É dentro da fábrica, especialmente na grande indústria, que se encontram as maiores contradições entre o capital e o trabalho. Nela, toda a produção é socializada, enquanto o produto do trabalho é apropriado pelos capitalistas. A divisão de trabalho é levada às últimas conseqüências e não resta dúvida de que isto é responsável em grande parte pelo aumento da produção. Há muito se foi a época em que um mesmo operário realizava mais de uma função. Do ponto de vista da produtividade, a empresa capitalista moderna atingia o máximo de sua eficiência.

O que ocorre fora da fábrica não incomoda tanto a burguesia quanto o que ocorre dentro. Isto porque a burguesia sabe que dentro da fábrica está a sua riqueza, o seu poderio. Mas sabe também que ali dentro está a sua ruína.

As contradições entre a burguesia e o proletariado são irreconciliáveis e a burguesia sabe disto. Os métodos utilizados pela burguesia ao longo dos tempos para submeter o proletariado têm variado. Mas, conforme a indústria se desenvolve e, com esta, a sociedade capitalista, a burguesia tem conseguido adaptar seus métodos de dominação.

Em fins do século passado e início deste, o capitalismo atingiu sua fase superior, a do imperialismo. Formavam-se os grandes monopólios. Partia-se para a conquista dos últimos mercados. Os diversos países cresciam – e ainda crescem – de maneira desigual, levando aqueles que mais se desenvolviam a uma necessidade urgente de novos mercados, sob o risco de suas economias entrarem em recessão. Conquistados estes, surge a necessidade da redivisão daqueles já conquistados. A Primeira Guerra Mundial se avizinhava.

Com a formação dos monopólios, a velha ordem existente dentro das fábricas passou a ser um entrave para a sua própria expansão. Os trabalhadores eram ainda, em grande parte, tratados como animais de carga e acreditava-se que o bom administrador era uma qualidade inata, privilégio de poucos, geralmente dos grandes capitalistas que, por uma razão ou outra, eram bem sucedidos em seus negócios. Eram necessários novos métodos de trabalho, assim como novos métodos de gestão.

RACIONALIZACÃO CAPITALISTA DO TRABALHO

Durante muito tempo estudiosos preocupados com uma eficiência do trabalho maior tentaram sistematizar os conhecimentos da época naquilo que posteriormente chamar-se-ia "bases científicas". O objetivo era aplicar esses conhecimentos tanto na organização do trabalho nas fábricas como na administração pública. No entanto, os conhecimentos práticos eram ainda insuficientes para que pudessem ser agrupados em um sistema coerente de teoria e prática.

Em fins do século passado há uma rápida expansão industrial nos Estados Unidos e grandes monopólios começam a ser formados. Começam a emergir e se solidificar as condições que tornarão os Estados Unidos a principal potência imperialista do século XX.

Justamente o aparecimento destas novas condições é que fornecerá o substrato para o desenvolvimento da administração como ciência. A eficiência dentro da fábrica tinha de aumentar, do contrário esta sucumbiria à concorrência; com a expansão dos monopólios, a figura do dono da fábrica – seu dirigente – passa a ser um obstáculo. Poucos homens na direção das empresas hão que ser substituídos por vários, por todo um corpo administrativo, assim como surge a necessidade de estruturar a nova empresa por setores, cada um contendo seu pessoal especializado em administração. Aos poucos vai surgindo a figura do administrador.

Em fins do século passado e início deste começa a ser difundido um dos primeiros sistemas administrativos, o taylorismo, inicialmente nos Estados Unidos – onde surgiu – e, pela época da Primeira Guerra, também na Europa. Este nome deveu-se a Frederick Winslow Taylor, que desenvolveu certos conceitos sobre administração, aos quais deu o nome de "Administração Científica".

Taylor pretendeu racionalizar o trabalho dentro da fábrica. Era um engenheiro que tinha muito contato com a produção. Chamou a atenção para a divisão de trabalho, para o treinamento dos operários em determinada função com a eliminação dos menos capazes, para a necessidade da alocação do homem certo na função certa. Através do controle de tempo procurou, em uma época em que o automatismo mal se iniciava, automatizar o homem, fazendo com que rendesse o máximo. Foi um especialista em estudos de movimento. Eliminando os movimentos desnecessários para a execução de um trabalho, junto a uma supervisão rigorosa, Taylor conseguia aumentar em muito a produção das fábricas pelas quais passava.

Taylor associava intimamente aumento de eficiência com aumento de salário e argumentava que, com a adoção de seu sistema, a contradição patrão-operário, ou seja, capital-trabalho, desapareceria das fábricas.

Esta preocupação é ressaltada a partir da própria definição dos objetivos da administração. Assim escreveu Taylor: "O principal objetivo da administração deve ser o de assegurar o máximo de prosperidade ao patrão e, ao mesmo tempo, o máximo de prosperidade ao empregado" (1).

Segundo Taylor, o trabalho era totalmente desorganizado dentro das fábricas; os próprios operários planejavam o que fazer e como fazer. Além disto, ainda segundo Taylor, havia a crença errônea, por parte dos operários, de que um aumento na produtividade levaria muitos deles ao desemprego; logo, eles operários trabalhavam o menos possível e a "cera" nas fábricas trazia prejuízo de milhões.
A adoção da maneira científica de trabalhar significava a definição prévia das tarefas a serem executadas pelos operários. Os administradores é que deveriam definir estas tarefas. Conforme dizia Taylor, cada tarefa tem sua ciência. Assim, por exemplo, existe a ciência de como carregar barras de ferro. O que a administração científica tem a fazer é descobrir as leis dessa ciência. São parte importante nessas pesquisas os estudos de movimento, nos quais se procura separar os movimentos essenciais, imprescindíveis, daqueles desnecessários e que podem, portanto, ser eliminados.

Estudando variáveis deste tipo e outras, Taylor conseguiu que o transporte de barras de ferro – em média de 12 toneladas/dia/homem em determinada companhia – subisse para 47 toneladas/dia/homem, sem que o operário se exaurisse.

Era evidente, conforme Taylor, que esses princípios só poderiam ser descobertos por quem os estudasse cientificamente e não por qualquer operário. O operário tinha o empirismo, mas a distância entre o empirismo e a ciência é muito grande. Uma das funções do administrador era descobrir esses princípios e ensinar os operários ignorantes a aplicá-los corretamente e assim aumentar a eficiência. Depreende-se que aumentava também a alienação do operário em relação ao trabalho. Nem todos os operários, dizia Taylor, servem para determinada função, por mais simples que a mesma possa parecer.

Portanto, operários deveriam ser selecionados e treinados para trabalhar no novo sistema; na época, isso soava quase como uma heresia. Como a produtividade desses operários era muito maior do que a daqueles que trabalhavam pelo "velho sistema", seria imprescindível, dizia Taylor, que o salário fosse aumentado, de tal modo que trouxesse ao mesmo tempo o "máximo de prosperidade ao patrão" e o "máximo de prosperidade ao empregado". Ao final de tudo, a sociedade ganharia, pois havendo aumento na produtividade, haveria mais artigos no mercado a preços menores, além de a qualidade ser superior, pois a produção estaria organizada estritamente de maneira científica.

Desta maneira Taylor acreditava resolver a contradição capital-trabalho. No entanto, embora argumentasse que deveria ser procurada a máxima produtividade por trabalhador, o salário não deveria ultrapassar certa quantia, pois, acima desta, dizia Taylor, o operário se corrompe. Por exemplo: uma "longa série de experiências, acompanhadas de cuidadosa observação" demonstrou a Taylor que os operários que carregavam barras de ferro na companhia citada não poderiam ter um acréscimo superior a 60% em seus salários, embora a produtividade tivesse aumentado 4 vezes. E assim se justificava:

"Quando, porém, eles recebem mais que 60% além do salário, muitos deles trabalham irregularmente e tendem a ficar negligentes, extravagantes e dissipados. Por outras palavras, nossas experiências demonstraram que, para a maioria dos homens, não convém enriquecer depressa" (2).

É verdade que o operário recebia mais, porém a mais-valia relativa aumentava mais que o aumento do salário e o capitalista saía ganhando e muito. Mesmo assim o sistema trouxe, durante sua implantação em muitas empresas, uma relativa paz entre as classes. Taylor se gabava de que jamais havia ocorrido uma greve nas empresas em que pessoalmente implantou seu sistema.

Nas empresas onde o taylorismo foi implantado seus proprietários experimentaram grandes lucros e, na corrida da concorrência, começaram a levar vantagem. Combatido no início, o taylorismo foi aos poucos se expandindo. Hoje, mais de oitenta anos após seu aparecimento, continua sendo a base da organização da produção dentro das fábricas.

F. W. Taylor não foi o primeiro nem o último a fracassar em seus planos de conciliar o trabalho e o capital, isto porque seu sistema servia para aprofundar a exploração do homem pelo homem e não para eliminá-la.

O sistema Taylor permitia um controle muito grande da força de trabalho dentro da fábrica, explorando-a ao máximo.
Ao contrário do que imaginava, a paz e a harmonia entre patrões e operários não ocorreram de maneira duradoura".

Não demorou para que outros cientistas a serviço dos capitalistas percebessem que outras variáveis – além de um maior salário e melhores condições de trabalho – tinham influência e precisavam ser controladas.

Ou melhor, o trabalhador tinha de ser controlado tanto fora como dentro da fábrica. Taylor dera o primeiro passo, controlando a força de trabalho, fazendo com que produzisse mais, tudo isto em "bases científicas". Porém, um operário não é somente força de trabalho. Tem suas necessidades, suas reações às circunstâncias. Tem sua família, participa de um grupo social. Como controlar tudo isso?

O SOCIALISMO UTÓPICO

A questão não era nova; tampouco a solução. Robert Owen, um industrial inglês, notabilizou-se porque, ainda no início do século XIX, fez algo que soava como utopia na fábrica de fios de algodão de New Lanark, na Escócia, da qual era sócio e gerente. Enquanto a maioria dos operários era obrigada a trabalhar à exaustão e crianças de 5-6 anos de idade eram figuras comuns nas fábricas, Owen reduziu a jornada de trabalho de seus operários. Enquanto a maioria dos trabalhadores ingleses morava em tugúrios, Owen deu-lhes casas decentes. Proibiu as crianças, filhos de seus operários, de trabalhar; construiu-lhes escolas e jardins de infância, e mandou-as para lá. Observou que neste regime liberal, embora trabalhassem menos, a produção de seus operários era muito maior que no restante das fábricas que visitava. Sua fábrica prosperava muito mais que as outras. A respeito disse Engels:

"Uma população operária que foi crescendo paulatinamente até 2.500 almas, recrutada a princípio entre os elementos mais heterogêneos, a maioria dos quais muito desmoralizada, converteu-se em suas mãos numa colônia-modelo, na qual não se conheciam a embriaguez, a polícia, os juízes de paz, os processos, os asilos para pobres nem a beneficência pública. Para isto bastou, somente, colocar seus operários em condições mais humanas de vida, consagrando um cuidado especial à educação da prole" (3).

Owen não parou aí em relação à questão social. Cada vez mais tomou partido ao lado do proletariado em suas reivindicações. Diante da burguesia, isto constituiu a ruína de Owen. É o mesmo Engels quem historia:

"O avanço para o comunismo constitui um momento crucial na vida de Owen. Enquanto se limitara a atuar só como filantropo, não colhera senão riquezas, aplausos, honra e fama. Era o homem mais popular da Europa. Não só os homens de sua classe e posição social, mas também os governantes e os príncipes, o escutavam e o aprovavam. No momento, porém, em que formulou teorias comunistas, virou-se a página” (4).

Assim a burguesia trata seus inimigos; assim tratou Owen. Entretanto, sua experiência em New Lanark mostrou que o bem-estar do operário era importante também fora da fábrica; ele produzia mais quando sabia que sua família estava em segurança ou que seus filhos iam à escola e teriam, no futuro, a possibilidade de ser melhores que ele na escala social.

NOVAS FORMAS DE EXPLORAÇÃO

Ao serem notadas as limitações do taylorismo, buscaram-se outras formas, agora com nova roupagem (e de maneira "científica"). Não é à toa que a psicologia moderna se desenvolveu a partir de estudos iniciados em fábricas. Desde cedo a psicologia mostrou ser um instrumento poderosíssimo nas mãos dos capitalistas, pois permitia, através de métodos sutis, o controle das emoções e das reações dos operários, assim como o controle grupal. O comportamento do operário passou a ser esmiuçado dentro e fora da fábrica; o círculo social no qual participava – e participa – passou a ter grande importância na nova forma de controle social.

Logo outras ciências vieram se juntar para apertar a camisa-de-força em torno do proletariado. Tudo passou a ter importância, a ser estudado. Sua intimidade passou a ser vasculhada. Grande número de sociólogos, antropólogos, assistentes sociais passou a fazer parte deste bem articulado exército, pago regiamente pelos capitalistas, com a finalidade de controlar o proletariado em todas as direções.
Posteriormente, também a medicina, chamada "medicina do trabalho", forneceria seus profissionais a este exército.

Hoje fala-se em várias "escolas" de administração.
Umas enfatizam as relações humanas, outras a sociologia, outras a psicologia dos grupos etc. Diferem, apesar disto, em questões secundárias, pois, na verdade, se complementam. Todas essas "escolas", no mundo capitalista, têm como objetivo reforçar o controle da burguesia sobre o proletariado e não a sua libertação.

A PEQUENA-BURGUESIA EM FUNÇÃO DA REFORMA SOCIAL

O exército de controladores utilizado pelos capitalistas é formado quase que exclusivamente de membros da pequena-burguesia.
A pequena-burguesia, geralmente, não é dona dos meios de produção. Por isso não guarda relação de antagonismo irreconciliável com o proletariado, como o guarda a burguesia.
A pequena-burguesia, embora assalariada, não pode ser igualada ao proletariado. O pequeno-burguês, mesmo o mais miserável, não é um proletário, pois, como disse Marx: "(…) 'proletário', na acepção econômica da palavra, deve entender-se unicamente o operário assalariado, que produz e aumenta 'o capital' e que é atirado à rua logo que se torna supérfluo para as exigências do crescimento do valor do 'senhor capital'” (5).

Ora, quem ao mesmo tempo produz e aumenta o "capital" é o proletário e não o pequeno-burguês.
No entanto, a pequena-burguesia, espremida entre a burguesia e o proletariado, vive em eterno dilema. De um lado as benesses da burguesia a chamam, de outro, as agruras do proletariado. E é justamente essa contradição da pequena-burguesia que é admiravelmente explorada pela burguesia em causa própria.

Recrutando amplos setores da pequena-burguesia para engrossar o exército "pacífico" que usa para controlar os operários – e suas famílias – a burguesia, em nome da "ciência", procura impingir-lhes que na verdade não trabalham para ela, burguesia, mas sim para a libertação da classe operária.
À pequena-burguesia, dita instruída, a burguesia procura dar a responsabilidade de reformadora social, usando a ciência ou os conhecimentos de um modo geral. E a pequena-burguesia tem se prestado diligentemente a este papel. No entanto, a pequena-burguesia, em seu conjunto, professa, mesmo quando diz o contrário, os dogmas do capitalismo. Vários ramos da ciência são dominados pela metafísica e não pela dialética; suas interpretações dos fenômenos sociais são idealistas e raramente materialistas. Pobre pequena-burguesia! Fechada em si, mergulhada em sua ignorância, cria um mundo à parte na sociedade, julga-se a dona da verdade. Mas, mesmo entre setores da pequena-burguesia pouca concordância existe. O axioma "em cada cabeça uma sentença" jamais será tão bem aplicado como a esses pequeno-burgueses, dos quais cada um se julga o conhecedor das "fórmulas" que salvarão a humanidade.

Em seus atos diários, os pequeno-burgueses, membros do exército "pacífico", acreditam que estão mudando a sociedade, quando na realidade mantêm a estrutura dominante capitalista, para o bem-estar da burguesia.

Desta maneira, a burguesia sabe valer-se do espírito crítico da pequena-burguesia, orientando-o aos seus propósitos. Sabe igualmente domar os pequeno-burgueses furiosos, radicais, dando-lhes alguns cargos de relativa importância, principalmente nos escalões governamentais.
Sendo assim, torna-se inevitável que surjam, no seio da pequena-burguesia, agrupamentos que dizem defender a doutrina do proletariado, ou melhor, se dizem marxistas.

A DEFORMAÇÃO DO MARXISMO

É certo que a física clássica, do tempo de Newton, é incapaz de resolver grande parte dos problemas colocados pela sociedade atual. No entanto, da física moderna ninguém diz ser uma nova ciência, que nada tem a ver com a velha física. Isto ocorre com qualquer ciência, ou seja, a ciência se desenvolve com o decorrer do tempo. Porém, não se trata de um desenvolvimento caótico, ao acaso, sem nexo. Cada ciência se desenvolve tendo por base uma série de princípios, de leis, de objetos de estudo, que a distinguem de qualquer outra.

Conforme se desenvolve, surgem novos ramos dentro de uma mesma ciência que, no entanto, têm a uni-los todos esses princípios e leis comuns. É por isto que não se diz que existem duas físicas, duas astronomias, duas matemáticas.

Com o socialismo científico ocorre processo semelhante. As bases do socialismo científico foram lançadas por Marx e Engels no decorrer do século passado, época em que o capitalismo estava na fase de livre concorrência. Entretanto, a época atual – época do imperialismo – se rege não só pelo marxismo, mas sim pelo marxismo-leninismo. Na fase imperialista, disse Stalin:

"(…) as contradições do capitalismo chegaram ao seu limite extremo, quando a revolução proletária se converteu numa questão prática e imediata, quando o antigo período de preparação da classe operária para a revolução chegou ao ponto alto e se transformou num novo período de luta direta contra o capitalismo" (6).

A teoria marxista-leninista não muda conforme este ou aquele fato, assim como as leis da física não mudam conforme a conveniência deste ou daquele cientista.
O grande mérito da ciência marxista é poder aplicar a teoria ao estudo do desenvolvimento da sociedade. Estuda as relações entre os homens, entre as diversas classes sociais. Ao contrário de outros sistemas filosóficos, não se limita a observar os fatos, mas a transformá-los. O marxismo é, antes de tudo, ação.

Assim pensa e age a pequena-burguesia?

Hoje, o marxismo "oficial" prolifera nas camadas que se julgam mais esclarecidas da pequena-burguesia. Há os marxistas de orelhas de livros, os marxistas de um livro só, os marxistas de livro algum. Há os marxistas que negam Marx ("Marx foi genial em seu tempo, mas hoje as condições do mundo são completamente diferentes"). Qualquer professor pequeno-burguês que se preze cita Marx e/ou Engels em seus enfadonhos trabalhos e teses ao lado de outros pensadores idealistas e metafísicos, como se todos fossem iguais, como se todos se completassem, como se Marx e/ou Engels fossem apenas mais um. Desta maneira, procura adquirir respeitabilidade entre seus pares, ao mesmo tempo em que contribui para a disseminação de tudo quanto é teoria anticientífica na sociedade.

Sabe-se que da análise que fez da sociedade capitalista, muito daquilo que Marx disse é aceito pela burguesia menos reacionária. Exemplo clássico é a questão da luta de classes; não foi Marx quem a descobriu; pensadores burgueses, antes dele, já a haviam descrito. No entanto, toda análise marxista tem por fundo a luta de classes. A luta de classes em si é aceita pela burguesia mais esclarecida. Esta não corre nenhum perigo iminente pelo fato de alguém dizer que a sociedade capitalista se divide em classes. São conceitos como este que a pequena-burguesia cita em seus escritos para tirar as mais esdrúxulas conclusões, que nada contêm de marxismo.

Entretanto, tudo o que Marx e Engels disseram a respeito da superação da luta de classes, do papel revolucionário do proletariado, da ditadura do proletariado, tudo isto a pequena-burguesia faz questão de ignorar ou então classificar como dogmas ultrapassados.

A revolução proletária assusta não só os capitalistas como também a pequena-burguesia. Lênin, que desenvolveu o marxismo na fase imperialista do capitalismo, conforme disse Stalin, passou sua vida organizando um partido de aço que fosse capaz de levar avante a luta de classes, ou seja, preparando a ditadura do proletariado. Não é, pois, de estranhar que seu nome raramente seja citado pelos escribas burgueses e pequeno-burgueses. Stalin que, à frente do Estado Soviético, teve como papel histórico a consolidação da ditadura do proletariado, é apresentado por esses mesmos escribas como a personificação de tudo quanto de ruim existiu no mundo, sendo comparado a Hitler, Nero e a outros déspotas de igual quilate. No entanto, esses mesmos escrevinhadores se regozijam com os feitos de Kruschev, Tito e outros da mesma laia.

Hoje estão em voga vários tipos de "socialismo".

Há o "socialismo humano", o "socialismo democrático", o "socialismo cristão", o "socialismo moreno" etc etc. O socialismo é uma ciência; logo, existe somente um. A pequena-burguesia "esclarecida", a serviço da burguesia, não admite várias ciências físicas, várias ciências matemáticas, mas julga um escândalo a idéia de só existir uma ciência marxista. "É um dogma que deve ser superado", dizem.
Note-se o quanto de filisteísmo e de farisaísmo existe no pensamento pequeno-burguês.

Muitos dos elementos mais inconformados da pequena-burguesia, os "pequeno-burgueses furiosos", na feliz expressão de Lênin, ver-se-ão tentados a mudar a sociedade, segundo suas confusas idéias de mudança social. É, pois, inevitável, que esses grupos se organizem e participem de movimentos de "esquerda", esforçando-se para levar suas teorias ao proletariado, aos camponeses e às massas trabalhadoras em geral. Como essas teorias sempre favorecem, desta ou daquela maneira, a burguesia, na verdade, esses setores cumprem o papel histórico de atrasar as transformações sociais conseqüentes.

As idéias reformistas pequeno-burguesas ganham nova amplitude quando conseguem atrair a aristocracia operária, aliada à burguesia e traidora da classe operária. Vários desses aristocratas são pessoas de certo prestígio no meio operário e exercem importante papel na disseminação das idéias pequeno-burguesas.

Todas essas correntes e partidos, inspirados pelo reformismo pequeno-burguês, são antimarxistas e anti-socialistas. Tentam conseguir a hegemonia no meio operário e em outras frentes.
Não por acaso, uma vez com um mínimo de organização, esses agrupamentos e partidos reformistas definem seus verdadeiros inimigos: os partidos revolucionários marxistas-leninistas. Ao mesmo tempo em que declaram guerra aberta aos autênticos partidos do proletariado, conciliam abertamente ou às escondidas com a burguesia.

No Brasil, atualmente, dentre esses agrupamentos reformistas pequeno-burgueses, destacam-se o Partido dos Trabalhadores (PT) e o chamado Partido Comunista Brasileiro (PCB, Partidão). Ambos são pequeno-burgueses, que têm como missão histórica a perpetuação do domínio da burguesia, a continuidade da exploração capitalista. Ambos são destacamentos da vanguarda burguesa infiltrados no meio operário. Defendem um socialismo de fachada. São profundamente anticomunistas. Tudo o que almejam é a própria sociedade capitalista, com esta ou aquela reforma. Seus principais inimigos são o autêntico partido da classe operária, fundado em 1922, o Partido Comunista do Brasil, e todas as forças progressistas da sociedade que realmente lutam por mudanças radicais na mesma.

O surgimento desses agrupamentos e partidos pequeno-burgueses reformistas é inevitável na sociedade capitalista. Assim como a burocracia se organiza em partidos políticos, associações etc. para defender e perpetuar seus interesses, assim também o faz a pequena-burguesia.
Os partidos autenticamente marxistas-leninistas terão de travar luta acirrada contra essas correntes no decorrer dos tempos.

Tais correntes surgem conforme as fases históricas pelas quais passa um determinado país. No Brasil, a expansão e o fortalecimento da indústria de ponta criaram uma aristocracia operária de alguma importância. Igualmente o desenvolvimento capitalista verificado de alguns anos para cá aumentou e fortaleceu certos setores da pequena-burguesia. Ampliou-se a burocracia; o papel do "técnico" sem "cor política" ganhou relevo. Importantes setores da pequena burguesia foram cooptados pela burguesia.

A pequena-burguesia não é utilizada pela burguesia somente para o controle dos operários ou de grande parte dos trabalhadores. É usada também para as funções de controle da sociedade como um todo, perpetuando a superestrutura capitalista. À medida que o capitalismo se desenvolve aumentam as escolas e, conseqüentemente, o número de professores; aumenta a burocracia estatal. Todos esses postos são preenchidos por membros da pequena-burguesia que, em sua grande maioria, estão empenhados em perpetuar a ordem capitalista, mesmo que aparentemente dela divirjam.
Um país não se tornará socialista conforme o número maior ou menor da classe operária, ou conforme a organização pequeno-burguesa. Países como Estados Unidos, Inglaterra, França, Itália têm grande número de operários, porém nada indica que chegarão ao socialismo em um futuro próximo. Esses países, mesmo onde os denominados Partidos Comunistas desempenham algum papel na sociedade, estão longe de realizar a revolução socialista, pois esses PCs seguem uma linha reformista, revisionista, de suporte à política burguesa.

Um partido autenticamente revolucionário, marxista-leninista, crescerá na medida em que desmascarar diante dos trabalhadores o reformismo, atraindo para suas fileiras amplos setores operários, camponeses e das classes trabalhadoras em geral para uma política justa e conseqüente.
Na medida em que isto for realizado, atrairá também para suas fileiras aqueles setores não reformistas da própria pequena-burguesia.

* Nilton Tornero é professor na Universidade Estadual de Londrina, PR, e colaborador de Princípios.

Notas
(1) TAYLOR, F. W. Princípios da administração científica. 7a ed., tradução de Arlindo V. Ramos. São Paulo, Atlas, 1976. p. 29.
(2) Ob. cit.. p. 76.
(3) ENGELS, F. Do socialismo utópico ao socialismo científico. Tradução de Roberto Goldkorn. São Paulo, Global, s/d. p. 40-41.
(4) Ob. cit., p. 42.
(5) MARX, K., citado por Hoxha, E. O eurocomunismo é anticomunismo. Tradução de Aníbal Jardim. São Paulo, Anita Garibaldi, 1983. p.70.
(6) STALIN, , J. V. Fundamentos do Leninismo. Tradução de Olinto Beckerman. São Paulo, Global, s/d. p. 8.

EDIÇÃO 9, OUTUBRO, 1984, PÁGINAS 26, 27, 28, 29, 30, 31