Questões da Revolução Chinesa(1) Tese Para os Propagandistas
I — As Perspectivas da Revolução Chinesa
OS FATOS fundamentais que determinam o caráter da revolução chinesa:
a) situação semi-colonial da China e a dominação financeira e econômica do imperialismo;
b) jugo das sobrevivências feudais que aprofundam o jugo do militarismo e da burocracia;
c) luta revolucionária crescente das massas de milhões de operários e camponeses contra o jugo feudal-burocrático, contra o militarismo e contra o imperialismo;
d) fraqueza política da burguesia nacional, a sua dependência do imperialismo e o seu temor da amplitude do movimento revolucionário;
e) a crescente atividade revolucionária do proletariado e o crescimento de sua autoridade entre as massas de milhões de trabalhadores;
f) a existência de uma ditadura do proletariado nas vizinhanças da China.
Daí decorrem os dois caminhos de desenvolvimento dos acontecimentos na China:
OU a burguesia nacional vence o proletariado, entra em transação com o imperialismo e juntamente com o mesmo realiza uma campanha contra a revolução para terminá-la com o estabelecimento da dominação do capitalismo;
OU o proletariado isola a burguesia nacional, fortalece a sua hegemonia e arrasta as massas de milhões de trabalhadores na cidade e no campo para vencer a resistência da burguesia nacional, alcançar a vitória integral da revolução democrático-burguesa e conduzi-la depois gradualmente para o caminho da revolução socialista com todas as consequências que dai decorrem.
Ou um ou outro caminho.
A crise do capitalismo mundial e a existência da ditadura do proletariado na URSS cuja experiência pode ser utilizada com êxito, pelo proletariado chinês, facilitam consideravelmente a possibilidade da realização do segundo caminho da revolução chinesa.
Por outro lado, o fato de que o imperialismo investe em frente única, no fundamental, contra a revolução chinesa, de que atualmente não há entre os imperialistas a cisão e a guerra que existiam, por exemplo, antes da Revolução de Outubro no campo do imperialismo e que enfraqueciam o imperialismo — esse fato indica que a revolução chinesa encontra, no caminho para a vitória, muito mais dificuldades do que a Revolução na Rússia, que as defecções e as traições no curso dessa revolução serão em numero incomparavelmente maior do que no período da guerra civil na URSS.
É por isso que a luta entre esses dois caminhos da revolução constitui o traço característico da revolução chinesa.
É justamente por isso que a tarefa fundamental dos comunistas consiste na luta pela vitória do segundo caminho da revolução chinesa.
II — A Primeira Etapa da Revolução Chinesa
NA primeira etapa da revolução chinesa, na etapa da primeira campanha em direção ao norte, quando o exército nacional, ao se aproximar do rio Iang-Tsé, conquistava uma vitória após outra, e um poderoso movimento dos operários e dos camponeses ainda não tivera tempo de se desenvolver, a burguesia nacional (não compradora)(1) marchava junto com a revolução. Era uma revolução da frente unificada da nação em geral. Isso não quer dizer que não havia contradições entre a revolução e a burguesia nacional. Significa apenas que a burguesia nacional se esforçava, ao apoiar a revolução, no sentido de se utilizar da mesma para a realização dos seus objetivos a fim de, orientando-a principalmente pelo caminho das conquistas territoriais, limitar a sua amplitude. A luta que se desenvolvia nesse período entre os direitistas e os esquerdistas no Kuomintang era um reflexo dessas contradições. A tentativa de Chiang Kai-Shek, em março de 1926, de expulsar os comunistas do Kuomintang foi a primeira tentativa séria da burguesia nacional no sentido de frear a revolução. É sabido que o Comitê Central do PC (b) da URSS já então considerava que “é necessário seguir uma linha no sentido de manter o Partido Comunista como parte integrante do Kuomintang”, que é preciso “conduzir as coisas visando a saída ou a exclusão dos direitistas do Kuomintang”. (abril de 1926).
Era uma linha de desenvolvimento posterior da revolução em estreita cooperação dos esquerdistas e comunistas dentro do Kuomintang e na composição do governo nacional, de fortalecimento da unidade do Kuomintang e, ao mesmo tempo, de desmascaramento e isolamento dos direitistas do Kuomintang, de submissão dos direitistas à disciplina do Kuomintang, de aproveitamento dos direitistas, de suas ligações e de sua experiência, conquanto que se submetessem à disciplina do Kuomintang, ou a expulsão dos direitistas do Kuomintang, quando quebrassem essa disciplina e traíssem os interesses da revolução.
Os acontecimentos posteriores confirmaram inteiramente a justeza desta linha. Um poderoso desenvolvimento do movimento camponês e a organização de uniões camponesas e Comitês de camponeses no campo, uma poderosa onda grevista nas cidades e a criação dos soviets de sindicatos, a vitoriosa penetração das forças nacionais em Changai, bloqueada pela frota e pelos exércitos dos imperialistas — todos estes fatos e outros fatos semelhantes confirmam que a linha seguida era a única linha justa.
É somente por esta circunstância que se pode explicar o fato de que a tentativa feita pelos direitistas em fevereiro de 1927 de dividir o Kuomintang e de criar em Nantchang um novo centro fracassou em virtude da repulsa unânime do Kuomintang revolucionário em Wu Han.
Mas esta tentativa era um indício de que se processava no país um reagrupamento das forças de classe, de que os direitistas e a burguesia nacional não se acalmaram e de que intensificariam a sua atividade contra a revolução.
Por isso o Comitê Central do P. C. (b) da URSS tinha razão quando afirmou, em março de 1927, que:
a) “atualmente a revolução chinesa, por motivo do reagrupamento das forças de classe e da concentração dos exércitos imperialistas, passa por um período crítico e as suas vitórias futuras somente se tornarão possíveis com uma linha firme de desenvolvimento do movimento de massas”;
b) “é necessário manter a política de armamento dos operários e camponeses, de transformação dos Comitês locais de camponeses em autênticos órgãos do poder com auto-defesa armada”;
c) “o Partido Comunista não deve ocultar a política traidora e reacionária dos direitistas do Kuomintang e deve mobilizar as massas em torno do Kuomintang e do Partido Comunista Chinês para o desmascaramento dos direitistas” (3 de março de 1927).
Por isso é fácil de compreender que, em seguida, um poderoso ímpeto da revolução, por um lado, e, por outro lado, a pressão dos imperialistas em Changai não podiam deixar de lançar a burguesia nacional chinesa no campo da contra-revolução, da mesma forma que a ocupação de Changai pelos exércitos nacionais e as greves dos operários de Changai não podiam deixar de unir os imperialistas para sufocar a revolução.
Foi justamente o que aconteceu. Os fuzilamentos de Nanquim, nesse sentido, serviram de sinal para uma nova delimitação das forças combatentes na China. Ao lançar mão de fuzilamentos em Nanquim e ao apresentar um ultimato, os imperialistas queriam dizer que procuravam apoio da burguesia nacional para uma luta em conjunto contra a revolução chinesa.
Ao espingardear comícios operários e ao organizar golpes, Chiang Kai-Shek afirmava, como se respondesse ao apelo dos imperialistas, que, juntamente com a burguesia nacional, estava disposto a entrar em acordo cem os imperialistas contra os operários e camponeses da China.
III — A Segunda Etapa da Revolução Chinesa
O GOLPE de Chiang Kai-Shek significa por si mesmo o afastamento da burguesia nacional da revolução, o nascimento de um centro da contra-revolução nacional e o acordo dos direitistas do Kuomintang com os imperialistas contra a revolução chinesa.
O golpe de Chiang Kai-Shek significa que haverá doravante no sul da China, dois campos, dois governos, dois exércitos, dois centros — o centro da revolução em Wu Han e o centro da contra-revolução em Nanquim.
O golpe de Chiang Kai-Shek significa que a revolução penetrou na segunda etapa do seu desenvolvimento, que se iniciou a passagem da revolução da frente unificada da nação em geral para a revolução das massas de milhões de operários e camponeses, para a revolução agrária que fortalece e amplia a luta contra o imperialismo, contra a gentry(2) e os latifundiários feudais, contra os militaristas e o grupo contra-revolucionário de Chiang Kai-Shek.
Isso significa que a luta entre os dois caminhos da revolução, entre os partidários do seu desenvolvimento posterior e os partidários de sua liquidação se aguçará dia a dia, enchendo consigo mesma toda a etapa atual da revolução.
Isto significa que o Kuomintang revolucionário em Wu Han, ao travar uma luta decisiva contra o militarismo e o imperialismo, se transformará, de fato, em órgão da ditadura revolucionária e democrática do proletariado e do campesinato, e o grupo contra-revolucionário de Chiang Kai-Shek em Nanquim, ao se afastar dos operários e camponeses e ao se aproximar do imperialismo, terá, no final das contas, a sorte dos militaristas.
Mas segue-se daí que a política de manutenção da unidade do Kuomintang, a política de isolamento dos direitistas dentro do Kuomintang e de utilização dos mesmos para os objetivos da revolução já não corresponda às novas tarefas da revolução. Esta política deve ser substituída pela política de expulsão decidida dos direitistas do Kuomintang, pela política de luta decidida contra os direitistas até à sua total liquidação política, pela política de concentração de todo o poder no país nas mãos do Kuomintang revolucionário, do Kuomintang, sem os seus elementos direitistas, do Kuomintang como bloco dos esquerdistas do Kuomintang e os comunistas.
Daí se segue, ainda, que a política de cooperação estreita dos esquerdistas e dos comunistas dentro do Kuomintang adquire em determinada etapa uma força particular e uma significação particular, que esta cooperação reflete a união dos operários e dos camponeses que se processa fora do Kuomintang e que sem uma tal cooperação é impossível a vitória da revolução.
Daí se segue, ainda, que a fonte fundamental da força do Kuomintang revolucionário é constituída pelo desenvolvimento posterior do movimento revolucionário dos operários e dos camponeses e pelo fortalecimento de suas organizações de massa — os Comitês revolucionários de camponeses, dos sindicatos dos operários de outras organizações revolucionárias de massas, como elementos preparatórios dos futuros soviets; que a principal garantia da vitória da revolução é o crescimento da atividade revolucionária das massas de milhões de trabalhadores e o principal antídoto para a contra-revolução é o armamento dos operários e dos camponeses.
Daí se segue, finalmente, que, ao lutar nas mesmas fileiras juntamente com os elementos revolucionários do Kuomintang, o Partido Comunista deve manter, mais do que nunca, a sua independência, como condição necessária para assegurar a hegemonia do proletariado na revolução democrático-burguesa.
IV — Os Erros da Oposição
O ERRO fundamental da oposição (Radek e companhia) está na incompreensão do caráter da revolução na China, na incompreensão da espécie de etapa que atravessa atualmente esta revolução e na incompreensão da situação internacional do momento.
A oposição exige que a revolução chinesa se desenvolva mais ou menos com o mesmo ritmo da Revolução de Outubro. A oposição se acha descontente pelo fato de que os operários de Changai não empreenderam um combate decisivo contra o imperialistas e seus esbirros.
Mas a oposição não compreende que a revolução na China não pode se desenvolver a um ritmo acelerado, entre outras coisas, por que a situação internacional atualmente é menos favorável do que em 1917 (não há uma guerra entre imperialistas).
Não compreende que é impossível empreender um combate decisivo em condições desfavoráveis, quando as reservas ainda não se acham preparadas, da mesma forma que, por exemplo, os bolcheviques não empreenderam o combate decisivo nem em abril e nem em julho de 1917.
A oposição não compreende que não evitar o combate decisivo em condições desfavoráveis (quando se pode evitá-lo) — significa facilitar a tarefa dos inimigos da revolução.
A oposição exige a criação imediata dos Soviets de deputados dos operários, dos camponeses e dos soldados na China. Mas o que significa criar os Soviets agora?
Em primeiro lugar não se pode criá-los em qualquer momento — eles são criados somente no período de um ascenso particular das ondas revolucionárias.
Em segundo lugar, os Soviets são criados não para tagarelice — são criados principalmente como órgãos de luta contra o poder existente, como órgãos de luta pelo poder. Assim aconteceu em 1905. Assim também aconteceu em 1917.
Mas o que quer dizer a criação de Soviets no momento atual na área de ação, por exemplo, do governo de Wu Han? Isto significa apresentar a palavra de ordem de luta contra o poder existente nessa área. Significa apresentar a palavra de ordem de criação de novos órgãos do poder, apresentar a palavra de ordem de luta contra o poder do Kuomintang revolucionário, do qual os comunistas também fazem parte em bloco com os esquerdistas do Kuomintang, porque não há atualmente nesta área nenhum outro poder além do poder do Kuomintang revolucionário.
Isto significa, ainda, misturar a tarefa da criação e do fortalecimento das organizações de massa dos operários e dos camponeses na forma de comitês de greve, de uniões, e de Comitês camponeses, de soviets sindicais, de Comitês de fábrica e usina, etc., sobre os quais já se apóia o Kuomintang revolucionário, com a tarefa da criação do sistema soviético como novo tipo de poder estatal .em substituição ao poder do Kuomintang revolucionário.
Isto significa, finalmente, não compreender qual é a etapa que atravessa a revolução na China no momento presente. Isto significa colocar nas mãos dos inimigos do povo chinês uma nova arma para a luta contra a revolução, para a criação de novas lendas de que não se processa uma revolução nacional na China, mas uma transplantação artificial da “sovietização de Moscou”.
Dessa forma a oposição, ao apresentar a palavra de ordem de criação dos Soviets no momento atual, faz o jogo dos inimigos da revolução chinesa.
A oposição considera inconveniente a participação do Partido Comunista no Kuomintang. A oposição considera, portanto, conveniente a saída do Partido Comunista do Kuomintang. Mas o que significa o afastamento do Partido Comunista do Kuomintang agora, quando toda a matilha imperialista com todos os seus laçais exige a expulsão dos comunistas do Kuomintang? Isto significa abandonar o campo da luta e abandonar os seus aliados do Kuomintang para alegria dos inimigos da revolução. Significa enfraquecer o Partido Comunista, minar o Kuomintang revolucionário, facilitar a tarefa dos Kaveniak de Changai e entregar a bandeira do Kuomintang, a mais popular de todas as bandeiras da China, às mãos dos direitistas do Kuomintang.
É isto precisamente o que os imperialistas, os militaristas e os direitistas do Kuomintang exigem atualmente.
Dessa forma se conclui que, ao se manifestar pela retirada do Partido Comunista do Kuomintang no momento atual, a oposição faz o jogo dos inimigos da revolução chinesa.
O recente pleno do Comitê Central do nosso Partido procedeu, por isso, de maneira inteiramente certa, ao repudiar, decididamente, a plataforma da oposição.(3)
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Notas:
(1) Nota da edição russa: Compradores — intermediários entre o capital estrangeiro e o mercado local que constituem parte da grande burguesia comercial nativa nos países coloniais e dependentes. A burguesia compradora constitui uma agência do imperialismo estrangeiro e inimigo feroz da revolução chinesa nos anos de 1925 e 1927.
(2) N. R. Gentry — aristocracia rural.
(3) Nota da edição russa: Trata-se do Pleno do CC do PC (b) da URSS realizado de 13 à 16 de abril de 1927. O Pleno debateu uma série de questões ligadas aos congressos dos Soviets da URSS e da RSFSR e decidiu a questão dos prazos de convocação do XV congresso do PC (b) da URSS. Em 13 de abril, J. V. Stálin interveio relativamente à questão da ordem do dia do pleno e nos debates sobre o informe de M. I. Kalinin “As questões dos congressos dos Soviets da URSS e da RSFSR”. Depois de examinar a comunicação do Bureau Político do CC do PC (b) da URSS relativa às resoluções aprovadas por ele em ligação com os acontecimentos internacionais (acontecimentos na China, etc.), o Pleno aprovou a política do Bureau Político do CC relativamente à questão internacional e repudiou energicamente a plataforma anti-partidária da oposição trotsquista-zinovievista.
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“Com o aparecimento dos partidos revolucionários marxistas-leninistas, o aspecto do movimento revolucionário mundial modificou-se e a modificação foi tão profunda que o mundo foi abalado de uma forma que jamais os nossos antepassados poderiam imaginar”. — MAO TSE-TUNG.