A imprensa, como empresa capitalista, segue a tendência geral de monopolização da economia, brutalmente acelerada pela política dos generais depois do golpe de 1964. Na televisão o fenômeno é ainda mais acentuado. O próprio sistema de concessão de canais de TV a grupos particulares leva a uma concentração brutal deste meio de comunicação. E a Rede Globo sozinha já estabeleceu um controle quase absoluto no país.

A informação se tornou uma mercadoria e sua produção é feita hoje por uma indústria de ponta que exige investimentos fabulosos e emprega tecnologias em rápida evolução. Sofisticadas máquinas de composição substituíram os velhos linotipos, técnicas com raio laser e processos eletrônicos de reprodução e impressão instantâneos avançam por todo lado, satélites artificiais rasgam os céus permitindo a comunicação imediata entre todos os pontos do Globo, arquivos de microfilmes e bancos de dados apoiados em computadores acumulam e cruzam um número incalculável de informações.

Para que os fatos cheguem a ser noticiados em jornais, revistas, rádios e televisões são mobilizados exércitos de repórteres, redatores, fotógrafos, editores, que trabalham com equipamentos caríssimos e altamente especializados, comandados pelo grande capital.

Nos Estados Unidos, em 1977, os grandes trustes já controlavam 60% dos jornais, representando 71% das tiragens do país. Em todo o mundo, um punhado de países imperialistas edita hoje 83% dos livros publicados, controla as dez maiores agências de publicidade – sendo sete norte-americanas e as outras três também com participação dos EUA – assim como produz 77% dos filmes e dispõe das cinco maiores agências de notícias. Segundo Leonard Marks, ex-diretor da United States Information Agency (USIA), "nos EUA se originam 65% de todas as notícias do mundo".

No Brasil, no ano passado, a Editora Abril era responsável por 69% das revistas vendidas no país. Em 1979 ela já abocanhava 21,9% do faturamento do setor. A Abril tem atualmente espaço na televisão e, no setor de distribuição de livros e revistas para as bancas, tem o monopólio em plano nacional, junto com a Fernando Chináglia.

A Rede Globo controlava, em 1981, 49 canais de televisão, 9 estações de rádio, 1 jornal, 2 editoras, 1 centro de programação audiovisual, 1 gravadora de discos e 1 centro de tele-educação. Atualmente a TV Globo atinge 3.918 municípios no país, chega a 17,6 milhões de lares abrangendo um público de aproximadamente 80 milhões de telespectadores, com cerca de 80% da audiência no Rio e em São Paulo. Ampliando ainda mais seu raio de ação, já dispõe de um canal de TV em Monte Carlo, que atinge uma parte da audiência da Itália, segundo o Dr. Luíz de Camargo Aranha Neto, advogado da Rede Globo em São Paulo.

EMPOBRECIMENTO DA INFORMAÇÃO

No terreno específico dos jornais diários – no qual concentramos maior atenção – em 1979, O Estado de S. Paulo, a Folha de S.Paulo e o Jornal do Brasil monopolizavam 46% do patrimônio líquido e 57% do faturamento total do setor no país.

Nos últimos 30 anos – principalmente no período da ditadura – um grande número de diários sucumbiu à avalanche do monopólio. Não eram menos criativos ou menos capazes do ponto de vista do jornalismo. Simplesmente não tiveram como enfrentar a guerra implacável da concorrência capitalista. É claro que o fato de gozar da confiança dos donos do poder dava a certos empresários mais facilidades para obter créditos e preferência na publicidade e, portanto, melhores condições para permanecer à tona.

Depois de 1964 desapareceram diários de certa tradição, com tiragens na época equivalentes às dos maiores jornais de hoje. Assim, deixaram de circular o Diário de Notícias (fundado em 1930), o Correio da Manhã, Diário da Noite, Diário de São Paulo, O Jornal, todos com orientação contrária ao governo Goulart e com posições que facilitaram o golpe de 1° de abril. Desapareceram também o Diário Carioca e a Última Hora, que adotavam posições nacionalistas, A Última Hora, fundada em 1955 por Samuel Wainer, constituiu uma cadeia de jornais com edições regionais e com tiragens expressivas em Brasília, Niterói. Porto Alegre, Recife, Belo Horizonte, sendo que no Rio tinha em média 150 mil exemplares por tiragem, e em São Paulo, 200 mil. Foi truculentamente liquidada pela ditadura através de pressões políticas e econômicas. Os que ainda circulam em nossos dias com estes títulos não têm nada a ver com a antiga "UH".

Independentemente da posição política de cada um desses órgãos de imprensa, o que fica patente é a limitação das oportunidades de informação, é a substituição de vários jornais por uns poucos instrumentos de grupos poderosos, em geral associados a grandes bancos e trustes internacionais. Com isto empobrece-se a informação, restringe-se, objetivamente, a democracia.

Como resultado desse processo, no início da década de 1950, publicavam-se no país uma média de 10,6 diários para cada 1.000 habitantes. No início dos anos 1960 esse número caiu para 5,4 e na década de 1970 para 3,5. No período do "milagre", sob o impulso dos altos índices de crescimento econômico, as tiragens dos grandes jornais e revistas se elevaram, mas sem compensar o crescimento da população e a liquidação de tantos órgãos de imprensa nestas décadas. E o interesse da burguesia desloca-se cada vez mais da imprensa escrita para a televisão principalmente. A tal ponto que o número de estações transmissoras de TV cresceu de 23, em 1961, para 52, em 1971, e para 68, em 1981. O número de domicílios com aparelhos de televisão subiu aproximadamente de 2,4 milhões em 1966, para 18 milhões em 1980. E da verba total de publicidade destinada aos meios de comunicação, em 1984, a televisão ficou com 61,4%, enquanto os jornais ficaram com apenas 12,3%. A disparidade é tão grande que alguns estudiosos do assunto se declaram pessimistas quanto às possibilidades de sobrevivência do jornalismo escrito.

Alguns dados servem para ilustrar como a produção de jornais se tornou proibitiva para quem não dispõe de grandes recursos. Entre 1943 e 1963, num espaço de 20 anos, portanto, o custo do papel de imprensa importado (que naquela época tinha domínio absoluto do mercado) subiu 5.744% – de Cr$ 2,50 para Cr$ 135,00 o quilo. Enquanto isso, num espaço de menos de dois anos, de janeiro de 1984 até outubro de 1985, a elevação do preço do papel foi de 745% – de Cr$ 671 para Cr$ 5.670. Só neste ano, de janeiro a outubro de 1985, a diferença foi de 130%. Já os custos de transportes subiram aproximadamente 121% e os custos gráficos mais de 160%. É claro, as grandes empresas, por diversos meios – como, por exemplo, através da participação acionária em fábrica de papel – conseguem preços menores, mas sem alterar substancialmente os dados acima.

Com isto, uma edição dominical do jornal O Estado de S. Paulo, com 172 páginas, além de outras 60 páginas tamanho tablóide dos encartes, custa, apenas de papel, Cr$ 6.472, quando o preço de cada é de apenas Cr$ 2.500. Somando os gastos com transportes, gráfica, pessoal etc. – considerando-se também que os jornaleiros ficam com uma percentagem de 30% das vendas e que os encalhes nas bancas de 50% ou mais são normais – percebe-se como o custo de produção fica distante do preço de capa. Nos dias de semana, com menos páginas, a defasagem é menor, mas o problema permanece. Essa diferença é financiada fundamentalmente pela publicidade, ou por aplicações a fundo perdido por interesses políticos ou de outra natureza.

Fica evidente que tudo caminha para restringir a atividade da imprensa aos grandes grupos capitalistas. Os dados acima – sem contar com as pressões políticas, a falta de créditos, o cerco estabelecido pelas agências de publicidade, o controle da distribuição dos jornais nas bancas e outras formas de concorrência – demonstram as dificuldades enfrentadas pela imprensa popular ou de pequenos empreendimentos democráticos, que vivem basicamente das vendas e ocasionalmente de campanhas financeiras apoiadas basicamente nos simpatizantes e nas massas trabalhadoras.

A EMPRESA CONTROLA A IMPRENSA

Na década de 1960, o sr. Octávio Frias, tradicional empresário de aves e ovos, através de um investimento de aproximadamente 8 milhões de dólares, montou o mais moderno parque gráfico do Continente, só superado por duas outras gráficas no resto do mundo. Implantou-se pela primeira vez no Brasil, a impressão a offset. O grupo "Folhas", que antes funcionava com 48 linotipos produzindo a Folha de S.Paulo e mais três jornais, passou a imprimir nove jornais, com uma produção equivalente a 250 linotipos.

Nos anos do "milagre", com tentadores incentivos para importar e obter empréstimos externos, as grandes empresas editoriais se jogaram de cabeça na "modernização" de seus equipamentos. O Brasil passou a ter o segundo maior parque gráfico do mundo, hoje com imensa capacidade ociosa. Mas todos os diários brasileiros juntos não alcançam os seis milhões de exemplares do Ashashi Shimbum, do Japão, que, no entanto, tem um equipamento gráfico muito mais modesto que o nosso.O Estado de S. Paulo, tradicional veículo de comunicação do que existe de mais conservador e entreguista no país, faz parte hoje de um gigantesco conglomerado que inclui a Rádio Eldorado, a Gravadora Eldorado, a Transportadora OESP, a Agência Estado, uma firma de planejamento e administração, além da participação majoritária na fábrica de papel PISA (Papel de Imprensa S/A). O jornal passou a ser apenas uma das muitas atividades do grupo, no qual, só para dar uma idéia, o número de engenheiros é maior do que o de editores e o contingente de guardas de segurança equivale ao de jornalistas.

A PISA, estabelecida em Jaguariaíra, no Paraná, é a maior produtora de papel de imprensa do país, com uma produção de 10 mil toneladas por mês, e com capacidade instalada de 186 mil toneladas por ano. É a responsável por quase todo o papel de imprensa consumido no país. Ligada a ela existe um reflorestamento com cerca de 25 mil hectares e aproximadamente 45 milhões de árvores (pinus) plantadas. O Jornal do Brasil é também sócio desse imenso empreendimento.

Esse processo de monopolização torna a imprensa vulnerável às crises econômicas e a envolve na marcha irrefreável de associações comandadas pelo grande capital financeiro.
Em junho de 1983, O Estado de S. Paulo teve que separar a editoria do jornal de sua operação industrial, um artifício legal, criando a Gráfica OESP e vendendo títulos no valor de 11 milhões de dólares a um pool de bancos, entre os quais Bradesco, BCN etc., liderados pelo Itaú.
Neste mesmo período, o Jornal do Brasil fez operação semelhante, criando a JB Indústrias Gráficas, vendendo 3,6 bilhões de cruzeiros em títulos aos bancos Bradesco, Bamerindus, Itaú e outros, liderados pelo Nacional. Em agosto de 1982, a Gazeta Mercantil já havia também passado 35,5% de seu capital a 12 investidores, entre eles Itaú, Bradesco, Grupo Votorantim, etc. E em janeiro de 1984, a Gazeta Mercantil comprou a revista Isto É.

Em junho de 1984, com dívidas de bilhões de cruzeiros, o grupo Caldas Junior, do Rio Grande do Sul, teve de encerrar as atividades do tradicional Correio do Povo, que circulava há 89 anos, e da Folha da Tarde, sendo que em 1980 já havia desativado a Folha da Manhã.
Nesta ciranda, a informação se concentra em poucas mãos, pondo fim à diversidade de opiniões que caracteriza a democracia burguesa. A liberdade de imprensa é submetida por interesses maiores, atrelada à liberdade da empresa, sem nenhum trocadilho.

A REALIDADE DEFORMADA

No Brasil e em todo o mundo manifesta-se uma contradição flagrante. Cresce a necessidade de mais informação, maior organização das notícias e mais análise. Mas a imprensa entra em crise, estagnada, concentrada em poucas mãos, com muitos jornais saindo de circulação. Ao mesmo tempo, as notícias cedem espaço à publicidade e para os serviços-indicações sobre bolsa de valores, lazer, turismo etc. E ainda mais, avalia-se que hoje, no Brasil, cerca de 10% das publicações vendidas em bancas são revistas pornográficas, tanto as "vulgares", para o povão, como as "refinadas", para os executivos.
Ocorre que informação é necessariamente seleção de notícias – que interessam a uns e não interessam a outros – esclarecendo a relação entre elas e o seu lugar na evolução dos acontecimentos. Assim, ao omitir certos fatos ou dar versões distorcidas sobre as coisas que mostra, a imprensa burguesa está agindo de acordo com sua condição de empresa capitalista de notícias. Objetivamente, vê a realidade de acordo com os interesses da classe a que é vinculada. E comprometida como está com a crise do sistema, não tem como informar cientificamente sobre suas mazelas, sob pena de suicidar-se.

A grande imprensa adota como paradigmas a honestidade, a imparcialidade e a objetividade. Entretanto, estes valores não são abstratos. Para um trabalhador, uma greve vitoriosa por aumento de salários é vista com alegria. Para seu patrão é um pesadelo, pois ameaça seus lucros. Pelo contrário, uma onda de desemprego pode expulsar o operário de sua casa e atirá-lo numa favela. Mas para o capitalista pode ser um alívio, salvando momentaneamente sua empresa de uma situação difícil. A notícia sobre cada uma dessas coisas será diferente de acordo com as concepções de quem informa. Mesmo as reportagens sobre as disputas de futebol, que envolvem um público considerável, dificilmente são feitas com isenção.

Em relação à Nicarágua, a imprensa nada diz sobre o combate ao analfabetismo, ao fornecer indicações sobre os avanços e problemas da produção agrícola e industrial, e nem sobre a organização dos trabalhadores em seus sindicatos. A coisa considerada mais importante, que está diariamente nos jornais, é a atividade dos contra, orientados pela CIA. E os mesmos órgãos noticiosos que justificaram e defenderam o golpe militar no Brasil, tacham de crime imperdoável a decretação do Estado de sítio pelo governo nicaragüense visando a barrar o invasor armado e treinado pelos Estados Unidos para assaltar o poder e liquidar a revolução sandinista.

Os jornais se referem aos líderes "extremistas" de EI Salvador e aos "terroristas" da OLP e hoje falam do presidente "marxista" do Peru. Mas nenhum deles aponta o líder "reacionário" ou o presidente "capitalista" dos EUA ou de outros países. Ou seja, o normal, o padrão, é o capitalismo. A conservação do sistema é desejável e a sua contestação é condenada. A notícia é, portanto, uma mercadoria como qualquer outra, sujeita às regras sociais vigentes e a própria linguagem usada para divulgá-la segue a lógica do capital.

Não é casual, portanto, o rancoroso anticomunismo destilado pelos grandes jornais e pela televisão. A atuação dos comunistas no país é flagrantemente boicotada e distorcida. E muitas vezes tratam de confundi-los maldosamente com os revisionistas. Em relação à Albânia Socialista, a imprensa burguesa só abre espaço para denegri-la, para difundir informações truncadas e mentirosas. Em relação aos social-imperialistas soviéticos, os meios de comunicação exploram suas atividades antioperárias e anti-socialistas – em tudo semelhantes às das grandes potências ocidentais –, mas tratam de apresentá-las como coisas dos comunistas, para confundir a opinião pública.

Entre o que acontece e a versão publicada encontra-se a máquina editorial capitalista, à qual os jornalistas são subordinados, independentemente de discordarem ou não de suas idéias. De acordo com o ponto de vista do patrão são feitas as pautas e a seleção de notícias, assim como decididas as formas de apresentá-las ao público. A partir desta constatação é que se pode compreender o que se informa, o que não se informa e como se informa.

Em 1978 a TV Globo deu grande destaque às "terríveis" conseqüências de uma gripe eqüina que se abateu sobre os cavalos de corrida. Em contrapartida a "Vênus Platinada" não viu os primeiros comícios das diretas, que colocaram milhões de pessoas nas praças públicas. Enxergando também com a lente distorcida pelo interesse burguês, a Folha de S. Paulo afirmava "imparcialmente" que Tancredo Neves e Paulo Maluf eram igualmente ilegítimos, pois ambos iam ao Colégio Eleitoral. O detalhe de que um tinha apoio maciço das forças democráticas e o outro era repudiado pela nação e considerado "irrelevante". E a tal ponto esta miopia contaminou o jornal que, na edição do dia 15 de setembro de 1984, ele estampava duas chamadas de capa com pequena diferença de destaque. A primeira dizia: "INDIRETAS VÃO ÀS URNAS" – tratava-se do primeiro comício de Tancredo, em Goiânia, com cerca de 500 mil pessoas. A segunda, logo abaixo e pouco menor, anunciava: "DIRETISTAS ATACAM TANCREDO" – eram os petistas, que mal conseguiram reunir sete mil pessoas em Belo Horizonte, no mesmo dia. Para a Folha, os dois fatos tinham aproximadamente a mesma importância.

Alguns órgãos de imprensa tentam apresentar sua "neutralidade" publicando em certas páginas matérias com pontos de vista discordantes. Ou entrevistando os dois lados numa disputa qualquer. É uma falsa solução, que induz o leitor a uma armadilha. Os dois artigos podem conter opiniões e dados equivocados. Os cidadãos precisam é de informação que os orientem, baseadas em dados precisos e em análises científicas, para que entendam o conjunto das coisas, percebam a tendência dos acontecimentos e tenham condições de julgar. Mesmo ao noticiar o número de pessoas de um comício, por exemplo, é comum os jornais colocarem várias quantidades – "segundo os organizadores, segundo a PM, segundo a Polícia Federal" etc. – e no fim os leitores ficam sem saber o número que se aproxima da verdade.

Na TV a edição da notícia tem enorme influência na formação da opinião pública. A transmissão direta de imagens e de palavras das pessoas envolvidas dá uma aparência de isenção e de confiabilidade, e produz grande impacto. Mas o "olhar" da câmara é dirigido, e com muito mais rigor do que a caneta do jornalista. Só vai ao ar o produto burilado, com flashes e sons considerados "relevantes" pela direção do programa.

Com o aperfeiçoamento da TV, setores ligados aos meios de comunicação especulam com a superação da imprensa escrita. Talvez seja o que corresponda aos desejos das classes dominantes, mas não tem respaldo na realidade. A TV fornece a notícia na hora que o fato acontece. Mas para captar os detalhes que a câmara apressada não pode ver, para indicar o porquê daqueles acontecimentos e analisar o seu movimento, a imprensa escrita é indispensável. A notícia limitada à TV tem como conseqüência a apresentação das coisas de maneira ligeira e superficial. A leitura é fundamental para aprofundar o estudo e o conhecimento. Na TV a burguesia apresenta com mais facilidade o mundo fragmentado, destaca o curioso, o dramático, escondendo o essencial. Fala sobre uma enorme variedade de coisas, dando aos espectadores a impressão de que estão sendo muito bem informados, quando na verdade ficam sabendo "de tudo um pouco" mas quase nada de tudo.

MONSTRO DE DESINFORMAÇÃO

Com o noticiário, assim como nas novelas e outros programas de alcance nacional – e até internacional em certas transmissões via satélite – a TV uniformiza e massifica a informação e o modo de pensar. Dá a mesma notícia, difunde os mesmos comportamentos sociais, os mesmos valores, e da mesma forma, para o operário da Volks em São Bernardo do Campo, como para os assalariados da cana de Pernambuco ou para os garimpeiros de Serra Pelada, no Pará. Em escala gigantesca, tenta convencer o mundo a adotar um determinado modo de vida e uma determinada maneira de ver as coisas, tudo "made in USA".

Já no século passado Marx alertava para a tendência de a imprensa burguesa de omitir "os vínculos invisíveis que conectam o particular com o geral". Na televisão isto é levado ao extremo, na desesperada tentativa dos trustes econômicos de monopolizarem também as mentes e os corações das pessoas e sujeitarem-nas à exploração.

O grande problema da burguesia é que os fatos, se analisados em seu conjunto e desenvolvimento, vão contra os interesses do capitalismo, revelam sua incapacidade para enfrentar os problemas sociais de nosso tempo e a necessidade de sua substituição por um novo regime. Por isso, para preservar o sistema, a lógica da informação capitalista é a de localizar "defeitos" nas instituições, como se fossem coisas locais ou pessoais, para camuflar sua falência no essencial; de apresentar os dramas de determinados indivíduos como se fossem exceções, fora da realidade social. Desta forma a revolta contra o status quo é prevenida com dosagens reguladas da "doença", como se faz na medicina com as vacinas. E a população é convidada a procurar soluções particulares, fora dos instrumentos de reivindicação coletiva estabelecidos.

Tudo isto prova, também no terreno da imprensa, a falência da burguesia como classe dirigente. Os imensos recursos da informática, os satélites de comunicação, os meios modernos de impressão e transmissão permitem uma organização superior da notícia, o enriquecimento cultural, a evolução do saber e sua democratização, a localização científica das tendências econômicas e políticas. Mas ocorre que a informática é controlada por uma oligarquia super-seleta. Os conhecimentos científicos são reservados às elites dominantes, os meios de comunicação de massas são utilizados para a "desinformação" como parte do desatinado esforço para impedir as transformações sociais. Segundo avaliação do jornal inglês The Economist, publicado em encarte na revista Senhor, n° 239, os conhecimentos sobre mercado financeiro, por exemplo, que dizem respeito tanto à dívida externa como ao preço do arroz que atormenta diariamente as donas de casa, são monopolizados no mundo por umas 300 pessoas.

Os computadores no Brasil estão sendo empregados pela imprensa para controlar o ritmo de trabalho dos redatores, para revisão e diagramação de jornais. Ou seja, para perseguir os trabalhadores do setor, ou então em aspectos secundários da produção jornalística e causando mais desemprego. E na TV continuam batendo recordes de audiência programas como Fantástico, para não falar em Sílvio Santos, Chacrinha etc. O vulgar e o grotesco são vendidos como cultura popular, a curiosidade de almanaque – ou de circo – aparece como ciência, inclusive através de entrevistas exclusivas, via satélite, diretamente dos EUA.

HARMONIA DO LOBO COM O CORDEIRO

Um aspecto que merece atenção no estudo da monopolização da imprensa e no seu papel como controladora da opinião pública pela burguesia é o das agências de notícias. Já vimos no início deste artigo alguns dados alarmantes. Há décadas atrás o ex-presidente norte-americano Dwight Einsenhower, orientava o serviço de informação dos EUA para "levar aos habitantes das outras nações, por meio de técnicas de comunicação, evidências de que os objetivos e as políticas dos EUA estão em harmonia e farão avançar as suas legítimas aspirações de liberdade, progresso e paz".
Mais recentemente, avaliando com bastante lucidez esta atividade, o ex-presidente venezuelano, Carlos Andrés Peres, afirmava: "A imprensa internacional seleciona apenas a informação que denigre a imagem de nossos povos, e a grande imprensa e os meios audiovisuais do mundo industrializado ignoram nossas lutas, nossos esforços e justas reivindicações em prol de um sistema de justiça internacional".

Na América Latina, dois terços das notícias – do continente para o resto do mundo, dos outros continentes para a América Latina e no seu próprio interior – são controlados por duas agências norte-americanas de notícias, a UPI e a AP. No Brasil é fácil notar este monopólio. As notícias estrangeiras, e as fotos, são as mesmas em todos os jornais. Cada um apenas decide se utiliza maior ou menor quantidade de material recebido, escolhe um título e uma diagramação particular. Mas o conteúdo é o mesmo.

Um exemplo flagrante de manipulação dos fatos ocorreu com o Suriname. Em 25 de novembro de 1975 este país tornou-se independente. Apenas cinco jornais latino-americanos deram chamadas de capa para essa notícia, dos 16 que falaram no assunto. Em 16 de fevereiro de 1980 os generais deram um golpe e tomaram o poder neste país. Isto, entretanto, mereceu farto noticiário. A tal ponto de apenas um diário, El Mercúrio, da Venezuela, publicar sozinho uma quantidade de linhas maior do que as utilizadas pelos 16 diários juntos, na época da independência.

Usando a seu bel-prazer a seleção de notícias, as agências imperialistas forjam a idéia de que os países latino-americanos são incapazes de resolver seus problemas, confusos e incoerentes. Enquanto isso, o menor êxito dos patrões norte-americanos, em qualquer terreno, é alardeado como uma nova maravilha do mundo e prova irrefutável de sua superioridade.

Em articulação com a atuação das agências de notícias, a maior parte das pesquisas de opinião pública e de mercado do continente é realizada por firmas norte-americanas ou por suas filiais locais. Servem aos magnatas das metrópoles na orientação dos gostos da população, facilitando a colocação de mercadorias, fornecem informações preciosas aos estrategistas e governantes estrangeiros sobre o estado de ânimo do povo e dão indicações-chave para a manipulação das idéias. Basta ver o papel decisivo das pesquisas eleitorais nas campanhas dos candidatos. As próprias pesquisas, em si, tornaram-se um componente básico da campanha. E o grande astro é o Instituto Gallup, ligado ao Gallup Internacional, dos EUA. Bastam dois pontos a mais para fulano e dois pontos a menos para sicrano, e a mídia se encarrega de fulminar: "enquanto tal candidato cresce, o outro despenca…", provocando reviravoltas radicais nas programações de cada um. E para especialistas na arte de ludibriar, dois ou três pontinhos não deve ser difícil de arranjar, sem prejudicar a fama de "infalível". Estes mesmos pesquisadores, com sua imensa "sapiência e cientificidade", revelam também como os "comunistas atrapalham e tiram votos" fornecendo munição boa e barata aos reacionários.

"LIBERDADE É UMA CALÇA DESBOTADA"

Um capítulo à parte na influência do capital sobre a imprensa cabe às agências de publicidade. Em toda a América Latina a publicidade é a principal financiadora dos meios de comunicação. Segundo estimava Nelson Werneck Sodré, na década de 1960, 80% da renda dos jornais brasileiros vinham dos anúncios.

Em 1984, os investimentos em publicidade no país alcançaram cerca de Cr$ 3 trilhões. As 350 maiores agências tiveram um faturamento de Cr$ 2,36 bilhões, sendo que as dez principais foram responsáveis por 47% desta quantia, o que demonstra ser uma área extremamente concentrada, com imenso poder de pressão.

Entre as maiores agências no Brasil, a Alcântara Machado é a segunda colocada, sendo que o principal anunciante, seu cliente, é a Volkswagen. Enquanto isto, a McCann-Erickson, a oitava maior do mundo, é a quinta em nosso país. Entre os anunciantes, os cinco maiores são: o Grupo Pão de Açúcar, Nestlé, Mesbla, Souza Cruz e Dorsay. Isto é, o capital estrangeiro tem amplo domínio no terreno da publicidade, como aliás em toda a economia de nosso país.

Em toda a América Latina, a publicidade ocupa em média 46% do espaço nos jornais. Pegando ao acaso uma edição dominical de O Estado de S.Paulo com 168 páginas, encontramos 127 com publicidade e apenas 41 com matérias. Sem contar que entre os artigos boa parte é de serviços e não de informações e análises no sentido próprio do jornalismo. E sem computar as páginas dos encartes – com suplementos femininos, que são praticamente todos de publicidade e serviços. Tomando também aleatoriamente um exemplar de meio de semana da Folha de S.Paulo, com 58 páginas, aproximadamente 23 continham matérias e 25 publicidade.

Clientes como o Mappin – que, aliás, é o décimo maior anunciante do país – têm muitas vezes mais de uma página de publicidade nas edições dominicais do Estadão e gigantes da construção civil, como Julio Bogoricin e outros, dispõem também de enormes espaços. Seria ingenuidade imaginar que o tradicional órgão de imprensa da família Mesquita tivesse isenção para contrapor-se aos interesses dessas empresas. Assim como seria pedir muito que a associação com o Banco Itaú não influenciasse na simpatia do jornal pelo sr. Jânio Quadros – apesar de um ou outro atrito secundário surgido no percurso da campanha, fruto de contradições naturais entre as classes dominantes. Aliás, esta simpatia tem mais efeito, em parcelas do público, se aparecer sutilmente como se fosse apenas o reconhecimento "imparcial" das "virtudes" do candidato.

Além de influir na linha editorial, na seleção de notícias e no seu destaque, a publicidade difunde, ela mesma, os seus conceitos – como a que afirmava que "liberdade é uma calça desbotada" e outras baboseiras, além da humilhante utilização de mulheres e crianças como instrumentos para comover os espectadores.

A publicidade – comercial e estatal – joga peso extraordinário nos meios de comunicação. E não se submete propriamente às leis de mercado. É estreitamente ligada a interesses maiores, de natureza política. As alianças políticas tornaram-se, com isto, peças fundamentais na produção de um jornal, pois determinam o financiamento ou o boicote das poderosas agências de publicidade.

No período da ditadura, um exemplo ilustrativo foi o envolvimento do SNI para forçar os anúncios na revista O Cruzeiro. Outro caso foi o do Correio da Manhã que, embora tenha contribuído na preparação do golpe, opôs-se à violação das liberdades democráticas pelos generais depois de 1° de abril de 1964. Imediatamente teve as verbas de propaganda cortadas. E mesmo esgotando suas edições, avidamente procuradas pelo público, não teve como evitar a crise financeira e o colapso. Antes disso ainda aceitou um interventor ligado às empresas publicitárias e submeteu-se à vexaminosa imposição de dispensar o jornalista Carlos Heitor Cony e de proibir que o combativo Otto Maria Carpeaux assinasse qualquer matéria em suas páginas. Mesmo assim foi a pique.

UMA PARTE DA LUTA DE CLASSES

O jornalismo, longe do que apregoam hipocritamente as classes dominantes como atividade neutra e imparcial, é um terreno de disputa feroz pela opinião pública, dentro da luta de classes geral da sociedade. No sistema capitalista serve principalmente à burguesia, pelo controle cada vez maior desta atividade pelo capital monopolista, e pelo capital financeiro em particular. Por outro lado, não se pode esquecer que mesmo os jornais menores, desde que suas posições correspondam aos anseios das massas trabalhadoras, cumprem imenso papel na luta pela liberdade e pelo socialismo.

Neste sentido, na discussão da Constituinte, e na remoção do chamado entulho autoritário, é da maior importância o movimento popular e democrático batalhar por uma nova legislação a respeito da imprensa. É vital eliminar as restrições à livre manifestação do pensamento e os mecanismos de perseguição aos jornalistas. Da mesma forma é urgente proteger a imprensa democrática e popular do massacre dos monopólios e criar meios de defesa contra a utilização da publicidade como instrumento de dirigir a informação. Encontros e congressos de jornalistas já formularam diversas sugestões a respeito que precisam ser estudadas e desenvolvidas pelos trabalhadores e estudiosos do assunto. Por exemplo, seria necessário que os pequenos e médios jornais contassem com subsídios oficiais para a compra de papel assim como para a utilização de gráficas além de outras facilidades.

Na televisão deve-se assegurar acesso para as correntes de opinião, em particular os partidos políticos, assim como para informações sobre a atividade parlamentar e sindical. O movimento democrático teria também que pressionar para dinamizar e conquistar lugar nos demais canais em mãos do governo, visando a incentivar a cultura popular, o debate de idéias, assim como a presença das lideranças de massas. Já se falou inclusive em criar uma TV do Congresso Nacional – ou horários nos canais já existentes, para ampliar os debates políticos sobre os problemas nacionais. Todas essas são tentativas de fazer os interesses sociais serem respeitados nos meios de comunicação. Dentro desta ótica impõe-se uma luta permanente contra o sistema exclusivista e discriminatório de concessão de canais de rádio e TV a grupos particulares.

Falta espaço para nos estendermos aqui sobre estas propostas visando a democratizar a informação. É bom apenas lembrar ainda que nesse esforço é fundamental que o povo tenha acesso a auditórios maiores e melhores para conferências, exposições culturais e artísticas, atos políticos etc. Para se ter uma idéia da urgência disto, basta lembrar que os sindicatos hoje, para realizarem suas assembléias, são obrigados a sair para as praças, com os trabalhadores de pé, sem condições apropriadas para uma discussão.

Estas formas de resistência democrática têm imenso valor. Mas é preciso que se tome consciência de que elas são insuficientes para resolver o problema da liberdade de imprensa e de informação. Não se pode pensar em deter a marcha da monopolização da economia, inerente à etapa imperialista do capitalismo. A solução dos problemas dos trabalhadores não pode ser encontrada tentando frear a história. Pelo contrário, o progresso social depende de transformações mais aceleradas, e da substituição deste sistema atual, caduco, pelo novo, que liberte a sociedade das amarras da propriedade privada. Que transforme o monopólio em propriedade social.

Lênin já indicava: "Com vistas a conquistar a igualdade efetiva e a verdadeira democracia para os trabalhadores, para os operários e camponeses, é preciso começar por privar o capital da possibilidade de alugar escritores, de comprar editoriais e subornar jornais, mas para isto é necessário destruir o jugo do capital, derrubar os exploradores e vencer sua resistência (…) Os capitalistas denominam liberdade de imprensa, a liberdade de suborno da imprensa pelos ricos, a liberdade de utilizar a riqueza para forjar e falsear a chamada opinião pública".

Só com a propriedade social dos meios de produção é possível colocar o imenso poderio da indústria da informação a serviço da grande maioria. Em vez da seleção de notícias para manter o público desinformado, ou para levar os povos a pensarem que "os objetivos e políticas dos EUA estão em harmonia com suas aspirações" – como orientava Einsenhower – os computadores, os satélites, os raios laser serão utilizados pelo proletariado para elevar o nível de conhecimento e permitir que as grandes massas participem consciente e planejadamente da construção do mundo. A informação deixará de ser uma mercadoria para se tornar ferramenta poderosa na defesa dos interesses sociais.

Vale notar que enquanto em todo o mundo capitalista a imprensa se debate numa crise cada dia mais profunda, na Albânia Socialista é uma atividade em franco crescimento. Em 1979 eram editados neste país 60 vezes mais livros e 17 vezes mais jornais que em 1938, último ano antes da invasão das tropas fascistas na Segunda Guerra Mundial. Em 1981 a Albânia publicava cinco vezes mais jornais por habitante que o Brasil – proeza invejável para uma nação que, em 1944, quando se libertou, tinha um índice de analfabetismo em torno de 80%, além de uma economia devastada pela guerra.

* Rogério Lustosa é jornalista, diretor do semanário nacional Tribuna Operária e membro do Conselho Editorial da Revista Princípios.

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EDIÇÃO 12, DEZEMBRO, 1985, PÁGINAS 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38