I – Algumas Pequenas Questões

Camaradas!

Devo desculpar-me pelo fato de haver chegado atrasado à reunião do Comitê Executivo e por isso não pude ouvir todo o discurso de Trotski, lido aqui perante o Comitê Executivo.

Penso, porém, que Trotski apresentou durante os últimos dias uma tal massa de literatura, teses e cartas ao Comitê Executivo relativas à questão chinesa que não pode haver entre nós falta de materiais para a crítica da oposição.

Por isso na minha crítica dos erros de Trotski partirei desses documentos, não tendo nenhuma dúvida de que esta crítica será ao mesmo tempo uma crítica das bases do discurso de hoje de Trotski.

Tentarei, tanto quanto possível, varrer o elemento pessoal da política. Os ataques pessoais de Trotski e Zinoviev contra determinados membros do Bureau Político do CC do PC (b) da URSS e do Presidium do Comitê Executivo da Internacional Comunista não merecem consideração.

Como se vê, Trotski desejaria representar o papel de certo herói nas reuniões do Comitê Executivo do Komintern com o objetivo de transformar o trabalho do Comitê Executivo sobre as questões do perigo de guerra, da revolução chinesa, etc. — em trabalho sobre o caso Trotski. Penso que Trotski não merece uma atenção tão grande. (Uma voz do auditório “Muito bem!”) Tanto mais quanto ele nos lembra mais um ator do que um herói e não se pode em caso algum confundir um ator com um herói.

Já não falo sobre o fato de que não há nada ofensivo para Bukarin ou Stálin em que pessoas do gênero de Trotski e Zinoviev, por ferem sido pilhados em flagrante pelo VII pleno ampliado do Comitê Executivo em desvio social-democrata, insultem sem motivo algum os bolcheviques. Pelo contrário, seria para mim a mais profunda ofensa se semi-mencheviques do tipo Trotski e Zinoviev me elogiassem e não me insultassem.

Não me alongarei também em indagações no sentido de saber se a oposição infringiu ou não, com as suas atuais manifestações fracionistas as obrigações assumidas por ela em 16 de outubro de 1926. Trotski afirma que, segundo a declaração da oposição de 16 de outubro de 1926, ele tem o direito de defender os seus pontos de vista. Isto é verdade, sem dúvida, mas se Trotski pensa afirmar que com isso se esgota aquela declaração então só se pode chamar a isso de sofisma.

Na declaração da oposição de 16 de outubro, fala-se não somente a respeito dos direitos da oposição em defender os seus pontos de vista mas também sobre o fato de que esses pontos de vista poderão ser defendidos dentro dos limites partidariamente permissíveis, que o fracionismo deve ser afastado e liquidado, que a oposição é obrigada “a se submeter incondicionalmente” à vontade do Partido e às resoluções do CC, que a oposição deve não somente se submeter a essas resoluções mas também “pô-las em prática” conscienciosamente.

Não é preciso ainda demonstrar depois de tudo isso que a declaração da oposição de 16 de outubro de 1926 foi por ela violada e rasgada da maneira mais estúpida.

Não me alongarei também sobre as deformações indecorosas e profundamente caluniosas contra as posições do. CC do PC (b) da URSS e do Komintern relativamente à questão chinesa, mencionadas em numerosas teses, artigos e discursos da oposição. Trotski e Zinoviev não cessam de afirmar que o CC do PC(b) da URSS e o Komintern defenderiam e continuariam a defender a política de “apoio” à burguesia nacional na China.

Acho que seria quase desnecessário demonstrar que essa afirmação de Trotski e Zinoviev é uma invencionice, uma calúnia, uma deformação proposital do problema. Na realidade o CC do PC(b) da URSS, e o Komintern não defenderam a política de apoio à burguesia nacional, mas a política de aproveitamento da burguesia nacional, enquanto a revolução na China era uma revolução da frente única de toda a nação, política esta que eles posteriormente substituíram pela política de luta armada contra a burguesia nacional, quando a revolução na China se tornou uma revolução agrária e a burguesia nacional começou a se afastar da revolução.

Quem quiser se convencer disso pode consultar documentos tais como a resolução do VII pleno ampliado, o conhecido apelo do Comitê Executivo do Komintern,(2) as teses de Stálin para propagandistas e, finalmente, as teses de Bukarin apresentadas há dias ao Presidium do Comitê Executivo do Komintern.

A infelicidade da oposição está precisamente no fato de que não pode passar sem calúnias e deformações.

Passemos ao nosso trabalho.

        II – A Revolução Agrária e Camponesa Como Base da Revolução Democrático-Burguesa

O erro fundamental de Trotski está em que ele não compreende o significado e o caráter da revolução chinesa. O Komintern parte do princípio de que as sobrevivências do feudalismo são, no momento atual, o fator predominante da opressão na China que estimula a revolução agrária. O Komintern parte de que as sobrevivências do feudalismo na aldeia chinesa e toda a super-estrutura militarista e burocrática que corresponde a essas sobrevivências com todos os seus dziudziuns, governadores, generais, Tchan Tso-Lin, etc, — constituem a infra-estrutura sobre cuja base surgiu e se desenvolve a atual revolução agrária.

Se 70% das rendas dos camponeses em toda uma série de provindas são da propriedade do latifundiário e da gentry(3), se os latifundiários, armados ou desarmados constituem não somente a autoridade econômica mas também a autoridade administrativa e judiciária e se até hoje ainda se pratica numa série de províncias o sistema medieval de compra e venda de mulheres e crianças — então não se pode deixar de reconhecer que as sobrevivências feudais constituem a forma básica de opressão nas províncias chinesas.

É precisamente pelo fato de que as sobrevivências feudais com toda a sua super-estrutura militar e burocrática constituem a forma fundamental de opressão na China — é precisamente por isso que a China passa hoje pela mais grandiosa das revoluções agrárias pela sua força e amplitude.

E o que é uma revolução agrária? É justamente a base e o conteúdo da revolução democrático-burguesa.

É precisamente por isso que o Komintern afirma que a China passa no momento atual pela revolução democrático-burguesa.

Mas a revolução democrático-burguesa na China não é apenas dirigida contra as sobrevivências feudais. É ao mesmo tempo dirigida contra o imperialismo.

Por que?

Porque o imperialismo com todo o poder financeiro e militar que possui na China é a força que apóia, inspira, cultiva e conserva as sobrevivências feudais com toda a sua super-estrutura burocrática e militarista.

Porque não se pode liquidar as sobrevivências feudais na China sem travar ao mesmo tempo uma luta revolucionária contra o imperialismo na China.

Porque todo aquele que desejar destruir as sobrevivências feudais na China deve obrigatoriamente levantar a mão contra o imperialismo e os grupos imperialistas na China.

Porque sem travar uma luta decisiva contra o imperialismo é impossível vencer e liquidar as sobrevivências feudais na China.

É precisamente por isso que o Komintern afirma que a revolução democrático-burguesa na China é ao mesmo tempo uma revolução anti-imperialista.

Dessa forma a atual revolução na China é a união de duas correntes do movimento revolucionário — o movimento contra as sobrevivências feudais e o movimento contra o imperialismo. A revolução democrático-burguesa na China é a união da luta contra as sobrevivências feudais e da luta contra o imperialismo.

Tal é o ponto de partida de toda a linha do Komintern (o que quer dizer também do CC do PC (b) da URSS) quanto às questões da revolução chinesa.

E qual é o ponto de partida da posição de Trotski quanto à questão chinesa? É diametralmente oposto ao ponto de vista do Komintern que acabamos de expor. Ou Trotski não reconhece de maneira nenhuma a existência das sobrevivências feudais na China ou então não lhes empresta significação decisiva. Trotski (o que quer dizer também a oposição), ao subestimar a força e a significação da opressão feudal e burocrática na China, supõe que a dependência nacional e alfandegária da China em relação aos países do imperialismo constitui a causa fundamental da revolução nacional chinesa.

Permiti que me refira às conhecidas teses de Trotski enviadas há dias ao CC do PC (b) da URSS, e ao Comitê Executivo do Komintern. Estas teses de Trotski têm o seguinte título: “A Revolução Chinesa e as Teses de Stálin”.

Eis o que escreve Trotski nestas teses:

“É fundamentalmente inconsistente a tentativa de Bukarin no sentido de justificar a linha oportunista e conciliadora por meio de citações referentes ao papel pretensamente predominante “dos restos do feudalismo” na economia chinesa. Se a apreciação feita por Bukarin da economia chinesa estivesse baseada até mesmo numa análise econômica e não em definições escolásticas, os “restos do feudalismo”não poderiam igualmente justificar a política que de maneira tão evidente facilitou o golpe de abril. A revolução chinesa tem um caráter nacional-burguês pela causa fundamental de que o desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo chinês se apoiou na dependência nacional e alfandegária da China em relação aos países do imperialismo”. (Vide Trotski, “A Revolução Chinesa e as Teses de Stálin”). (O grifo é meu — J. Stálin).
Se não se prestar atenção a esta citação pode-se pensar que Trotski trava luta não contra a linha do Komintern sobre a questão do caráter da revolução chinesa, mas contra a “política conciliadora” de Bukarin. Mas isto, sem dúvida, não é verdade. Na realidade esta citação se refere à negação “do papel predominante” das sobrevivências feudais na China. Na realidade trata-se aqui de qualificar a revolução agrária que se desenvolve atualmente na China de revolução de cúpula, de revolução, por assim dizer, anti-alfandegária.

O palavrório a respeito da “política conciliadora” de Bukarin foi aqui necessário a Trotski para mascarar o seu afastamento da linha do Komintern. Trata-se — digamo-lo francamente — da maneira habitual e velhaca com que procede Trotski.

Dessa forma chega-se à conclusão, segundo Trotski, que as sobrevivências feudais na China com toda a sua super-estrutura militarista e burocrática não são a mola fundamental da revolução chinesa no momento atual, mas uma força insignificante e de segunda categoria, que só merece ser posta entre aspas.

Dessa forma chega-se à conclusão, segundo Trotski, que a “causa fundamental” da revolução nacional na China é a dependência alfandegária da China em relação aos imperialistas, e que em vista disso a revolução na China é, principalmente, uma revolução, por assim dizer, anti-alfandegária.

Tal é o ponto de partida das concepções de Trotski.

Tal é o ponto de vista de Trotski quanto ao caráter da revolução chinesa.

Permití-me observar que este ponto de vista é o ponto de vista do conselheiro civil de “sua alteza” Tchan Tso-Lin.

Se o ponto de vista de Trotski é acertado então é preciso reconhecer que estão certos Tchan Tso-Lin e Chiang Kai-Shek que não desejam nem a revolução agrária, nem a revolução operária e que só se esforçam no sentido de anular os acordos injustos e estabelecer a autonomia alfandegária da China.

Trotski rolou até o ponto de vista dos burocratas de Tchan Tso-Lin e Chiang Kai-Shek.

Se é preciso colocar os restos do feudalismo entre aspas; se o Komintern está errado ao declarar que os restos do feudalismo têm uma significação predominante na atual etapa da revolução; se a base da revolução chinesa é a dependência alfandegária e não a luta contra as sobrevivências feudais e contra o imperialismo que as sustenta — então o que resta da revolução agrária na China?

De onde surgiu a revolução agrária na China com a exigência do confisco das terras dos latifundiários? Sobre que fundamento consideram, em tal caso, a revolução chinesa uma revolução democrático burguesa? Não é verdade que a revolução agrária é a base da revolução democrático-burguesa? Será que a revolução agrária possa cair do céu?

Não é verdade que milhões e dezenas de milhões de camponeses se acham integrados numa grandiosa revolução agrária em províncias como Hunan, Hupeh, Honan, etc, onde os camponeses estabelecem o seu poder, os seus tribunais, os seus órgãos de auto-defesa, expulsando os latifundiários e ajustando contas com os mesmos “à maneira plebéia”?

De onde pôde surgir um movimento agrário tão poderoso se a opressão feudal-militarista não é a forma predominante da opressão na China?

Como pôde esse poderoso movimento de dezenas de milhões de camponeses assumir, ao mesmo tempo, um caráter anti-imperialista se não reconhecer que o imperialismo é o aliado principal dos opressores feudais-militaristas do povo chinês?

Não é verdade que somente em Hunan as uniões camponeses contam atualmente com mais de dois e meio milhões de membros? E quantos deles há atualmente em Hupeh e em Honan e quantos deles haverá muito brevemente nas outras províncias da China?

E os “chuços vermelhos”, as “uniões dos cintos apertados”, etc., será que tudo isso é fantasia e não realidade?

Será que se pode afirmar seriamente que a revolução agrária de dezenas de milhões de camponeses, que apresenta a palavra de ordem de confisco das terras dos latifundiários, não seja dirigida contra as sobrevivências reais e indubitáveis do feudalismo, mas contra as imaginárias sobrevivências do feudalismo entre aspas?

Não é evidente que Trotski rolou até o ponto de vista dos burocratas de “sua alteza” Tchan Tso-Lin?

Temos, dessa forma, duas linhas fundamentais:

à) o linha do Komintern que leva em conta a existência de sobrevivências feudais na China como a forma predominante de opressão, a significação decisiva de um poderoso movimento agrário, a ligação das sobrevivências feudais com o imperialismo, o caráter democrático-burguês da revolução chinesa com o aguçamento da luta contra o imperialismo;

b) a linha de Trotski que nega a significação predominante da opressão feudal-militarista, que não vê a significação decisiva do movimento agrário-revolucionário na China e que explica o caráter anti-imperialista da revolução chinesa somente pelos interesses do capitalismo chinês que exige a independência alfandegária da China.

O erro fundamental de Trotski (o que quer dizer também da oposição) está na subestimação da revolução agrária na China, na subestimação do caráter democrático-burguês desta revolução, na negação das premissas de um movimento agrário na China do qual participam milhões e na subestimação do papel do campesinato na revolução chinesa.

Este erro de Trotski não é novo. Constitui o traço característico de toda a linha de Trotski durante todo o período de sua luta contra o bolchevismo.

A subestimação do papel do campesinato na revolução democrático-burguesa é o erro que Trotski comete desde 1905 e que se manifestou de maneira particularmente clara antes da revolução de fevereiro de 1917 e que ele não abandonou até hoje.

Permití-me citar alguns fatos da luta de Trotski contra o leninismo, por exemplo o que se refere às vésperas da revolução de fevereiro de 1917 quando marchávamos para a vitória da revolução democrático-burguesa na Rússia.

Trotski afirmou naquela época, que, uma vez que se aprofundara a diferenciação entre o campesinato, uma vez que tínhamos então a dominação do imperialismo e o proletariado se colocara contra uma nação burguesa, então o papel do campesinato diminuiria de significação e a revolução agrária não teria a significação que lhe emprestavam em 1905.

Mas, como respondeu Lênin a isso? Permití-me mencionar uma citação de um artigo de Lênin de 1915, relativo à questão do campesinato na revolução democrático-burguesa na Rússia:

“A original teoria de Trotski (trata-se da “revolução permanente” de Trotski. J. St.) toma dos bolcheviques o apelo a uma decidida luta revolucionária do proletariado, e à conquista por eles do poder político e toma dos mencheviques “a negação” do papel do campesinato. Afirma ele que o campesinato se dividiu em camadas e se diferenciou; o seu possível papel revolucionário diminuiu por completo; na Rússia é impossível uma revolução “nacional”; “vivemos na época do imperialismo”, e “o imperialismo não coloca uma nação burguesa contra o velho regime, mas o proletariado contra a nação burguesa”.
Eis um exemplo divertido de “jogo de palavras”: imperialismo! Se na Rússia o proletariado já se coloca contra uma “nação burguesa”, então quer dizer que a Rússia já se acha imediatamente antes da revolução socialista! então está errada a palavra de ordem de “confisco das terras dos latifundiários” (repetida por Trotski em 1915 em seguida à conferência de janeiro de 1912), então não é preciso falar sobre “o operário revolucionário”, mas sobre o “operário de um governo socialista”!! Percebe-se até onde chega a confusão de Trotski pelas suas frases no sentido de que, com a sua decisão, o proletariado arrastará “as massas populares não proletárias (!)” Trotski não percebeu que se o proletariado arrastar as massas não proletárias do campo para o confisco das terras dos latifundiários e derrubar a monarquia, então isto será a conclusão da “revolução nacional burguesa na Rússia, isto será a ditadura revolucionária-democrática do proletariado e do campesinato! (o grifo é meu J. Stálin).

Toda uma década — a grande década de 1905 a 1915 — demonstrou a existência de duas e somente de duas linhas de classe da revolução russa. A divisão do campesinato em camadas aprofundou a luta de classes em seu seio, despertou muitos elementos politicamente inativos, aproximou o proletariado do campo do proletariado urbano (desde 1906 que os bolcheviques insistiam quanto à sua organização particular e introduziram esta exigência em resolução aprovada pelo congresso menchevique de Estocolmo). Mas para os Markov, os Romanov e os Kvostov o antagonismo do “campesinato” se intensificou, cresceu e se aprofundou. Trata-se de uma verdade tão evidente que até mesmo milhares de frases em dezenas de artigos publicados em Paris por Trotski não conseguirão “refutá-la”. Trotski na realidade ajuda aos políticos operários liberais da Rússia, os quais entendem por “negação” do papel do campesinato a relutância em levantar os camponeses para a revolução! É assim que se coloca atualmente a questão”(4).

Eis que esta particularidade do esquema de Trotski, que se manifesta no fato de que ele vê a burguesia, vê o proletariado, mas não nota o campesinato e não compreende o seu papel na revolução democrático-burguesa — é precisamente o que constitui o erro fundamental da oposição quanto à questão chinesa.

É aí precisamente que se encontra o “semi-menchevismo” de Trotski e da oposição quanto à questão do caráter da revolução chinesa.

Deste erro fundamental decorrem todos os demais erros da oposição e de toda a confusão nas teses da oposição relativas à questão chinesa.

III – O Kuomintang dos Direitistas em Nanquim, que Assassina os Comunistas, e o Kuomintang dos Esquerdistas em Wu-han, que Apóia a Aliança com os Comunistas

Consideremos, por exemplo, a questão de Wu-Han. As considerações do Komintern relativas à questão do papel revolucionário de Wu-Han são claras e conhecidas. Uma vez que a China passa pela revolução agrária; uma vez que a vitória da revolução agrária é a vitória da revolução democrático-burguesa, a vitória da ditadura revolucionária do proletariado e do campesinato; uma vez que Nanquim é o centro da contra-revolução nacional e Wu-Han é o centro do movimento revolucionário na China, então é indispensável o apoio ao Kuomintang de Wu-Han, é indispensável a participação dos comunistas neste Kuomintang e no seu governo revolucionário sob a condição de que seja assegurado o papel dirigente do proletariado e de seu Partido tanto dentro do Kuomintang quanto fora do Kuomintang.

É o governo atual de Wu-Han um órgão da ditadura revolucionária democrática do proletariado e do campesinato?. Não, por enquanto ainda não é nem será tão cedo este órgão. Mas têm todas as possibilidades de se desenvolver e se transformar num órgão desse tipo com o desenvolvimento posterior da revolução e com os êxitos desta revolução.

Tal é a orientação do Komintern.

Trotski considera a questão de maneira inteiramente diferente. Ele considera Wu-Han uma “ficção” e não um centro do movimento revolucionário. À indagação do que seja atualmente o Kuomintang de esquerda Trotski responde: “Por enquanto ainda não é nada, ou quase nada”.

Admitamos que Wu-Han seja uma ficção. Mas se Wu-Han é uma ficção, por que Trotski não exige uma luta decisiva contra esta ficção? Desde quando os comunistas começaram a apoiar uma ficção, participar de uma ficção, chefiar uma ficção, etc? Não é fato que os comunistas devem lutar contra as ficções? Não é fato que a recusa da luta contra as ficções da parte dos comunistas significa enganar o proletariado e o campesinato? Por que Trotski, portanto, não propõe a luta contra as ficções, embora por meio da saída imediata dos comunistas do Kuomintang de Wu-Han e do governo de Wu-Han? Porque Trotski propõe a permanência nesta ficção e não sair de lá? Portanto, onde está a lógica?

Essa incongruência “lógica” não se explica pelo fato de que Trotski, após haver levantado as mãos contra Wu-Han e após denominá-lo ficção, se acovardou depois e não se decidiu a tirar a conclusão correspondente, nas suas teses?

Ou, por exemplo, consideremos Zinoviev. Nas suas teses distribuídas ao pleno do CC do PC (b) da URSS, em abril deste ano, Zinoviev qualifica o Kuomintang de Wu-Han como um governo dos kemalistas do período de 1920. Mas o governo dos kemalistas é um governo de luta contra os operários e camponeses, um governo onde não há e não pode haver lugar para os comunistas. Tem-se a impressão que de uma tal qualificação do governo de Wu-Han só se pode tirar uma conclusão: uma luta decisiva contra Wu-Han e a derrubada do governo de Wu-Han.

Mas assim podem pensar as pessoas comuns que têm uma lógica humana comum.

Zinoviev não pensa assim. Ao qualificar o governo de Wu-Hu em Hankoi, de governo dos kemalistas, propõe ao mesmo tempo prestar o apoio mais enérgico a este mesmo governo, que os comunistas não saiam dele, não abandonem o Kuomintang em Wu-Han, etc.. Afirma claramente:

“É necessário prestar a ajuda mais enérgica e por todos os meios a Hankoi organizando ali a repulsa aos Kaveniaks. É necessário concentrar esforços no futuro imediato justamente em ajudar os trabalhos de organização e de consolidação em Hankoi”. (Vide as teses de Zinoviev).
Entenda quem puder!

Trotski afirma que Wu-Han, isto é, Hankoi, é uma ficção. Zinoviev, ao contrário, afirma que Wu-Han é um governo dos kemalistas. Daqui se deveria tirar uma conclusão: a luta contra as ficções ou a luta pela derrubada do governo de Wu-Han. Mas tanto Trotski como Zinoviev recuam diante da conclusão que inevitavelmente decorre das suas premissas e Zinoviev até mesmo avança mais, propondo “a ajuda mais enérgica e por todos os meios a Hankoi”.

O que revela tudo isso? Revela que a oposição se perdeu em contradições. Perdeu a capacidade de pensar logicamente e perdeu todas as perspectivas.

A confusão nos pontos de vista e a perda de qualquer perspectiva quanto à questão de Wu-Han — esses são os princípios de Trotski e da oposição, se em geral se pode denominar a confusão de princípios.

                       IV – Sobre os Soviets de Deputados, Operários e Camponeses na China

Ou consideremos ainda, por exemplo, a questão dos Soviets de deputados, operários e camponeses na China.

Quanto à questão da organização dos Soviets possuímos três resoluções aprovadas no II Congresso do Komintern: as teses de Lênin sobre a formação de Soviets não proletários e camponeses nos países atrasados, as teses de Roi sobre a formação de Soviets operários e camponeses em países como a China e a Índia e teses especiais relativamente a “Quando e sob que condições pode-se criar Soviets de deputados operários”.

As teses de Lênin tratam da formação de Soviets “camponeses”, “populares” e não proletários em países do gênero da Ásia Central, onde não há ou quase não há proletariado industrial. Nas teses de Lênin não há nenhuma palavra sobre a formação de Soviets de deputados operários em tais países. Note-se que as teses de Lênin consideram como uma das condições indispensáveis do desenvolvimento e da formação de Soviets “camponeses” e “populares” nos países atrasados o apoio direto do proletariado da URSS à revolução nesses países. É claro que estas teses não têm em vista a China ou a Índia, onde há um mínimo conhecido de proletariado industrial e onde a criação de Soviets operários constitui, em determinadas condições, a premissa da formação de Soviets camponeses, mas outros países, mais atrasados, do gênero da Pérsia, etc.

As teses de Roi têm em vista, principalmente, a China e a Índia, onde há um proletariado industrial. Nestas teses propõe-se a formação, em determinadas condições, no período de transição da revolução burguesa à revolução proletária — de Soviets de deputados operários e camponeses É claro que estas teses se referem diretamente à China.

As teses particulares do II congresso sob o título” Quando e sob que condições pode-se criar Soviets de deputados operários” falam sobre o papel dos Soviets dos deputados operários na base da experiência da Revolução na Rússia e na Alemanha. Estas teses afirmam que os

“Soviets sem a revolução proletária se transformam inevitavelmente em paródia de Soviets”.
É claro que na análise da questão sobre a formação imediata dos Soviets de deputados operários e camponeses na China devemos também ter em conta estas últimas teses.

Como se coloca o problema da formação imediata dos Soviets de deputados operários e camponeses na China se se levar em conta, nesse sentido, tanto a situação da China no momento atual e a existência do Kuomintang em Wu-Han como centro do movimento revolucionário como também as indicações das duas últimas teses do II congresso do Komintern?

Criar Soviets de deputados operários e camponeses agora, por exemplo na região em que se desenvolve a atividade do governo de Wu-Han — significa criar um duplo poder, apresentar a palavra de ordem de luta pela derrocada do Kuomintang de esquerda e da formação de um novo poder, soviético, na China.

Os Soviets de deputados operários e camponeses são órgãos de luta pela derrocada do poder existente, órgãos de luta por um novo poder. O aparecimento dos Soviets de deputados operários e camponeses não pode deixar de criar um duplo poder, e um duplo poder não pode deixar de tornar mais aguda a questão relativa a quem deve pertencer todo o poder.

Como se apresentou o problema na Rússia em março, abril, maio e junho de 1917? Existia então um governo provisório que tinha em suas mãos a metade do poder, mas talvez um poder mais efetivo, uma vez que as tropas ainda continuavam a apoiá-lo. Ao seu lado existiam os Soviets de deputados operários e soldados que também tinham em suas mãos uma espécie de metade do poder, embora um poder não tão real como o do governo provisório. A palavra de ordem dos bolcheviques apelava então para o afastamento do governo provisório e para a transmissão de todo o poder aos Soviets de deputados operários e soldados. Ninguém entre os bolcheviques pensava então em ingressar na composição do governo provisório uma vez que não se pode fazer parte de um governo se se caminha no sentido de derrubar esse governo.

Pode-se dizer que a situação vigente na Rússia de março a junho de 1917, seja análoga à situação atual da China? Não, não se pode afirmá-lo. Não se pode afirmá-lo não apenas porque a Rússia se encontrava então diante da revolução proletária, enquanto que a China se encontra atualmente diante da revolução democrático-burguesa, mas também porque o governo provisório na Rússia era então um governo contra-revolucionário e imperialista, enquanto que o governo atual de Wu-Han é um governo anti-imperialista e revolucionário no sentido democrático-burguês desta palavra.

E o que nos oferece, nesse sentido, a oposição?

Ela nos propõe a criação imediata dos Soviets de deputados operários, camponeses e soldados na China, como centros de organização do movimento revolucionário. Mas os Soviets de deputados operários e camponeses não são apenas centros de organização do movimento revolucionário, são, antes e acima de tudo, órgãos de insurreição contra o poder existente, órgãos de formação de um novo poder revolucionário. A oposição não compreende que somente como órgãos de insurreição e somente como órgãos de um novo poder — os Soviets de deputados operários e camponeses podem ser transformados em centros do movimento revolucionário. Sem isto os Soviets de deputados operários se transformam numa ficção, em apêndice do poder existente, como aconteceu na Alemanha em 1918 e na Rússia em julho de 1917.

Será que a oposição compreende que a criação dos Soviets de deputados operários e camponeses agora significa a criação de um duplo poder, o poder dos Sovietes e o poder do governo de Wu-Han e conduz obrigatória e infalivelmente à palavra de ordem de derrubada do governo de Wu-Han?

Duvido muito que Zinoviev tenha compreendido essa verdade simples. Mas Trotski compreende isso muito bem, porque ele afirma claramente nas suas teses que:

“a palavra de ordem dos Soviets significa um apelo à criação de órgãos efetivos do poder através do regime de transição de dois poderes”. (Vide teses de Trotski “A revolução chinesa e as teses de Stálin”). i
Conclui-se dessa forma que, ao criar Soviets na China, criamos ao mesmo tempo um “regime de duplo poder”, derrubamos o governo de Wu-Han e formamos um novo poder revolucionário. É evidente que Trotski toma aqui da história da revolução na Rússia, o período anterior a outubro de 1917 como modelo dos acontecimentos. Houve então entre nós, realmente, um duplo poder, e nós, realmente, derrubamos então o governo provisório.

Mas eu já afirmei que ninguém pensava naquela ocasião em fazer parte do governo provisório. Por que então Trotski não propõe agora a saída imediata dos comunistas do Kuomintang e do governo de Wu-Han? Como se pode criar Soviets, criar um regime de duplo poder e ao mesmo tempo fazer parte do próprio governo de Wu-Han que se pretende derrubar? As teses de Trotski não nos dão uma resposta a esta pergunta.

E é evidente ainda que aqui Trotski se perde no labirinto de suas próprias contradições, sem esperanças de salvação. Confundiu a revolução democrático-burguesa com a revolução proletária. Ele “se esqueceu” de que a revolução democrático-burguesa na China não só ainda não está terminada e não só ainda não venceu, mas está apenas na primeira fase de seu desenvolvimento. Trotski não compreende que recusar o apoio ao governo de Wu-Han, apresentar a palavra de ordem de duplo poder e derrubar o governo de Wu-Han agora através da formação imediata dos Soviets — isso significa prestar apoio direto e franco a Chiang Kai-Shek a Tchan Tso-Lin.

Afirmam-nos: então como compreender, em tal caso, a formação dos Soviets de deputados operários em 1905 na Rússia — uma vez que nessa ocasião não estávamos na revolução democrático-burguesa?

Mas, em primeiro lugar, os Soviets eram então ao todo dois — o de Petersburgo e o de Moscou e a existência de dois Soviets ainda não criava um sistema de poder Soviético na Rússia.

Em segundo lugar os Soviets de Petersburgo e de Moscou eram então órgãos de insurreição contra o antigo governo , o governo tzarista , o que uma vez mais confirma que não se pode considerar os Soviets apenas como meros centros de organização da revolução e que os Soviets podem ser centros desse gênero somente como órgãos de insurreição e órgãos de um novo poder.

Em terceiro lugar a história dos Soviets operários nos afirma que Soviets desse gênero podem existir e se desenvolver mais apenas no caso em que haja condições favoráveis para a passagem direta da revolução democrático-burguesa para a revolução proletária, se se tiverem, por conseguinte, condições favoráveis para a passagem do poder da burguesia para a ditadura do proletariado.

Não foi porque não houve então essas condições favoráveis que pereceram os Soviets operários em Petersburgo e em Moscou em 1905 assim como os Soviets operários na Alemanha em 1918?

É possível que não tivesse havido Soviets na Rússia em 1905, se existisse então na Rússia uma ampla organização revolucionária do gênero do atual Kuomintang de esquerda na China. Mas uma tal organização não podia existir então na Rússia porque não havia elementos de opressão nacional sobre os operários e camponeses russos, os próprios russos oprimiam outras nacionalidades e uma organização do gênero do Kuomintang de esquerda pode surgir somente nas condições de opressão nacional da parte de imperialistas estrangeiros, unificando numa ampla organização os elementos revolucionários do país.

Somente os cegos podem negar ao Kuomintang de esquerda o papel de órgão da luta revolucionária, o papel de órgão de insurreição contra as sobrevivências feudais e o imperialismo na China.

Mas o que se segue daí?

Daí se segue que o Kuomintang de esquerda na China representa para a atual revolução democrático-burguesa na China aproximadamente o mesmo papel que os Soviets representaram em 1905 para a revolução democrático-burguesa na Rússia.

O problema seria outro se não houvesse na China uma organização tão popular e democrático-revolucionária do gênero do Kuomintang de esquerda. Mas uma vez que existe essa organização revolucionária específica, adaptada às particularidades das condições chinesas e que já demonstrou ser adequada para o desenvolvimento posterior da revolução democrático-burguesa na China — seria estúpido e insensato destruir agora uma organização criada durante anos quando acaba de se iniciar a revolução democrático-burguesa que ainda não venceu e não vencerá tão cedo.

Partindo disto alguns camaradas tiram a conclusão de que se poderá aproveitar o Kuomintang no futuro, por ocasião da passagem à revolução proletária, como forma da organização estatal da ditadura do proletariado e nesse sentido vêm nisto a possibilidade da passagem pacifica da revolução democrático-burguesa para a revolução proletária.

A possibilidade do desenvolvimento pacífico da revolução sem dúvida não esta excluída, falando-se de maneira geral. Entre nós, na Rússia, falou-se também em princípios de 1917 sobre a possibilidade do desenvolvimento pacífico da revolução através dos Soviets.

Mas, em primeiro lugar, o Kuomintang não é os Soviets e se se acha adaptado à tarefa do desenvolvimento da revolução democrático-burguesa isso ainda não significa que possa ser adaptado à tarefa do desenvolvimento da revolução proletária, uma vez que os Soviets de deputados operários são a forma mais própria da ditadura do proletariado.

Em segundo lugar, mesmo com a existência dos Soviets na Rússia em 1917 não teve lugar, na realidade a passagem pacífica para a revolução proletária.

Em terceiro lugar, há tão poucos centros proletários na China e os inimigos da revolução chinesa são tão fortes e numerosos que todo avanço da revolução e todo ataque da parte dos imperialistas serão infalivelmente acompanhados de novas cisões no Kuomintang e de novo fortalecimento do Partido Comunista às custas da autoridade do Kuomintang.

Penso ser necessário considerar excluído o caminho pacífico de desenvolvimento da revolução chinesa.

Penso que se terá de criar Soviets de deputados operários e camponeses na China no período de transição da revolução democrático-burguesa à revolução proletária. Isso porque é impossível uma passagem desse gênero nas condições atuais sem os Soviets de deputados operários e camponeses.

É preciso primeiro permitir que o movimento agrário se desenvolva por toda a China, é preciso fortalecer o governo de Wu-Han e apoiá-lo na luta contra o regime feudal-burocrático, é preciso ajudar o governo de Wu-Han a conseguir a vitória sobre a contra-revolução, é preciso desenvolver amplamente e por toda parte as uniões camponesas, os sindicatos operários e outras organizações revolucionárias, como bases para a criação dos Soviets no futuro, é preciso permitir que o Partido Comunista fortaleça sua influência entre o campesinato e no exército — e somente após isso é que se pode criar Soviets de deputados operários e camponeses como órgãos de luta pelo novo poder, como fatores do duplo poder, como fatores de preparação da passagem da revolução democrático-burguesa para a revolução proletária.

A criação dos Soviets operários na China não é uma palavra vazia, uma tirada “revolucionária” vazia. Não se pode considerar essa questão com tanta leviandade como o faz Trotski.

Formar Soviets operários e camponeses — significa, em primeiro lugar, sair do Kuomintang, uma vez que não se pode criar os Soviets e fazer avançar o duplo poder, apelando para os operários e camponeses no sentido da criação de um novo poder, e continuar ao mesmo tempo no Kuomintang e no seu governo.

Criar Soviets de deputados operários significa, ainda, substituir o bloco atual que se encontra dentro do Kuomintang por um bloco fora do Kuomintang, por um bloco análogo ao bloco que existia entre os bolcheviques e os social-revolucionários de esquerda em 1917. Por que?

Porque se ali, onde existe a revolução democrático-burguesa, trata se da criação da ditadura revolucionária do proletariado e do campesinato e a isto corresponde integralmente a política do bloco dentro do Kuomintang, então aqui, para a formação dos Soviets e no período de transição à revolução proletária, tratar-se-á da criação da ditadura do proletariado, da criação do poder dos Soviets e só se pode preparar e criar um tal poder sob a direção de um único Partido, o Partido Comunista.

Prossigamos. Os Soviets de deputados operários assumem sérios compromissos. Atualmente na China os operários recebem de 8 a 15 rublos por mês, vivem em condições insuportáveis e trabalham demasiadamente É necessário e possível pôr fim a tal situação agora mesmo, aumentando-se os salários, introduzindo o horário de oito horas de trabalho por dia, melhorando as condições de habitação da classe operária, etc. Mas com a existência dos Soviets de deputados operários os trabalhadores não pararão aí. Dirão aos comunistas (e com toda razão): se temos os Soviets e os Soviets são órgãos do poder, então não se pode apertar um pouco a burguesia e expropriá-la “um pouquinho”? Os comunistas se tornarão uns meros palradores se não tomarem o caminho da expropriação da burguesia com a existência dos Soviets de deputados operários e camponeses.

Pergunta-se: é possível e é necessário tomar esse caminho agora, na fase atual da revolução?

Não, não é necessário.

É possível e é necessário desistir no futuro da expropriação da burguesia na vigência dos Soviets operários e camponeses? Não, não é possível. Mas pensar que se possa, nessa eventualidade, manter o bloco dos comunistas dentro do Kuomintang — significa incorrer em ilusão e não compreender a mecânica da luta das forças de classe no período de transição da revolução burguesa para a revolução proletária.

Eis como se coloca o problema da formação dos Soviets de deputados operários e camponeses na China.

Como se vê, esse problema não é tão simples como o nos apresentam algumas pessoas desmedidamente insensatas, do gênero de Trotski e Zinoviev.

É admissível, em geral, do ponto de vista de princípios, a participação dos marxistas e a cooperação com a burguesia revolucionária num partido democrático-revolucionário comum ou num governo democrático-revolucionário comum?

Alguns dos oposicionistas pensam que isso não seja admissível. Mas a história do marxismo nos afirma que em determinadas condições e por determinado prazo tal participação é inteiramente admissível.

Eu poderia citar como exemplo o que aconteceu com Marx em 1848 na Alemanha, por ocasião da revolução contra o absolutismo germânico, quando Marx e os seus partidários ingressaram numa aliança democrático-burguesa na província do Reno e quando o órgão desse partido democrático-revolucionário era a “Nova Gazeta Renana”, tendo Marx como redator.

Encontrando-se nesta aliança democrático-burguesa e fazendo avançar a burguesia revolucionária, Marx e seus partidários criticavam por todas as formas as vacilações dos seus aliados da direita, da mesma maneira que o partido Comunista na China, encontrando-se no Kuomintang, deve criticar por todas as formas as indecisões e as vacilações dos seus aliados esquerdistas do Kuomintang.

Sabe-se que foi somente na primavera de 1849, que Marx e seus partidários abandonaram esta aliança democrático-burguesa e procederam a organização independente da classe operária com uma política de classe completamente independente.

Como se vê, Marx foi ainda mais longe do que o Partido Comunista Chinês que faz parte do Kuomintang como partido independente de classe do proletariado.

Pode-se discutir ou não sobre a conveniência do ingresso de Marx e de seus partidários nessa aliança democrática burguesa em 1848. Rosa de Luxemburgo era de opinião, por exemplo, que Marx não deveria ter ingressado nessa aliança democrático-burguesa. É uma questão de tática. Mas não pode haver dúvida alguma de que Marx e Engels admitiam. em princípio, a possibilidade e a conveniência do ingresso num partido burgues-revolucionário no período da revolução democrático-burguesa. sob determinadas condições e por determinado prazo. No que diz respeito à participação dos marxistas num governo revolucionário-democrático e à cooperação ali com a burguesia revolucionária, sob determinadas condições e em determinada situação, temos as indicações de marxistas da envergadura de Engels e Lênin. Sabe-se que Engels se manifestou a favor dessa participação na sua brochura “O trabalho dos bakuninistas”. Sabe-se que Lênin, em 1905, também se manifestou admitindo uma tal participação num governo revolucionário democrático-burguês.

                                                                 V – Duas Linha

Assim, acham-se diante de nós duas linhas inteiramente diferentes quanto à questão chinesa — a linha do Komintern e a linha de Trotski e de Zinoviev.

Linha do Komintern. As sobrevivências feudais e a super-estrutura burocrática e militarista que se assenta sobre as mesmas, apoiada por todas as formas pelos imperialistas de todos os países, constituem o fato fundamental da realidade chinesa atual.

A China passa no momento atual pela revolução agrária dirigida tanto contra as sobrevivências feudais como contra o imperialismo.

A revolução agrária constitui a base e o conteúdo da revolução, democrático-burguesa na China.

O Kuomintang de Wu-Han e o governo de Wu-Han, formam o centro do movimento revolucionário democrático-burguês.

Nanquim e o governo de Nanquim representam o centro da contra revolução nacional.

A política de apoio à Wu-Han é ao mesmo tempo a política de desenvolvimento da revolução democrático-burguesa com todas as consequências que daí decorrem. Daí a participação dos comunistas no Kuomintang de Wu-Han e no governo revolucionário de Wu-Han, participação que não exclui mas supõe a crítica, em todos os sentidos, dos comunistas às indecisões e vacilações dos seus aliados do Kuomintang.

Esta participação dos comunistas deve ser utilizada para facilitar ao proletariado o papel hegemônico na revolução democrático-burguesa na China e aproximar o momento da passagem para a revolução proletária.

No momento em que a revolução democrático-burguesa se aproximar da vitória completa e quando no decorrer da revolução burguesa se delinearem os caminhos para a passagem à revolução proletária — nesse momento é preciso se criar os Soviets de deputados operários, camponeses e soldados como fatores de duplo poder, como órgãos de luta por um novo poder, como órgãos de um novo poder, do poder dos Soviets.

Nessa ocasião o bloco dos comunistas dentro do Kuomintang deve ser substituído pelo bloco fora do Kuomintang, e o Partido Comunista deve se tornar o único dirigente da nova revolução na China.

Propor agora, como o fazem Trotski e Zinoviev, a formação imediata dos Soviets de deputados operários e camponeses e a criação imediata de um duplo poder, quando a revolução democrático-burguesa ainda se encontra na fase inicial de seu desenvolvimento, quando o Kuomintang constitui a forma de organização da revolução nacional-democrática mais adequada e que melhor corresponde às particularidades específicas da China — significa desorganizar o movimento revolucionário, enfraquecer Wu-Han, facilitar a sua queda e prestar ajuda a Tchan Tso-Lin e à Chiang Kai-Shek.

A linha de Trotski e de Zinoviev. Sobrevivências do feudalismo na China — trata-se de uma invenção de Bukarin. Ou de todo não existem na China, ou então são tão insignificantes que não podem ter qualquer significação séria.

Na realidade, existe atualmente uma revolução agrária na China. Mas de onde surgiu, nem o próprio diabo o sabe. (Risos).

Mas uma vez que ela, esta mesma revolução agrária, existe, então não há dúvida de que se tem de apoiá-la de uma forma ou de outra.

O elemento principal aqui não está na revolução agrária, mas na revolução pela independência alfandegária da China, na revolução, por assim dizer, anti-alfandegária.

O Kuomintang de Wu-Han e o governo de Wu-Han ou são uma “ficção” (Trotski) ou o kemalismo (Zinoviev).

Por um lado, é preciso criar um duplo poder para a derrocada do governo de Wu-Han por meio da formação imediata dos Soviets (Trotski). Por outro lado, é necessário fortalecer o governo de Wu-Han, é indispensável uma ajuda enérgica e por todas as formas ao governo de Wu-Han, também, sem dúvida, por meio da formação imediata dos Soviets (Zinoviev).

Como regra, seria melhor que os comunistas saíssem imediatamente desta “ficção”, do governo de Wu-Han e do Kuomintang de Wu-Han. E, aliás, seria melhor que eles permanecessem nesta mesma “ficção”, isto e, tanto no governo de Wu-Han como no Kuomintang de Wu-Han. E para que vão ficar no Wu-Han, se o Wu-Han é uma “ficção” — isto, de fato, somente Deus sabe. E quem não concordar com isto, — é um apóstata e traidor.

Tal é a chamada linha de Trotski e Zinoviev.

É difícil se poder apresentar algo mais incongruente e confuso do que esta pretensa linha.

Tem-se a impressão de que não estamos tratando com marxistas, mas com certos burocratas afastados da vida ou, ainda melhor — com turistas “revolucionários” que viajaram de Seca à Meca, deram uma espiada pelo VII pleno ampliado do Comitê Executivo do Komintern que apresentou os princípios fundamentais da revolução chinesa, souberam depois pelos jornais que na China de fato havia uma certa revolução, não se sabe se agrária ou anti-alfandegária, e decidiram que é necessário compor todo um monte de teses — em abril as primeiras teses em princípios de maio outras teses, no fim de maio as terceiras teses e, após haverem composto todo um monte de teses, atirá-las contra o Comitê Executivo do Komintern, evidentemente supondo que a abundância de teses confusas e contraditórias constitui o meio principal de salvação da revolução chinesa.

Tais são, camaradas, as duas linhas relativas às questões da revolução chinesa.

Vocês terão que escolher uma dessas duas linhas.

Termino, camaradas.

Ao terminar desejaria dizer algumas palavras sobre o sentido político e a significação dos discursos fracionistas de Trotski e Zinoviev no momento atual. Eles se queixam de que não se lhes permite a necessária liberdade para lançar insultos e impropérios sem precedentes contra o CC do PC (b) da URSS e o CE. da IC. Queixam-se do “regime” vigente no Komintern e no PC (b) da URSS. Querem, em suma, liberdade para a desorganização do Komintern e do PC (b) da URSS. Querem, em suma, transplantar para o Komintern e o PC (b) da URSS os costumes e hábitos de Maslov & Cia..

Devo dizer, camaradas, que Trotski escolheu um momento demasiadamente impróprio para os seus ataques contra o Partido e o Komintern. Acabo de receber a notícia de que o governo conservador inglês decidiu romper relações com a URSS. Não há necessidade de demonstrar que agora se desencadeará em toda parte uma campanha contra os comunistas. Esta campanha já começou. Alguns ameaçam o PC (b) da URSS com a guerra e a intervenção. Outros — com a cisão. Forma-se uma espécie de frente única que vai de Chamberlain a Trotski.

É possível que queiram nos amedrontar com isto. Mas duvido que seja necessário demonstrar que os bolcheviques não são crianças que se deixam atemorizar. A história do bolchevismo conhece muitas “frentes” desse gênero. A história do bolchevismo demonstra que essas “frentes” foram invariavelmente destroçadas pela decisão revolucionária e pela bravura sem precedentes dos bolcheviques.

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Notas:
(1) Nota da edição russa das obras de Stálin: — O VIII Pleno do Comitê Executivo da Internacional Comunista realizou-se de 13 a 30 de Maio de 1927 em Moscou. O Pleno debateu as tarefas do Komintern na luta contra a guerra e a ameaça de guerra, as tarefas do Partido Comunista da Inglaterra, as questões da revolução chinesa, etc. J. V. Stálin pronunciou o discurso “A revolução na China e as tarefas da Internacional Comunista” na décima sessão do pleno, realizada em 24 de maio. O pleno fez uma apreciação da situação internacional, estabeleceu o programa de luta contra a ameaça de guerra, e, em ligação com o rompimento, pela Inglaterra, das relações diplomáticas e comerciais com a URSS, aprovou um apelo “Aos operários e camponeses de todo o mundo. A todos os povos oprimidos. Aos soldados e marinheiros”. Os líderes do bloco anti-partidário trotskista-zinovievista se aproveitaram do aguçamento da situação internacional da URSS e intervieram no pleno com ataques caluniosos contra a direção do Komintern e do PC (b) da URSS. Por meio de uma resolução especial o pleno condenou severamente a conduta divisionista dos líderes da oposição e os advertiu que se continuassem a luta de frações, seriam excluídos do Comitê Executivo do Komintern. 
(2) Trata-se do apelo do Comitê Executivo da Internacional Comunista de 14 de abril de 1927: “Aos proletários e camponeses de todo o mundo. A todos os povos oprimidos”. O apelo foi publicado no jornal “Pravda” n.” 85, de 15 de abril de 1927. 
(3) N. R. — Gentry: aristocracia rural. 
(4) V. I. Lênin — Obras, tomo XVIII, págs. 317-318, edição russa. Moscou.