido no mundo inteiro. Nos países do Império Britânico este ponto é considerado como uma tentativa de excluir, sem delongas, a Inglaterra.

O jornal inglês «Evening Standard» publicou recentemente uma declaração a respeito do plano Marshall feita por Jordan, alto comissário da Nova Zelândia, durante uma entrevista com o correspondente desse jornal.

«Se a ajuda americana tem como condição a supressão das cláusulas parciais de se beneficiam os países do Império esta ajuda é um triste presente»
Efetivamente, se considerarmos que, segundo as declarações habituais dos políticos ingleses, é a extensão do comércio do Império que deve permitir vencer as dificuldades econômicas, facilmente se compreende que uma tal ajuda americana lembra muito a da corda do enforcado.

No que se refere à desvalorização das divisas, o projeto de acordo, sobre o plano Marshall exige aos participantes deste plano que aceitem quaisquer prescrições americanas neste setor, prescrições ditadas, é claro, não pela preocupação de sanear os sistemas monetários europeus, e sim pelo desejo de eliminar a concorrência possível, dos países da Europa no mercado mundial das mercadorias e capitais.

Já em março do ano corrente, o «Daily Express» escrevia:

«A América quer que a Inglaterra renuncie ao papel de banqueiro dos países do Commonwealth britânico e de todos os. que fazem parte do bloco da libra esterlina. Falindo por sua própria vontade, deverá recomeçar tudo, ligando sua economia, e suas finanças não mais ao Império, mas à Europa. Estas cláusulas não figuram no plano Marshall. Mas é de supor que a América pressionará a Inglaterra para as pôr em execução».
Tais são as cláusulas leoninas dos acordos que o administrador do
plano Marshall impõe atualmente aos governos dos dezesseis países.
Por mera aparência, para enganar a opinião pública, as cláusulas são
criticadas. Isso é feito com o objetivo de anunciar em seguida, solenemente, «concessões» obtidas durante as conversações, concessões despidas, na verdade, de qualquer valor.  

                                        IV — Desenvolvimento Desitual do Capitalismo

A POLÍTICA que se enquadra no plano Marshall exigia um terreno econômico determinado. Só podia nascer nas condições existentes no mundo capitalista após a segunda guerra mundial.

Esta guerra enriqueceu os Estados Unidos, ou, mais exatamente, aos monopólios americanos, mas levou a ruína à maioria dos países da Europa. Desta forma, a guerra, resultado do desenvolvimento desigual dos países capitalistas, acentuou mais ainda essa desigualdade.

Nos Estados Unidos, o aparelho de produção aumentou consideravelmente durante a guerra. O mesmo não aconteceu nos países capitalistas europeus.

Segundo o «Estudo da Situação Econômica Internacional», apresentado no início de 1948 pela seção econômica do secretariado geral da ONU, a extração de carvão nos Estados Unidos, em 1947, foi de 133% em relação a antes da guerra. Nos outros países, salvo a União Soviética, atingiu apenas 81%. A produção de ferro e ligas ferruginosas, nos Estados Unidos, aumentou para 142% relativamente ao número anterior a guerra. Não excedeu 61% nos outros países, excluindo a URSS. Para o aço esses algarismos atingiram respectivamente 147 e 65% e para o cimento 153 e 80%.

Foram reunidas no Estudo publicado pela Comissão Econômica da ONU para a Europa as indicações oficiais dos vários países, indicações que, certamente, apresentam a situação sob uma aparência mais favorável do que realmente é. De acordo com esses dados oficiais o nível de produção da indústria, em 1946-47, oscilava entre 75 e 104% em relação a 1938 na França, entre 77 e 104% na Bélgica, entre 62 e 91% na Holanda. Mas estes algarismos não dão uma idéia justa do estado real das coisas.

É necessário saber que o ano de 1938 foi de muito baixa produção. Muitos países capitalistas sofreram uma crise de subprodução, cujo curso foi em seguida interrompido pela guerra.

Em 1938, o índice geral da produção industrial do mundo capitalista em seu conjunto era de 93% em relação ao nível de 1929. Este número médio encobria uma baixa muito acentuada na produção em certos países e seu crescimento artificial noutros, principalmente no Japão e na Alemanha, que se preparavam febrilmente para a guerra. O nível de produção industrial em 1938, em relação a 1929, era de 72,3% nos Estados Unidos, de 66% na França, de 70% na Bélgica e de 89,8% na Holanda.

Comparando o nível de 1920 demonstrado em porcentagem relativamente a 1913, e o de 1946-47 em relação a 1938, os autores da revista chegaram à conclusão de que em muitos países, especialmente na Inglaterra e na França, o reerguimento no presente se faz mais rápido do que após a primeira guerra mundial. Esta conclusão, porém, não é convincente. Ela encobre o essencial.

Comparar a 1913 é tomar para ponto de comparação um ano em
que a produção industrial atingiu um nível elevado. Limitamo-nos a lembrar que antes da primeira guerra mundial a produção industrial no mundo inteiro, em 23 anos, de 1890 a 1913, aumentou em mais do dobro; que o nível da produção, neste período, aumentou em 60% na Inglaterra e quase o dobro na França. Nos 25 anos seguintes, de 1913 a 1938, a produção industrial, na Grã-Bretanha, longe de aumentar, baixou um pouco. Na França baixou 8%!

Verifica-se que as décadas que precederam a primeira guerra mundial foram um período de desenvolvimento rápido da indústria, enquanto que no intervalo entre a primeira e a segunda guerra mundial a indústria dos grandes países capitalistas da Europa Ocidental, como a França e a Inglaterra, marcaram passo, mostrando ao mundo inteiro a podridão de seus alicerces.

A comparação com 1938, sendo vantajosa para a Inglaterra e a França, é muito menos vantajosa para os países como a Alemanha e a Itália. Segundo o estudo aludido, o nível da produção industrial italiana, em 1946-1947, foi de 34 a 76%. Quanto às três zonas ocidentais da Alemanha, não ultrapassaram em 1946-47, a porcentagem de 37% em relação a 1938. O general Clay anunciara, como um fato sensacional, que a produção industrial na bizona em abril de 1948, atingira 40% do nível anterior à guerra.

A guerra abalou fortemente a economia rural do Oeste europeu. O nível da produção agrícola belga era de 58% em 1945-46 e de 72% em 1946-47 em relação ao período de 1935-38; os números eram respectivamente de 56 e 63% na Áustria, 50 e 73% na França, 68 e 65% nas três zonas ocidentais da Alemanha, 41 e 77% na Grécia, 79 e 77% na Itália, 56 e 79% na Holanda, 80 e 95% em Portugal e 87% na Suíça.

Estes algarismos dão uma idéia da desigualdade do desenvolvimento dos países capitalistas, aumentada devido à segunda guerra mundial. Mas as coisas não se limitam a isto. É necessário também considerarmos várias outras circunstâncias.

O que caracteriza a economia nacional dos países capitalistas é uma inflação desenfreada. Em toda a parte, tanto na América como na Europa, a inflação é um fator complementar do enriquecimento dos monopolistas e da baixa do nível do vida das massas trabalhadoras. Além disso, no países da Europa Ocidental, a dança louca da inflação, ligada à orgia da especulação do câmbio negro, acentua a ruína geral e o caos econômico.

Foi também causado um enorme prejuízo aos países do Oeste europeu pela supressão das receitas elevadas que retiravam, antes da guerra, de suas colônias, de seus investimentos no estrangeiros, da navegação, das operações bancárias e de seguros. Grandes dificuldades surgiram para a Inglaterra, que devido à política pouco inteligente de seu campo governamental se encontrou no circulo vicioso dos problemas complicados da balança de contas da exportação e importação. Mas para os países como a França, a Holanda e a Bélgica, esta mesma circunstância desempenha também um papel considerável.

Os Estados Unidos, longe de terem sido sacrificados com a guerra, aumentaram suas fontes de enriquecimento no estrangeiro. Os lucros que os monopólios americanos retiram de seus investimentos nos outros países aumentaram em comparação com o período anterior à guerra. Uma parte considerável do valor que os fretes, seguros e outras operações anteriormente levavam às capitais do Oeste europeu, especialmente a Londres, passou para as mãos de firmas e bancos dos Estados Unidos.

O inflado aparelho de produção da América, por um lado, e por outro o restrito consumo das massas populares e seu baixo nível de vida, exigem um aumento crescente das exportações americanas. Os monopólios americanos, no período de após guerra, intensificaram imensamente suas exportações, premidos pelo espectro da crise iminente, infalível, da superprodução. Ao apoderar-se dos mercados mundiais, os Estados Unidos opõem-se ao afluxo de produtos estrangeiros em seu mercado interno.

Entre as duas guerras, de 1921 a 1929, os Estados Unidos exportavam em média 3 bilhões e 600 milhões de dólares por ano, o que representava 4,3% da produção global do país. Em 1946, as exportações dos Estados Unidos atingiram 10 bilhões de dólares, ou seja, 4,9% e em 1947 a exportação foi de 15 bilhões e 100 milhões, isto é 8,8% da produção global. Em dois anos foram exportados 25 bilhões e 100 milhões de mercadorias, ou seja 5,8% do total da produção.

Outra é a situação no que se refere às importações nos Estados Unidos. De 1921 a 1930 o valor das importações foi em média de 2,9 bilhões de dólares por ano, ou seja 3,4% da produção global. Em 1940 o valor foi de 4 bilhões e 900 milhões, isto é 2,4% e em 1947 foi de 5 bilhões e 600 milhões ou seja 2,5%. Para os dois anos do após guerra tomados em conjunto, o total é de 10 bilhões e 500 milhões, ou seja 2,4%.

Os números citados denotam um estado do coisas dos mais curiosos. Primeiro, o desnível entre as importações e exportações dos Estados Unidos atingiu em dois anos a soma redonda de 15 bilhões aproximadamente. Segundo, verificou-se não só o aumento considerável do valor das exportações americanas no período de após guerra, como, por seu lado, o aumento da produção global do país. Ao contrário, a porcentagem das importações em relação à produção global, longe de aumentar, diminuiu nitidamente, caindo de 3,4 para 2,4%.

Bem diferente é o quadro do comércio externo dos países da Europa Ocidental. Estes países importam mais do que exportam. O desnível entre suas exportações e suas importações nos países não europeus, acentuou-se em relação a antes da guerra. Era de cerca de dois bilhões de dólares em 1938, de 5 bilhões e 100 milhões em 1916 e de 6 bilhões e 900 milhões em 1947 (preços dos anos respectivos). Se tomarmos este desnível em preços de 1938, teremos 3 bilhões para 1946 e 3 bilhões e 300 milhões de dólares para 1947.

É bastante elucidativo o confronto destes algarismos. Constata-se assim que a diminuição das exportações e o crescimento das importações só parcialmente explicam o déficit da balança comercial da Europa em relação aos países não europeus. A causa principal está na alteração da relação dos preços, alteração desvantajosa para os países da Europa. Esta paga muito mais caro os produtos não europeus importados, e vende os seus, aos países não europeus, relativamente mais barato que antes da guerra.

Os algarismos do comércio externo francês são significativos. Os produtos importados da América para a França representam 9,5% do total das importações francesas em 1937 e 32,7% em 1947. Para a exportação a mudança operou-se em sentido inverso. A exportação da França para os Estados Unidos foi de 6,4% em 1937 e de 4,2% apenas em 1947. Sobre o valor total do déficit da balança comercial francesa, que em 1947 atingiu 132 bilhões e 200 milhões de francos, quase 60% (78 bilhões e 700 milhões) cabiam aos Estados Unidos.

É esta a base econômica geral sobre a qual se realiza a política americana encarnada no plano Marshall.

A acentuação da desigualdade do desenvolvimento dos países capitalistas, devido à segunda guerra mundial, teve como resultado a modificação considerável da correlação das forças entre os Estados Unidos de um lado, e os países da Europa Ocidental do outro. Este é um fato que os defensores do plano Marshall naturalmente também reconhecem. Mas concluem desse fato que os Estados Unidos, na sua qualidade de parente rico e forte, dão prova de generosidade e estão dispostos a ajudar os países europeus enfraquecidos a se reerguerem.

Este o um raciocínio profundamente vicioso. Os que pensam assim procuram abstrair o capitalismo monopolista contemporâneo e suas leis. Ora, este sistema social criou em sua última etapa obstáculos ao cumprimento das mais urgentes tarefas. Prova-se agora e sempre que a avidez de um punhado ínfimo de monopolistas desejosos do aumentar seus lucros leva a fatos monstruosos e absurdos. As leis do lucro são implacáveis. Há dezenas de anos que essas leis condenam a economia rural, nos países capitalistas mais evoluídos, a vegetar miseravelmente, quando esses países dispõem de capitais suficientes para tornar seu nível mais elevado. Se o capitalismo, com seu sistema de dominação dos monopólios, tivesse, em vista não o lucro, mas os interesses vitais da imensa maioria dos homens, se o seu objetivo fosse elevar o nível de vida das massas, de acabar com o estado atrasado dos campos, de levar a ajuda dos países ricos aos povos pobres, enfraquecidos pela guerra, deixaria de ser capitalismo.

No terreno, do capitalismo monopolista de nosso tempo, as modificações havidas na correlação de forças entre os Estados Unidos e os países da Europa Ocidental, implicam não numa ajuda desinteressada de tio Sam a seus sobrinhos da Europa, mas ao contrário, numa política impiedosa de submissão e escravização dos países e povos da Europa Ocidental realizada pelos monopolistas da América e seus auxiliares europeus. Os Estados Unidos de um lado e de outro lado o Oeste europeu acham-se numa situação completamente desigual. Ora, as leis do capitalismo sob as quais cada homem é um lobo frente a outro, homem, apenas reconhecem uma coisa: golpear os fracos, explorá-los, subjugá-los, torná-los instrumento para atingir, seus mais tenebrosos e inconfessáveis objetivos.

                                        V — Ressurereição da Política de Goering

OS REPRESENTANTES dos círculos dirigentes americanos não poupam suas afirmações adocicadas e promessas hipócritas ao se dirigirem aos povos da Europa e às massas trabalhadoras de seu próprio país. Falam aos europeus, da magnanimidade e desinteresse da República transoceânica. E procuram demonstrar aos simples cidadãos dos Estados Unidos a necessidade de sacrifícios e privações em nome de um fim elevado: a salvação da Europa.

No entanto, muita vez a eloqüência farisaica dos «salvadores» da
Europa é substituída por uma linguagem, seca, infinitamente mais expressiva de homens de negócios.

Em seu discurso transmitido pelo rádio a 18 de junho de 1948, o senador Vandenberg declarou que o plano Marshall é «para nós o melhor dos investimentos». Esta formulação corresponde tão bem às inclinações dos políticos americanos, que foi repetida depois de alguns dias por Dwight Green, governador de Illinois, correligionário político do famoso McCormick, diretor do «Chicago Tribune». Eleito presidente provisório do Congresso do Partido Republicano em Filadélfia, Green em seu discurso, agressivo do princípio ao fim, elogiou o plano Marshall e declarou:

«É um plano dispendioso, e temos o direito de contar que nossos investimentos nos dêem um lucro real sob o aspecto de paz e segurança.»
Não há necessidade de lembrar de novo o que os expansionistas americanos entendem por «paz e segurança». Sabe-se que incluem nesta fórmula a dominação sobre as bases militares e recursos em matérias primas, a formação de alianças militares agressivas, uma política de força e de chantagem, os preparativos para uma nova guerra.

Os monopolistas americanos associam ao plano Marshall vastos projetos econômicos e políticos.

No domínio econômico, trata-se, por um lado, de escravizar economicamente os países da Europa Ocidental.

São os seguintes os argumentos que de ordinário na América apresentam os partidários do plano Marshall: este plano estimulará, dizem eles, a «atividade econômica» nos Estados Unidos, «permitirá a saída dos excedentes», afastará dos operários a ameaça do desemprego e dos empregadores a da perda dos lucros e dos capitais, inevitável no caso de crise econômica de super-produção. Constata-se que o plano Marshall é apresentado como uma espécie de emplastro que deve absorver os intumescimentos do organismo econômico americano.

Fazendo a comparação do plano Marshall com o «New Deal» seguido por Roosevelt depois da Crise de 1929-1933, a revista «United States News and World Report» escreveu recentemente:

«O programa de ajuda aos países estrangeiros comporta também um meio mais fácil de manter a atividade comercial dos. Estados Unidos e permite a saída dos excedentes. A maioria das encomendas serão divididas entre os ramos da industria que produzem as máquinas, os caminhões, os tratores, aparelhagem elétrica, isto é, os ramos que o «New Deal» não pôde reanimar antes da guerra. A saída dos excedentes de sementes, legumes e algodão para o estrangeiro será talvez mais útil do que os programas de ajuda interna ao país.»
Deve notar-se que o papel do plano Marshall, como fator de retardamento da crise, é muitas vezes invocado para combater as objeções que lhe são feitas. Por exemplo, por ocasião dos debates sobre o plano Marshall na comissão de créditos da Câmara dos Representantes, Dodd, ministro da Agricultura em exercício declarou:

«Penso que se o plano for cortado, sereis testemunhas de um dos maiores craques nos mercados de escoamento dos produtos».
Mahon, membro da citada comissão, usou a mesma argumentação. Declarou que ao conseguir o escoamento dos excedentes americanos de produtos agrícolas, o plano Marshall dá meios para evitar «uma baixa imediata dos preços desses produtos». Outro membro da Comissão, Cannon, disse que, sem o plano Marshall, os preços dos produtos da economia rural americana baixariam e «nos encontraríamos em plena depressão».

Já é bastante demonstrativo que seja invocado o espectro da crise para fazer aprovar a política do Sr. Marshall. Mas o mais importante ainda é o fato de que a esperança de conjurar a crise pela ajuda do plano Marshall é manifestamente edificada sobre areia. Isto porque os fundos para a realização desse plano, são tirados, não dos lucros extraordinários dos monopolistas, e sim da bolsa magra dos contribuintes americanos. E este fato não pode deixar de restringir ainda mais o mercado interno. O mal não pode ser curado por tal processo. Pode apenas ser recolhido, após o que a explosão da crise será ainda mais violenta.

Para os monopólios americanos o plano Marshall representa sem dúvida um investimento vantajoso. Para tal, basta o fato dos capitais serem fornecidos pelo Estado e os lucros serem para os monopolistas. Este processo é familiar às corporações que o usaram durante a guerra. Hoje as firmas americanas encontraram de novo um grande e excelente cliente: à frente do qual está o diretor da Cooperação Econômica, Hoffman, A encomenda por parte deste cliente é considerada nos meios monopolistas dos Estados Unidos como um «ersatz» de uma parte da encomenda do tempo da guerra, de que guardam a mais preciosa lembrança com a apetência insaciável de um regresso a esse estado de coisas. . . O que deve suprir a outra parte da encomenda do tempo de guerra são as despesas para a realização do plano de armamentos, proclamado pelo presidente Truman.

É com conhecimento de causa que os organismos governamentais de Washington ligam constantemente as despesas para a corrida aos armamentos às referentes ao plano Marshall. Por exemplo, o relatório do Conselho Econômico junto ao presidente para o primeiro trimestre:

«O plano de reerguimento da Europa e o da defesa devem ser considerados em conjunto, visto que suas conseqüências econômicas são idênticas».
De fato, a natureza dessas despesas é muito semelhante na medida que se refere a seus resultados para a vida econômica americana. Tiram do bolso dos contribuintes bilhões de dólares que vão cair no bolso dos monopolistas da indústria de guerra, dos negociantes de algodão, de trigo, de ovos em pó, dos reis do automóvel, etc.. Desta forma, o relatório do Conselho Econômico, que já mencionamos, exorta os americanos a que abandonem a esperança alimentada depois da guerra de obterem um nível de vida mais elevado e declara com louvável franqueza:

«Esta é nossa variante específica da velha alternativa: «Canhões ou manteiga».
A esta confissão, pode acrescentar-se que a pudica reserva que fala da «variante específica» é manifestamente supérflua. Mesmo examinando ao microscópio nada se encontrará de «específico» na política americana da corrida aos armamentos e de escravizarão da Europa. É a velha variante da «velha alternativa». É a política de Goering que renasce com todos os seus traços característicos.

                                                     VI — As Condições da «Ajuda»
 
A PRINCÍPIO os adeptos do plano. Marshall rejeitavam com fingida indiginação as advertências dos que diziam que este plano comporta uma ameaça mortal à soberania econômica dos países da Europa Ocidental. Hoje, a existência desta ameaça é um segredo de polichinelo. Num ano viu-se acumular uma multidão de fatos que desmascaram o plano Marshall como programa de escravização econômica do Oeste europeu pelos monopolistas da América. Atualmente, mesmo os advogados mais fervorosos do plano Marshall são obrigados a reconhecer afinal de contas que o dito plano torna bem duvidosa a independência econômica dos países que nele tomam parte.

Por exemplo, o jornal conservador inglês «Evening Standard» manifestava desde janeiro de 1948, em termos claros, a apreensão de que «a soberania econômica seja trocada por uma omelete de ovos em pó».

Agora que são conhecidas as condições da famosa ajuda americana, estas confissões involuntárias são cada vez mais freqüentes. A 20 de junho o jornal inglês «Sunday Times» lamentava-se amargamente de que os acordos propostos conferirão de fato, à América, o controle econômico da Europa Ocidental e «privilégios especiais que nada justifica». No dia seguinte o «Combat», falando das negociações de Washington a respeito das condições da ajuda americana, também reconhecia que se tratava menos de um problema técnico do que da submissão aos Estados Unidos da vida econômica dos vários países europeus.

No mesmo dia o correspondente da agência Reuter telegrafava de Paris.

«Os meios franceses responsáveis consideram que certas cláusulas do acordo colocariam sob a dependência do capital americano todas as novas empresas francesas que utilizam os materiais recebidos de conformidade com o programa de ajuda à Europa».
Estas confissões e semiconfissões involuntárias multiplicam-se diariamente.

Os meios dirigentes da Europa Ocidental não quiseram escutar a União Soviética quando os advertia de que se os povos da. Europa queriam realmente fazer renascer sua economia, deviam contar em primeiro lugar com seus próprios esforços. Na hora atual a justeza desta advertência é reconhecida por confissões um pouco tardias. Por exemplo, a 12 de junho, o «Financial Times», órgão dos círculos de negócios ingleses, escrevia:

«A Europa fará bem em não contar demasiadamente com a ajuda americana, que pode repentinamente acabar. Por paradoxal que isto pareça, pode se dizer que quanto maior for a realização da Europa no domínio do reerguimento econômico, por seus próprios esforços, mais os americanos estarão dispostos a ajudá-la».
É caso de perguntar a razão por que os sócios europeus de Washington, mudos há tanto tempo, recuperaram de repente a voz. A razão é esta: durante o ano que acaba de passar, muitas coisas que, anteriormente se escondiam com cuidado, surgiram nitidamente. Em presença dos fatos, o silêncio torna-se por vezes impossível mesmo para aqueles que se entregaram de corpo e alma ao dólar.

Os monopolistas americanos e seus homens de confiança cada vez fazem menos cerimônia com seus clientes da Europa e, freqüentemente, põem os pés sobre a mesa. Isto ressaltou em especial durante os debates sobre o plano Marshall, conduzidos lentamente nas comissões do congresso americano.

Hoffman, administrador do plano Marshall, ao tomar a palavra a 13 de maio na comissão senatorial dos créditos, declarou;

«Assemelhamo-nos a um banqueiro. Podemos dizer que não daremos nossos dólares se vocês não fizerem estas ou aquelas coisas».
«Estas ou aquelas coisas», na rica linguagem de Paul Hoffman, compreendem, conforme o demonstra a experiência do tempo decorrido, exigências econômicas e políticas muito variadas: desvalorização do franco e bases militares na Groelândia; o diktat de Londres prescrevendo o desmembramento da Alemanha e a renúncia da Inglaterra ao bloco da libra esterlina; manutenção de um bando de conselheiros americanas na Turquia e participação no bloco militar ocidental, etc. A alegação de Hoffman a respeito do papel de banqueiros não engana mais: nas condições atuais, o banqueiro não impõe semelhantes exigências ao devedor. Mas o fato é que, de modo exato, Washington de nossos dias não age como o banqueiro que empresta em condições comuns. Hoje, Washington desempenha o papel do usurário mundial que exige, em troca dos seus dólares, uma submissão econômica e política total dos países que participam do plano Marshall.

No início de maio, durante uma entrevista com James Brough, correspondentes do «Daily Mail» em New York, Hoffman desvendou um pouco seus objetivos em relação à Inglaterra. Depois de ter notado que Hoffman controlará mais de um terço das importações inglesas, o correspondente cita a declaração seguinte do entrevistado:

«Considero que será apresentado um plano que mostrará que os dólares americanos são investidos numa obra de reerguimento da Inglaterra na base de princípios de negócios sãos e firmes. Conto ver aplicar os princípios que aplicarei em minhas próprias empresas particulares. Conto também que os dirigentes ingleses apresentarão regularmente relatórios referentes aos êxitos obtidos em matéria de reerguimento».
Há algumas décadas atrás os usurários não se permitiam semelhante atitude a não ser com a Turquia dos sultões, esse «homem enfermo» da Europa. Hoje, falam desse jeito aos representantes da orgulhosa Albion. Realmente, passou os limites!

Os monopolistas americanos olham os países da Europa Ocidental como falidos a quem se deve ensinar a viver. Para Hoffman os princípios que usa nas suas próprias empresas são o máximo da sabedoria. O senador Capehart deu prova de maior largueza de vistas. Por ocasião dos debates sobre o plano Marshall no Senado, em março de 1948, declarou que se devem ensinar aos europeus os métodos americanos de direção dos negócios; que devem assimilar o «sistema americano» em seu conjunto. Por outras palavras, deve ser ensinado aos países da Europa Ocidental, pouco esclarecidos, não só os princípios de Hoffman, como também os de Ford, Morgan, Rockefeller, Du Pont e outros financistas e magnatas dos trustes da América.

Será um erro supor que os pais conscritos de Washington sonham apenas ensinar os cidadãos da Europa. Os senadores americanos, espíritos universais, não deixam também de se ocupar do aperfeiçoamento espiritual da população rural do Oeste europeu. Por exemplo, o bravo republicano Young, senador de Dakota-Norte, tomando a palavra em maio último na comissão senatorial dos créditos, propôs que os Estadas Unidos enviassem especialistas para ensinar aos camponeses franceses os bons métodos da economia rural. De passagem, este homem experimentado manifestou a opinião de que os franceses devem, em sua alimentarão, substituir a manteiga pela margarina. Não se pode negar ao sr. Young a lógica. De fato, desde que se propõe aos americanos canhões em vez de manteiga, por que não exigir que os franceses substituam a manteiga pela margarina?

Em fins de janeiro de 1948, Calder, presidente do comitê das relações internacionais da Associarão Nacional dos Industriais, tomou parte nos debates sobre o plano Marshall na comissão dos negócios estrangeiros do Senado. Declarou sem preâmbulos que a «ajuda» americana não deve ser concedida se este ou aquele país não renunciar a «um programa de novas nacionalizações e a planos que causariam prejuízo à iniciativa privada, baseada na livre concorrência». Segundo Calder, a «ajuda» dos Estados Unidos, nos países estrangeiros, deve ser dada, tanto quanto possível, a firmas particulares, e não aos governos ou organismos governamentais».

Este representante da Associação Nacional dos Industriais, considerada nos Estados Unidos como o governo de fato, expôs francamente o que os tubarões das finanças de Wall Street esperam do plano Marshall.

Calder declarou que a «ajuda» americana não deve ser concedida aos Países «que não dêem bastante garantia de uma atitude justa em relação aos investimentos de firmas americanas particulares nesses países ou suas possessões.» Não deve ser permitido aos países; da Europa Ocidental «sobrecarregar com impostos extraordinários, direta ou indiretamente, as exportações dos Estados Unidos ou os bens dos cidadãos americanos nos referidos países».

Por outras palavras, nada de nacionalização, nada de tentativas para coibir os apetites vorazes dos exploradores, isto de um lado, e do outro liberdade completa, para os negocistas americanos a fim de agirem à sua vontade nos países da Europa Ocidental, como na própria casa, pu talvez como em Nicarágua ou na Venezuela.

Este o conteúdo que os verdadeiros senhores dos Estados Unidos dão ao plano Marshall. E é este programa que, deve se reconhecer, guia os diplomatas do Departamento do Estado.  

                                                 VII — Os Lucros do Plano Marshall

OS ACONTECIMENTOS mostraram bem os meios que os monopólios americanos utilizam para atingir os objetivos fundamentais do plano Marshall, isto é. escravizar economicamente a Europa Ocidental e criar uma união militar destes países com o fim de uma agressão na Europa.

À forma da pretensa ajuda americana desempenha, por si só, um papel considerável neste sentido. É sabido que os fundos para o plano Marshall são concedidos aos países europeus sob o aspecto de «subsídios» (isto é, donativos) e empréstimos.

Tendo o Congresso americano aprovado a soma das concessões de crédito somente por um ano, a divisão dos fundos para os subsídios e os empréstimos deve igualmente ser feita anualmente. Os países da Europa ficam numa ignorância absoluta, não só do total das somas que poderão receber durante o período de ação do Plano Marshall, como também da proporção segundo a qual estas somas serão divididas entre os subsídios e os empréstimos. Desta forma, também, sob este aspecto se abre um vasto campo ao arbítrio dos tutores americanos, que obtêm uma vasta possibilidade de exigirem dos países que participam do plano Marshall uma linha de conduta que faça o jogo dos Estados Unidos. O jornal francês «A Tribuna das Nações» disse com razão que as autoridades americanas concedem sua «ajuda» a Europa nas mesmas condições em que antigamente Luiz XVIII outorgou a Carta à França… Os partidários do Plano Marshall vêem nos «subsídios» aos países europeus uma ocasião de elevar às nuvens a intitulada generosidade sem precedente, o pretenso desinteresse dos Estados Unidos. Na realidade, o que é sem precedente é outra coisa.

O produto da venda das mercadorias recebidas pelos países da Europa a título de subsídios forma um fundo especial em moeda local. A despesa fica inteiramente sob o controle dos Estados Unidos.

Por exemplo, no «acordo» firmado pelos Estados Unidos a respeito do plano Marshall com a Itália, o artigo 4 prevê que este país criará um fundo especial em liras, correspondente ao valor em dólares de todos os subsídios na Itália. Os fundas em liras serão destinados às despesas de administração americana, referente ao plano Marshall nesse país, ao pagamento dos transportes internos e outras despesas semelhantes, assim como à «criação e desenvolvimento da produção de materiais cuja falta se faz sentir, ou possa vir a se fazer sentir, nos Estados Unidos».

O acordo firmado com a Dinamarca estipula que o produto da venda das mercadorias americanas recebidas a título de donativo deve ser lançado numa conta especial. Uma parte desta soma deve ser posta à disposição dos delegados para o plano Marshall que se encontrem junto à embaixada da América. A outra parte deve ser destinada ao financiamento e desenvolvimento da produção, assim como ao incentivo das riquezas minerais em que os Estados Unidos estão interessados e desejam receber.

As cláusulas da «ajuda» sob o título do plano Marshall colocam a
despesa do fundo em moeda local sob o controle dos delegados americanos. Controle total, que se insinua em toda parte e fornece aos emissários dos monopólios do outro lado do Atlântico possibilidades realmente sem precedente para se imiscuírem em toda a atividade dos governos, aprovação ou interdição de qualquer tipo de emprego das fundos do Estado, etc.

Esta forma desconhecida de tutela sobre os países da Europa Ocidental é completada pelas condições humilhantes de utilização das mercadorias entregues a título de subsídios. Por exemplo, estas mercadorias devem ser munidas de etiquetas especiais atestando que são um donativo da generosa América aos países europeus. Os governos dos países que participam do plano Marshall são expressamente encarregados de fazerem entre a população uma ampla propaganda das «altas qualidades morais» dos filantropos de além Atlântico.

Para se compreender bem até que ponto se menosprezam os povos, devemos considerar o fundo econômico da questão. O fato é que, sob a cor de donativos intitulados gratuitos, os monopolistas americanos nada mais fazem do que restituir aos países da Europa Ocidental uma parte bem modesta dos lucros por eles já embolsados e que continuam a embolsar às suas custas.

É o que ressalta mais claramente para países como a Itália, a Áustria, assim como para as zonas ocidentais da Alemanha.

São do conhecimento de todos, os números publicados pela imprensa democrática italiana desde fevereiro de 1946. Já nesse momento, os valores materiais que as autoridades de ocupação americanas, que agem à vontade na Itália, tinham conseguido por todos os meios, somavam cerca de 400 bilhões de liras, ou seja ao câmbio dessa data, 4 bilhões de dólares. E, que valores enormes, de então para cá, os monopólios americanos sorveram da economia italiana!

Por outro lado, aproveitando da facilidade do governo De Gasperi, que executa docemente as ordens de Washington, os industriais e os banqueiros italianos organizaram numa escala sem precedente a transferência de capitais para o estrangeiro. Afluíram ao estrangeiro as riquezas amontoadas pelos aproveitadores da guerra fascista, pelos acaparadores do mercado negro, as riquezas provenientes das especulações de divisas, nas condições de uma inflação desenfreada e de outros processos de pilhagem das massas populares. Segundo os resultados de um inquérito especial, foram transferidos 300 bilhões de liras, durante 1946 e 1947 nos bancos dos Estados Unidos e da América Latina, e 200 bilhões de liras nos bancos suíços.

Confrontemos com estes números imponentes os da «ajuda» americana à Itália. Hoffman, administrador do plano Marshall, disse que o plano de «ajuda provisória» à Itália para o trimestre abril-junho de 1948 previa 140 milhões de dólares de subsídios e 25 milhões de dólares de créditos. Segundo uma informação ulterior do mesmo Hoffman, a importância que a Itália deve receber para todo o ano, do 1 de abril de 1948 a 31 de março de 1949 é de 703.600.000 de dólares. Não é evidente que se trata de uma piedosa esmola em comparação aos valores que os monopolistas americanos e seus auxiliares tiraram da economia italiana sangrada a frio?

Mas eloqüentes ainda são os dados relativos à Alemanha Ocidental, transformada, depois da guerra, numa nova Califórnia para os monopolistas americanos, esses contemporâneos exploradores do ouro.

Desde fevereiro de 1946 que Nixon, antigo diretor do serviço americano no trabalho de inquérito sobre os cartéis alemães e os bens alemães no estrangeiro, junto à administração militar americana na Alemanha, avaliava em 3 bilhões de dólares os valores alemães no estrangeiro, adquiridos pelas autoridades americanas. Se acrescentarmos a isso o enriquecimento desenfreado dos monopólios americanos por meio da retirada deferramentas industriais, muita vez únicas em seu gênero, assim como do estoque de matérias primas e produtos manufaturados, através do embargo sobre as patentes alemães e por outros meios, a importância de 7 bilhões de dólares parecerá ainda menor em relação com as reparações recebidas da Alemanha pelos monopolistas da América sob uma forma velada, durante o primeiro período, a lua de mel, por assim dizer, da ocupação.

No período seguinte os monopolistas americanos encontraram uma nova e inesgotável fonte de riqueza à custa da Alemanha Ocidental, no domínio do comércio externo. A atividade da famosa JEIA (Agência unificada de exportação e importação anglo-americana), causaria inveja a qualquer alquimista da idade média. Esta organização achou um meio extremamente simples para fabricar ouro com ar. Aproveitando seu monopólio, a JEIA compra os produtos alemães a preços ínfimos e revende os mesmos no estrangeiro por preços desmedidamente altos. A exportação do carvão do Ruhr já é em si mesma uma verdadeira mina de ouro. Levou-lhes centenas de milhões de dólares de lucro líquido. A JEIA tirou igualmente enormes lucros da exportação de automóveis, produtos químicos, aparelhos fotográficos alemães, etc.

Finalmente, deve ser notado o lucro que as autoridades americanas obtiveram pela reforma monetária realizada separadamente na Alemanha Ocidental. Segundo as informações de que se dispõe, já puseram em circulação mais de 11 bilhões de marcos. Em vista do valor mínimo da troca por habitante, é fácil compreender que a parte do leão da emissão em «marcos alemães» constitui uma renda líquida para as autoridades americanas. Com esse dinheiro os emissários dos monopólios do lado de lá do Atlântico compram por preços miseráveis casas, terrenos e. lotes de ações das empresas industriais e dos bancos; embolsam assim uma parte cada vez maior do patrimônio nacional da tri-zona.

Comparemos estes empréstimos sobre a economia da Alemanha Ocidental às somas que representa a «ajuda» concedida a título do plano Marshall. Do 1 de abril de 1948 a 31 de março de 1949, os abonos previstos somaram 437.400.000 dólares para a bi-zona e a 96.400.000 dólares para a zona francesa. É evidente que esta soma é apenas uma parte ínfima do que as autoridades americanas retiraram e continuam a tirar da Alemanha Ocidental.

Fato característico: mesmo a Turquia, país de miséria, que não participou da guerra e não sofreu a ocupação alemã, paga enorme tributo aos monopólios americanos. Não há muito, por exemplo, a imprensa turca divulgou uma declaração do general Mc Bride, chefe da missão militar americana na Turquia, na qual ressalta, entre outras coisas, que o valor de 4 submarinos entregues a este país ultrapassa 20 milhões de dólares pelo menos o de toda a importância dos créditos abertos à Turquia pelos Estados Unidos. Segundo as considerações publicadas a estadia dos técnicos da missão Mc Bride e dos outros oficiais e soldados americanos que estão na Turquia importa em 32.700.000 dólares por ano ao magro orçamento deste país. A imprensa comunica que o governo turco, obrigado a pagar em divisas uma parte dos fornecimentos americanos, recorreu à sua reserva ouro, que ameaça se esgotar de maneira catastrófica: de setembro de 1946 a junho de 1948 caiu de 230 para 110 toneladas.

Mas, dirão; talvez que países como a Inglaterra, a França, a Holanda ou a Bélgica recebam os subsídios americanos a título realmente gratuito? Absolutamente! Só em deslocar estes países do mercado mundial, os monopolistas americanos conseguem lucros que ultrapassam muitas vezes as esmolas que distribuem em forma de subsídios. O controle sobre os mercados vantajosos, que anteriormente estavam nas mãos da Inglaterra, da França e da Holanda, os lucros retirados das possessões coloniais destes países, constituem para as firmas americanas uma fonte de receita enorme e sempre crescente. Basta lembrar as operações extremamente vantajosas realizadas pelos americanos na Índia, Indochina, Indonésia, no Congo Belga e outros países coloniais. Verifica-se que também para os outros países da Europa os donativos dos magnatas americanos nada mais são do que manifesta mascarada.

                             VIII — Monopólio Estatal de Exportação de Capitais

OS CRÉDITOS representam a segunda forma de «ajuda» americana. Com a ajuda destes créditos os monopolistas dos Estados Unidos apertam cada vez mais o nó corrediço da dependência financeira dos países da Europa Ocidental.

Em geral, quando se firma um contrato sobre créditos, entre partes iguais em direitos, se estabelece de comum acordo a taxa do juro, os prazos e modalidades de pagamento da dívida. A situação manifestamente desigual dos credores americanos, de um lado, e, de outro lado, de seus devedores da Europa Ocidental está demonstrada especialmente no fato de que, até aqui, os países europeus ignoram o custo dos empréstimos e o modo de reembolso. Os credores americanos julgam inútil não só entrarem em acordo a este respeito com os governos europeus, como ao menos lhes darem a conhecer suas condições. Pois, de qualquer maneira, estas condições não podem ser discutidas ou alteradas! De qualquer forma que possam se apresentar mais tarde, os vassalos europeus deverão sofrer a vontade de seu soberano americano. Demonstração característica do feudalismo financeiro contemporâneo, que se constitui devido à decomposição cada vez mais avançada do regime capitalista!

Os textos dos acordos firmados a título do plano Marshall, entre os Estados Unidos e os países da Europa Ocidental, textos agora publicados, contêm materiais abundantes que permitem definir as formas mais recentes das relações extra-econômicas de domínio e sujeição sobre que repousa o capitalismo monopolista de nossa época.

Tomemos, por exemplo, o acordo com a França, cujas cláusulas são igualmente típicas para os outros países.

No artigo primeiro, já este acordo prevê que as compras de produtos a efetuar pela França, fora do território dos Estados Unidos, não devem prejudicar os interesses comerciais destes. Baseando-se nesta cláusula, os monopolistas americanos podem proibir à França o comércio com qualquer outro país. Não é por acaso que a imprensa francesa divulga que os americanos forçam a compra de carvão ao preço de 20 dólares a tonelada, quando os franceses poderiam obtê-lo à razão de 12 dólares.

O artigo 2 do acordo estipula que os produtos fornecidos a titulo deste acordo devem ser utilizados para os fins correspondentes ou para fins especiais que possam ser admitidos pelo governo dos Estados Unidos. Isto significa que Washington pode, a qualquer momento, prescrever ao governo francês para utilizar determinado artigo de importação, por exemplo, o próprio carvão, com um fim expresso, digamos, para a produção de armamentos e de material de guerra.

Em seguida, o acordo prevê que a França deve fornecer aos Estados Unidos as matérias primas estratégicas que lhes são necessárias. Desta forma as reservas de bauxita, petróleo, níquel e cromo existentes no território da França ou nas possessões do ultramar são, de fato, colocadas à disposição absoluta e sem partilha de Washington.

O artigo 6 obriga o governo francês a assegurar uma proteção bastante ampla a todos os cidadãos dos Estados Unidos, em qualquer companhia sociedade ou associação criada de acordo com as leis americanas. Deve lhes garantir o acesso à exploração dos recursos franceses em igualdade de direitos com os cidadãos franceses.

Os povos europeus sabem já muito bem que a exigência americana de «possibilidades iguais» corresponde a pedir uma liberdade completa da expansão econômica e política dos monopólios da América. Hoje, isto é exigido dos países da Europa. Na França, por exemplo, as companhias americanas organizadas nos termos do artigo 6 do acordo podem facilmente esmagar seus concorrentes franceses graças à superioridade imensa de seus meios financeiros. É com absoluto conhecimento de causa que os meios progressistas franceses protestam contra as cláusulas do acordo, declarando que se trata de um «acordo sobre a colonização da França».

O artigo 8 obriga o governo francês a dar aos Estados Unidos informações sobre a economia e quaisquer outras. Assim a França é obrigada a comunicar aos americanos toda a espécie de informações de ordem econômica, inclusive os segredos de fabricação. Por outras palavras, o acordo abre completamente a porta da França a uma espionagem econômica de grande envergadura. E o governo francês está não só impedido de tomar medidas contra esta espionagem, mas ainda deve lhe prestar toda sua ajuda e concurso.

Assinalemos, como fato de grande significação que já em meados de junho de 1948, a revista «Finanstidende», órgão dos meios financeiros dinamarqueses que tentam fazer objeção à espionagem econômica americana ligada ao plano Marshall, escrevia:

«O que inquieta é a extrema curiosidade demonstrada pelas comissões encarregadas do controle da ajuda americana. Os ministérios europeus dos negócios estrangeiros e os serviços administrativos estão a tal ponto ocupados em preencher os questionários americanos de toda a espécie que não lhes sobra tempo para outros trabalhos».
Os jornais de muitos países da Europa Ocidental falam de questionários dirigidos pelas missões americanas a diversas empresas convidando as mesmas a comunicar as informações mais detalhadas sobre o tipo de sua atividade industrial e comercial.

O artigo 9 do acordo com a França prevê para os cidadãos americanos que têm interesses nesse país a compensação dos prejuízos decorrentes de medidas governamentais que possam afetar seus bens ou interesses. Os americanos obtêm assim um motivo legal de ingerência em toda a questão da política econômica francesa. Terão especialmente a possibilidade de impedir a nacionalização de qualquer ramo da indústria onde podem criar em pouco tempo seu próprio lar.

Finalmente têm uma importância especial as cláusulas (incluídas em todos os acordos) que levam os governos dos países europeus a ampliar o regime da nação mais favorecida não só aos Estados Unidos como ainda a todos os territórios ocupados por estes, isto é, à Alemanha Ocidental, ao Japão e à Coréia.

Esta cláusula levantou em numerosos países, sobretudo na Inglaterra e. na Franca, uma verdadeira tempestade de indignação. Nada existe de extraordinário nesse fato, pois, esta determinação do acordo obriga a França, a Inglaterra e outros países europeus a contribuírem de todas às formas para o reerguimento prioritário da economia dos antigos países inimigos. Trata-se, como todos sabem, não do reerguimento econômico pacífico, mas de restabelecer a base econômica da agressão, ou seja o potencial da industria de guerra. Isto porque nenhuma garantia é dada contra o renascimento das forças de agressão do imperialismo alemão e japonês. Pelo contrário, toda a orientação da política americana nestes antigos países inimigos contribui para o reerguimento mais rápido de suas forças imperialistas e agressivas.

Compreende-se à luz dos fatos precedentes, que o Bureau dos estudos econômicos da CGT francesa tenha qualificado o famoso acordo sobre o plano Marshall de domínio pelos americanos do controle efetivo da política financeira e monetária francesa.

Tais são os acordos chamados bipartites que, segundo a observação irônica de um jornal francês, seria mais justo chamar unipartites. Com efeito, estes acordos foram elaborados por Washington e, em seguida, pura e simplesmente impostos aos governos da Europa Ocidental.

Durante os recentes debates sobre estes acordos nos parlamentos dos países europeus (depois de já assinados pelos governos) os campeões do plano Marshall usaram toda espécie de artifícios na tentativa de embelezar a triste realidade. Por exemplo, a 3 de julho de 1948, na sessão do Storting norueguês, Lange, ministro dos Negócios Estrangeiros, fez considerações no sentido de que toda cooperação internacional comporta, inevitavelmente, prestar atenção, a perda, da soberania nacional. Mas este sofisma não poderia encobrir um fato inegável, isto é, que a cooperação de partes iguais em direitos difere por completo da «cooperação» do cavalo e do cavaleiro e, ainda, mais, da cooperação da jibóia e do coelho que aquela engole.

O plano Marshall é uma tentativa de criar um gigantesco monopólio de Estado para a exportação de capitais americanos para os países da Europa. Os empréstimos sob o titulo de plano Marshall que excluem de fato o afluxo de investimentos a longo prazo e créditos a curto prazo assentam sobre uma base comercial normal. Em compensação, o mecanismo do plano freia o caminho da colocação de capitais americanos na base da colonização dos países europeus. Trata-se da expansão dos monopólios de Wall Street em condições aproximadamente: semelhante às que existem na América Latina ou no Oriente Médio. Mas a Europa Ocidental, por muito baixo que tenham caído as forças governamentais, política e moralmente, não é o Paraguai nem a Arábia Saudita. Esta é uma das contradições profundas do plano Marshall, que aliás está todo crivado de contradições.

O monopólio de exportação de capitais americanos para os países da Europa, monopólio estabelecido pelo plano Marshall, torna ainda mais desfavorável a correlação das forças entre o credor que ocupa a situação dominante, de um lado, e do outro os devedores, subjugados e humilhados. Os créditos são concedidos em condições econômicas que impedem por si próprias, de todas as formas, os países devedores a levantarem realmente sua economia nacional, o que lhes teria permitido mais tarde se libertarem de suas dívidas. Trata-se de créditos escravizadores. Ao mesmo tempo, o plano Marshall é incapaz de vencer ou mesmo atenuar o efeito das leis espontâneas do capitalismo. Ora, estas leis levam inevitavelmente a uma nova acentuação da desigualdade do desenvolvimento dos países capitalistas, a novas modificações na correlação das forças.

                                        IX — Intercâmbio com Ovos em Pó e Carros Velhos

A COMBINAÇÃO dos fornecimentos, os preços dos produtos e o caráter unilateral do comércio americano, coisas todas previstas nas estipulações do plano Marshall, constituem o principal meio de dominação dos países da Europa.

Não vale a pena provar que os países da Europa Ocidental, para reerguerem sua economia, necessitam antes de tudo, de maquinaria e matérias primas industriais. Isto porque a indústria destes países exige em primeiro lugar a reconstituição de seu capital fixo e o renovamento dos fundos correntes dilapidados.

Contudo, o plano Marshall prevê um fornecimento de mercadorias completamente diferente. O primeiro lugar está reservado, como se sabe, aos produtos manufaturados americanos, às quinquilharias que antes de tudo devem ter saída.

Além do lugar ínfimo que cabe aos fornecimentos de ferramentas Industriais nas previsões americanas, deve se notar que toda a redução das somas concedidas leva acima de tudo à diminuição dos envios de máquinas para a Europa.

Hoffman, ao tomar a palavra na comissão senatorial dos créditos, citou um cálculo curioso: a redução da soma total dos abonos a título do plano Marshall terá por efeito fazer cair de 1 bilhão e 100 milhões para 100 milhões de dólares os fornecimentos de máquinas-utensílios e ferramentas, isto é, cair de 11 vezes. Por outro lado numerosas decisões do Congresso americano estabelecem um contingente de exportação determinado, muito alto, para produtos como o leite em pó, ovos em pó, fumo etc. Por exemplo, o Congresso aprovou uma emenda especial de Murrav que obriga os países da Europa Ocidental a comprar aos Estados Unidos por 65 milhões de dólares o leite em pó. Fato curioso: a importação deste produto é obrigatória mesmo para um país como a Áustria, que tem fazendas de criação de vacas leiteiras de primeira ordem.

À quinquilharia é imposta não só aos países secundários que, são assim obrigados a engolir o que lhes dão. Também a Inglaterra está no mesmo caso. Durante todo o período de após guerra não param de se lamentar na imprensa inglesa a respeito do sortimento forçado dos fornecimentos americanos à Grã-Bretanha, primeiro a título do empréstimo de 1946, e depois na base do plano Marshall. No início de 1948, por exemplo, os jornais declaravam que, num total de 900 milhões de libras que representavam o valor dos fornecimentos americanos previstos no plano Marshall para 51 meses, mais de 50% são concedidos para mercadorias que não são em absoluto necessárias, como fumo, petróleo, ovos em pó, frutas frescas e secas. O total para estes 4 artigos de importação, perfaz, segundo os jornais, cerca de 600 milhões de libras.

Foi assim que a imprensa apreciou as previsões no início do ano. Depois a situação também não melhorou. Em junho, o comentarista político do «Observer» constatava com tristeza que os excedentes destinados à exportação para os países do plano Marshall «não contêm senão uma quantidade limitada de artigos de primeira necessidade», que os americanos são obrigados, imaginem, «a dar-nos produtos de que não necessitamos».

Na Dinamarca, os produtos que «podem ser dispensados» representam, nas previsões para 1948, uma soma de 511 milhões de coroas contra 118 milhões apenas para os artigos necessários ao reerguimento do país.

A concorrência das mercadorias americanas imposta à Europa Ocidental estrangula a economia local. Os americanos exportam grandes quantidades de automóveis para os países que têm sua própria indústria de automóveis. Também este ramo bem desenvolvido da indústria italiana, por exemplo, está de há muito presa de uma crise sem solução. Muitas fábricas de automóveis da Alemanha Ocidental tiveram que fechar. Todos os que conheçam um pouco a estrutura da economia americana sabem que este ramo da indústria é sempre a primeira vítima da super-produção, das dificuldades de escoamento, das crises enfim. É por esta razão que os monopolistas dos EE. UU. se apressam em assegurar novos mercados para os automóveis. O fato do magnata do automóvel, Paul Hoffman, ter sido proposto para a realização do plano Marshall, tem uma importância não apenas simbólica, mas também puramente prática.

Os fornecimentos de fumo americano para os mercados da Europa puseram fora dos eixos a própria imprensa turca, que já está habituada a tudo. No fim de maio, o jornal governamental «Cumhuritet», lamentava-se com amargura deste «triste quadro», escrevendo:

«A cultura do fumo, em nosso país, e, consequentemente, toda a economia do país, caminha rapidamente para uma crise que será difícil vencer visto que, ao enviar para a Europa, sob a máscara do Plano Marshall, o fumo bom da Virgínia e ao proibir a exportação do fumo turco para a Alemanha, a América desfere um.terrível golpe neste ramo de nossa produção e, desta forma, em toda a nossa economia».
Em seguida, este jornal arqui-reacionário, lembrando os méritos da Turquia na qualidade de «barreira contra o comunismo», expressava seu espanto diante da «política de boicotagem ao fumo turco na Alemanha», onde é batido, como se sabe, pelos maus cigarros americanos, que desempenham o papel de divisas especuladoras no mercado negro das zonas ocidentais.

Os monopólios americanos não estão apenas pouco inclinados a fornecer aos países da Europa as máquinas e matérias primas indispensáveis para o desenvolvimento da produção. Praticam com espírito de lógica uma política que consiste em tirar destes países as matérias primas que eles próprios necessitam para o desenvolvimento de sua indústria. Por exemplo, importam da Alemanha Ocidental ferro velho. Muita vez, como a imprensa constata, encontra-se entre este ferro-velho máquinas e ferramentas industriais que poderiam perfeitamente ser utilizadas para a volta à produção pacífica. Por outro lado, as cláusulas do plano Marshall prevêem, como foi dito acima, a obrigação, para os países europeus, de proverem em primeiro lugar a América de matérias primas estratégicas e, em geral, de matérias primas deficitárias.

Ao fixar seu sortimento de mercadorias para os países europeus os monopolistas dos Estados Unidos se inspiram unicamente em considerações egoístas e cúpidas, visando conservar e aumentar ainda mais seus lucros extraordinários, exorbitantes, somente possíveis, nas condições de dominação dos monopólios no mercado mundial.

O exemplo da Suécia é característico sob este aspecto. Segundo as informações da imprensa, este país deve receber num ano, a título do plano Marshall, por 28.400.000 dólares de mercadorias especialmente: 2 milhões de café; 2.100.000 dólares de fumo; 8 milhões de peles e couros; 6.900.000 dólares de automóveis; 1 milhão de fios de algodão; 4.700.000 dólares de produtos da indústria petrolífera.

Estes algarismos mostram que a Suécia não receberá a título do plano Marshall os produtos que lhe são particularmente necessários: trigo, carvão, máquinas, aço para edificação e construções marítimas e máquinas-ferramentas pesadas. Todos estes produtos formam apenas uma sexta parte do total dos fornecimentos, a título do plano Marshall. O «Goteborgs Handelstidning» escrevia a propósito, que a redução notável dos fornecimentos americanos em aço para a construção de navios na Suécia e nos outros países incluídos no plano Marshall não significa que a América tenha falta de aço. Os fornecimentos em questão, dizia esse jornal, foram diminuídos porque os Estados Unidos:

«objetivam, por razões políticas, econômicas e militares, reduzir consideravelmente a exportação para á Europa de aço para a construção de navios». Pois aumentar esses fornecimentos «estaria em contradição direta com o desejo que a América tem de entravar o desenvolvimento das frotas de comércio dos países europeus».
Uma tal política de abastecimento dos países europeus, premeditadamente orientada e cujo fim é a redução de maneira artificial, em proporção da necessidade, das principais indústrias desses países, implica na ameaça indiscutível de estrangulamento das referidas indústrias e, consequentemente, de desemprego para os operários. Os industriais suecos declaram que esta política obrigará os estaleiros de construção naval a reduzirem consideravelmente sua atividade ou mesmo a paralisarem completamente.

Os outros países da Europa Ocidental cuja indústria está desenvolvida, estão no mesmo caso. Em março de 1948 o correspondente, da «Berlingske Aftenavis» em Paris escrevia:

«O plano Marshall é seguido por sua fiel sombra: a ameaça de desemprego. A explicação deste fato está na falta de matérias primas. O fornecimento de algumas delas não entrará no quadro desse plano. Os Estados Unidos podem dar dólares, mas não matérias primas de toda a espécie. O desemprego ameaça em primeiro lugar a Bélgica. Os industriais belgas fazem notar que será necessário um milagre para afastar deste país um desemprego considerável. Fala-se num milhão de desempregados. Isto num país cuja população é de 8 milhões de almas! Em França, o desemprego já existe. É tanto mais curioso que, ainda bem recentemente, a França importava mão de obra da Itália e da Alemanha».
As sombrias perspectivas de desemprego, seguindo como uma sombra do plano Marshall, preocupam não somente os operários sindicalizados, como também os representantes dos meios de negócios. Por exemplo, no início de maio, o jornal conservador inglês «Evening Standard» escrevia:

«Cada inglês e, em particular, cada sindicalizado tem o dever de saber o que o governo inglês dá aos Estados Unidos em troca de fumo e de ovos em pó. Tem o direito de saber se não será golpeado pelo desemprego no dia em que for suspensa a ajuda prestada a título do plano Marshall. Pois o firme consentimento de baixar as barreiras comerciais e dirigir a exportação para os canais aceitos pelos americanos pode levar ao desaparecimento dos melhores mercados para os produtos ingleses».
A influência funesta do sortimento forçado a título do plano Marshall alia-se à influência não menos fatal dos preços elevados dos produtos fornecidas. O plano Marshall cria um monopólio não só sobre os mercados dos capitais, como também sobre os dos produtos. Os homens de negócios americanos encontraram uma ocasião única de esvaziar sua vitrine de quinquilharias a preços fabulosamente aumentados. Este monopólio dos especuladores, das bolsas de mercadorias americanas já custa caro aos povos europeus.

É sabido que, sobre o total dos créditos americanos de 1946 à Inglaterra, esta perdeu, só devido à alta dos preços dos produtos americanos, cerca de um bilhão de dólares, isto é, mais de um quarto do valor total do empréstimo. A Bélgica compra o trigo americano a 350-375 francos o quintal, quando pode comprar na Europa a 320 francos.

Diariamente à imprensa dos países da Europa ocidental aponta fatos semelhantes.

A troca desigual entre os países industriais avançados e os países atrasados, entre as metrópoles e as colônias, é característica para toda a época do capitalismo monopolista. Hoje, nas condições de agravamento da crise gerai do sistema capitalista, esta troca desigual torna-se a regra também para as relações entre os Estados Unidos e os países do Oeste europeu.

Privando os países da Europa Ocidental de seus mercados, o plano Marshall afasta-os ao mesmo tempo das fontes de abastecimento onde poderiam encontrar as mercadorias em condições mais vantajosas.

Citamos como fato característico, a este respeito, uma declaração de Gunnar Seidenfaden ao delegado dinamarquês no «comitê dos dezesseis». Durante uma entrevista com o correspondente do «Berlingske Aftenavis», a 15 de junho de 1948, portanto já conhecendo as cláusulas dos «acordos bipartistes», este delegado disse:

«Pensávamos que com os dólares recebidos a título do Plano Marshall poderíamos comprar noutros lugares sem ser os Estados Unidos, especialmente na América do Sul, as forragens que necessitamos. Constatamos que esta possibilidade não existe hoje. Será necessário que esperemos bastante. Antes da. guerra importávamos cerca de 600.000 toneladas de tortas porano. No primeiro trimestre de 1948 apenas recebemos 8.80O toneladas. Que teremos amanhã? Enigma».
Vê-se que o plano Marshall visa perpetuar a dependência econômica, dos países da Europa Ocidental perante a América e ainda fazer crescer de ano em ano esta dependência.

Ora, sabe-se que as tentativas dos imperialistas nazistas que queriam transformar os países da Europa em anexos agrários da indústria alemã, para o abastecimento desta em matérias primas fracassaram vergonhosamente. Estas tentativas eram levadas a efeito sob a insígnia da famosa «nova ardem» hitlerista na. Europa. Atualmente, os monopolistas americanos, retomam, no fundo, esse planos de transformação dos países industriais altamente evoluídos da Europa Ocidental em fornecedores de matérias primas aos Estados Unidos e em mercados para seus produtos manufaturados.

Este programa engendra inevitavelmente um círculo vicioso de contradições. Os primeiros passos, já no caminho da realização deste programa, terão por efeito baixar, de forma imensa, o nível de vida das massas populares dos países da Europa Ocidental e, principalmente, aumentar o desemprego. O caráter reacionário e utópico do plano Marshall, como programa de transformação dos países da Europa Ocidental em anexos agrários dos monopólios industriais americanos, se manifesta de forma cada vez mais sentida.

Notamos finalmente, como exercendo uma influência funesta sobre a economia européia, o fato de que os Estados Unidosao procurarem esvaziar seus armários de quinquilharias, opõem-se realmente a uma importação ainda que pouco importante de produtos europeus para a América. Daí o enorme déficit em dólares na balança das contas da Europa Ocidental.

Há uma contradição evidente no fato de que os Estados Unidos se, esforçam por aumentar sua exportação sem admitir uma importação adequada, enquanto que os países do Oeste europeu são obrigados a importar, mas não têm possibilidade de exportar uma quantidade bastante de mercadorias. É esta dupla contradição que é, em grande parte, a origem do plano Marshall. Mas, isto nada mais faz, na realidade, do que sancionar um estado de coisas também anormal, sendo impotente para resolvê-lo.

O caráter unilateral do comércio americano torna-se um dos meios de escravização dos países da Europa Ocidental. Os homens de negócios do outro lado do Atlântico não encontram na Europa os produtos de que têm necessidade, além das matérias primas, sobretudo estratégicas. O espírito de altruísmo é, porém, completamente desconhecido para estes negocistas. Não querendo mercadorias européias, propõem-se comprar em bloco os países da Europa Ocidental, com suas cidades e empresas industriais, com seus parlamentares e seus reis, com seus conservadores e pseudo-socialistas. Esta é a compensação que os usurários americanos pedem em troca dos ovos em pó e carros velhos.
 
                                                          X — A Dupla Escravidão

UM DOS PRINCIPAIS meios de ação do sistema de escravização dos países da Europa Ocidental pelos monopólios americanos, criados em Washington, consiste em minar as posições desses países no mundo colonial. Foi prescrito aos aderentes do plano Marshall que assegurassem a famosa «liberdade de comércio», com «possibilidades iguais» para os monopolistas dos Estados Unidos, os quais afastam os países europeus de seus mercados tão vantajosos do ultramar.

Esta cláusula do plano Marshall assusta especialmente a Inglaterra, cujo Império é de há muito sua fonte de imensos recursos. As relações econômicas e os adiantamentos extra-econômicos operados nos países do Império, constituem de longa data a base mais importante do capitalismo inglês. Mas, também a passagem efetiva das possessões dos outros países da Europa (França, Holanda, Bélgica) para o alto patrocínio dos monopolistas americanos enfraquece imensamente estes países no domínio econômico e político.

A imprensa inglesa, comentando o famoso acordo bipartite sob o título de plano Marshall, foi obrigada a reconhecer que este acordo «abre amplamente as portas do Império aos interesses comerciais americanos». Será melhor dizer que a porta do Império britânico está completamente aberta à expansão americana.

Já no decorrer da guerra, os monopolistas americanos afastaram seus concorrentes ingleses de muitos mercados vantajosos. Desenvolveram especialmente em grande escala seu comércio com a Índia. Limitemo-nos a lembrar que, desde 1942, a exportação americana para esse país aumentou 9 vezes em relação a 1939.

Terminada a guerra, a Grã-Bretanha intensificou de forma considerável suas exportações em comparação ao valor anterior à guerra. O escoamento das mercadorias inglesas, porém, é inconcebível, em primeiro lugar, sem a importação de um certo contingente de produtos dos países coloniais e, em segundo lugar, sem uma política apropriada de créditos e investimentos. As cláusulas do plano Marshall permitem amplamente minar estas bases da exportação e, em conseqüência, a economia britânica em todo seu conjunto.

A política de Washington visa liberar a colocação para os produtos americanos no Império britânico. Para este efeito tomam-se medidas visando enfraquecer as relações econômicas entre a Inglaterra e seu Império. Alegam que o plano Marshall não deve, vejam só, servir para fornecer créditos aos países não europeus. É sob este pretexto que os monopólios americanos submetem ao seu pesado domínio as relações entre a Inglaterra e a zona da libra esterlina.

Esta circunstância inquieta os meios financeiros ingleses. A 19 de
maio, o «Times» notava sem qualquer entusiasmo que, para Harriman, a zona esterlina e sua posição em relação ao programa de reerguimento europeu são um «problema» que deve ser «resolvido em comum».

Desde que se considera isto como um problema, dizia o jornal, quanto mais cedo se discutir, melhor. E mais adiante: :

«Criticando o uso que a Inglaterra fez do crédito em dólares, os americanos ressaltam sobretudo o fato de que a Inglaterra remeteu a maior parte dos dólares a outros, pagando suas dividas, e exportando capitais para outros países, da zona esterlina. Atualmente os Estados Unidos insistem seriamente para que os dólares recebidos a título do plano Marshall não sejam enviados, direta ou indiretamente, a outros, como foi feito antes».
Objetando a esta crítica americana, o órgão da City apontava um argumento muito original, isto é, que as restrições à conversão das libras em dólares para os países da zona esterlina podem levar a uma discriminação em relação à exportação americana!

«Além disso, prosseguia o «Times», os investimentos que asseguram o desenvolvimento dos outros países da zona esterlina contribuirão mais que os destinados ao desenvolvimento da Inglaterra propriamente dita para torná-la um país não dependente da ajuda em dólares. Toda a limitação sobre as transferências, para a zona do esterlino, dos dólares recebidos pelo Plano Marshall, pode, pois, ter conseqüências indesejáveis para os Estados Unidos».
Mas ao falar assim, por meias palavras, o jornal inglês se trai. Isto porque se advinha sem dificuldade que o enfraquecimento da Inglaterra não é absolutamente uma «conseqüência indesejável para a América». Antes ao contrário!

O imperialismo americano se considera antes de tudo como o herdeiro do Império britânico. Mas, por outro lado, não negligencia de modo nenhum as possessões coloniais dos outros países do Oeste europeu. O capital dos Estados Unidos penetra cada vez mais fundo na Indonésia, na Indochina, no Congo Belga. Eis, por exemplo, alguns dos algarismos referentes a este último país. A parte das exportações desta colônia para a metrópole caiu de 84% em 1949 para 63% em 1947, enquanto que sua exportação para os Estados Unidos, que atingia a 3,5% em 1939, elevou-se em 1947 a 17%. Ao mesmo tempo a América tornou-se o principal fornecedor do Congo Belga. A importação de produtos americanos para esta possessão colonial da Bélgica passou de 7% em 1939 para 38% em 1947 em relação ao valor total das importações. Quanto aos produtos belgas, a importação caiu de 48% em 1939 para 27% em 1947. É claro que o governo belga, que se atrelou já há muito tempo ao carro do imperialismo americano, não deixa de contribuir para este reforço das posições da América em sua colônia.

As colônias dos países da Europa Ocidental atraem a atenção dos imperialistas do outro lado do Atlântico não só como mercados onde podem esvaziar, a elevados preços, seu armário de quinquilharias, mas ainda como bases estratégicas e fontes de matérias primas.

Em novembro de 1947 foram publicados muitos relatórios da «comissão especial da Câmara, dos Representantes para a ajuda aos países estrangeiros», chamada comissão Herter. Estes documentos mostram, em principio, que os países participantes do plano Marshall devem remediar «ao esgotamento das riquezas naturais americanas». Era previsto o envio aos Estados Unidos de «metais e minerais estratégicos», cujas jazidas existem especialmente nos «territórios coloniais controlados pelos países da Europa Ocidental».

Os documentos da comissão Herter vão até à previsão:

«No caso em que seja inoportuno, por razões políticas ou outras, tentar obter diretamente direitos sobre os minerais, uma combinação do capital particular americano posto a serviço da valorização, sob uma garantia governamental parcial, e de entregas destinadas à constituição de estoques, poderia permitir o reembolso em grande parte de certos empréstimos concedidos sob o plano Marshall, e poderia também assegurar o pagamento dos juros dos empréstimos anteriores».
Por outras palavras, as colônias, com suas reservas de matérias primas estratégicas, deviam formar uma espécie de penhor colocado pelos devedores da Europa à disposição dos usurários americanos.

Um relatório da mesma comissão indicava o que os Estados Unidos deviam receber em primeiro lugar, da França, da Bélgica e da Holanda: 20.000 toneladas de chumbo, 30.000 toneladas de zinco, 2.000 toneladas de cobalto, 15.000 toneladas de cromite, 20.000 toneladas de cobre, 2.500 toneladas de estanho, 50.000 toneladas de bauxita.

É sabido que as frases sobre o pretenso esgotamento das riquezas naturais da América servem sempre para mascarar as tentativas dos magnatas do dólar em seu avanço sobre as fontes de matérias primas dos outros. Devemos lembrar as demagogias periódicas a respeito do esgotamento dos recursos petrolíferos dos Estados Unidos. Na realidade, o capital americano procura monopolizar em suas mãos as fontes das matérias primas mais importantes e principalmente as estratégicas.

Por exemplo, a política de Washington tende abertamente a monopolizar as reservas de urânio. Assim, o «Daily Express» de Londres podia colocar num dos seus recentes artigos o seguinte título: «Os Estados Unidos pretendem absorver o mineral de Urânio». E passava a relatar: «toneladas de mineral de urânio do qual não pôde utilizar senão uma décima parte para a fabricação de bombas atômicas ou experiências».

Trata-se pois, de um lado, do acúmulo dos estoques desta importante matéria prima e, por outro lado, de uma tentativa de monopolizar suas reservas para que não possam cair nas mãos de outros países. Este jornal notava que o Congo belga e o Canadá são os principais fornecedores do mineral de urânio para os Estados Unidos.

Desta forma, estamos em presença de uma situação bastante paradoxal. As potências coloniais da Europa, que os americanos ajudam por meio de seus fornecimentos de armamentos e pela diplomacia dos «bons serviços», fazem a guerra de rapina nas colônias, embora seus «protetores» de Washington tirem para si todos os pedaços mais saborosos da economia dos países coloniais. As potências européias tiram as castanhas do fogo para os que se nomearam os tutores. Por sua conduta, as metrópoles da Europa se desacreditam ainda mais aos olhos dos povos coloniais, enquanto que os maestros da América procuram ficar na sombra. Mas a linguagem dos tanques e aviões americanos é bem mais eloqüente que as afirmações amáveis dos diplomatas. O plano Marshall leva aos povos das colônias e dos paises dependentes uma dupla escravidão: ao regime colonial das potências européias alia-se a pressão da exploração americana. 

                                         XI — Colonização da Europa Ocidental

O EX-PRESIDENTE do Conselho Robert Schuman, ao tomar a palavra a 12 de julho em Lille, declarou que o plano Marshall é «o maior empreendimento de solidariedade humana que história européia jamais conheceu».

Canção já velha! Foi com idênticas palavras servis que os homens do governo de Vichy, que antecederam Schuman, admiravam, ao dirigirem-se aos hitleristas residentes, a «solidariedade européia».

É necessário dizer que os imperialistas americanos falam muito mais claramente que seus lacaios da Europa. A revista americana «Nations Business», por exemplo, publicou em julho de 1947, sob o título significativo «Nossa geo-economia», um artigo cujo sentido ó o seguinte:

«Nossa arma é a economia, e nunca existiu país tão bem preparado para a guerra econômica como os Estados Unidos».
Deixemos de lado a fanfarronada a respeito da «boa preparação». Tenhamos paciência e veremos no que acabará esta «preparação» sob onda inevitável e destruidora da crise econômica. O que importa é a confissão aberta de que os Estados Unidos levam aos povos não a paz econômica e sim a guerra econômica. O plano Marshall encarna precisamente a política americana de guerra econômica, que tem para os países europeus as mais desastrosas conseqüências.

A participação de qualquer país no plano Marshall tem como condição, prévia um apoio sem reservas, de sua parte, à política americana de divisa) da Europa. A lei votada pelo Congresso autoriza a administração encarregada de realizar o plano Marshall a suspender as entregas de todos os materiais que possam servir à produção com fins de exportação para os países da Europa Oriental, de mercadorias que os Estados Unidos não exportam para lá. A lista destes produtos acha-se do ministério americano do comércio. É uma lista secreta. É sem dúvida um desses «segredos de Estado» que se devem guardar, no qual o governo Truman achou pretexto para fazer votar as odiosas leis anti-comunistas, copiadas dos modelos hitleristas. Oficialmente, trata-se de produtos que têm um «valor militar potencial». Mas, é fácil de compreender que nas condições atuais, qualquer artigo pode ser incluído nesta rubrica.

A casuística grosseira da lei americana tem por objetivo minar todo o comércio normal entre o Oeste e o Este da Europa. Os fantoches europeus do imperialismo do outro lado do Atlântico, pretendiam ainda recentemente que a limitação do comércio com a Europa Oriental atinge unicamente os produtos preparados com os materiais recebidos pelo plano Marshall. Os monopolistas americanos dissiparam igualmente, neste sentido, a ilusão propagada por seus sócios na Europa.

A 30 de junho de 1948, Hoffman, ao tomar a palavra durante uma conferência da imprensa em Washington, não deixou a menor dúvida quanto ã sua pretensão a um controle ilimitado de toda a exportação dos países da Europa Ocidental no Este do continente. Tendo lembrado que certos produtos americanos não são exportados para a Europa Oriental aparentemente por «razões estratégicas», Hoffman declarou que:

«se estes produtos não são exportados pelos Estados Unidos, também não devem ser exportados pelos países que tomam parte do plano Marshall».
Poderia alguém se expressar mais claramente? Hoffman pretende demonstrar que é pelo encorajamento do comércio de todos os produtos que não são «contrabando». Mas esta afirmação hipócrita nada muda aos fatos. Pois o essencial é que o delegado dos monopólios americanos para os negócios dos países da Europa Ocidental deu a entender, com a mais completa sem cerimônia, que considera estes países como colônias americanas.

Os jornais ingleses, especialmente o «Manchester Guardian», informaram que a resposta de Hoffman «provocou confusão em Londres». Esta confusão explica-se facilmente: Hoffman com sua franqueza brutal arrancou a máscara. Ora, seus clientes europeus teriam preferido esconder, como doença secreta, este grau vergonhoso de dependência aos Estados Unidos. Teriam preferido calar a verdade a respeito de uma tão completa perda de sua independência, pois esta verdade não pode deixar de levantar a indignação de milhões e milhões de europeus.

A política de divisão dá Europa é funesta, acima de tudo, para os países do Oeste europeu, do ponto de vista de seus interesses econômicos e políticos vitais.

Os países da Europa Ocidental sempre tiveram na Europa Oriental um mercado, amplo e vantajoso, para os produtos manufaturados, assim uma fonte certa de abastecimento de produtos alimentícios e matérias primas. O fato de um certo número de países da Europa central e sul-oriental terem seguido o caminho da democracia popular, não diminuiu de modo nenhum a importância desta relações econômicas para os países da Europa Ocidental. Claro, as democracias populares não serão, nunca mais, objeto de dominação dos monopólios estrangeiros nem da exploração colonial pelo capital vindo dos outras países. Mas em compensação, estas democracias, tendo se empenhado no caminho da industrialização em grande escala, podem constituir um vasto mercado para as máquinas e ferramentas produzidas na Europa Ocidental. Por outro lado estes países que estão em perspectiva de elevar rapidamente e modernizar sua agricultura, poderiam fornecer aos países do Oeste europeu, em condições vantajosas, para ambos os lados, quantidades crescentes de produtos alimentícios e matérias primas.

Segue-se assim que o rompimento previsto por Washington, das relações tradicionais que sempre existiram entre os países da Europa Ocidental e seus vizinhos do continente, aumenta imensamente a instabilidade da economia do Oeste europeu e cria-lhe inúmeras dificuldades suplementares.

A divisão sob o plano político, isto é o desmembramento da Europa, estipulada no plano Marshall, como uma de suas cláusulas essenciais, enfraquece seriamente a capacidade de resistência dos países da Europa Ocidental à pressão, ao americano. A política de cisão da Europa impede estes países de manobrarem na arena internacional, colocando os mesmos, finalmente, na necessidade de renunciarem a uma política externa independente, que corresponda a seus próprios interesses nacionais. Tornaram-se cada vez mais uns piões nas mãos dos negocistas de Washington.

                                                               XII — A Caminho da Guerra

DESTA FORMA, a própria vida desmascara, a cada instante, a legenda que apresenta o plano Marshall como um programa de reerguimento da economia da Europa. A despeito do bluff americano, os fatos mostram que o plano Marshall, longe de contribuir para o reerguimento dos países da Europa Ocidental, mina as próprias bases de sua vida econômica, condenando-as a uma catástrofe econômica e uma progressiva ruína. Todos os planos dos magnatas do dólar partem da utilização da fraqueza econômica destes países para seus próprios fins tenebrosos.

Seu objetivo mais monstruoso, e ao mesmo tempo primordial, é a inclusão do Oeste europeu nos planos militares dos pretendentes americanos ao domínio mundial, transformando-o em base de agressão dos Estados Unidos.

No mundo capitalista, enfraquecido pela segunda guerra mundial, os Estados Unidos são a principal cidadela da reação e da expansão imperialistas. Exatamente como seus antecessores hitleristas, no caminho perigoso da luta pela dominação mundial, os imperialistas americanos tentam achar na arena política externa a saída para suas dificuldades internas que, cada vez se acentuam mais. Prova-se claramente inútil procurar afastar a crise econômica iminente apenas pelos métodos de expansão econômica. Nestas condições os monopolistas americanos contam prevenir ou pelo menos atenuar a crise por meio de uma corrida absurda aos armamentos, um aumento enorme de suas despesas militares e, finalmente, por aventuras guerreiras.

Os monopolistas americanos sentem que as posições que conseguiram obter pelo caminho da penetração econômica e política nos outros países são precárias. Os métodos de chantagem e de bluff praticados pela democracia do dólar não conseguiram enfraquecer o campo da democracia e do socialismo que tem à sua frente a União Soviética e os países de democracia popular. A política reacionária de Washington não pôde entravar o progresso das forças democráticas na Europa Ocidental e o desenvolvimento do movimento de libertação nacional no mundo colonial, e principalmente nos países da Ásia. Cada vez mais convencidos que é impossível atingir o domínio mundial apenas pelos meios econômicos e políticos, os monopolistas americanos atiram-se de cabeça na preparação e atiçamento de uma nova guerra mundial.

É sabido que os empreendimentos de guerra são preparados pelo imperialismo americano sob a capa de frases mentirosas em relação à defesa do hemisfério ocidental, à segurança dos Estados Unidos, à proteção do nível de vida americano e assim por diante. Constatando a aversão das massas pela guerra, ja imperialistas da América organizaram uma campanha de mentiras e calúnias do mais alto estilo. Esta campanha tem por fim intimidar as pessoas, sugerir às massas que a guerra é inevitável, criar uma atmosfera de psicose de guerra e de nervosismo, bem propícias aos atos mais insensatos. A isto se destinam as calúnias contra a URSS, baluarte da paz e da segurança dos povos, país que os falsificadores americanos apresentam, dia a dia, como um agressor sempre disposto, segundo eles, a se precipitar sobre a Europa Ocidental e a América.

O plano Marshallé um dos elementos mais importantes da política americana atual de preparação de uma nova guerra. Forma uma só peça com os projetos aventureiros de guerra dos diplomatas do átomo, assim como dos generais do Departamento do Estado e o Departamento de Guerra.

Um relatório do Comitê consultivo junto ao presidente americano para a ajuda aos países estrangeiros proclama solenemente que:

«os interesses dos Estados Unidos na Europa não devem ser considerados do único ponto de vista, dos fatores econômicos. Têm também um caráter estratégico e político».
O caráter real dos interesses estratégicos e políticos americanos não é mais um segredo para ninguém. O ministro da Defesa Forrestal e o financista conhecido e influente, Baruch, em suas declarações do início deste ano, revelaram com toda a franqueza o laço que existe entre o famoso «programa de reerguimento europeu» e a criação de um bloco militar agressivo sob a direção suprema dos Estados Unidos. Baruch tomando a palavra a 19 de janeiro de 1948 na comissão senatorial dos Negócios Estrangeiros, no decurso dos debates sobre o Plano Marshall, recomendou que os países da Europa «se agrupem numa união política econômica e defensiva» e que os Estados Unidos e os países «que pensam da mesma maneira dão aos países que fazem parte desta união garantias mútuas contra a agressão».

«Como garantia, disse Baruch, compreendo a firme promessa de entrar em guerra para a defesa comum, se um entre eles for atacado».

A eventualidade de um «ataque» é evocada neste caso, bem entendido, com o único objetivo de tapear. E é este também o fim de todas as afirmações relativas ao caráter chamado «defensivo» da aliança militar. Quem não sabe que os agressores imperialistas falam sempre dos fins «defensivos» de seus preparativos de guerra? Duas semanas mais tarde, o ex-congressista Fish, representante da organização «América First», tomou a palavra nessa mesma comissão senatorial dos negócios estrangeiros. Este descarado bandido fascista pediu a criação de um bloco militar da Europa Ocidental contra a União Soviética. Conclamou para:

«completar imediatamente o plano Marshall por meio de acordos militares com a Inglaterra, a França, a Itália e a Espanha (esta última sobretudo, como país anti-comunista), com a Bélgica, a Holanda, a Suíça, os países escandinavos e, talvez, o Canadá, a União Sul Africana, a Austrália e a Nova Zelândia».
Durante os meses seguintes foi iniciada uma azáfama febril para a realização do programa Marshall-Baruch-Fish, programa de criação, sob a égide de Washington, de um bloco militar e político dos países da Europa Ocidental, bloco dirigido contra a União Soviética e os países da democracia popular.

É afinal para que serve o pacto dos cinco firmados em Bruxelas entre a Inglaterra, a França-, a Bélgica, a Holanda e o Luxemburgo. Este pacto não pode em caso algum ser considerado como um acordo de caráter defensivo. Fato sintomático: menção referente à defesa contra uma agressão alemã eventual, menção feita em termos velados, não foi incluída no projeto do pacto senão na última fase de sua preparação. Ao mesmo tempo o texto de pacto não deixa nenhuma duvida de que a aliança militar dos cinco países pode ser dirigida indistintamente contra qualquer dos países que foram aliados na segunda guerra mundial. E aquilo que o texto em questão silencia, a imprensa americana, inglesa e francesa proclama francamente. Brada a todo o mundo que o pacto de Bruxelas é dirigido contra a União Soviética e as democracias populares.

A resolução Vandenberg de apoio às alianças militares chamadas regionais, resolução votada pelo congresso a 11 de junho, é um novo passo na montagem do bloco ocidental. Esta resolução cria uma base jurídica para o papel dirigente dos Estados Unidos em qualquer ação agressiva e aventureira sobre o continente europeu.

Na hora atual, a atividade da diplomacia americana e de seus agentes da Europa. Ocidental tem um caráter duplo. De um lado, esforçam-se por alargar o quadro da União Ocidental. Para consegui-lo exercem especialmente uma pressão cada vez mais forte sobre os países escandinavos. Os círculos dirigentes da Noruega e da Dinamarca já vão longe para executarem seus planos. Por outro lado, os participantes do bloco ocidental organizam incessantes conferências para coordenarem seus planos e preparativos de guerra.

A este fim são consagrados especialmente as conversações «não oficiais» que se realizam neste momento em Washington. Tomam parte nestas conversações, segundo as informações que vieram a lume pela imprensa, os Estados Unidos, os cinco países signatários do pacto de Bruxelas e o Canadá. Já ressaltamos as intervenções dos ministros canadenses Saint-Laurent dos Negócios Estrangeiros, e Claxton, da Defesa, que pregam uma nova guerra. O governo canadense, que participa das conversações de Washington, propõe ampliar o bloco ocidental, completando este bloco com um pacto do atlântico norte entre os países do Oeste europeu, os Estados Unidos e o Canadá. Foi mencionada na Câmara dos Comuns, a este respeito, uma declaração do governador geral da Nova Zelândia que, por seu lado, se pronunciou favorável a uma «aliança defensiva mais estreita entre a Nova Zelândia, a Inglaterra e a Europa Ocidental». À semelhança de Hitler, que admitiu os japoneses ns seio da raça ariana, seus continuadores americanos estão dispostos a situar a Nova Zelândia no norte do Atlântico, Realmente a carne de canhão não tem cheiro!

Tal é o programa do fascista americano Fish em ação. E ninguém se espantará de ver os pseudo-socialistas do tipo Bevin e Leon Blum trabalharem com maior zelo na realização desse programa.

Enquanto se realizam conversações «não oficiais» em Washington, na Europa procura-se um «dirigente militar único» para as forças reunidas do bloco ocidental ou do pacto do atlântico norte. A 6 de julho, o jornal «Le Monde» publicou uma carta de Paul Reynaud, um dos que antes traíram a França. Considero, escreve Reynaud nessa carta, que a partir de hoje, se deve designar um dirigente supremo único para, em caso de necessidade, dirigir a batalha na Europa. Deve ser designado antecipadamente no plano inter-aliado, da mesma forma como os comandantes gerais da aviação, dos exércitos de terra e mar, que lhe serão subordinados e dirigirão as forças ocidentais.

Mais adiante, Paul Reynaud fixa sua posição, ao declarar que este dirigente militar único se preocupará em estudar e preparar a futura guerra, em pedir os meios necessários ao comitê dos delegados dos estados-maiores; esse dirigente entrará antecipadamente em contacto com as formações que serão colocadas sob seu comando em caso de guerra (por exemplo com as tropas de ocupação da Alemanha).

Os debates sobre estes assuntos, animados na imprensa oficiosa francesa, coincidiram com a chegada a Paris de Montgomery. Assim, Reynaud, traidor da França, tornou-se intermediário a favor de Montgomery. De seu lado, pretende, ao que parece, o posto de governador geral da França junto ao «dirigente militar ocidental». Todo este episódio mostra até onde vão os preparativos militares do bloco ocidental. Como sempre acontece nas combinações imperialistas deste gênero, as mesmas ameaçam principalmente a independência e os interesses vitais dos próprios participantes do bloco. Assim sucedeu no bloco hitlerista, e assim sucede no bloco atual do dólar.

Obrigando um certo número de países a tomarem parte na agressiva União Ocidental, o plano Marshall impõe aos povos da Europa Ocidental enorme encargo sob o aspecto de armamentos. Não é por acaso que na hora presente, três anos após a guerra, os orçamentos militares dos países da Europa Ocidental aumentam rapidamente. O peso das despesas militares consome uma economia já esgotada, privando-a de todos os meios de reerguimento e desenvolvimento real. Constata-se o aumento do efetivo dos exércitos, o que retira do trabalho produtivo uma parte importante da população válida.

Sob a aparência da estandardização dos armamentos, os tutores americanos obtiveram um novo meio de explorar de modo cada vez mais intenso os países da Europa, de se imiscuírem em sua vida econômica, de privá-los em definitivo de sua independência. A indústria de guerra destes países torna-se de fato uma filial da economia de guerra americana. Por outro lado, os «protetores» americanos revendem aos seus clientes por preços exorbitantes o material de guerra antiquado.

A tensão internacional criada e mantida artificialmente pela diplomacia de Marshall constitui um fator considerável de acentuação da catástrofe econômica nos países do Oeste europeu.

Os países da Europa são obrigados a pôr à disposição dos expansionistas americanos bases militares em seu próprio território e no das suas colônias.

É sabido que as bases navais e de aviação americanas estão espalhadas pelo mundo inteiro, a milhares de quilômetros dos Estados Unidos. Seu papel, com vistas à agressão, é incontestável. Estas bases estão nas paragens árticas e na Itália, na Grécia e na Turquia, no Japão e na China, na Áustria e na Alemanha Ocidental, no Egito e no Irã. Também foram criadas bases na África do Norte e na Arábia Saudita.

Desde o início de 1948 a imprensa comunicava que o governo americano, em troca de sua «ajuda» na base do plano Marshall, exige, entre outras coisas, a revisão do tratado anglo-americano de 2 de setembro de 1940, que conferia aos americanos o direito de construção e utilização, durante um período de 99 anos, de uma base naval e de aviação na Guiana Inglesa. Era comunicado em seguida que os americanos propunham à Inglaterra lhes vender as colônias que tivessem preciosas jazidas de bauxitas, tais como a Jamaica. Querem igualmente comprar à França, a Guadalupe e a Martinica, e à Holanda, a Guiana Holandesa e Curaçao. A Dinamarca é objeto de uma continuada pressão, cujo fim é se apoderarem da Groelândia.

É de notar, como especialmente importante, o papel realmente sinistro reservado no plano Marshallà Alemanha Ocidental. A indústria pesada do Rhur foi duas vezes, no espaço de um quarto de século, o arsenal da agressão alemã. Hoje os imperialistas americanos visam restabelecer este arsenal que é, segundo a expressão ilustrada por John Foster Dulles, o «coração econômico da Europa». A reconstituição do arsenal do Rhur sob o controle americano é o elemento principal de todo o plano Marshal.

O Rhur é, talvez, a única região do Oeste europeu que os monopolistas da América têm realmente a intenção de reerguer. Têm necessidade de carvão e do metal do Rhur para dominar economicamente a Europa Ocidental. Têm necessidade do Rhur como forja de armamentos para seus empreendimentos de guerra. Têm necessidade da Alemanha Ocidental como fonte de carne para canhão.

A política americana, na Alemanha, visa dividir, desmembrar esse país, visa transformar sua parte ocidental em feudo das forças reanimadas da reação e do militarismo alemães, a serviço do dólar. A diplomacia do dólar rasgou sem pejo os acordos de Ialta e de Potsdam referentes à Alemanha, acordos a que apenas se refere de tempos a tempos para encobrir as manobras tenebrosas. Com seus sócios anglo-franceses esta diplomacia sabotou a desmilitarização e a desnazificação na Alemanha Ocidental. Passou por cima das decisões dos aliados a respeito da destruição do potencial de guerra alemão e sobre o recebimento das reparações. Depois da Conferência unilateral de Londres, as três potências ocidentais liquidaram por sua própria iniciativa a administração quadripartite da Alemanha. O sentido real de todos estes atos surgirá bem claro se os apreciarmos em sua ligação indissolúvel com o plano Marshall, plano de aventuras de guerra na Europa.

A própria vida revelou o estreito laço que existe entre esse plano e a intervenção americana nos negócios internos dos países europeus. Determina-se a estes países que vivam segundo as normas americanas, que assimilem a famosa maneira de pensar americana, que significa poder absoluto dos monopólios, sem precedente na Europa, obscurantismo em todos os domínios da vida cultural e ideológica, volta ao estado mais primitivo no setor da vida espiritual, miséria intelectual enfim. Os «protetores» americanos determinam aos países da Europa Ocidental que adotem uma legislação reacionária dirigida contra a classe operária e contra todas as forças democráticas, que se juntem à histeria anti-comunista que deve, à semelhança da Alemanha hitlerista, servir de cortina à fascistização do aparelho do Estado, ao esmagamento das liberdades democráticas e dos direitos da população, e, para a preparação de uma guerra agressiva.

Os dirigentes americanos declararam por mais de uma vez que a «ajuda» sob o plano Marshall não será concedida aos países onde os comunistas tomam parte no governo. Após estas declarações os representantes dos grandes Partidos Comunistas da França e da Itália foram afastados ilegalmente da participação do poder. Hoje, os políticos americanos declaram que a «ajuda» do plano Marshall não será dada também aos países que não tenham estabelecido internamente leis anti-comunistas do tipo americano. É fato conhecido que o governo trabalhista britânico se comprometeu, já há muitos meses, neste vergonhoso caminho.

Por ocasião dos debates sobre o acordo bipartite a respeito do plano Marshall, o republicano De Vita na Câmara italiana, como primeiro orador, pronunciou-se pela ratificação do acordo, declarando que o plano Marshallé — não um instrumento de guerra, mas um instrumento de luta contra o comunismo. Poderia repetir-se neste sentido, depois de Jean Hus, «O canta simplicitas!», se nas condições atuais, não fosse mais provável que o republicano esconda neste caso o fascista de ontem, que sabe muito bem por experiência hiterista e mussoliniana, que a «luta contra o comunismo» é uma cortina de fumaça que esconde os preparativos de uma guerra criminosa. Alguns dias após o discurso do republicano De Vita, deu-se o criminoso atentado contra Palmiro Togliatti, dirigente dos trabalhadores italianos. Não será isto prova do papel real do plano Marshall e dos inspiradores e defensores deste plano?

Desta forma, se nota que sob a capa de frases hipócritas a respeito do programa de reerguimento econômico da Europa, a respeito da segurança e defesa do hemisfério ocidental, os atuais pretendentes ao domínio mundial se esforçam por subjugar o Oeste europeu e transformá-lo numa só base da economia de guerra e na base estratégica objetivando novas atividades belicistas.

Este o objetivo final e essencial do plano Marshall.

                                            XIII — Resistência das Forças Democráticas

O MECANISMO do plano Marshall é brutal e hipócrita. O aparelho de esmagamento dos países da Europa Ocidental e do seu rebaixamento ao nível econômico e político das colônias, aparelho criado na América, espezinha, sem piedade, não só a independência, como também a segurança, a liberdade, a honra dos povos europeus. Vota estes povos ao papel de dóceis piões no jogo de azar, no jogo de ventura que os imperialistas do dólar empreenderam.

Estas simples verdades não poderiam ser escondidas com a ajuda de miseráveis artifícios a que recorrem os campeões do plano Marshall, ou pelos tambores de uma propaganda falsa que visa encobrir os fins verdadeiros do plano.

Por esta razão a política que constitui o programa do plano Marshall entra em choque indiscutível com uma resistência crescente dos dois lados do Atlântico. Nos Estados Unidos, todos os elementos progressistas compreendem perfeitamente o caráter funesto desta política do ponto de vista dos interesses fundamentais do povo americano. Henry Wallace, candidato do terceiro partido à presidência da República, apreciou da seguinte maneira, num dos seus discursos, o plano Marshall:

«O programa de reerguimento da Europa não será um programa de luta contra a fome. Apenas fará com que esta se perpetue. O programa de reerguimento da Europa não contribuirá para o reerguimento, mas ao contrário adiará esse reerguimento por tempo indefinido. O programa de reerguimento da Europa faz baixar o nível de vida europeu em comparação com o nível anterior à guerra; visa, por outro lado, reerguer a Alemanha, como grande centro industrial do bloco militar da Europa e restabelecer o poder dos monopolistas e dos latifundiários europeus sobre os povos deste continente. O programa de reerguimento da Europa colocará a Europa Ocidental sob o controle de Wall Street. Deturpa a Organização das Nações Unidas e causará sua destruição. Acentuará, em vez de atenuar, as divergências internacionais. E, visto que acarreta tudo isto, o programa de reerguimento da Europa é uma grave ameaça à esperança e às necessidades do povo americano».
A medida que o caráter real do plano Marshall se destaca, a realização deste plano esbarra com a resistência cada vez maior dos povos da Europa Ocidental. As massas trabalhadoras do Oeste europeu não podem deixar de compreender que a realização deste programa faz perigar sua liberdade, sua independência e sua existência nacional. Ao mesmo tempo vêem que a União Soviética e com sua ajuda, os países de democracia popular, elevam com êxito sua economia nacional, vencem as dificuldades do após guerra. A marcha vitoriosa da grande potência soviética no caminho do progresso econômico real mostra a todos os povos que podem e devem adotar uma forma de agir diferente da sujeição dócil ao imperialismo americano.

Ao examinarmos de perto o plano Marshall, nota-se que é uma nova edição dos insensatos planos hitleristas de dominação mundial. Os povos aos quais a luta contra os opressores nazistas custou sacrifícios incalculáveis não têm a intenção de se curvar ao jugo dos novos senhores do outro lado do Atlântico. Sabem que as forças da democracia são imensas e que depende de sua coesão, de sua atividade e de sua vigilância a derrocada dos planos da reação imperialista, inimigos da humanidade.

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«Devemos estar preparados para enfrentar a mais forte das resistências e lutar contra todos os inimigos internos e externos. Contudo, se formos capazes de dominar a ciência do marxismo-leninismo, de ter fé nas massas, de estar intimamente ligados às massas e conduzi-las para a frente, poderemos superar qualquer dificuldade e nessa forca será invencível.»

Mao Tse-Tung