Aqui o autor indica a existência, por um longo período da construção do socialismo, de dois tipos de propriedade no campo: a kolkhosiana (cooperativista) e as fazendas estatais (propriedade de todo o povo), ambas de caráter socialista. Aponta caminhos para a transformação da kolkhosiana em propriedade de todo o povo no rumo do aperfeiçoamento constante das relações de produção socialistas no país. O conjunto de opiniões e teses que defende constitui uma contribuição teórica de Stalin ao enriquecimento do marxismo-leninismo também nesse terreno.

Salta aos olhos, no texto ora publicado, como também em todo o livro Problemas Econômicos do Socialismo na URSS – que em breve virá à luz –, a argúcia do raciocínio de Stalin e a clarividência científica de seu pensamento. Criticando pontos de vista errados, Stalin adverte para questões essenciais da economia socialista, em seguida tergiversadas pelos revisionistas que assaltaram o poder em 1956. Particularmente no que se refere ao papel das Estações de Máquinas e Tratores, como concentradores de meios de produção agrícola fundamentais, Stalin defende sua manutenção pelo Estado Socialista em contraposição à tese de sua desmobilização ou venda às cooperativas.

Stalin relaciona esta questão com a da esfera de ação da circulação mercantil e da lei do valor no socialismo, alertando para o fato de que a transformação dos kolkhoses em proprietários de grandes e fundamentais meios de produção, (as máquinas e tratores) – longe de contribuir para a transformação dos kolkhoses em propriedade de todo o povo e para o avanço do país no sentido do comunismo –, conduziria, como conduziu, ao retrocesso histórico.

Reveste-se, portanto, de grande atualidade este texto de Stalin, notadamente no que se refere ao combate teórico contra os revisionistas soviéticos. Que medidas são necessárias para elevar a propriedade kolkhosiana – que não é, naturalmente, propriedade de todo o povo – ao nível da propriedade de todo o povo ("nacional")?

Para alguns camaradas, basta simplesmente nacionalizar a propriedade kolkhosiana, declarando-a propriedade de todo o povo, como se fez, em seu tempo, com a propriedade capitalista. Esta proposta é totalmente errada e completamente inaceitável. A propriedade kolkhosiana é socialista e não podemos tratá-la de nenhum modo como capitalista. Do fato de a propriedade kolkhosiana não ser propriedade de todo o povo não se depreende, de maneira alguma, que ela não seja uma propriedade socialista.

Estes camaradas supõem que a passagem da propriedade de indivíduos, ou de grupos de indivíduos, para a propriedade do Estado seja a única, ou em todo caso, a melhor forma de nacionalização. Isso é falso. Na realidade, a passagem para a propriedade do Estado não é a única, nem sequer a melhor, forma de nacionalização, mas sim a forma inicial de nacionalização, como acertadamente diz Engels em Anti-Dühring. E indubitável que enquanto existir o Estado, a passagem para a propriedade do Estado é a forma inicial de nacionalização mais compreensível. Contudo, o Estado não existirá eternamente. Com a ampliação da esfera de ação do socialismo na maioria dos países do mundo, o Estado irá extinguindo-se, e naturalmente desaparecerá, devido a isso, o problema da passagem dos bens de indivíduos ou de grupos de indivíduos para a propriedade do Estado. O Estado se extinguirá, mas a sociedade subsistirá. Em conseqüência, como herdeiro da propriedade de todo o povo, aparecerá já não o Estado – que se terá extinguido – mas sim a sociedade mesma, na pessoa do seu organismo econômico central, dirigente. Que é necessário fazer, nesse caso, para elevar a propriedade kolkhosiana ao nível da propriedade de todo o povo?

Os camaradas Sánina e Vénzher propõem, como medida fundamental para essa elevação do nível da propriedade kolkhosiana, vender aos kolkhoses os principais instrumentos de produção concentrados nas estações de máquinas e tratores (EMT), desobrigar desse modo o Estado das inversões básicas na agricultura e fazer com que os próprios kolkhoses assumam a responsabilidade da manutenção e do desenvolvimento das EMT. Dizem eles:

"Seria falso supor que as inversões kolkhosianas devam ser destinadas principalmente a satisfazer as necessidades culturais dos kolkhoses e que o Estado deva continuar proporcionando o volume fundamental das inversões para satisfazer as necessidades da produção agrícola. Não seria mais acertado eximir o Estado deste encargo, já que os kolkhoses estão plenamente capacitados para assumi-lo? O Estado terá muito em que investir seus recursos a fim de criar no país a abundância de objetos de consumo”.

Para fundamentar esta proposta, seus autores apresentam vários argumentos:
Primeiro, reportando-se às palavras de Stalin de que os meios de produção não se vendem nem mesmo aos kolkhoses, os autores da proposta põem em dúvida esta tese de Stalin ao dizerem que apesar de tudo o Estado vende aos kolkhoses meios de produção como, por exemplo, pequenos instrumentos: foices, gadanhos, pequenos motores etc. Consideram que se o Estado vende esses meios de produção aos kolkhoses, poderia também vender-lhes todos os demais meios de produção, como, por exemplo, as máquinas da Estação de Máquinas e Tratores (EMT).

Este argumento é inconsistente. Naturalmente o Estado vende pequenos instrumentos aos kolkhoses, como estipulam os Estatutos do Artel Agrícola e a Constituição. Mas, podem equiparar-se os pequenos instrumentos a meios de produção tão fundamentais à agricultura como as máquinas e os tratores, ou digamos, a terra que também é um dos meios de produção fundamentais na agricultura? É evidente que não. Não, porque os pequenos instrumentos não decidem, em absoluto, da sorte da produção kolkhosiana, ao passo que meios de produção, como as máquinas da EMT e a terra, decidem plenamente da sorte da agricultura em nossas condições atuais.

Não é difícil compreender que quando Stalin dizia que os meios de produção não se vendem aos kolkhoses não se referia a pequenos instrumentos, mas sim a meios fundamentais de produção agrícola: as máquinas da EMT e a terra. Os autores da proposta jogam com as palavras "meios de produção" e confundem duas coisas distintas sem perceber que laboram em erro.

Segundo, os camaradas Sánina e Vénzher referem-se também ao fato de no período em que se iniciava o movimento kolkhosiano em massa – fins de 1929 e princípios de 1930 – o próprio Comitê Central do Partido Comunista (b) da URSS ter sido partidário da entrega, como propriedade, aos kolkhoses, das estações de máquinas e tratores, estipulando que os kolkhoses amortizariam o seu custo no prazo de três anos. Para os autores da proposta, muito embora essa iniciativa tivesse fracassado naquela ocasião "em vista da pobreza" dos kolkhoses, agora que estes estão ricos, poder-se-ia voltar a essa política, à venda das EMT aos kolkhoses.

Este argumento também é inconsistente. Com efeito, em princípios de 1930, o Comitê Central do Partido Comunista (b) da URSS aprovou uma resolução a respeito da venda das EMT aos kolkhoses. Ela foi aprovada por proposta de um grupo de kolkhosianos de choque, a título de experiência, de prova, com a condição de num futuro próximo voltar-se à questão e reexaminá-la. Contudo, a primeira verificação demonstrou que a resolução não era conveniente e, ao fim de alguns meses, precisamente em fins de 1930, foi ela anulada.

O ascenso posterior do movimento kolkhosiano e o desenvolvimento da construção kolkhosiana persuadiram, definitivamente, tanto os kolkhosianos como os dirigentes, de que a concentração dos meios de produção agrícola fundamentais, em mãos do Estado – as Estações de Máquinas e Tratores – é o único meio de assegurar um ritmo rápido de crescimento da produção kolkhosiana.

Todos nós nos rejubilamos com o gigantesco crescimento da produção agrícola em nosso país, com o crescimento da produção de cereais, algodão, linho, beterraba etc. Qual a fonte deste crescimento? É a técnica moderna, é o grande número de máquinas modernas que servem a todos esses ramos de produção. Não se trata apenas da técnica em geral. Trata-se de que a técnica não pode manter-se em ponto morto; de que deve aperfeiçoar-se sem cessar; de que a velha técnica deve ser posta fora de serviço e substituída pela técnica nova, e esta pela novíssima. Sem isso é inconcebível o progresso de nossa agricultura socialista, são inconcebíveis as colheitas e a abundância de produtos agrícolas. Mas que significa pôr fora de serviço centenas de milhares de tratores de rodas e substituí-los por tratores de lagarta, substituir dezenas de milhares de colhedeiras-combinadas, antigas por novas, criar novas máquinas, digamos, para culturas industriais? Significa despender bilhões de rublos que não poderão ser recuperados senão dentro de 6 a 8 anos. Podem suportar tais gastos nossos kolkhoses, mesmo que milionários? Não. Não podem, porque não estão em condições de suportar gastos de bilhões de rublos que só podem ser amortizados dentro de 6 a 8 anos. Só o Estado está em condições de realizar essas despesas, pois só ele, e unicamente ele, está em condições de suportar as perdas determinadas pela retirada de serviço das máquinas velhas e sua substituição por outras novas; uma vez que ele, e unicamente ele, está em condições de arcar com essas perdas durante 6 a 8 anos para, ao término desse prazo, ressarcir-se das despesas realizadas.

Que significa, depois disso tudo, pedir a venda das EMT aos kolkhoses? Significa condená-los a grandes perdas e arruiná-los; solapar a mecanização da agricultura, diminuir o ritmo da produção kolkhosiana.

Daí a conclusão: ao propor a venda das EMT aos kolkhoses, os camaradas Sánina e Vénzher retrocedem e procuram fazer a roda da história girar para trás.
Admitamos, por um instante, que aceitamos a proposta desses camaradas e comecemos a vender aos kolkhoses os instrumentos de produção fundamentais, as Estações de Máquinas e Tratores. Que resultaria disso?

Disso resultaria, em primeiro lugar, que os kolkhoses passariam a ser proprietários dos instrumentos de produção fundamentais, isto é, encontrar-se-iam em situação excepcional, que nenhuma empresa ocupa em nosso país; como se sabe nem mesmo as empresas nacionalizadas são, entre nós, proprietárias dos instrumentos de produção. Como se poderia justificar tal situação excepcional dos kolkhoses, em que considerações de progresso, de avanço se basearia? Pode-se dizer que tal situação contribuiria para elevar a propriedade kolkhosiana ao nível da propriedade de todo o povo, que aceleraria a passagem de nossa sociedade do socialismo ao comunismo? Não seria mais acertado dizer que tal situação só poderia afastar a propriedade kolkhosiana da propriedade de todo o povo e que, ao invés de nos aproximar do comunismo, nos afastaria dele?

Disso resultaria, em segundo lugar, o alargamento da esfera de ação da circulação mercantil, visto que em sua órbita entraria uma enorme quantidade de instrumentos de produção agrícola. Que pensam a respeito os camaradas Sánina e Vézher? O alargamento da esfera da circulação mercantil poderá contribuir para nosso avanço no sentido do comunismo? Não seria mais exato dizer de fato que frearia nosso avanço no sentido do comunismo?

O erro fundamental dos camaradas Sánina e Vénzher consiste em não compreenderem o papel e o significado da circulação mercantil no socialismo; não compreenderem que a circulação mercantil é incompatível com a perspectiva da passagem do socialismo ao comunismo. Pensam, pelo que se vê, que a circulação mercantil não constitui um obstáculo para a passagem do socialismo ao comunismo, que a circulação mercantil não pode impedir essa transição. Isto é um grande erro, fruto da incompreensão do marxismo.

Ao criticar a "comuna econômica" de Dühring, que funciona sob as condições da circulação mercantil, Engels demonstrou persuasivamente em seu Anti-Dühring que a existência da circulação mercantil deve levar de modo inelutável, a chamada "comuna econômica" de Dühring ao ressurgimento do capitalismo. Os camaradas Sánina e Vénzher pelo visto não estão de acordo com isto. Tanto pior para eles. Mas nós, marxistas, partimos da conhecida tese marxista de que a passagem do socialismo ao comunismo e o princípio comunista da distribuição dos produtos segundo as necessidades, excluem todo intercâmbio mercantil e, em conseqüência, excluem também a transformação dos produtos em mercadorias e, ao mesmo tempo, sua transformação em valor.

Isto é o que eu tinha a dizer a respeito da proposta e dos argumentos dos camaradas Sánina e Vénzher.
Que se deve fazer, então, para elevar a propriedade kolkhosiana ao nível da propriedade de todo o povo?

O kolkhós não é uma empresa do tipo comum. Ele trabalha numa terra e cultiva uma terra já há muito não propriedade kolkhosiana, mas sim propriedade de todo o povo. Portanto, o kolkhós não é proprietário da terra que cultiva.

Prossigamos. O kolkhós trabalha com instrumentos de produção fundamentais que não são propriedade kolkhosiana, mas sim de todo o povo. Portanto, ele não é proprietário dos instrumentos de produção fundamentais.
Ainda mais. O kolkhos é uma empresa cooperativa; utiliza o trabalho de seus membros e distribui o rendimento entre eles de acordo com os "dias de trabalho" realizados; além disso, ele tem suas sementes, que se renovam anualmente e se empregam na produção.

Cabe perguntar: que possui concretamente o kolkhós? Onde está a propriedade kolkhosiana da qual se pode dispor com plena liberdade conforme o seu desejo? Tal propriedade é a produção do kolkhós, o fruto da produção kolkhosiana: cereais, carne, manteiga, legumes, algodão, beterraba, linho etc., sem contar os edifícios e a exploração pessoal pelos kolkhosianos de um terreno que cerca a casa. Ora, uma parte considerável dessa produção, o excedente da produção kolkhosiana, destina-se ao mercado e junta-se assim ao sistema de circulação de mercadorias. É exatamente esta circunstância que impede agora a elevação da propriedade kolkhosiana ao nível da propriedade de todo o povo.

Precisamente por isso é necessário tomar esse fato como ponto de partida do trabalho para elevar a propriedade kolkhosiana ao nível da propriedade de todo o povo.
A fim de elevar a propriedade kolkhosiana ao nível da propriedade de todo o povo é necessário excluir o excedente da produção kolkhosiana do sistema de circulação mercantil e incluí-lo no sistema de troca de produtos entre a indústria do Estado e os kolkhoses. Aí está o essencial da questão.

Não dispomos ainda de um sistema desenvolvido de troca de produtos, mas existem os germes da troca de produtos em forma de "pagamento em mercadorias" para os produtos agrícolas. Como se sabe, a produção dos kolkhoses que cultivam algodão, linho, beterraba etc., há muito é "paga em mercadoria"; é verdade que isso não se realiza totalmente, e sim parcialmente, mas apesar de tudo é "paga em mercadorias". Observemos, de passagem, que a expressão "pagamento em mercadorias" é infeliz e que deveria ser substituída pela expressão "troca de produtos". A tarefa consiste em organizar em todos os ramos da agricultura esses germes da troca de produtos e desenvolvê-los em um amplo sistema de troca de produtos para que os kolkhoses obtenham, pela sua produção, não só dinheiro, mas sobretudo os artigos necessários. Tal sistema exige um enorme aumento da produção que a cidade envia ao campo; e por isso terá de ser introduzido sem muita pressa, na medida em que se acumulem os artigos produzidos pela cidade. Mas, é preciso ser introduzido metodicamente, sem vacilações, reduzindo-os passo a passo à esfera de ação da circulação mercantil e ampliando-se a esfera da troca de produtos.

Tal sistema, ao reduzir a esfera de ação da circulação mercantil, facilitará a passagem do socialismo ao comunismo. Além disso, permitirá incluir a propriedade fundamental dos kolkhoses – o fruto da produção kolkhosiana – no sistema geral da planificação nacional.
Será este precisamente o meio real e decisivo de elevar, em nossas condições atuais, a propriedade kolkhosiaha ao nível da propriedade de todo o povo.

É vantajoso tal sistema para os camponeses kolkhosianos? Sem dúvida, é. É vantajoso, pois os camponeses kolkhosianos receberão do Estado produtos em quantidade muito maior e a preços mais baratos do que com o sistema de circulação mercantil. Todo mundo sabe que os kolkhoses que fizeram contratos de troca de produtos com o governo ("pagamento em mercadorias") obtêm vantagens incomparavelmente maiores do que os kolkhoses que não os fizeram. Se se estende o sistema de troca de produtos a todos os kolkhoses do país, essas vantagens serão patrimônio de todos os nossos camponeses kolkhosianos.

Extraído do livro Problemas Econômicos do Socialismo na URSS.

EDIÇÃO 9, OUTUBRO, 1984, PÁGINAS 18, 19, 20, 21