A atual crise do capitalismo tem sido madrasta para com as teorias formuladas pelos ideólogos da burguesia. A perplexidade entre as pitonisas do neoliberalismo é profunda e, da mesma forma como o pensamento único triunfante repetia loas à vitória final da burguesia, agora repetem, com a monotonia de um cantochão: esta crise não era prevista por nossa teoria.

Alguns revêem suas posições, como Paul Krugman, do MIT que – em agosto passado – escreveu um artigo onde, significativamente, dizia que, ao contrário de Keynes, Marx nunca conseguiu "oferecer uma explicação abrangente sobre os motivos pelos quais estas catástrofes acontecem ou qualquer sugestão sobre o que fazer a respeito delas (exceto abolir o capitalismo)".

Krugman foi ao ponto: para os marxistas não se trata, claro, de dar soluções para o capitalismo. É também falso que Marx não tenha encontrado explicações para as crises. Ao contrário, vivemos sob aquilo que, para o marxismo, é uma autêntica crise de manual.

A convulsão dos mercados traz (como os artigos deste número de Princípios procuram demonstrar) pelo menos dois elementos essenciais que podem caracterizar uma crise revolucionária – embora ela ainda não tenha chegado a esse limite.

Em primeiro lugar, a tendência à queda na taxa de lucro resulta da alteração na composição orgânica do capital, com a valorização do capital constante (máquinas, equipamentos, instalações etc), em detrimento do capital variável (os salários). A diminuição nos lucros leva os capitalistas a demitirem legiões de trabalhadores e usarem mais equipamentos, agravando aquela tendência. Em consequência, o desemprego ou o emprego em setores improdutivos, precários e de salários menores, diminuem o tamanho dos mercados, acarretando fortes problemas de realização para o capital, uma situação de crise financeira e de superprodução.

Em segundo lugar, a produção capitalista está encalacrada na contradição entre forças produtivas cujo desenvolvimento ameaça romper as relações de produção crescentemente obsoletas. Os ganhos de produtividade do trabalho são enormes, mas o capitalismo é incapaz de levá-los às últimas consequências e fazê-los beneficiar o conjunto da humanidade.

Nesta situação, aquele novo renascimento anunciado por FHC no início de 1996, revela-se, para a maioria dos trabalhadores, como o inferno de Dante, para ficarmos em imagens de 500 anos atrás. E a nova economia, simplesmente não existe, assegurou Allan Greenspan (do alto de seu cargo de dirigente do banco central dos EUA) num discurso de setembro de 1998.

Mas o governo brasileiro ainda crê em salvação no rumo que vem seguindo, e acena agora com a nova importância do Brasil no contexto internacional, pelo tamanho das dívidas interna e externa (cuja soma ultrapassa 50% de nosso PIB) e pelo fato do mercado brasileiro ser fundamental para as multinacionais norte-americanas. A derrocada do Brasil, temem, arrastaria também aquelas empresas.
Não satisfeito em ser o governo mais entreguista que o país já teve, FHC esmera-se também em garantir para o imperialismo o principal apoio para o desenvolvimento autônomo do país, nosso mercado interno, cujo potencial nos dá condições únicas para enfrentar a crise de forma soberana.

O governo brasileiro continua vivendo no mundo dos que fizeram sua lição de casa e agora querem a recompensa por bom comportamento. Sua “teoria” é a mesma doutrina cega. Não percebeu, como o professor Walden Bello, da Universidade das Filipinas, que "a teoria sobre os benefícios líquidos da globalização, pela via do livre mercado de bens e capitais, tem pouco ou nenhum respaldo teórico", sendo simplesmente "fé desfilando como ciência".

Comissão Editorial

EDIÇÃO 51, NOV/DEZ/JAN, 1998-1999, PÁGINAS 3