O presidente Fernando Henrique Cardoso está rindo à toa depois que descobriu um novo herói nacional, o frango, que foi a tônica de seus discursos e entrevistas de fim de ano.
A apologia do bípede coroa, de forma aparentemente feliz, a monótona cantilena entoada pelo presidente e seus acólitos ao longo de 1995 – o repetido chavão de que o Plano Real promoveu a maior distribuição de renda já ocorrida na história do país.

Isso seria muito bom se as bases das transformações anunciadas fossem sólidas.
Mas nada indica que sejam duradouras. O povo pobre, parece verdade, beneficiou-se da inflação baixa apesar de – em decorrência da jogada perversa que deixou os preços irem às nuvens nos meses de preparação do Real, no primeiro semestre de 1994 – ter pago um preço quase insuportável para que o ajuste econômico fosse feito sem prejudicar os interesses das elites brasileiras e seus aliados externos.

Mas é preciso ver direito os fatos: não é que o povo tenha ganho mais; na verdade, o que ocorreu é que quem vive de salário passou a perder menos com a inflação baixa. Se há uma virtude nas mudanças promovidas por Fernando Henrique Cardoso, ela não está na repartição de renda, mas em limitar a pilhagem inflacionária dos salários e em mostrar quanto o trabalhador perdia com a inflação alta.

É preciso relativizar os benefícios que o governo anuncia. São números modestos e precários, pouco dignos de alarde. Afinal, o consumo per capita diário, em 1995, foi de apenas 208 gramas de arroz, 56 g de feijão, 24,4 g de carne de porco, 77 g de carne bovina, 61 g de frango e 1/3 de ovo. Os brasileiros alcançaram a marca de 2.545 calorias/dia per capita, superior às 2.440 cal/dia recomendadas pelos nutricionistas. Tudo isso é bom, mas é muito pouco. Médias tão apertadas revelam que a abundância das mesas dos privilegiados ainda é o prato vazio dos que não alcançaram sequer aquele consumo mínimo. Afinal, é bom lembrar a desigual distribuição de renda no país para concluir que o acesso ao consumo de alimentos ainda não está garantido para todos os brasileiros. Pesquisa recente mostra que, apesar da renda média per capita anual das famílias brasileiras ser de US$ 4.500,00, três vezes acima da linha da pobreza, 40% dos brasileiros vivem abaixo dessa linha, com renda inferior a US$ 1.500, 00 por ano.

Além disso, é preciso também registrar que o maior consumo não resulta de uma política deliberada do governo para melhorar a vida do povo, mas é um subproduto modesto dos esforços feitos para manter o Plano Real, e que transferem bilhões de reais aos mesmos poderosos de dentro e fora do país que foram os grandes beneficiados pelos anos de inflação alta. Um estudo ainda inédito feito pela liderança parlamentar do PCdoB mostrou que 42,4% do Orçamento da União para 1996 são “encargos financeiros”, juros – quantia que representa cerca de 13 vezes a verba destinada para a educação.

O governo ancorou o Plano Real na política de atrair capitais externos e no arrocho à agricultura. Para atrair dólares e compor a reserva de US$ 50 bilhões tão alardeada, os juros foram jogados à estratosfera – são dos mais altos do mundo, cerca de 30% reais ao ano em 1995. E o Plano Plurianual de Investimentos, feito para substituir o Real, pretende aumentar a dívida externa do país dos atuais US$ 120 bilhões para 170 bilhões em 1999. Um jogo arriscado de dependência externa, que o país já viveu, e apenas agravou os problemas da imensa maioria do povo.

A outra âncora do Real, responsável pelo frango barato, a “âncora verde”, foi “um pesado ônus” para os agricultores, diz o professor Fernando Homem de Melo, da USP. Embora a inflação tenha sido de 42,3% entre julho de 1994 e outubro de 1995, os preços agrícolas aumentaram apenas 29,2%. Roberto Rodrigues, presidente da Sociedade Rural Brasileira, aponta perdas, em 1995, de R$ 5 bilhões só na cultura de grãos, e mais R$ 4 bilhões com laranja, café, cana e pecuária. Foi o pior ano para a agropecuária desde 1929, diz ele. Especialistas dizem que, em 1996, a âncora verde vai desaparecer, tragada pelos preços crescentes no mercado mundial, pelas perdas que a seca causou no sul do país e pela distribuição da área plantada, que poderá levar a uma colheita 15% menor do que a atual.
Apesar disso, Fernando Henrique ainda encontra motivos para parecer feliz. A taxa oficial de desemprego, por exemplo, é um deles. Indicada pelos critérios marotos do IBGE, que ajudam a esconder o número real dos que estão sem trabalho, ela diz que cerca de 5% da força de trabalho do país estiveram desocupados em 1995, embora o Dieese diga ter sido o dobro. O presidente reconhece que houve desemprego em algumas áreas, como calçados e metalúrgicos, mas diz que ele teria sido compensado por uma oferta maior no setor de serviços. Na média, diz, a taxa de desemprego não cresceu.

Isto é, os trabalhadores trocam de setor e as estatísticas não mudam. Recentemente, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e o Dieese mostraram a devastação que provocou esse remanejamento da força de trabalho no ABC. Ali, em 1989, 52% dos trabalhadores estavam na indústria, 12% no comércio e 36% em serviços. Em 1993, apenas quatro anos depois, o quadro mudou, e apenas 35% continuavam na indústria, enquanto 21% estavam no comércio e 44% nos serviços. A troca de setores representou um aviltamento enorme nos salários e na qualidade de vida dos trabalhadores, visível no crescimento das favelas na região – em dezembro de 1986 existiam 30.408 barracos no ABC. Em 1995, eles eram 42.727, 40% a mais. Esse é o resultado do ajuste econômico feito via mercado, com presença apenas discreta do Estado.

Não é o crescimento da economia que vai acabar com a pobreza – é a intervenção do governo

Fernando Henrique diz que a vida dos trabalhadores só vai melhorar com o crescimento da economia, e que a exigência de intervenção do governo para melhorar os salários é demagógica. Declarou que não vai aumentar o mínimo e nem o salário dos servidores públicos. Ele tende a reeditar a façanha do marechal Dutra, que passou o governo sem mexer no mínimo. Parece um adepto da velha teoria dos militares e de Delfim Netto de que o bolo precisa crescer antes de ser repartido. Já em 1983 ele dizia que a oposição não pedia a “repartição do bolo, mas apenas que ele não pare de crescer”. Hoje, no governo, ele continua nessa tecla.

Mas a teoria do bolo não se aplica mais ao Brasil, se é que um dia se aplicou. É o que demonstram os economistas Ricardo Barros e Rosane Mendonça, do IPEA, e José Márcio Camargo, da PUC/RJ, para quem não é o crescimento econômico que vai acabar com a pobreza no Brasil, mas sim uma intervenção decidida e ousada do governo. Para resgatar os 40% de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza bastaria, dizem eles, empregar 3% do PIB, cerca de R$ 15 bilhões, uma quantia apenas um pouco maior do que aquela gasta para salvar bancos falidos.

Em seus discursos e entrevistas, o presidente falou pouco a respeito do socorro aos bancos. Talvez porque considere ser esta uma questão menor pois, em seu governo, os banqueiros estariam sendo tratados a pão e água! Em contrapartida, voltou a outro tema frequente, a reforma do Estado, que deve deixar de ser proprietário “para ser um Estado regulador”, não necessariamente mínimo, mas eficiente. Falou pouco também das privatizações. Dizem que elas entram agora em outra fase, que o período das privatizações fáceis terminou. É verdade. Agora, a batalha vai envolver empresas gigantes, extremamente eficientes, assim reconhecidas mundialmente, como a Petrobras, a Cia. Vale do Rio Doce, a Eletrobrás etc.

FHC acha que as MP's são fundamentais e supera Sarney, Collor e Itamar em seu uso

Além de mexer em ícones da nacionalidade, da luta pela afirmação da independência e autonomia do país, a pauta das privatizações previstas para 1996 inclui empresas cuja venda envolverá bilhões de dólares – e parece que os capitalistas brasileiros e estrangeiros não estão muito dispostos a encarar essa parada. Para diferenciar-se dos neoliberais, o presidente tentou inovar: a idéia de menos Estado e mais mercado “é um pouco simplista”, disse. Precisa haver “mais mercado e mais sociedade”, isto é, mais controle do Estado pela sociedade civil, uma tese simpática, com a cor das convicções democráticas – mesmo que seja apenas social-democráticas! Mas essa cor foi desbotada pelo elogio que o presidente fez das famigeradas medidas provisórias como instrumento para as mudanças políticas, e mesmo para o confronto com o Congresso Nacional.

Na entrevista que deu a seu colega francês, o sociólogo Alain Touraine – um dos principais ideólogos da vertente que mistura social-democracia e neoliberalismo, à qual Fernando Henrique se filia –, ele reconheceu que, embora a medida provisória dê um “poder imperial” ao executivo, ela é fundamental para a reforma política que quer fazer, porque “a vontade política da maioria, por meio do presidente, pode se contrapor às fragmentações dos partidos”. E mesmo o uso desse instrumento antidemocrático é canhestro, confessou ele à Veja. “Acho melhor colocar a medida provisória e ver o que acontece…”. O furor “legisferante”, que supera o de seus antecessores, mostra isso. José Sarney teve uma média mensal de 8 medidas provisórias; Collor, de 5; Itamar, 18, Fernando Henrique supera-os de longe: o deputado federal Haroldo Lima, do PCdoB/BA, mostrou que ele tem uma média de 36 MP's por mês, mais de uma por dia!

Não é preciso esquecer o que FHC escreveu: a essência de suas idéias parece se manter

É a demonstração prática da opinião pouco lisonjeira que Fernando Henrique tem das funções do parlamento: este não é feito para tomar decisões como as exigidas pelas reformas que o governo quer fazer, disse ele a Veja.

O presidente não disfarça e desejo de governar de forma imperial, sem um Congresso Nacional funcionando de forma independente, e que exista apenas para ratificar as inciativas do executivo. Daí para a ditadura é um passo, e a admiração que Fernando Henrique Cardoso mostra pelo desempenho do general Ernesto Geisel na presidência da República parece confirmar seu pouco apreço pelos processos democráticos mais comezinhos das repúblicas burguesas.

Fernando Henrique repete o velho refrão antidemocrático de pretensos salvadores da Pátria messiânicos, que – como Jânio nos anos 1960 e Collor recentemente – julgam ter recebido um mandato absoluto das urnas, capaz de sobrepôr o presidente aos demais poderes da República, principalmente o Congresso Nacional, e que transforma em anti-patriótica ou demagógica qualquer manifestação de independência e autonomia do parlamento em sua atividade de fiscalizar e disciplinar a ação do Executivo, submetendo-a ao controle dos representantes eleitos da sociedade.

Fernando Henrique disse também que deu “ênfase à questão da distribuição de terras”, assentando 42.746 famílias, e que é preciso repensar a ocupação da terra. O objetivo da reforma agrária, em sua opinião, não é atender aos pobres do campo, mas sim dar terra a quem tenha capital e tecnologia para trabalhá-la.

O MST não concorda nem com uma coisa nem com outra. Para o movimento, o alvo da reforma agrária são os pobres do campo. São os pequenos arrendatários, os filhos dos pequenos produtores, os trabalhadores diaristas (os bóias frias) que abarrotam as periferias das cidades do interior. Esta é uma disputa política, de natureza classista. Ao contrário do MST, o governo quer uma reforma agrária que beneficie a empresa agrícola, capitalista, e que se subordine às necessidades do capital.

Feia mesmo foi a outra discordância, a respeito ao número de assentados, na qual a propaganda não escondeu o nariz de Pinóquio do governo. Contra o número oficial de mais de 40 mil beneficiados, o MST apresentou a conta mais magra de 12.263 famílias assentadas em 1995. O governo incluiu em sua conta quem já estava na terra e teve sua situação regularizada. Isso não é conta para o MST, para quem assentar “é o ato de dar acesso à terra às famílias que ainda não tinham”.

Fernando Henrique quer passar a imagem de que governa para o povo e contra as elites irresponsáveis – entre as quais inclui os setores organizados dos trabalhadores, com destaque para funcionários públicos e aposentados, apresentados há muito tempo como beneficiários de privilégios duvidosos.

Mas há uma lógica no discurso do presidente. Antes de assumir o ministério da Fazenda, em junho de 1993, ele disse: “esqueçam o que escrevemos no passado, porque o mundo mudou e a realidade agora é outra”. Mas, olhando bem, não há por que esquecer o que escreveu. Deixando-se de lado veleidades socialistas, seu marxismo desdentado de professor da USP, e mesmo as bandeiras democráticas com as quais se envolveu na luta contra a ditadura, a essência de seu pensamento parece manter-se.

O que mudou foi o modo de FHC ver a inserção do Brasil no mundo e o valor da autonomia

O que mudou foi a maneira de conceber a inserção internacional do Brasil e a valorização da autonomia e independência do país. Ela é paralela a outra, semelhante, ocorrida na forma de pensar da burguesia brasileira nesse particular. Fernando Henrique Cardoso foi pioneiro na compreensão da complexidade das relações entre a burguesia brasileira e seus aliados internacionais, através da chamada teoria da dependência. Numa época em que era dominante o pensamento de que havia uma burguesia nacional capaz de contrapor-se ao imperialismo, ele apontava a relevância dos aliados internos dos interesses externos, entre os quais setores importantes (e dominantes) da burguesia. Num texto de 1978 (publicado em 1985 num livro do qual foi um dos organizadores), Fernando Henrique chegou mesmo a radicalizar nesse rumo:

“Há analistas superficiais ou apologetas que, a fim de minimizar os aspectos da exploração da economia internacional, simplesmente afirmam que as economias ‘modernas’ são ‘interdependentes’. Ao sustentar tal banalidade, geralmente esquecem que a questão relevante são as formas assumidas pela ‘interdependência’. (…) Enquanto algumas economias tornam-se devedoras dos centros mundiais de capital financeiro, outras são credoras. Os banqueiros certamente precisam de clientes, tanto quanto os clientes precisam de banqueiros. Mas a 'inter-relação' entre ambos é qualitativamente diversa, devido à posição ocupada por cada parceiro na estrutura da relação. O mesmo vale para a análise das economias 'interdependentes' nos mercados mundiais”.
Insistindo na tese de que o desenvolvimento capitalista dos países da periferia capitalista era viável e possível, mas não eliminaria os “problemas e conflitos sociais aí existentes”, ele dizia : “o que deve ser discutido como alternativa não é a consolidação do Estado e a realização plena do ‘capitalismo autônomo’, mas sim a sua superação. A questão relevante, então, é como construir caminhos para o socialismo”.

FHC, Bresser e outros organizaram uma ideologia adequada ao interesse das classes dominantes

Embora inesquecíveis, essas palavras ajudaram a esconder a outra face do então sociólogo militante político. Afinal estávamos em plena ditadura militar, e os temas democráticos e institucionais saltavam ao primeiro plano, deixando num longínquo patamar de preocupações a natureza do modelo de desenvolvimento na democracia que buscava.

Fernando Henrique foi um ideólogo do desenvolvimento capitalista no Brasil e do papel central das elites empresariais nesse processo. Foi um pensador que ajudou a burguesia industrial a formular seu tímido projeto para o país. Em meados dos anos 1960, há cerca de 30 anos, ele já defendia a tese da ambiguidade das chamadas elites tradicionais (os latifundiários, o grande capital mercantil) e pensava que elas poderiam ter um papel no processo de modernização do país. Trinta anos depois, ele se aliou ao PFL, com a intenção de cavalgar essas elites tradicionais para chegar à presidência da República.

Numa entrevista em 1979, ele dizia que “nunca estivemos tão perto da ordem burguesa”, apesar dos que sonhavam com o socialismo. Já era um ponto de vista antigo: em 1977 ele dizia que não “se vai passar do autoritarismo ao socialismo distributivista, como alguns temem e outros, ingenuamente, pensam que é possível”. Mas “a realidade é que a economia brasileira está articulada a um sistema transnacional e se baseia em fortes interesses capitalistas internos. Nada disso desaparecerá, por encanto, com a redemocratização”.

Intelectuais como Fernando Henrique e Bresser Pereira, seu ministro da Administração, sistematizaram, nesses anos, uma ideologia adequada aos interesses dos setores dirigentes das classes dominantes brasileiras, e que tiveram um pé no palanque contra a ditadura militar. No governo, esforçam-se para impor ao país o figurino talhado de acordo com esses interesses. Eles falam há muito tempo que o Brasil já atingiu um estágio de industrialização que deixou para trás o subdesenvolvimento (embora o país continue injusto e pobre); insistem que o capital multinacional é aliado no desenvolvimento do país, e não um obstáculo; que o Estado brasileiro deve ser reformado de acordo com o modelo e as necessidades dos interesses dominantes. Hoje, disse ele à Veja, “o problema é reformar a estrutura do Estado para conviver melhor com o sistema produtivo atual, que se globalizou”.

FHC faz a política da elite dizendo defender os interesses do povo, o que não é verdade

No discurso no Indian Internacional Center, em Nova Déli, ele registrou essa mudança radical que internacionalizou as formas de produção do capitalismo contemporâneo, e homenageou essa nova forma que o imperialismo assume: “é preciso que as regras nos diferentes países sejam similares”: alguns itens, particularmente a questão das patentes e das regras de investimento, que “eram considerados como de a competência interna de cada país, estão agora sujeitos a regimes multilaterais de regras”, acredita.

Esta talvez seja a novidade antiquada de Fernando Henrique e do governo da aliança PSDB/PFL: a repetição da velha artimanha da elite brasileira que, desde o Império, procura nichos de mercado do momento da economia mundial. O governo arma novamente esse jogo anacrônico de ajeitar a economia do país de acordo com os interesses dominantes internos e as imposições externas. Como no passado, Fernando Henrique joga com as contradições entre os blocos mundiais: afaga os EUA, diz que a Europa é o parceiro ideal para o Brasil, consolida o Mercosul, faz tratados comerciais e tecnológicos com China e Índia… Muitas vezes, esse jogo tem um ar de autonomia. Getúlio Vargas, em seu empo, jogou com as contradições mundiais em benefício do país. Jânio Quadros, em 1961, usou uma política esterna independente como um biombo para ocultar uma política interna conservadora.

Como os políticos do Império, gente como Bernardo Pereira de Vasconcelos (que se aliou ao PFL da época para fazer o regresso, assegurar a monarquia e garantir a escravidão), Fernando Henrique faz a política das classes dominantes dizendo defender interesses nacionais. E rende-se à globalização porque quem ganha com a dependência externa do país são essas mesmas elites dominantes que são, simultaneamente, esteio e promotoras da dependência externa do país.

As necessidades da globalização levam, pensa o presidente, ao afastamento do Estado das funções produtivas. A ênfase dos governos, agora, diz, está “dirigida quase exclusivamente para tornar possível às economias nacionais desenvolverem e sustentarem condições estruturais de competitividade em escala global”.

A única coisa positiva que FHC pode apresentar ao povo no balanço é o preço acessível do frango

O ministro Bresser Pereira tem feito, há tempos, uma descrição clara – e reiterada – do tipo de Estado que o governo quer construir. A redução do tamanho do Estado, diz, implica seu afastamento da área empresarial, cabendo-lhe “regular e transferir, e não executar. A função reguladora é função clássica do Estado. Por meio dela, mantém-se a ordem, a propriedade e os contratos são garantidos. Mas é também por meio dela, mantém-se a ordem, a propriedade e os contratos são garantidos. Mas é também por meio dela que o Estado interfere no mercado e tenta corrigir suas falhas”. Fala também na necessidade de recuperar a capacidade do Estado de realizar poupança pública.

Ele usa uma expressão-chave, que denuncia a verdadeira natureza das mudanças que o governo tenta conduzir, e quer disfarçar com a história da fartura do frango. Bresser diz que a função clássica do Estado é manter a ordem, e garantir a propriedade e os contratos. Isto não é nada mais do que o velho Estado liberal que, no Brasil, foi reduzido a pó pela Revolução de 1930. Mas ele diz também que a função do Estado é corrigir as distorções provocadas pelo mercado. Essa é a correção que, em sua origem, o pensamento neoliberal faz na velha teoria liberal do Estado.

O governo social-democrata de Fernando Henrique aplica uma política de natureza neoliberal para reformar o Estado, aprimorá-lo como instrumento da acumulação e reprodução do capital, torná-lo mais eficiente para encontrar, definir e defender um nicho subordinado para a produção brasileira na economia mundial dominada pelo imperialismo. Por isso, a única coisa positiva que Fernando Henrique pode apresentar ao povo, em seu balanço de fim de ano, é o frango a um e tantos reais o quilo.

* Jornalista.

Bibliografia

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