O ano de 1996 começou com uma grave advertência para as correntes conservadoras de todo o mundo: os distúrbios promovidos por milhões de trabalhadores franceses ao longo de um mês de manifestações, apontava os limites suportáveis para o povo de uma das nações mais desenvolvidas e civilizadas do planeta ao programa de estabilização baseado no corte de direitos sociais, principalmente da população mais pobre.

Na Itália, a resistência às reformas neoliberais combina com sucessivos escândalos de corrupção conduziu a instabilidade recorrente, fazendo 1995 um ano terrível para a direita italiana.
Fernando Henrique Cardoso, baseado na unanimidade artificial produzida por uma imprensa servil, parece não ter dado ouvidos aos clamores contra o “pensamento único”voltado para o deus do mercado, conforme escreveu o editorialista do Le Monde Diplomatique logo após os episódios que sacudiram a França em dezembro de 1995.

Após realizar o mais difícil das reformas econômicas, a quebra do monopólio estatal de petróleo e das telecomunicações, a liquidação do conceito de empresa nacional e da reserva em áreas como navegação de cabotagem e gás canalizado, o governo preparou-se para tornar 1996 o ano das reformas políticas, administrativas e previdenciárias.

A reforma da previdência despertou a cobiça de poderoso lobby privado interessado em pelo menos duzentos bilhões de dólares que comporiam os fundos de previdência com o fim da administração pública sobre os recursos das aposentadorias.

Confiando nas vitória obtidas com relativa facilidade no ano anterior, o governo preparou-se para mais um êxito tranqüilo no caso da previdência. Subestimou a influência que a indignação dos aposentados teria sobre os parlamentares e a primeira dificuldade surgiu nas atitude do próprio relator escolhido, Deputado Euler Ribeiro (PMDB-AM), desconfiado de que o papel de carrasco de velhinhos e velhinhas não ficaria bem para quem precisa de voto popular.

A Comissão Especial reunida para debater a Emenda Constitucional foi outra pedra enfiada no sapato do governo Para presidi-la, o PFL escolheu o ex-governador do Rio Grande do Sul e ex-ministro da própria pasta da previdência Deputado Jair Soares.

Homem acostumado aos humores das ruas, Jair Soares negou-se a transformar a Comissão em correria de transmissão das intenções do Executivo. No duelo que se seguiu entre o presidente da comissão, ajudado pelas oposições as lideranças do governo, sobrou chumbo para os dois lados. O presidente da Câmara, Deputado Luis Eduardo Magalhães, simplesmente encerrou os trabalhos da Comissão e levou para plenário o enfrentamento final.

A derrota do Relatório Euler Ribeiro no plenário da Câmara foi o ato final previsível da insensibilidade do governo diante da insegurança de sua base parlamentar em surrupiar os direitos dos aposentados. A oposição pôde tomar fôlego enquanto, num golpe parlamentar, preparava um novo Relatório, desta vez aos cuidados do Deputado do PMDB paulista, Michel Temer.

Assustado com o tumulto que a matéria provocou na Câmara, o Senado até hoje não se manifestou sobre o assunto. O governo preferiu não voltar a mexer no vespeiro em pleno ano eleitoral, o que não impediu que os eleitores cobrassem o devido preço aos candidatos do PSDB, como veremos mais adiante.

A reforma administrativa, cultivada exigência do credo reformista conservador, também se arrasta em meio a confusão. O governo não consegue formular um programa de reorganização de uma máquina administrativa deformada por anos e anos de manipulação pelas forças fisiológicas e autoritárias. No máximo, os atuais governantes pretendem impor parte do ajuste fiscal (corte de despesas) à custa dos funcionários públicos, promovendo infame campanha contra seus direitos e sua função social.
A aprovação do Relatório do Deputado Moreira Franco apenas evidenciou a intenção descrita acima, alimentada pela histeria da imprensa governista (hoje, composta pelos principais veículos de comunicação do país) contra a coisa pública em geral e os funcionários do Estado em particular.

A multiplicação de escândalos financeiros (o primeiro foi o caso Econômica) culminou com a edição de uma medida provisória criando um programa de socorro aos bancos falidos – o Proer, iniciativa largamente contestada, principalmente quando vieram a público os fatos relacionados com a quebra do Banco Nacional, instituição financeira tradicional, ligada indiretamente ao presidente da República pelo casamento de um de seus filhos com uma das herdeiras do banco quebrado.

O Congresso logo mobilizou-se no sentido de instalar uma CPI que investigasse as causas e responsabilidades pelos crimes cometidos na quebra do banco. A investigação era um clamor nacional e a omissão do Congresso poderia custar inestimável desgaste à instituição.

A retaliação contra o Poder Legislativo não tardou. Na alça de mira o governo colocou primeiro o próprio presidente do Congresso, Senador José Sarney, que declarou a intenção de instalar a CPI tão logo as assinaturas exigidas fossem alcançadas.

Os ataques ao Poder Legislativo e ao presidente do Congresso não surtiram os efeitos esperados. A CPI foi instalada. Só uma manobra de bastidores permitiu aos governistas abordar seus trabalhos com um recurso que impedia o funcionamento da Comissão enquanto os partidos do governo não oficiassem os nomes de suas fileiras para integrá-la.

As eleições municipais revelaram que os conflitos de uma sociedade profundamente desigual e desajustada não permitiam vitória fáceis mesmo para quem se encontra no poder apoiado maciçamente na propaganda, em vastos recursos públicos e privados, e na simpatia externa das principais correntes imperialistas.

Fernando Henrique assistiu acabrunhado a derrota de seus principais candidatos ao pleito municipal. Em São Paulo, o senador José Serra, estrela de primeira grandeza da constelação tucana, foi batido pelo candidato do prefeito Paulo Maluf, festejado líder da oposição à direita do governo FHC. No Rio de Janeiro e em Belo Horizonte os tucanos também foram derrotados estrepitosamente. Na cidade maravilhosa é um arquiteto ex-esquerdista apoiado pelo hoje direitista César Maia. Em Belo Horizonte o autor da proesa foi o médico Célio de Castro, do Partido Socialista Brasileiro – PSB, apoiado pela esquerda e por algumas correntes do centro.

O que sai da eleição é um país retalhado pelos votos, distribuídos quase que eqüitativamente ao longo do caleidoscópio político-ideológico mas fundamentalmente mergulhado em dúvidas quanto ao futuro. A onda neoliberal mostra visíveis sinais de que iniciou sua vazante, mas não se vê ainda os indicadores da contra-onda que lhe venham tomar lugar.

A batalha da reeleição terá portanto, papel decisivo em prolongar ou retardar o concerto das forças neoliberais. Vencendo a batalha, Fernando Henrique certamente disso tirará proveito fortalecendo sua própria posição, centralizando as alianças para a tentativa para mais quatro anos de governo. Até o encerramento desta edição, o governo já havia ganho a votação em primeiro turno da emenda da Reeleição, faltando o segundo turno na Câmara e os primeiro e segundo turnos no Senado.
É sabido que embora o núcleo do governo FHC e a essência de sua política tragam as marcas dos postulados do neoliberalismo, nem todos que ali gravitam comungam totalmente do evangelho do grande capital financeiro. A vitória final da reeleição reforçará a manutenção desse quadro de composição de forças. Mesmo assim,setores preteridos nas barganhas políticas estimularão a liberação de contradições prisioneiras de conveniências políticas e do fisiologismo do poder.

O ano de 1996 ficará ainda marcado por um período sombrio para a soberania nacional. O governo conseguiu finalmente aprovar a lei de patentes, cavando ainda mais fundo o buraco que nos separa da alta tecnologia e das indústrias do futuro. A lei de patentes brasileira transformou-se em verdadeiro vexame internacional,exibida em todo mundo pelos laboratórios norte-americanos e europeus como a quintessência do que eles desejam para o mundo.

O encontro da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Cingapura, em dezembro, cobriu de vergonha e ridículo a delegação brasileira. Acostumada a discutir os temas mais importantes (patentes, tecnologia de foguetes, satélites, informática, entre outros) nos fóruns internacionais, dessa vez quando escolhemos como tema prioritário o da agricultura, vimos a reunião começar e terminar sem que o assunto fosse incluído na pauta das conversações.

O ambiente social e econômico interno leva 1997 pontos de tensão inevitável. O desemprego assombra os trabalhadores e põe os economistas neoliberais na defensiva. Os números alarmantes geram um sentimento inquietante para os governantes, vindo da desconfiança das massa trabalhadoras na utilidade da atual política econômica para os interesses dos assalariados.
A construção de um mega-déficit na balança comercial (importação menos exportação) abala a crença na âncora cambial, fundamento do plano real. A dívida pública e a falência de Estados e Municípios agravados ao longo de 1996, chega em 1997 como uma grande cujo pino de segurança foi destravado pelos governantes.

A decisão de privatizar a Companhia Vale do Rio Doce já articula a mais ampla e combativa frente contra a venda e o desmonte de uma empresa desde que o programa de desestatização foi posto em prática no Brasil. É certo que no caso de vitória, o desgaste do governo será inevitável diante da opinião pública nacionalista e democrática. O governo ainda pode recuar do crime imperdoável de vender ima das três mais importantes empresas do país.

Se conseguir êxito em seus intentos – reeleição, privatização, etc. – a tropa de choque do capital financeiro avançará nas chamadas reformas políticas, mutilando a liberdade partidária e eleitoral. Derrotado o governo terá mais dificuldades em impor os retrocessos aos direitos políticos brasileiros.
A oposição popular tem pela frente o desafio de colocar no centro de suas preocupações a derrota do plano neoliberal, mas só terá êxitos de despertar no povo a desconfiança e a repulsa contra a orientação dos atuais governantes.

ALDO REBELO é jornalista e deputado federal pelo PCdoB/SP

Voto em separado do Deputado Aldo Rebelo ( PCdoB) ao parecer do Relator da Proposta de Emenda à Constituição Nº 001, de l995 (reeleição)
Janeiro de 1997

Relatório

A inegibilidade do Presidente da República, dos governadores de Estado e dos prefeitos de municípios para os mesmos cargos, no período imediatamente posterior a seu mandatos,é uma das tradições mais antigas e mais consistentes do direito constitucional brasileiro. Introduzido pela carta de 1891, essa proibição foi repetida por todas as Constituições republicanas, inclusive as do regime militar. A carta outorgada em 1937 foi a única que omitiu a regra, sem revogá-la explicitamente. Reafirmada na Lei Magna vigente, a proibição foi novamente confirmada, h’apenas dois anos, pela emenda constitucional que diminuiu o prazo do mandato presidencial para quatro anos.

Quem consultar nossos constitucionalistas mais eminentes, verificará que esta tradição secular se alicerça em sólidas razões jurídicas e numa preocupação sincera com a precariedade de nossa vida democrática. Procura dificultar a personalização do poder, a disputa sangrenta e fútil entre grupos oligárquicos e a utilização eleitoreira da máquina administrativa, muito mais fácil,é óbvio, se o próprio chefe do Poder Executivo é candidato. Como alertou João Barbalho, um destes juristas ilustres, em obra reeditada recentemente pelo Senado Federal, admitir presidente candidato é expor o eleitorado à pressão, corrupção e fraude na mais larga escala”.

A preocupação com a lisura dos pleitos eleitorais e com a rotatividade dos titulares de cargos executivos se tornou tão acentuada em nossa tradição constitucional que a inelegibilidade se estendeu aos parentes próximos do chefe do Poder Executivo e destes se exigiu, mesmo para concorrer a outros cargos, que renunciassem aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito. A experiência confirmou que estas restrições, embora insuficientes, serviram como barreiras úteis ao continuísmo de grupos e caudilhos e a manipulação administrativa dos pleitos.

Um país que respeitasse suas instituições republicanas, não admitiria subverter essas normas democratizadoras sem motivos sérios e, além do mais, urgentes, que justificassem , dois anos antes da próxima da próxima eleição, a reapresentação improvisada de uma emenda constitucional, atropelada pelo final de uma sessão legislativa e tramitando num período de convocação extraordinária do Congresso. Lamentavelmente por mais que se leia, com afinco e boa vontade, a exposição de motivos do projeto original e o voto de Exmo.Sr Relator, essas razões sérias e prementes não são encontradas.

Invoca-se o exemplo de outros países, notadamente dos Estados Unidos, negligenciando-se o exemplo oposto de numerosas nações, inclusive latino-americanas, de formação histórica e trajetória política mais assemelhadas a nossa No inveterado vício nacional de transplantar instituições de outros países, esquece-se, inclusive, que a possibilidade de reeleição presidencial nos Estados Unidos, ou na Argentina, ou no Peru. A experiência de outros povos deve ser estudada, sem dúvida, mas não copiada. Devemos modelar nossas instituições de forma independente, em função das circunstâncias concretas do nosso país e atendo-nos a nossas melhores tradições, que devem ser modificadas apenas quando razões séria e nacionais o recomendarem.

Alega-se que o prazo de quatro anos é exíguo para a execução de um programa de governo. Alegação estranha, pois o atual presidente e os atuais governadores, ao se candidatarem a dois nos atrás, em nenhum momento consideraram que o período era insuficientes para as promessas que faziam ao eleitorado. Aliás, naquela ocasião, tão recente, o presidente e boa parcela dos atuais governadores atuaram como congressistas no sentido contrário, aprovando a redução do mandato presidencial de cinco para quatro anos. Pode-se compreender que, empossados, desenvolveram um apego muito rápido às pompas e privilégios dos cargos. Pode-se entender também que os partidos e as lideranças que sustentam os atuais governantes desejam prorrogar seu condomínio do poder sem correr o risco de novos candidatos e incertas coligações. Mas as condições de ilegibilidade dos chefes do Poder Executivo representam normas importantes do sistema político constitucional, de conseqüências duradouras, para serem discutidas ao sabor desses cálculos imediatistas e eleitoreiros dos partidos e candidatos.

É surpreendente também o argumento de que os eleitores devem gozar do direito de manter nos cargos os governantes que estejam realizando boas administrações e desfrutem de aprovação popular. Levando a sério, esse argumento recomendaria não uma reeleição, mas a possibilidade de os governantes serem reconduzidos aos cargos ilimitadamente,à semelhança das sucessivas e fraudulentas reeleições de Strossner no vizinho Paraguai. Aprovado tal retrocesso, pouco restaria de democrática rotatividade dos ocupantes do poder. A pretexto de facilitar a governabilidade, uma das tradições latino-americanas mais nocivas seria ressuscitadas, a do poder pessoal de caudilhos messiânicos, mesmo que abrilhantados com títulos universitários e modernizados com a pregação neoliberal da abertura externa indiscriminada e das contra-reformas privatizantes e anti-trabalhistas.

O Exmo. Sr Relator, dando-se conta da lógica absurda implícita no argumento dos direitos do governante a recandidatar-se e do eleitor a reconduzi-lo, procura, segundo suas palavras, um” equilíbrio” entre esses direitos e os valores opostos de despersonalização e rodízio. A solução que recomenda, porém de limitar a reelegibilidade a um novo mandato consecutivo, não elimina o vício de fundo desse arrazoado de ocasião, que é confundir o prosseguimento de programas de governo com o continuísmo pessoal dos governantes. De uma proposta política e administrativa conta com o apoio popular e quadros dispostos a levá-la adiante, continuidade pode ser assegurada por meio de uma salutar renovação de lideranças, sem necessidade de reeleições. Se o Presidente Fernando Henrique acredita que seu programa de governo desfruta de apoio e atende aos interesses da maioria, por que avalia, presunçosamente, que só ele é capaz de defendê-lo e implementá-lo? Não estariam o presidente e os partidos que o apóiam incorrendo na “covardia eleitoral” de que acusam seus adversários?

A mesma “covardia eleitoral” se manifesta na recusa tenaz de qualquer consulta á vontade popular através de plebiscito ou de referendo, sugerida inclusive por figuras destacadas do PSDB ou por jornais influentes como a Folha de São Paulo. Para quem se preocupa sinceramente com o país e não apenas com o futuro da coligação eventualmente no poder, qualquer mudança nas regras de elegibilidade dos chefes do Poder Executivo é uma questão institucional, suficientemente importante e polêmica para merecer amplo debate nacional e consulta a preferência dos eleitores.

Defendendo opinião contrária, o Exmo. Sr Relator alega, segundo suas palavras, que “o país adota a democracia representativa” e que, portanto, não seria correto “partir do pressuposto da ilegitimidade do nosso corpo de representantes, tendo de consultar a população para cada nova decisão a ser tomada no âmbito do Poder legislativo”. Cabe, em primeiro lugar, recordar que a Constituição vigente não adota simplesmente a democracia representativa. Em seu artigo primeiro, parágrafo único, declara solenemente que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”. E no artigo 14 esclarece que ä soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos,e, nos termos da lei, mediante: I – plebiscito; II – referendo; III – iniciativa popular”. Em segundo lugar, é necessário lembrar também, que existe uma hierarquia de importância e de procedimentos nas decisões que podem ser tomadas “no âmbito do poder legislativo”, assim discriminadas no artigo 59 da Constituição:I “- emendas à Constituição; II – leis complementares; III- leis ordinárias: IV – leis delegadas; V decretos legislativos; VI – resoluções”. O parágrafo quarto do artigo 60 enumera, por sua vez, matérias que não podem ser abjeto sequer de emenda constitucional e o artigo segundo do ato das Disposições Constitucionais Transitórias previu uma consulta plebiscitária ao eleitorado sobre a forma republicana ou monárquica e o sistema parlamentar ou presidencialista do governo antes de nova deliberação do Congresso. Não se trata de questionar a representatividade do Congresso ou de exigir que a população seja consultada a qualquer decisão que ele pretenda adotar. Trata-se de reconhecer que as regras de elegibilidade dos chefes do Poder executivo, embora não figurem entre as cláusulas pétreas da Constituição, que não podem ser modificadas, , são suficientemente importantes para merecerem um tratamento assemelhado ao que foi garantido às deliberações sobre a forma e o sistema de governo.

Voto

Não se vêem, portanto, razões substantivas e urgentes que aconselhem a aprovação precipitada de uma emenda que revoga tradição secular de nosso direito constitucional e que, além disso, pretende aplicar-se aos atuais governantes e abolir a exigência de que renunciem previamente os cargos para candidatar-se. Não se trata de opor-se aos princípios da reeleição, em qualquer circunstância. Numa fase mais avançada de nossa história, com o regime democrático consolidado, com um nível mais alto de consciência e de participação dos cidadãos, com a moralidade pública menos exposta aos vexames de corrupção e abuso de poder que periodicamente envergonham o país, com a influência econômica nos pleitos restringidas e o controle dos meios de comunicação democratizado, será possível discutir uma alteração das regras de inelegibilidade sem precipitação e sem cerceamento à manifestação das várias opiniões.

Nas circunstâncias atuais e da forma atropelada e impositiva como se pretende mutilar, mais uma vez, a Constituição Federal de 1988, o significado histórico e concreto da emenda proposta é restringir e não ampliar a participação democrática. Se aprovada, o resultado será a reeleição generalizada de presidente, governadores e prefeitos, com uma queda drástica na renovação das chefias de governo e na rotatividade de partidos e coligações partidárias nos cargos executivos. Entrelaçadas a outras contra-reformas, lembradas pelo Exmo. Sr. Relator em seu Parecer, a emenda representa a ponta de lança de uma ofensiva política conservadora que objetiva esvaziar o debate das alternativas nacionais, institucionalizar o desinteresse político de largos seguimentos da população e confinar as grandes decisões, novamente, a um circulo estreito de partidos conservadores e potentados regionais, para facilitar a aplicação do receituário desnaciolizante e anti-trabalhista que vem sendo infligido ao país.

A emenda proposta demonstra que o Projeto Neoliberal, abraçado pelo Presidente Fernando Henrique, já não se contenta em golpear a soberania nacional e os direitos sociais dos trabalhadores. Enfrentando uma oposição crescente á esquerda e à direita, investe também contra o regime democrático arduamente conquistado nos anos 80, tentando restringir as liberdades por ele garantidas e reverter as esperanças de participação ampliada que despertou.

Estavam certos os signatários do manifesto suprapartidário, lançado em São Paulo no mês passado, quando proclamaram que a emenda proposta é inoportuna, imoral, precipitada e antidemocrática em seus desígnios. Mantida nos termos sugeridos pelo Exmo. Sr. Relator, equivale a um golpe continuísta.
Pelas razões expostas, unindo-se às demais correntes populares e democráticas e a todos os setores que se opõe ao golpe continuísta dos atuais governantes, o Partido Comunista do Brasil diz não à reeleição, com indignada veemência. Voto, portanto, contra a emenda proposta.

Deputado Aldo Rebelo

EDIÇÃO 44, FEV/MAR/ABR, 1997, PÁGINAS 17, 18, 19, 20, 21