Colômbia – A Verdadeira Situação do País
Ao examinar a economia colombiana no ano de 1980, o presidente Turbay afirmou que, se bem o crescimento econômico tivesse sido inferior ao dos anos anteriores, o país tinha vivido um ritmo de expansão acompanhado de fatores positivos: a redução da inflação, a politica de preços internos, particularmente no setor energético, e a passagem, sem traumatismo, de uma situação "atípica" de desenvolvimento acelerado para outra "normal" de crescimento mais lento.
INFLAÇÃO
Contra toda evidência, derivada da penosa situação do povo colombiano, o governo ajustou a percentagem da inflação para 1980 em, aproximadamente, 26%, dois pontos menos do que em 1979. Independentemente do que têm de enganador esses danos, que se chocam com a pequena capacidade de compra dos trabalhadores, com a falta dos alimentos indispensáveis na maioria dos lares colombianos, e com a impossibilidade de obter serviços de saúde, educação etc…, a inflação, como mal crônico, é, no país, um fator que pesa gravemente sobre as massas trabalhadoras, acentuando o seu maior empobrecimento, pois, à medida que conduz à elevação geral e rápida dos preços dos artigos de consumo, atua como oneroso imposto indireto sobre todo o povo. Cada peso (moeda colombiana) a mais que as massas têm de entregar, a fim de conseguir a mesma mercadoria, ou menos, vai parar no bolso de um punhado de exploradores. Bem sabemos que na época dos monopólios, o contínuo incremento dos preços, manejados pelos monopolistas, converte-se num dos métodos mais eficazes para aumentar os lucros e garantir a elevação da rentabilidade de suas inversões. Com este jogo sujo, todas as mercadorias aumentam de preço, à exceção da mercadoria força de trabalho, reduzindo de forma constante o valor do salário real.
"(…) a inflação (…) é, no país, um fator que pesa gravemente sobre as massas trabalhadoras”.
Daí por que as medidas antiinflacionárias do governo jamais serão dirigidas contra as verdadeiras causas da inflação. Todo alvoroço em torno da política monetária do governo, do controle do crédito, das restrições à elevação dos meios de pagamento etc., é simples ajuste na circulação monetária tendente a ocultar a essência daquele fenômeno, instrumento de espoliação nas mãos da burguesia. Com tais medidas, intentam os governantes aliviar um pouco a pressão social existente, que cresce sem cessar, pois os trabalhadores intensificam as lutas contra o rebaixamento de suas condições de vida.
PREÇO DOS COMBUSTÍVEIS
O segundo fator considerado positivo pelo presidente Turbay seria o de ter mantido "uma política o mais realista possível em matéria de preços internos de energia". É bom recordar que o aumento dos preços em matéria energética (aqui se incluem os combustíveis), afeta todos os demais artigos de consumo e desencadeia de imediato uma onda altista. Para o governo, o termo "realista" significa o encarecimento constante e progressivo da energia em detrimento dos consumidores, ao mesmo tempo em que melhoram as condições para elevar os lucros das grandes companhias que operam nesse ramo. Aos olhos da burguesia mundial, o problema energético constitui a causa da crise que ameaça a civilização construída sobre a base do petróleo. E com todo esse ambiente de atemorização, ela pretende que sejam o proletariado e os povos dos distintos países aqueles a carregar as conseqüências da escassez de combustível e a se sacrificar em benefício do imperialismo.
"pretende que sejam o proletariado e os povos dos distintos países aqueles que a carregar as conseqüências da escassez de combustível e a se sacrificar em benefício do imperialismo”.
O governo de Turbay, fazendo coro com a burguesia imperialista, vem aplicando uma política de acréscimos graduais, disfarçados de "realismos", com a pretensa finalidade de solucionar a crise energética. No curso de 1980, os aumentos decretados no preço da gasolina atingiram o nível de 69%, que se sabe muito bem sobre quem recaem. Porém, esse governo entreguista nada diz acerca da longa história de traições da burguesia colombiana que serviu numa bandeja de prata nosso petróleo aos imperialistas norte-americanos não apenas para que o explorassem de forma predatória, mas também a fim de controlarem o conhecimento do potencial real petrolífero do país e dominar:.em sua comercialização, impondo os preços. É bom salientar igualmente que 1980 se caracterizou pela infame entrega das grandes reservas de carvão das minas de El Cerrejon à multinacional EXXON, do grupo Rockefeller, sob a forma de contrato de Associação, a mesma que está sendo utilizada na exploração estrangeira do nosso petróleo.
DESAQUECIMENTO ECONÔMICO
O terceiro fator dito positivo do presidente Turbay refere-se à passagem não-traumática a um período de crescimento menos acelerado da economia. Evidentemente a burguesia não contará com a bonança cafeeira e tampouco é clara a perspectiva de incrementar as exportações não tradicionais, em face da tática atual do imperialismo e dos problemas agudos vividos pelos países altamente desenvolvidos. Isso trará conseqüências inevitáveis no que respeita à disponibilidade de divisas e à balança cambial.
Não é demais fazer uma referência à recessão que se verifica nos países capitalistas e também na Colômbia, assim como as difíceis condições econômicas internacionais dentro das quais os índices de crescimento registrados pela burguesia deixam muito a desejar. O comércio internacional, sob o domínio dos países imperialistas, está ordenado segundo os seus interesses. Nesse comércio, a participação dos países dependentes somente cresce enquanto favorece àqueles interesses, acomode-se à sua tática ou se coloque como necessária para adiar a revolução e minorar a crescente pressão social.
Atualmente, sem a bonança cafeeira, a burguesia colombiana volta suas vistas para as exportações diferentes das do café. Particularmente para os artigos manufaturados. No entanto, devido à importação de capitais, às inversões imperialistas disfarçadas de créditos, às indústrias mistas, e a outras formas que adquire hoje a internacionalização do capital, grande parte de nossas exportações de manufaturas está nas mãos das multinacionais. Por sua vez, não se pode desconhecer que os mercados internacionais encontram-se abarrotados e que a competitividade de nossos produtos, longe de melhorar, piorou. Em tais condições, os planos de exportação esbarram em claras limitações.
Tomemos, por exemplo, o mercado exterior para os têxteis colombianos. Com a penetração do capital estrangeiro na indústria manufatureira de Taiwan, Hong Kong, Singapura e outros lugares, e a elevada produção de têxteis nessas áreas, o imperialismo tem de abrir mercado à sua realização. Ademais, a China, com mão-de-obra barata e hábil nesse ramo, apresta-se também a receber quota no mercado norte-americano de tecidos. A par destes fatores, os países altamente desenvolvidos, ainda que desloquem ramos industriais com processos tecnológicos para eles obsoletos a fim de aproveitar a força de trabalho mais barata nos países dependentes, reservando para si as indústrias estratégicas, não prescindem daqueles ramos em termos absolutos, já que o problema do desemprego, que adquire características dramáticas e ameaçadoras, se agravariam, alcançando níveis insuportáveis; por isso, conservam alguns desses setores industriais em seu território, e, igualmente por essa razão, aplicam regimes alfandegários protecionistas que atuam como barreira à importação de manufaturados dos países dependentes. "(…) os problemas do lento crescimento, da recessão aberta, da inflação, do desemprego e outros estão se agravando”.
A oligarquia crioula sabe que, tanto na Colômbia como no mundo inteiro, as perspectivas são obscuras, os problemas do lento crescimento, da recessão aberta, da inflação, do desemprego e outros estão se agravando. Portanto, o ano de 1981 não será nada promissor. A passada prosperidade cafeeira, decorrente das geadas ocorridas no Brasil e das dificuldades existentes na América Central e na África (produtores de café), agora desapareceu. Daí Turbay considerar como fenômeno positivo os baixos ritmos de crescimento da economia. Os índices da produção industrial, da agropecuária, da construção e do comércio apresentados pelos órgãos oficiais, não apenas são reduzidos, mas acham-se bastante distanciados das necessidades da população, de tal forma que o incremento constante nessas áreas cria, dia a dia, maior abismo entre produtores e consumidores. As massas trabalhadoras sabem, por experiência própria, que enquanto existir a exploração capitalista, o aceno de melhoramento substancial de suas condições de vida não passa de chamariz demagógico para lograr apoio político.
REALIZAÇÔES ENGANOSAS
O governo faz barulhenta campanha em torno dos três chamados fatores objetivos: o crescimento de inversões públicas, o PIN (entidade ligada ao Estado) e aos manejos fiscais. A manipulação de cifras permite a Turbay falar do crescimento de inversões sem desdobramento inflacionário. Na realidade, esse crescimento não tem sido tão notável, pois apenas parte do que se recolhe para esse fim é aplicada. O pior ainda é que as receitas governamentais, tanto em 1979 como em 1980, provêm, em quantias consideráveis, do endividamento externo, de modo que a inversão pública significa o aprofundamento da nossa dependência. Além do mais, os gastos de funcionamento – ou seja, o que é empregado com a burocracia – consomem as maiores porcentagens dessa inversão. E o que sobra dedica-se a infra-estruturas enquadradas nas necessidades do capital imperialista que exige, para sua expansão, melhoramento em obras básicas, em vias de transporte, em energia etc.
As poucas realizações do PIN representam ordenamento oficial para atrair o capital estrangeiro e favorecer os monopólios, comportando, em nossas condições econômicas, sérios elementos inflacionários que vêm piorar a situação do povo. Vale a pena mencionar que as inversões estrangeiras autorizadas pelo governo, durante 1980, foram seis vezes superiores às do ano anterior.
Quanto à política fiscal, a experiência mostra que os impostos indiretos cobrados ao povo quotidianamente nos artigos de consumo, nas diversões, nas atividades culturais, no transporte etc., somados à captação de créditos externos, constituem a base principal das receitas estatais. Estes os fatores do aumento das receitas em 51% comparado com as do ano anterior. Todo colombiano sabe que quem menos tem é quem mais paga.
"(…) das mãos do atual governo ou de qualquer outro que defenda o sistema capitalista, só poderá vir maior miséria e opressão”.
Chega a ser ofensiva, nessas condições, a atitude do governo – dando-se ares demagógicos – no que concerne ao aumento do salário mínimo que ele pretende ter sido superior à inflação. Os problemas gritantes da fome e da desnutrição, a falta absoluta de habitação para milhões de pessoas, as percentagens aterradoras da mortalidade infantil e das doenças na população, as legiões de desempregados, de crianças sem escolas e a insuficiência de serviços médicos são provas irrefutáveis da piora das condições de vida de nosso povo.
A única realidade para o proletariado e os habitantes do país é a certeza de que, das mãos da burguesia, das mãos do atual governo ou de qualquer outro que defenda o sistema capitalista, só poderá vir maior miséria e opressão. Frente a isto, resta às massas impulsionar sua luta, reforçar sua unidade e sua organização com o objetivo de impor soluções que o momento exige.
DEMAGOGIA E FASCISMO
O presidente Turbay também põe em relevo a política demagógica do atual governo. Ainda que não seja novo o conteúdo dessa política, apresenta particularidades que se devem ter em conta, devido a suas implicações com a presente situação. Nesse marco se inscrevem a Lei sobre a Anistia, as propostas de entendimento, a mentirosa promessa de "prosseguir sua tarefa de restauração procurando o bem-estar do nosso povo" e o chamamento a "afiançar a paz e a harmonia em nossa pátria".
A verdade é que a anistia governamental não merece a credibilidade do povo colombiano. Por essa razão, o presidente repete que a anistia "não é um ardil, senão uma abertura democrática ao amparo da qual será possível a reconciliação da família colombiana". Suas palavras, entretanto, não têm respaldo algum na realidade do país, pois os graves problemas econômicos e políticos que vivemos desmentem a proposição oficial sobre a suposta "abertura democrática". É óbvio que a gravidade da crise econômica e o agravamento dos conflitos sociais dela decorrente não deixam margem a tal "abertura" por parte de quem violou os direitos e as liberdade políticas do povo.
"As bases materiais da exacerbação da luta de classes acham-se na voracidade dos exploradores e na ferocidade do Estado colombiano, que responde com violência aos justos reclamos do povo”.
Se nos apegarmos aos fatos, observamos que o período de governo do presidente Turbay demonstra a aplicação de uma política repressiva e sanguinária como resposta às reivindicações, aos protestos e às lutas populares. Nesse sentido, não cabem dúvidas de que o Estatuto de Segurança converteu-se no símbolo do atual governo. Quando fazemos a análise da atual situação do país, não perdemos de vista a natureza e os interesses das classes dominantes. As intenções e as ações dos governantes dependem de tais fatores e confirmam as opiniões de setores progressistas sobre a tendência à fascistização. Enquanto se repetem, com insistência, explicações sobre as "benemerecências" da anistia, as forças armadas continuam encarcerando, torturando e assassinando nossos compatriotas e os "esquadrões da morte" prosseguem atuando impunemente.
Turbay fez um apelo aos grupos e partidos políticos, aos núcleos gremiais, às forças do capital e do trabalho a fim de que "canalizem todas as suas energias para a nobilíssima finalidade de afiançar a paz e a harmonia em nossa pátria". Este chamado, impregnado da falsidade oficial, pretende ocultar as verdadeiras causas dos conflitos sociais e intenta dissimular as posições do governo. As bases materiais da exacerbação da luta de classes acham-se na voracidade dos exploradores e na ferocidade do Estado colombiano que responde com violência aos justos reclamos do povo. Em tais condições, não há lugar para a paz e a harmonia. As classes no poder e seu governo estão mostrando claramente que sua atitude e seu posicionamento são contrários aos interesses colombianos. Por exemplo, a ofensiva governamental contra as organizações sindicais, as frequentes ameaças oficiais para os que rechaçam a anistia, o aperfeiçoamento dos métodos repressivos servem para confirmar os manejos enganadores da atual Administração.
Também o presidente Turbay reiterou a promessa de "prosseguir sua tarefa de restauração procurando o bem-estar do povo" e pediu "entendimento" entre o governo, o setor patronal e as centrais sindicais materialistas. Para confirmar a absoluta falsidade dessas palavras, não se faz necessário muito esforço. Basta repassar sua obra administrativa e a realidade presente para compreender o conteúdo demagógico das palavras presidenciais.
* Artigo publicado no jornal Colombiano Revolución.
Turbay Ayala, atual Presidente da Colômbia.
EDIÇÃO 2, JUNHO, 1981, PÁGINAS 34, 35, 36, 37