O desfecho vitorioso da Luta de Libertação Nacional, com a expulsão do exército ocupante, ocorreu concomitantemente ao triunfo da revolução popular e democrática que assestou golpes mortais aos traidores da pátria e às classes exploradoras mancomunadas com o inimigo externo. No lugar do velho poder dessas classes, ultrapassadas historicamente, emergia um novo poder, revolucionário, representativo das forças vivas da nação, os patriotas e democratas, o campesinato pobre e a classe operária, sob a direção desta última, com o Partido Comunista à frente. Pela primeira vez em sua história, o povo albanês abria caminho e reunia condições para vencer o atraso em que vegetou por séculos, romper os vínculos escravizantes com as potências imperialistas e os círculos chauvinistas vizinhos e liquidar de uma vez para sempre a iníqua opressão política e social a que fora submetido.

A vitória da Luta de Libertação Nacional e da Revolução Popular – conquistada pelo povo unido e armado nas fileiras da Frente Antifascista de Libertação Nacional e do Exército Popular, sob a lúcida direção do Partido do proletariado – abriu, assim, uma nova época na história do povo albanês.
A crônica de todos os eventos políticos e das transformações radicais econômicas, sociais, políticas e ideológicas ao longo destes 40 anos preenche a história dessa nova época, alcunhada pelo povo como "anos do Partido" e "anos do Poder Popular".

Quatro décadas representam muito pouco na existência de um povo milenar, sobretudo se a tarefa que ele tem diante de si é vencer o atraso deixado por quinhentos anos de domínio de um império retrógrado como foi o Império Otomano, liquidar as relações de produção semifeudais e construir uma ordem econômico-social superior – o socialismo. Isto, em meio a conjunturas internacionais sempre turbulentas, fazendo frente a poderosos inimigos internos e externos.
Visto sob esse prisma, esse curto período da história da Albânia pode muito bem ser comparado a uma epopéia legendária, como a de Ulisses vencendo os Ciclopes.

O ENTRELAÇAMENTO DE DUAS ETAPAS

Dada a complexidade das tarefas políticas, econômicas e sociais, foi titânico o esforço encetado pelo novo poder para ingressar na senda do socialismo. Tratava-se, antes de tudo, de reconstruir o país, reerguê-lo dos escombros deixados pela guerra, como ponto de partida para empreender as transformações de fundo.

Inserida no conjunto das relações capitalistas dominantes em nível mundial, a Albânia, entretanto, tinha o seu desenvolvimento sócio-econômico e cultural entravado pela dependência externa e pelo monopólio da propriedade da terra nas mãos de poucas famílias, mantendo em larga escala a vigência de relações de produção pré-capitalistas. Para abrir caminho à construção do socialismo, colocava-se em primeiro plano o desenvolvimento econômico autônomo, por meio da exploração dos recursos nacionais no interesse do país, e a liberação das forças produtivas através do rompimento do monopólio da terra, da reforma agrária radical. Em suma, impunha-se a resolução, por parte do poder popular, dos problemas atinentes à revolução democrática e nacional, sem o que não se poderia sequer pensar em construir o socialismo.

Resolvendo esses problemas de fundo, assegurando ao país a independência e ao campesinato a conquista de seu anseio secular, o poder popular acelerou a marcha da revolução e preparou as premissas para a passagem a sua segunda etapa. Ao lado da reforma agrária e da nacionalização das empresas estrangeiras que operavam no país, foram estatizados os principais meios de produção, golpeando assim, decisivamente, os interesses das classes exploradoras internas.

Não foi pacificamente que o poder popular cumpriu tais tarefas. Enfrentou a obstinada resistência das classes derrocadas, como também as abusivas ingerências dos imperialistas anglo-americanos.
Por isso, no plano político se colocou desde logo a necessidade de erguer instituições que correspondessem às mudanças que estavam sendo efetivadas no terreno econômico-social. De início tratou-se de democratizar inteiramente o país, extirpando toda a herança do domínio fascista e das forças reacionárias internas, que impediam o exercício dos mais comezinhos direitos democráticos pelas massas populares. No lugar da monarquia ditatorial do rei Ahmet Zogu, representante das classes reacionárias, avultou o poder dos Conselhos Populares, sucedâneos dos Conselhos Antifascistas de Libertação Nacional criados durante a guerra. Pouco mais de um ano depois da libertação realizaram-se eleições para a Assembléia Constituinte, que elaborou a primeira Constituição verdadeiramente democrática da história da Albânia. A 11 de janeiro de 1946 era proclamada a República Popular da Albânia.

Ganhava expressão política, num novo patamar, a aliança operário-camponesa, e o povo, pela primeira vez em sua história, pontificava como o principal protagonista da vida política e social. Estava vencida a primeira etapa da revolução. Começava a construção do regime socialista.

Desenvolvendo ininterruptamente o processo revolucionário, sem interpor uma "muralha da China" entre as duas etapas da revolução, o Partido do Trabalho da Albânia, aplicando criadoramente o marxismo-leninismo às condições concretas do país, orientou no sentido de estender as relações de produção socialistas, surgidas com as primeiras estatizações, ao conjunto da economia nacional. Os comunistas albaneses rejeitaram a tese revisionista de retardar a construção da base econômica do socialismo devido à incipiência do anterior desenvolvimento capitalista no país. Nesse sentido, seguiram caminho diferente dos chineses, para quem entre a revolução democrático-antiimperialista e a construção do socialismo mediava um longo período. O caminho que conduziria ao avanço nesse rumo passava necessariamente pela completa eliminação de todas as formas remanescentes de propriedade privada. É significativo notar o contraste da experiência albanesa também com relação à via .indicada por Tito na Iugoslávia, onde, ao invés de um combate sistemático aos elementos capitalistas, adotou-se a estratégia de "integração pacífica".

No campo é que esse problema se colocou com maior agudeza, pois a reforma agrária transformara em pequenos proprietários milhares de camponeses que antes da revolução não possuíam nenhuma terra. O esforço para transformar o país de agrário atrasado em país agrário-industrial, com perspectiva de se converter em médio prazo em industrial-agrário, tendo como base as novas relações de produção socialistas, esbarrava na existência da pequena propriedade privada.

O meio para conduzir a transformação da propriedade privada dos pequenos produtores em propriedade social foi a coletivização, entendida como união livre e voluntária dos pequenos proprietários rurais em grandes unidades de produção agrícola – as cooperativas – nas quais os camponeses possuem coletivamente a terra.

A coletivização da agricultura na Albânia, seja pela criação das cooperativas, seja pela existência paralelamente a estas, de fazendas estatais (propriedade de todo o povo), ensejou a criação das relações de produção socialistas no campo, liquidou por completo a burguesia enquanto classe e forjou um novo tipo de aliança operário-camponesa, o que representou um passo gigantesco na construção da base econômica do socialismo.

LUTA DE CLASSES E DITADURA DO PROLETARIADO

No plano social, essas importantes modificações na base econômica da sociedade repercutiram na formação de uma nova estrutura de classes. Com a desaparição da burguesia como classe possuidora dos meios de produção, passaram a conviver duas classes amigas – o proletariado e o campesinato cooperativista – unidas em tomo de interesses fundamentais comuns: a completa construção da sociedade socialista.

Decerto, isto não significa ter cessado a luta de classes, uma vez construída a base econômica do socialismo, e uma vez criadas as relações de produção socialistas com o predomínio da propriedade estatal socialista em escala nacional e da propriedade cooperativista (também de natureza socialista) no campo. Não. Estes quarenta anos de vida livre para o povo albanês foram também anos em que se travou, em todos os terrenos da vida social, uma árdua e renhida luta de classes.

Primeiro, contra os latifundiários e a burguesia aliada ao imperialismo. Em seguida, contra os remanescentes da burguesia nas cidades e no campo. E hoje contra os inimigos que por longo tempo se acobertam, mas sempre são descobertos e condenados pelo povo, elementos que se corrompem, degeneram e capitulam diante da multilateral pressão do imperialismo. Luta de classes também no terreno ideológico e cultural, para extirpar das consciências das pessoas as idéias, os hábitos, os vícios acumulados por gerações e gerações. Luta
que não se decide num só dia, por um só golpe, posto que significa em última instância a pugna entre uma velha ideologia, que decai – a ideologia burguesa –, e a ideologia do proletariado, a principal força social do mundo contemporâneo que, embora noviça, corresponde às exigências do presente e do futuro da humanidade e por isso viceja e avança.

Na Albânia, esta luta tem trazido como resultado a formação do novo homem, portador de uma nova concepção de vida, baseada na colocação do interesse coletivo acima do interesse estritamente pessoal. Além disso, na fase em que se encontra a construção do socialismo na Albânia, é pelas veredas da luta de classes que se vão reduzindo as diferenças salariais, as diferenças entre cidade e campo e entre o trabalho físico e o intelectual. Enfim, o desenvolvimento da luta de classes no socialismo tem o mérito de, golpeando o liberalismo e o burocratismo, ir fechando cada vez mais os caminhos à degeneração burguesa-revisionista como ocorreu na URSS e demais países outrora socialistas, onde o capitalismo foi restaurado.

O encaminhamento conseqüente da luta de classes nas condições de construção da sociedade socialista só tem sido possível devido ao fortalecimento, ao aperfeiçoamento e à consolidação do Estado da ditadura do proletariado, que significa poder político indivisível nas mãos da classe operária, com seu Partido marxista-leninista à frente, e ampla democracia para o conjunto dos trabalhadores. Não fosse a existência de um poder político solidamente implantado nas massas populares, firmemente embasado na unidade Partido-povo, capaz de permitir a participação direta dos trabalhadores no ato de governar, por conseguinte, profundamente democrático e, ao mesmo tempo, suficientemente enérgico com os inimigos externos e internos, o socialismo na Albânia não apenas não teria avançado como avançou nesses 40 anos, mas sequer teria durado 40 dias, se tivermos em conta as dificuldades de toda ordem que enfrentou.

Desse modo, em contraste com as prédicas dos revisionistas soviéticos sobre o "Estado de todo o povo" ou dos eurocomunistas e maoístas sobre o "pluralismo político e ideológico no socialismo", o Partido do Trabalho da Albânia, sob a direção de Enver Hoxha, enriqueceu na prática e em importantes generalizações teóricas, o princípio marxista-leninista sobre o papel do Estado da ditadura do proletariado como poderosa arma nas mãos da classe revolucionária para assegurar a transição rumo à sociedade sem classes.

A SUPERIORIDADE DO SOCIALISMO

Os "anos do Partido e do Poder Popular" constituem um período de redenção de todo um povo e de renascimento de uma nação. Mudou inteiramente a face do país, que floresce e progride. Foram obtidas conquistas sociais asseguradas na lei e na prática, que deram ao povo o bem-estar e a verdadeira justiça social.

A economia, que antes da libertação era meramente agrária, tomou impulso com a criação de um vasto, multilateral e potente parque industrial, englobando: Indústria Elétrica
Petrolífera
Extração Mineral (carvão, cromo, cobre e ferro-níquel)
Metalúrgica
Siderúrgica
Química
Mecânica
Materiais de Construção
Madeireira e Papeleira
Têxtil
Alimentícia
Farmacêutica

Pode parecer quimera para os que encaram as categorias econômicas e sociais como eternas, os burgueses e pequenos burgueses aferrados a seus privilégios de classe, mas o socialismo na Albânia – se bem que enfrente as dificuldades criadas pelo cerco imperialista-revisionista – aboliu as chagas sociais que hoje se alastram por todo o organismo dos regimes capitalistas e revisionistas. E garante, a ritmos graduais, mas constantes, a elevação do padrão de vida de sua população.
Seu sistema econômico, baseado na planificação e no desenvolvimento harmônico e proporcional dos diversos setores, adquiriu invejável estabilidade, sendo para ele estranhos os fenômenos negativos tão característicos do mundo capitalista-revisionista, como a anarquia na produção, as crises de superprodução, a recessão, a alta de preços, a inflação e a dependência ao exterior. Por isso, inexiste o desemprego e o poder aquisitivo da população segue uma curva ascendente. A reprodução socialista ampliada sem interrupções, o crescimento da indústria, com primazia para a indústria pesada, e da agricultura possibilitam o incremento, a ritmos elevados, da renda nacional e do produto social, o que permite aumentar progressivamente os fundos de consumo individual e social.

É o que atestam os principais indicadores econômicos do 7o Plano Qüinqüenal (1981-1986) que, neste ano de festas, os trabalhadores albaneses lutam para cumprir e até ultrapassar com incomparável ímpeto revolucionário:
Produção Global – crescimento de 36% no qüinqüênio
Renda Nacional – crescimento de 35% no qüinqüênio
Produção Industrial – crescimento de 38% no qüinqüênio
Produção Agrícola – crescimento de 32% no qüinqüênio
Prevê-se, ainda, que a taxa de aumento do Fundo de Consumo será, ao final do qüinqüênio, duas a três vezes maior que a taxa de incremento demográfico.

A estabilidade econômica e o constante crescimento estão na base dos direitos sociais assegurados aos trabalhadores, como instrução pública e gratuita, habitação a preços meramente simbólicos, assistência médico-hospitalar gratuita, um avançado sistema de pensões e aposentadorias, direito à diversão e ao lazer, prática do esporte e amplo acesso das massas à atividade e à produção artístico-cultural. Dentre as conquistas dos trabalhadores albaneses merece menção especial a emancipação da mulher.

Tudo isso mostra que na realidade da Albânia socialista encontra livre curso a lei econômica fundamental do socialismo que, segundo a formulação clássica de Stalin, é: "Assegurar a satisfação máxima das necessidades materiais e culturais, sempre crescentes, de toda a sociedade, mediante o desenvolvimento e o aperfeiçoamento ininterruptos da produção socialista à base da técnica mais elevada" (1).

Esta realidade viva e dinâmica da construção do socialismo na Albânia, em constante mutação e desenvolvimento ascendente, atesta a indiscutível superioridade do socialismo sobre o capitalismo. Em lugar de crise, crescimento; em vez de miséria, bem-estar; ao contrário de atraso, progresso; onde havia obscurantismo e ignorância, há agora florescimento da cultura e da ciência; em vez de repressão, liberdade para o povo; de acordos escravizantes com potências imperialistas, o desenvolvimento independente, baseado nas próprias forças.

Nesse sentido, a experiência da Albânia tem para os povos de todo o mundo um valor simbólico. Não para ser mecanicamente copiada, pois a revolução e o socialismo são obra de cada povo. Mas, como uma experiência a indicar, primeiro, que é possível viver livre e independente, mesmo num mundo onde as superpotências imperialistas tornaram letra-morta a soberania dos países que caíram em suas garras. Segundo, que o triunfo da revolução e da construção do socialismo é possível, mesmo num só país, e malgrado ser este pequeno territorial e populacionalmente. E, terceiro, que o marxismo-leninismo, apesar da traição revisionista e do pessimismo que esta espalhou, mantém toda a sua atualidade e vigor científico.

Pela ação do Partido do Trabalho da Albânia, dirigido com perspicácia pelo eminente e talentoso comunista, Enver Hoxha, um dos mais insignes homens do mundo contemporâneo, a doutrina imortal do proletariado encontra aplicação e se enriquece. Isto é o que garantiu as vitórias históricas do povo albanês nestes 40 anos. É o que assegurará seu luminoso porvir socialista e comunista.

* José Reinaldo de Carvalho é jornalista, membro da redação de Princípios e diretor cultural da Associação de Amizade Brasil-Albânia.

Notas:
(1) STALIN, J. Problemas Econômicos do Socialismo na URSS (no prelo).

EDIÇÃO 9, OUTUBRO, 1984, PÁGINAS 22, 23, 24, 25