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    Antirracismo

    Resgate da negritude em poesias

     série Cadernos negros, criada em 1978, “tem trazido à luz uma literatura não oferecida pela grande maioria das editoras nacionais. Autores procedentes de vários lugares vêm publicando aqui seus poemas e contos”. Assim Márcio Barbosa fala sobre a importância desta obra para a literatura brasileira. Para Clóvis Moura, que apresenta esse volume, “são dezessete anos […]

    POR: Redação

    3 min de leitura

     série Cadernos negros, criada em 1978, “tem trazido à luz uma literatura não oferecida pela grande maioria das editoras nacionais. Autores procedentes de vários lugares vêm publicando aqui seus poemas e contos”. Assim Márcio Barbosa fala sobre a importância desta obra para a literatura brasileira. Para Clóvis Moura, que apresenta esse volume, “são dezessete anos de produção literária ininterrupta, fato quase inédito na militância cultural dos negros em São Paulo”.

    O livro traz obras de cinco poetas, nas quais pode-se sentir a força da palavra para uma “afirmação literária do negro”, explica Clóvis Moura. Já Márcio Barbosa acredita que “a importância literária da poesia negra não é algo que possa ser atestado por apenas um volume”. Ele acentua que “a leitura deste Cadernos negros 17 (Editora Anita em parceria com o grupo Quilombhoje), entretanto, mostra muito a favor da afirmação dessa importância”.

    Poemas como Serão sempre as terras do senhor?, de Esmeralda Ribeiro, atestam essa força e qualidade:

    É invasão
    o homem
    fincar os pés na terra, pois
    será a própria Terra que
    vai devorá-lo como
    um joão-ninguém?

    Ou os do poeta Jamu Minka, José Carlos de Andrade, que possuem a mesma força e graça de sua colega, como em Novembro, 20, data de aniversário da morte do líder dos Palmares, Zumbi, e Dia nacional da Consciência Negra:

    Canhões do racismo contra a fartura
    lições da brutal brancura: o negro negar-se sempre
    gerações famintas de corpo e espírito
    Rebelião, este sonho é bicho de mil fôlegos
    antigas trilhas da mata renascem no século XX

    Os editores explicam que “os textos passaram por uma avaliação – feita por escrito, com utilização de pseudônimos –, que envolveu todos os escritores e teve por objetivo estimular a discussão literária”. Colaboraram nesse processo a professora de teoria literária Marisa Lajolo e o leitor Eraldo M. Ferreira.
    A poeta Miriam Alves também deixa sua marca de indelével lirismo, mostrando sua realidade particular que atinge o universal, devido ao seu caráter de cunho social. Um exemplo é o poema Abandonados:

    Eram meninos
    menores
    errantes na terra dos homens
    Eram meninos menores
    agonizantes
    sedentos nus
    Eram meninos
    menores agora… não eram
    nenhum

    Ou a beleza original das obras de Oubi Inaê Kibuko, Aparecido Tadeu dos Santos, na poesia Tranças:

    Rasta búzios kanekalon
    crespa estética assentada
    laço traço toque afro
    magia apaixonando meu olho
    num entrelaçar de seduções pretinhas

    Para finalizar, a poeta Sônia Fátima da Conceição destila seus versos como quem prepara uma aguardente rara e muito especial. Sinta o sabor no poema O Dia:

    Mau-comunado
    com pré-conceitos
    não concebe

    nonegro

    Esperanças
    nascendo na noite.

    EDIÇÃO 34, AGO/SET/OUT, 1994, PÁGINAS 82