A classe operária no limiar do século XXI
As últimas décadas deste século têm sido marcadas por profundas mudanças no mundo do trabalho. As transformações em curso decorrem principalmente do desenvolvimento objetivo das forças produtivas. Dão-se, contudo, no interior do capitalismo, e são condicionadas pelas relações de produção próprias desse sistema.
Nos países avançados, que se consumaram nas primeiras décadas deste século, a transição das economias agrárias para industriais (alterando a composição demográfica, em especial a População Economicamente Ativa – PEA – entre campo e cidade), as mudanças nos três setores da economia (primário, secundário e terciário) são acompanhadas por mutações de classes e grupos sociais.
O campo sofreu um expressivo esvaziamento. Nos países desenvolvidos, apenas 4% dos trabalhadores empregados estão na agricultura. O chamado setor secundário (onde se destaca a indústria de transformação), que crescera sensivelmente durante o processo inicial de urbanização, está registrando um declínio relativo tanto da sua expressão econômica mais global como, em especial, de sua importância como provedor de empregos.
Verifica-se, em contrapartida, o crescimento do setor terciário, embora não em dimensão adequada para absorver a mão-de-obra liberada pelos outros setores. Com as inovações tecnológicas modernas (que, em conjunto, e na velocidade em que se desenvolvem, configuram uma terceira revolução técnico-científica, centrada principalmente na área da informática), eleva-se como nunca a produtividade e opera-se cada vez mais a substituição do trabalho vivo por trabalho morto. Só encontramos paralelo para esse processo na revolução industrial do século XVIII, que substituiu a ferramenta pela máquina-ferramenta.
Conforme previa Karl Marx, ao analisar os impactos sociais da automação, a produção passa a depender cada vez menos do trabalho operário e cada vez mais das máquinas instaladas no sistema produtivo, bem como do nível geral de desenvolvimento da ciência:
“À medida que a grande indústria se desenvolve, a criação de riqueza efetiva torna-se menos dependente do tempo de trabalho e da quantidade de trabalho empregado do que frente aos agentes postos em movimento durante o tempo trabalhado que, por sua vez, não guarda relação alguma com o tempo de trabalho imediato que custa sua produção, mas que depende mais do estado geral da ciência e do progresso da tecnologia, ou da aplicação dessa ciência à produção”.
Conforme define o sociólogo francês Jean Lojkine, a automação “flexível”, característica da atual revolução tecnológica, designa a passagem da “máquina ferramenta ao sistema das máquinas auto-reguladoras. Isso implica a capacidade de a automação substituir não somente as mãos humanas, como também as funções cerebrais requisitada pela vigilância das máquinas-ferramentas”. A flexibilidade e a integração se opõem à base técnica rígida e à segmentação do sistema mecânico e organizacional desenvolvidos pelo taylorismo e fordismo. Nas empresas flexíveis e integradas, a verticalização dá lugar à horizontalização da produção com as “terceiras”, as subcontratadas, conectadas em escala nacional ou mundial, criando a tendência à descentralização da produção em empresas de menor porte. Substitui-se o trabalho parcelarizado pelo trabalho por fluxos produtivos através das equipes, células de produção ou Círculos de Controle de Qualidade – CCQ. Com a reengenharia, muda-se o chão da fábrica e enxuga-se a mão-de-obra.
A produção em série cede lugar à produção com maiores variações e dirigida pela demanda. A hierarquia rígida é substituída por uma hierarquia enxuta, que utiliza chefes de equipes muitas vezes escolhidos pelos próprios operários. Essas são, entre outras, mudanças ocorridas no processo produtivo.
As potencialidades e contradições
O avanço da produtividade impulsiona a liberação de trabalho vivo independentemente do modo de produção no qual se verifica. Esse fenômeno tem um sentido geral progressista. A redução do tempo de trabalho necessário para a produção de bens e mercadorias abre na história a possibilidade de operar mudanças radicais na sociedade, em especial no mundo do trabalho. O volume a cada dia maior de produção pode inaugurar uma era de fartura e garantir a satisfação mais ampla dos consumidores, superando a escassez, a fome, a miséria. Ao mesmo tempo, numa situação de pleno emprego, com o grau de produtividade alcançado e em perspectiva, é viável uma substancial redução da jornada, capaz de conferir ao trabalho um outro significado. Em vez de um suplício, seria uma atividade mais atraente, criativa, que pouco a pouco se confundiria com o domínio, hoje certamente mais nobre, das artes da filosofia e da ciência.
“Sob o capitalismo, crescem o desemprego e outros efeitos altamente perversos”
Sob as relações de produção capitalista, tal cenário é impossível. O crescimento da produtividade nesse sistema, causa em vez da redução da jornada, desemprego estrutural e em massa, além de outros efeitos perversos para os trabalhadores e contraditórios para a burguesia:
1- Desemprego estrutural, que no capitalismo decorre das novas condições de produção de bens e serviços: CNC (Controle Numérico Computadorizado) na indústria, o sistema on line nos bancos, a leitura ótica nos supermercados, os equipamentos eletrônicos nos hospitais e outros. Essas inovações estão levando a uma significativa redução do tempo socialmente necessário para a produção. No mercado de trabalho, estão diminuindo as áreas de compensação e absorção de mão-de-obra, destruindo-se definitivamente postos de trabalho e até profissões. A população trabalhadora vai sendo composta por um segmento de empregados mais ou menos estáveis e uma grande massa excluída do processo produtivo. Tal situação coloca para a sociedade a necessidade premente de uma mudança radical na gestão do trabalho, com a redução da jornada, requalificação profissional e realocação da mão-de-obra.
2- Expressivo crescimento do subproletariado, do trabalho temporário, precário e outros vinculados à economia informal. Desse incremento de trabalhadores, um contingente expressivo é composto por mulheres. Segundo Helena Hirata, no Japão, em 1980, 20% das mulheres trabalhavam em tempo parcial, em condições precárias. Na França, entre 1981 e 1986, 80% do volume de emprego gerado em tempo parcial foram preenchidos pela força de trabalho feminino, de acordo com Ricardo Antunes. Visando à maximização do lucro, o capital hoje prioriza empregar um número menor de trabalhadores estáveis, e flexibiliza o grosso da mão-de-obra com o trabalho temporário e terceirizado. Aí se combinam a exploração da mais-valia absoluta e relativa.
3- Aumenta o controle do trabalho pelo capital, através da desqualificação profissional, com a simplificação dos trabalhos complexos que subsistiam no interior das fábricas fordistas (de ferramenteiros, torneiros-mecânicos e projetistas, que tinham maior estabilidade na empresa e liderança entre os operários) através da apropriação do saber operário, transferido para os programas das máquinas. Surge a polivalência, com o trabalhador operando simultaneamente de três a cinco máquinas. Além disso a micro-eletrônica permite o registro do trabalho que está sendo realizado e o aumento da sua intensidade.
4- Novas doenças ocupacionais: se, de um lado, as mudanças no processo de produção liberam o assalariado de trabalhos penosos, perigosos, e mesmo do desgaste físico, de outro, provocam novas doenças ocupacionais como o estresse, esgotamento psicológico e Lesões por Esforço Repetitivo (LER). O cérebro é “sugado” e controlado pela máquina. No coração do toyotismo surge o karoshi, termo que se refere à morte súbita no trabalho, provocada pelo ritmo e intensidade alucinantes da produção.
As contradições dentro da globalização da economia
A substituição de trabalho vivo por trabalho morto reflete-se na alta composição orgânica do capital, pondo em movimento a tendência à queda das taxas de lucro. Ao lado desse fator, o crescimento do setor terciário e do desemprego estrutural (cujo custo é elevado) subtrai recursos do setor produtivo. Essas estão entre as principais causas da atual crise do sistema capitalista. Diante dessa situação, a burguesia idealiza e coloca em prática a política neoliberal, que representa a antítese do keynesianismo, adotado como solução para a crise dos anos 1930. Advoga a redução do Estado, a eliminação de direitos sociais, o desmanche da previdência e seguridade, o desemprego em massa, divisão e pulverização dos sindicatos, desregulamentação e arrocho dos salários.
Vale ressaltar, também, a ofensiva contra a soberania das nações dependentes, forçadas a uma abertura indiscriminada de suas economias para os grandes monopólios imperialistas e à subordinação de uma nova divisão internacional do trabalho, onde é reservado às grande potências o papel de supridoras do saber, da pesquisa e da alta tecnologia, enquanto se impõe ao Terceiro Mundo a produção em setores industriais de menor relevância. Segundo o Banco Mundial, 80% das indústrias estão concentrados, atualmente, nos países mais pobres, enquanto nos países ricos mais de 60% da População Economicamente Ativa já estão empregados no setor terciário. A distribuição da população operária no mundo também reflete essa nova realidade: entre 1960 e 1990, os efetivos industriais passam de 250 para 450 milhões, mas os Estados Unidos, o Japão e a Comunidade Econômica Européia, juntos, só têm um quinto deles.
“O objetivo maior do neoliberalismo é a recomposição das margens do lucro capitalista”
Política traçada pelos grandes grupos monopolistas sediados nos países imperialistas, o neoliberalismo tem como objetivo maior a recomposição das margens de lucro e, a partir disso, a superação da crise, inaugurando um novo ciclo de prosperidade. Esse é o objetivo, que, entretanto, parece não estar sendo atingido. Essa saída vai na contramão da história e aprofunda, em vez de solucionar, a crise.
O operariado brasileiro
País do chamado Terceiro Mundo, de capitalismo dependente, o Brasil viveu um processo de industrialização relativamente tardio, se comparado ao das nações européias, dos Estados Unidos e do Japão. Ainda em 1960, a agricultura ocupava 54% da População Economicamente Ativa (PEA). Em consequência, a classe operária brasileira é nova. Registra um crescimento quantitativo sensível a partir dos anos 1940, e também teve o perfil alterado, concentrando-se em grandes unidades industriais, com a implantação das empresas automobilísticas e aindustrialização pesada.
Em 1980, a urbanização do país já se havia completado, com 69,8% da PEA nas cidades, enquanto a agricultura empregava 30,2% da mão-de-obra, conforme o IBGE. O esvaziamento do campo continuou, de forma que, em 1990, esse percentual caiu para 22,8%. Tais mudanças aconteceram de forma desigual nas diferentes regiões do país. A luta dos camponeses ainda joga um papel destacado no movimento social.
Observa-se a afirmação das novas tendências do mercado de trabalho verificadas nos países mais avançados. Ocorre declínio relativo do emprego industrial, crescimento do setor terciário, avanço do trabalho precário e, igualmente, surgimento e ampliação dos chamados novos atores. São fenômenos que se desenvolvem condicionados pela dependência econômica que caracteriza o capitalismo nacional.
E 1990, existiam 40,2 milhões de trabalhadores assalariados no país (65% do total de trabalhadores). Destes, apenas 38% tinham carteira profissional assinada. Do total de crianças brasileiras entre 14 e 18 anos, pelo menos 18% trabalham fora para ajudar na casa. Entre 1990 e 1992, somente em São Paulo, desapareceram meio milhão de empregos apenas no setor industrial, devido ao processo acelerado de subordinação à economia globalizada. Conforme a amostragem domiciliar (PNAD/IBGE) de 1990, 54,4% da PEA estavam ocupados no setor terciário, enquanto a indústria empregava 22,8%, o mesmo percentual da agricultura. Em 1980, o setor respondia por 26% do emprego do país. Cabe considerar ainda que, entre 1960 e 1980 (período de industrialização pesada), as maiores taxas de crescimento de emprego foram registradas pela construção civil, serviços de utilidade pública, instituições financeiras, educação, saúde e recreação. A participação do conjunto desses ramos na PEA não agrícola aumentou de 12,4%, em 1940, para 18,2%, em 1960, e 28,2%, em 1980. Esse setor da classe trabalhadora (empregado do comércio, prestação de serviços, governo, transporte e comunicação etc.) sofreu e vem sofrendo um dramático processo de proletarização; tem encabeçado importantes lutas contra o arrocho salarial e está destinado a ter um papel fundamental, ao lado do operário industrial, dos trabalhadores rurais e dos estudantes, na luta contra a ofensiva neoliberal em defesa do socialismo.
O papel da classe operária e a luta consciente
Teóricos da burguesia elaboram teses cujo centro reside em “provar que a atualidade retira o papel histórico da classe operária. Os principais argumentos referem-se à redução tendencial da classe e às mudanças radicais do processo produtivo, que retirariam, ao mesmo tempo, a sua força e papel central da sociedade. A proliferação de novos atores e movimentos sociais, que surgiram na cena política, teria substituído a luta de classes. Marx, ao evidenciar o papel histórico da classe operária, enfoca a questão quantitativa como um elemento acessório em seus argumentos, que não compõem o núcleo central das suas conclusões teóricas. A centralidade da classe operária se coloca em função do seu insubstituível papel na valorização do capital e do espaço que ocupa no processo produtivo, o que faz com que apenas essa classe possa reunir as condições necessárias para subverter a ordem burguesa.
“A idéia de uma fábrica sem homens é falsa e ideológica”
Apesar do crescimento absoluto da classe operária, a generalização das inovações tecnológicas aponta para a sua redução, mas isso não significa o seu desaparecimento. O trabalho humano dos operários é fundamental em qualquer tipo de produção, por mais automatizada e informal que seja. A idéia de uma fábrica sem homens é falsa e nitidamente ideológica.
A produção está cada vez mais dependente do trabalho coletivo, tanto intra-empresa como inter-empresas (fornecedoras subcontratadas). Esse é um outro efeito da revolução tecnológica que exige maior integração entre as diversas fases do processo produtivo. O mapeamento desse processo, realizado pelos operários, possibilita maior conhecimento do processo global da produção, e também a identificação dos pontos estratégicos. O processo de produção fica mais vulnerável à ação dos trabalhadores. Para o capital é fundamental implementar os métodos participativos de parceria e de envolvimento dos operários, através de novas técnicas gerenciais.
A questão de fundo a ser analisada não é a redução, mas sim as transformações ocorridas no perfil e composição da classe operária. As máquinas auto-reguladoras, ao mesmo tempo que alienam ainda mais o trabalhador, exigem maior grau de escolaridade e capacidade de operar com símbolos e codificações. Isso explica, de uma certa maneira, o aumento significativo de jovens no mercado de trabalho. A integração das atividades relacionadas a projetos e planejamento com a produção incorpora os técnicos e engenheiros na criação de valor e amplia os conceitos de “trabalhador coletivo” e “classe operária”. Enfim, pode estar se forjando uma nova classe operária com maior capacidade intelectual e com potencialidade para compreender o processo de exploração. As modificações ocorrem no perfil e composição da classe, com as novas tecnologias, não apontam para a sua dissolução, e sim para um aprofundamento de sua centralidade.
Novos atores sociais
Por outro lado, o aumento e a diversificação dos atores sociais não supõem o desaparecimento das classes sociais, nem da luta entre elas, que representa o eixo fundamental da sociedade de classes. De fato, prolifera, em todo o mundo, um grande número de movimentos sociais. Com isso, a cena social e política se torna cada vez mais complexa. Esse fenômeno é resultado de modificações sociais e econômicas ocorridas principalmente no pós-guerra. O aumento e a urbanização da população mundial, o crescimento econômico ilimitado e descontrolado sem preocupações ambientais, o extraordinário avanço do setor de serviços, sobretudo na área da educação, saúde, transportes urbanos e informação, o crescimento do número de estudantes universitários, como um fenômeno de massas, tudo isso gera contradições que não encontram respostas no capitalismo. Estudar e compreender essa nova complexidade de conflitos é fundamental para entendermos a extensão e o aprofundamento das lutas na época atual.
Essa nova realidade requer explicações de novo tipo. Esses movimentos têm sua própria identidade e dinâmica, e é dessa maneira que devem ser entendidos. Mas é fundamental que se compreenda que esses movimentos contribuem, através de suas reivindicações e lutas, para solapar a estabilidade da dominação burguesa. No entanto, não vão à radicalidade para superar o capitalismo. A luta de classes e a vitória da classe operária são pressupostos para a solução dos antagonismos da sociedade atual. Fica mais evidente a aproximação entre operários e o conjunto dos assalariados urbanos e rurais, estudantes e intelectuais.
O fator consciente
O desenvolvimento das forças produtivas vai engendrando, objetivamente, as condições para o rompimento com o seu invólucro capitalista. O grande problema colocado para a classe operária é o fator consciente. Além do abalo provocado pela derrota histórica do socialismo, as mutações tecnológicas estão atingindo profundamente sua subjetividade. Hoje o operariado vive uma crise de identidade, decorrente da maior diversificação de sua composição – o que torna mais complexa e difícil a formação da consciência de classe. Esse fenômeno reflete-se no enfraquecimento de suas organizações e na crise do sindicalismo, com nítida tendência da redução das taxas de sindicalização.
Essa situação é explorada pelo capital que, através de seus agentes, incentiva o surgimento de um neocorporativismo por parte dos trabalhadores empregados estáveis, a concorrência entre os próprios operários, a xenofobia e o racismo (principalmente na Europa e nos Estados Unidos), ao desenvolver os valores individualistas reforçados pela mídia burguesa. Essas tendências são alimentadas pelos oportunistas do sindicalismo de negócios, de resultados e até mesmo social-democratas.
O papel do Partido
Antes de tudo, a classe operária precisa encontrar a si mesma. Ela vive no curso de uma 3ª Revolução Tecnológica. Historicamente, o proletariado sofreu impacto de duas revoluções industriais e, no processo de luta de classes, foi recompondo sua identidade de classe. No entanto, isso não opera espontaneamente – depende da mediação do partido, que desenvolve a ciência social revolucionária e atua como força dirigente na transformação social. São enormes e, ao mesmo tempo, instigantes os desafios para nos colocarmos à altura desse empreendimento histórico.
Os desafios
1- Além da agitação e da luta política, faz-se necessário desenvolver um trabalho fecundo e em longo prazo de organização partidária por local de trabalho, através de células e comitês de empresas. Tal trabalho compreende vários níveis:
a) Dentro das empresas: ajudar os trabalhadores na luta concreta contra os efeitos perversos que acompanham as mutações tecnológicas no capitalismo, de forma que tomem consciência do processo de exploração e entendam, enquanto classe, a sua importância determinante no processo integrado, nacional e mundial, da produção das riquezas da sociedade. Gramsci foi elucidativo, nesse sentido:
“O operário somente pode conceber-se a si mesmo como produtor se se considera parte inseparável de todo um sistema de trabalho que se resume no objeto fabricado; somente se viver a unidade do processo industrial, que requer a colaboração do peão, do operário qualificado, do empregado da administração, do engenheiro, do diretor técnico”.
b) Os sindicatos classistas precisam se readequar para melhor defender os assalariados. Cumprirão o seu papel na medida em que contribuírem para a elevação da educação e da solidariedade de classe dos trabalhadores, ajudando, ao mesmo tempo, na implantação das organizações de base, pressuposto fundamental de sua concepção de classe.
c) Com o desemprego estrutural, os bairros populares ganham importância na organização e educação dos operários, na ação de solidariedade e de luta dos trabalhadores desempregados e empregados.
d) Em vista das inovações tecnológicas que estão a exigir maior grau profissional e de escolaridade dos operários, o trabalho político com a juventude nas escolas profissionais, técnicas e de terceiro grau (engenharia, informática etc.) deve merecer maior atenção do Partido.
“O Programa do PCdoB vai no sentido oposto da ofensiva do neoliberalismo”
2- Lutar pelo aprofundamento da democracia hoje golpeada pelo governo neoliberal de FHC. Lutar pela garantia e pela ampliação das liberdades políticas e sindicais. A luta pela democracia deve compreender também a batalha pela igualdade de condições sociais, nelas incluídas o direito a trabalho, saúde, moradia, educação em todos os níveis, lazer, cultura e o direito legal de organização autônoma dos trabalhadores nas empresas, assim como a participação na gestão das escolas profissionalizantes e técnicas.
Essas lutas estão relacionadas com o caminho para alcançar o socialismo, como assinala o nosso Programa, que vai no sentido inverso da ofensiva neoliberal, ajuda a elevar a consciência política e social da massa trabalhadora e faz desenvolver a unidade com outros setores sociais, com a sociedade civil, partidos políticos, com excluídos, os Movimentos dos Sem-Terra, Mulheres, Negros e Estudantes.
3- Intensificar a educação socialista, como meio de elevação da consciência “em si” dos trabalhadores à consciência “para si”. Levar os operários a compreenderem melhor essa outra forma de luta de classes, a luta teórica, é fundamental para a conquista da hegemonia política ideológica do proletariados. Não é por menos que os capitalistas, além de possuírem o monopólio da mídia, se escudam em teóricos burgueses que propagam a idéia de perpetuação do capitalismo. Utilizam também os métodos participativos e de envolvimento dos operários dentro das empresas, e contam com o apoio de seus agentes no meio do movimento operário e sindical. A educação socialista assume o papel de impulsionar a luta operária pelos seus direitos e recupera sua perspectiva revolucionária e histórica.
Penso que esse três níveis de embates são inseparáveis para desenvolver a consciência da classe de trabalhadores, o que não depende só do Partido, mas também das próprias experiências do proletariado.
Conclusão
Não podemos confundir a 3ª Revolução Técnico-Científica com o neoliberalismo, desenvolvimento das forças produtivas materiais e humanas com o seu invólucro capitalista-imperialista. Pelo contrário, esse progresso extraordinário está levando a um patamar insustentável a contradição da produção social com a apropriação privada, ao mesmo tempo em que desenvolve as potencialidades para a sua superação. Nas palavras de Karl Marx:
“O roubo do tempo de trabalho alheio, sobre o qual se funda a riqueza atual, aparece com uma base miserável, [para o desenvolvimento da sociedade]. O sobretrabalho da massa deixa de ser condição para o desenvolvimento da riqueza social, assim como o não-trabalho de uns poucos deixa de ser a condição para o desenvolvimento dos poderes do intelecto. Com isso se desmorona a produção fundada no valor de troca”.
No neoliberalismo, as inovações tecnológicas são utilizadas para a maximização do lucro, o que leva a maior concentração e centralização do capital. De outro lado, surge, como consequência, a feroz exclusão social de milhões de trabalhadores do trabalho e do progresso alcançado, o que significa a pauperização da maioria dos assalariados, o desemprego estrutural crescente e a degradação do trabalho e da sociedade. Cria-se uma situação explosiva.
O proletariado não tem outra saída a não ser a luta pela revolução social. E, com a conquista do poder político, pode-se edificar a nova sociedade em outras bases, socialistas, onde o sobretrabalho será substituído gradativamente pelo tempo livre, e o progresso técnico não será mais privilégio de poucos, mas estará a serviço do bem-estar de toda a sociedade.
Nesse sentido, mais do que nunca é bem vindo o Programa Socialista do nosso Partido. Poderá jogar um grande papel na formação de uma consciência revolucionária do operariado brasileiro.
* Membro da Direção Nacional do PCdoB. Este é o texto de sua intervenção especial na 8ª Conferência Nacional do PCdoB.
EDIÇÃO 39, NOV/DEZ/JAN, 1994-1995, PÁGINAS 21, 22, 23, 24, 25