Democracia e pluralismo: a reforma política no Brasil
O seminário tornou-se um importante fórum de reflexão crítica sobre a proposta de reforma política do governo, que está em pauta no Congresso. O evento teve por base a inquietação de segmentos importantes da inteligência do Rio de Janeiro com as reformas do governo Fernando Henrique Cardoso, pois elas apontam para a restrição da democracia e do pluralismo político, caracterizando um retrocesso. Segundo a agenda política do governo atual, seria necessário reduzir o atual quadro partidário para garantir a governabilidade. Princípios apresenta as contribuições dos expositores Candido Mendes, Luiz Werneck Vianna, Jairo Nicolau e Wanderley Guilherme dos Santos a este debate. Democracia: exigências e frustrações
Candido Mendes de Almeida*
“Vou procurar situar as dimensões da democracia à entrada do milênio. Participei recentemente de conferência de cientistas sociais em Moscou que analisou o atual cenário pós-Kosovo e o mundo resultante desta Pax hegemônica – que já apresenta sinais inquietantes. Não se sabe qual o futuro neste quadro em que uma força hegemônica decide de maneira absolutamente unilateral qual será a próxima etapa. A América Latina não foge à regra e podemos constatar, com vergonha e tristeza, que este homem que está na Casa Rosada, neste momento, negocia o tratado do Atlântico Sul e procura convencer os Estados Unidos a criar uma força de retaliação nos dois hemisférios. Dentre tantos motivos argumentados para as ingerências (limpeza étnica, narcotráfico…) não é difícil levantar-se algo para controlar as marginalidades urbanas ou o perigo da desordem, interferindo na subúrbia brasileira. Verificamos assim, por diversas manifestações, risco de enorme degradação política na América Latina que colocam em perigo nossa soberania.
A noção de democracia, no cenário que se apresenta, envolve muitas frustrações, em especial depois do esvaziamento do conceito e perante nossa inquietação no imaginário do futuro. A democracia, hoje, já esgotou praticamente todo o seu sentido – podemos até verificar isso no próprio imaginário social que emana dos Estados Unidos, a exemplo do mais recente filme, ultra-fascista, de George Lucas, Star Wars, em que a democracia não aparece como perspectiva futura – e pode até mesmo ser usada para sua própria incineração.
A democracia formal configura regras definitivas do jogo político. A primeira, evidentemente, é a do pluralismo. Sabemos os inúmeros problemas que surgem em função da garantia pela diferença de todos os quadros das minorias políticas. Tal problema implica na defesa do direito de representação a toda corrente de opinião pública, independentemente de seu tamanho. O partido pequeno é o partido que teve o embrião da utopia e da mudança, e tem sua capacidade de expansão. Acabar com o partido “nanico” é atentar à noção da diferença na sua própria e necessária instauração. Dentro dessa reforma política bochorna que está sendo apresentada, verificamos pelas análises dos coeficientes que o DataBrasil nos dá sobre a antiga legislatura, que é mais ou menos o mesmo percentual de quem quer tornar o voto facultativo e de quem quer acabar com o minipartido. Isso por si mesmo já indica o autoritarismo em marcha dentro dessa ditadura das maiorias.
A defesa dos partidos que começaram com baixos percentuais é necessária. Eles crescem porque a idéia nova, tendo de vencer a inércia do óbvio, acaba vicejando; e é por ele que se faz a nova mudança. Há vários exemplos na Europa Ocidental (os Verdes na Alemanha, e outros casos em vários países). Considero típico do neofascismo neoliberal do Brasil, que está começando a se manifestar, a tentativa de estabelecer a cláusula de barreira dentro da reforma política do Executivo. A utopia brasileira – a que queremos, aquela que vai pensar ainda a alternativa – como pela defesa dos partidos minoritários. Quer se ver o fascismo, veja-se, então, o veto aos partidos pequenos e a proporção entre este veto e a defesa do voto facultativo, a que me referi anteriormente.
Na Conferência de Moscou (a que me referi no início) o primeiro princípio democrático explicitado por 90% dos participantes foi a manutenção de eleições diretas. Essa regra parece hoje constelada e definida no mundo. Evidente que temos de fazer, hoje, um rebalanço de seus principais princípios.
Todos somos muito influenciados pela fonte romana de força da democracia direta e precisamos refletir como ela vai hoje em dia. Em primeiro lugar, curiosamente, a democracia direta está bastante desligada não só da convivência com a representação, mas com a própria ruína da representação. Aí aparece o termo médio que nos faz pensar: a pressão social não precisa da participação para mudar, ela pode existir independentemente de sua origem e tonalização. E a pressão social – aqui entra o seu perigo – que conhecemos hoje, não é mais a pressão do tipo que conhecemos nas campanhas Diretas Já e outras grandes lutas passadas. Porque um fenômeno novo está surgindo na democracia: os testes de opinião pública estão “aguando” a pressão social objetiva. Está havendo o fenômeno da transposição da pressão direta pela chamada pressão virtual. Hoje temos uma temperatura nacional permanente nos testes da opinião pública. Quem pode ficar contra o teste da opinião pública, que prevalece sobre a representação (contra a pressão social direta)?
Essa questão leva a um dos problemas mais dramáticos da democracia contemporânea que é o rapto do controle da opinião pública de quem a faz por quem a mede. Não estamos conseguindo sair da ditadura mais sutil do chamado “pensamento único” e da chamada captura desses instrumentos pela mídia. Levantamos há um certo tempo no Congresso a proposta de que no Brasil se tivesse algo de essencial: o controle pela Universidade da informação dos testes de opinião pública das agências de publicidade ligadas a grandes meios jornalísticos e de TV. O Brasil não tem esse controle porque até agora a Mesa da Câmara não teve coragem de encarar o problema (de a Câmara, quando iniciar o período eleitoral, convocar um pool de universidades para controlar e verificar se a amostra corresponde, se efetivamente o universo pesquisado variou, se há as definitivas variáveis que mostrem o que é um público diferenciado para poder emitir uma opinião). A tese é de que existe amostra de viveiro e o seu resultado tende a ser absolutamente monitorizado. A esquerda brasileira tem dívida enorme com esse tipo de vigilância na eleição do ano passado, quando a Folha de S. Paulo não manifestou a distância real de Marta Suplicy diante dos outros candidatos uma semana antes do desfecho. Hoje, ela seria governadora de São Paulo. Destes pequenos assassinatos e grandes estupros está marcada a democracia brasileira. É necessário denunciar a mecânica que continua impune entre os institutos de opinião pública e a mídia que se associa a eles nas eleições.
Continuamos sob a ditadura dos números que, não são forjados, e sim, não são realmente desmonitorados na maneira pela qual são apresentados à opinião pública. É preciso que exista um controle não mercadológico do que , afinal de contas, se transforma na consumação do sistema como está instalado e definido atualmente. O Brasil é o único país de nossa dimensão que não tem anticorpo para conseguir controlar a produção dos percentuais de mídia de opinião pública.
Parece-me essencial, assim, saber se a pressão real desapareceu. A verdade é que não temos mais o homem da rua que é o agente da pressão, temos o chamado “homem médio”, que é uma abstração. Fala-se para o “homem médio”, calcula-se suas bissetrizes, e isso dá o “voto médio” do “Brasil médio”.
Por outro lado, vivemos o que pode ser de fato a experiência da participação. Estou acabando estudo sobre “primavera” dos orçamentos participativos, a experiência mais interessante que as esquerdas fizeram do ponto de vista de o município ser um espaço em que governante e governados se auto-ajudam. Mas não sei se a democracia direta – através desse instrumento contundente – pegou.
Estamos sentindo (e é a experiência do Rio Grande do Sul com três administrações sucessivas do PT que pode apresentar um padrão de coerência maior) que há, cada vez menos, a presença do munícipe na organização do orçamento direto. A presença do cidadão na participação direta está diminuindo e há, agora, a idéia do orçamento participativo ser votado através de representantes. Estamos, assim, de fato, voltando ao princípio da representação porque a democracia direta cansa? Parece então que esse “pugilismo cívico” termina por deixar as coisas cada vez mais nos “controles remotos”. Não parece que a democracia do futuro vá melhorar por uma intensidade do modelo participativo direto. O Brasil pôde ver mais longe através da admirável contribuição do PT, mas não se avançou no outro princípio – o da desinvestidura do mandatário. É um princípio de relativa quebra da inteireza e da distância do princípio da representação. Com ele se quer que o representante procure a redução da representação em função da participação.
Outro princípio visceral à democracia – além da representação e da participação – é o dos freios e contrapesos. O Brasil é hoje o país da devastação dos freios e contrapesos da democracia. Nos índices de países democráticos e países formalmente democráticos estamos muito mal, especialmente agravado em matéria da desregulação.
Comecemos analisando a Medida Provisória, que era um instrumento feito para o parlamentarismo e foi, assim como uma “luva de médico”, deixada no “estômago” de um sistema presidencialista. Acabou permanecendo, com sua suprema ignomínia, diante do sistema de freios e contrapesos de equilíbrio democrático no Brasil. Assim, estamos num governo em que quem legisla é o Executivo através de um instrumento muito mais contundente, até, que é o próprio decreto-lei. E o que impressiona é que nesse processo o Congresso, já há três legislaturas, se auto-demitiu de legislar. Já há um certo tempo se fala que seria necessário regular a emissão de Medidas Provisórias. Não preciso dizer o número de MPs que são renovadas, o que me impressiona é que não se delimitou o número de vezes que isso pode ser feito – e pelo menos deveria se chegar a esta barreira. Mas por que o Congresso se demitiu de maneira tão degradante da tarefa de legislar? Qual o fato implícito pelo qual, no jogo dos freios e contrapesos, o Legislativo perde seu papel e o presidente da República se transforma no verdadeiro legislador no país? Como compensação, o Legislativo adentra à esfera do Judiciário. O Congresso só vai, hoje, às manchetes e à opinião pública na medida em que instala as suas Comissões Parlamentares de Inquérito. E o que é isso senão o exercício de um poder parajudicial? É o exercício do poder judicial vindo ao Parlamento, assim como o poder legislativo já foi para o presidente. Essa deslocação do sistema dos poderes é um fato instigante para a ciência política. Valeria um seminário inteiro para se debater a teoria da investidura judicial do Congresso a partir das CPIs.
Vários desses fatores são um pouco das causas de o Brasil estar muito mal nos índices internacionais do que seja a definição dos freios e contrapesos do poder político. Quando se dá essa contradança de poderes que pisam sobre o território do outro, acaba se envolvendo a indignação corporativa. No início deste ano, a agressão entre a Presidência da República e o Supremo Tribunal Federal e, um pouco depois, a acusação, por parte do presidente do Senado, de fraude ao presidente da Câmara (e este acusou aquele de abuso de poder) – e ninguém abriu CPI para investigar – expôs um processo em que houve várias manifestações e retaliações corporativas entre os poderes.
Esses fenômenos todos refletem uma degradação institucional brasileira das mais terríveis. E o pior é o tamponamento que a mídia colocou sobre tudo isso. Não conheço história contemporânea em que um presidente de um órgão do legislativo acusa o outro e vice-versa. Não sei se se está dando conta da insuportabilidade disso tudo no clima da opinião pública brasileira. Não vai ser a grande imprensa que vai dar resposta a esta questão.
Entender os corpos ou atores no processo democrático envolve entender quem faz o que, para que e como. Evidente que tradicionalmente são as clientelas. Nossa geração, com pessoas como Hélio Jaguaribe, se dedicou às discussões do trânsito entre a política de clientela e a política de ideologia. Pensávamos que com o decorrer do tempo, o robustecimento dos partidos e a densificação da representação, nos bateríamos por idéias e por princípios – por frentes que a contemplassem – e o poder deixaria de ser o espaço mercadológico para a contratação de favores. Nestas semanas estamos chegando a um fenômeno extraordinário que envolve a reforma ministerial do governo Fernando Henrique. Na divisão dos cargos, os ministros podem mudar mas as prebendas são absolutamente intocáveis. Chegamos a um fato extraordinário do “ministro imexível” e de “cadeira cativa”. Há loteamentos definidos até o final do “segundo tucanato”. Vamos ver se algum feudo (como prebenda) realmente muda! O episódio da substituição da chefia da Polícia Federal, neste jogo, é elucidativo da substantivação que a clientela está tendo no Brasil, ao invés dela ter desaparecido.
Houve no passado, um momento em que se pensava contrapor à clientela a tecnocracia. A tecnocracia, a militar e a civil, teria como função o bem comum; como classes desligadas da terra e das grandes fortunas – as classes pretorianas que assumiram o poder em 1964 – poderiam pensar em programas, metas e soluções. Mas sabemos no que se transformou a tecnocracia no tucanato: transformou-se no jogo do Rei e de seus amigos – no “comitatus, ou seja, o grupo palaciano titular do poder pode circular numa porta giratória entre os bancos, entre o Pactual, o BNDES, o Oportunity… e volta depois ao Banco Central. É a roda gigante da absoluta transposição, como num círculo de cavalheiros, entre o público e o privado. Dizem que “isso é muito bom porque eles têm experiência lá fora”, que “são pessoas da casa” e “devemos ter confiança”. O Brasil não aceitou a tese da quarentena e não querem a cláusula da abstinência política pelo menos de quem sai. A neutralidade financeira do sistema e sua dissociação do grande pacto de poder vigente precisa ser debatida. Isso levaria a entendermos onde estão as capitanias hereditárias hoje no Brasil e de que maneira os sistemas de poder estão organizados neste momento em que, na constelação de interesses atuais, não se define a diferença entre o que é o interesse público e o que é a máfia.
Adentramos um pouco mais ao que são os problemas das frustrações que envolvem a democracia hoje – e como vamos enfrentar essa nova emergência numa economia neoliberal, em que o político é o mercado do poder assim como o econômico é o poder do dinheiro. Até onde, com todas as teorias contemporâneas sobre o que seja este tema, estamos ou não encontrando o mercado político e seus possíveis controles, talvez, para criar uma política para o Estado nacional brasileiro? O que fazer com ele neste momento, como podemos medir a sua presença ou a sua demolição dentro do quadro geral que estamos enfrentando? Estamos cercados pela ameaça do currency board e pelo sistema do Pacto de Washington, em que desaparece a possibilidade de ainda haver um controle nacional do sistema de trocas e prestações entre o que é a ação pública regulatória e os mecanismos de liberalização na arena econômica. O lema que temos em andamento é privatizemos, privatizemos!
Mas como foi definido o sistema das concessões emergentes? As “Anatéis” (agências reguladoras) estão regulando o que emergiu dos leilões a partir de cláusulas que estavam no instrumento licitatório. Não há – e isso é preciso cobrar do Congresso – uma lei standard de concessões. O mundo inteiro está sem entender porque o Brasil não pode punir as empresas pelo caos do DDD – pois não há, aqui, sistema de concessão definido. Isso significa que o Brasil não quer mais gerir a riqueza, expressado no fato de não termos disciplinamento dessas emergentes. O mecanismo das “empresas espelho” adotado pelo governo, procura o controle não pela ação regulamentar, e sim, pelo mercado. Estas últimas semanas demonstraram que a empresa espelho não estimula o rendimento da outra – o sistema neoliberal de “concorrência” não funciona.
O Brasil precisa ter regulamentação, sim, e o Estado se demitiu de regular e se transformou em um banqueiro do capital internacional. Veja-se o exemplo da Telemar em que 20% dela veio do BNDES (única agência para movimentar investimentos produtivos) e dos fundos dos brasileiros médios e pobres. O caso da FORD é outro exemplo. Em todos eles financiamos, com dinheiro do proletário brasileiro, a empresa estrangeira num verdadeiro ciclo do horror. Na faixa de sobrevivência do Estado nacional brasileiro estão as soluções necessárias, diferentemente do que se anuncia. Há 40 milhões de brasileiros miseráveis, sendo que para acabar com seu estado de miserabilidade seriam necessários 32 bilhões de dólares – foi o que se perdeu na banca internacional quando da crise cambial de janeiro. Com isso teríamos tirado 40 milhões de brasileiros da miséria. Vê-se que sair da miséria é barato. Não adianta, em contraposição, argumentar que temos democracia formal, pois isso não basta para a sociedade brasileira”.
* Professor e reitor das Faculdades Cândido Mendes, presidente do senior board do Conselho Internacional de Ciências Sociais da Unesco e membro da Academia Brasileira de Letras.
A reforma política no Brasil
Jairo Nicolau*
“A agenda de reformas políticas brasileira é, talvez, a maior já identificada em qualquer democracia e, ao mesmo tempo, a menos conhecida; ou seja é inversamente proporcional o tamanho da agenda de reformas e a magnitude dos debates sobre ela.
Circunstanciadas ao debate nacional, as questões propostas chamam a atenção de alguns problemas ligados a essa agenda. Em primeiro lugar é bom lembrar que o momento oportuno para costurar escolhas institucionais é a Constituinte. Tivemos oportunidade de fazer isso em 1987-88 e praticamente todos os temas, atualmente na ordem do dia, foram discutidos naquele momento. A Constituição de 1988 optou por seguir a tradição republicana brasileira. As principais escolhas institucionais da Constituição de 1988 já haviam tido acolhida em outros momentos da história republicana brasileira. Optou-se pela manutenção do presidencialismo, pela representação proporcional de lista, pelo bicameralismo simétrico entre as duas casas e pelo federalismo. Algumas alterações importantes foram introduzidas, mas as grandes questões foram aprovadas sem grandes controvérsias.
Curiosamente alguns anos depois toda a agenda decidida na Constituinte de 1988 passou a ser alvo de desconfiança. Poderíamos localizar no debate do plebiscito de 1993 o aparecimento mais intenso da agenda de reformas políticas. Desde os anos 1950 vários temas têm sido propostos, mas é a partir de 1993 que as questões da reforma surgem como opinião mais organizada. De lá para cá, verificamos o tema aparecer em editoriais de jornais, opiniões de articulistas e intelectuais, transparecendo um consenso, mais ou menos estabelecido, de que o Brasil precisava de uma “reforma política”.
Fiz um levantamento desses projetos que começaram a aparecer de 1993 para cá, localizando 20 tópicos diferentes vinculados a projetos de alteração do sistema representativo brasileiro. Para citar as macro-áreas desses projetos, temos: o sistema eleitoral, regra de eleição para o executivo, voto obrigatório, restrição à troca de legenda, legislação eleitoral mais ampla, legislação partidária e sistema de governo. Em todos esses tópicos tivemos iniciativas, seja por projetos individuais ou projeto mais sistematizado como o apresentado pelo senador Machado. Não podemos esquecer que em 8 desses 20 tópicos o Congresso já deliberou. Mesmo não havendo uma reforma geral incluindo todos os 20 tópicos, já houve uma reforma política feita topicamente nas instituições decididas na Carta de 88.
Se todos os projetos desses 20 tópicos, traduzidos de maneira cristalina no projeto do senador Sérgio Machado, fossem aprovados, provavelmente teríamos feito a maior e mais profunda reforma política já conhecida por um país democrático que não tenha vivido graves crises institucionais. Não conheço nenhum país democrático que tenha feito uma reforma política tão profunda quanto esta que faríamos se adotássemos todos esses pontos.
O que está por trás, que atores políticos vão se beneficiar, qual a ontologia dessa reforma? Não vou, especificamente, adentrar nesta questão. Mas quando lemos a justificativa das propostas apresentadas pelo senador Sérgio Machado, curiosamente transparece, nos diversos tópicos, que a escolha institucional é muito mais estética do que substantiva. Para dar um exemplo, o voto distrital misto virou uma espécie de panacéia institucional para todos os “reformistas”, mas quando se lê o projeto Sérgio Machado, o que aparece como justificativa para a adoção do sistema distrital misto, é uma profunda e radical crítica ao funcionamento da lista aberta – que é simplesmente uma variante da representação proporcional. Então se critica a lista aberta como se se estivesse criticando a representação proporcional e desconhece-se que ela é apenas uma variante possível. Ou seja, não há uma justificativa mais consistente para embasar o projeto proposto.
Quando se observa a experiência de outros países, por exemplo os 21 países considerados ininterruptamente democráticos desde a Segunda Guerra, vê-se que são raros os que fizeram alterações profundas em suas instituições representativas. Com exceção de França, Itália, Japão e Nova Zelândia, todos os outros fizeram apenas modificações tópicas no seu sistema eleitoral representativo. E isso foi feito, em geral, em uma das duas direções: ou tentando tornar o sistema mais generoso e justo com os pequenos partidos, ou criando dificuldades a eles, e com isso gerando um sistema menos proporcional.
É curioso que no Brasil, no meio do discurso da necessidade de uma reforma profunda, há o objetivo claro em seguir a linha de dificultar a vida dos pequenos partidos visando a criação de um sistema menos proporcional e mais excludente.
Como tem sido a normatização da legislação partidária na história brasileira? Verifica-se que, em geral, nossa experiência democrática tem sido generosa com a atuação dos partidos políticos. O primeiro código eleitoral de 1932 foi tão generoso com a atividade dos partidos que, na primeira eleição de 1933, mais de cem partidos concorreram e 40 elegeram deputados para a Constituinte daquele ano. Em função dessa experiência, no período posterior que vai de 1945 a 1964, a primeira normatização (a Lei Agamenon) estabeleceu que um partido tinha de ter pelo menos o apoio de 10 mil pessoas para ser registrado. Depois houve um aumento para 50 mil em 1950 e ficou-se nisso por um bom tempo.
Com a volta do país à democracia tivemos, de 1985 a 1995, uma legislação bastante generosa e nesse período 76 legendas diferentes concorreram em alguma eleição no Brasil.
Em 1995 foi aprovada uma nova lei partidária extremamente rigorosa com os pequenos partidos. Para criação de um novo partido é preciso o apoio de 0,5% dos eleitores que votaram na eleição anterior (hoje, seriam 330 mil eleitores). E isso não é simples. Mas por alguns quesitos de transição, tal lei permitiu que muitos pequenos partidos se legalizassem. Com isso temos hoje 30 partidos com registro definitivo. Eles têm direito de existir, registro no TSE e não podem ser cassados. Mas nessa lei, aprovada em 1995, algumas restrições foram apresentadas, a exemplo da que estabelece que os partidos que não obtiverem 5% dos votos para a Câmara (a partir de 2002 – estamos portanto ainda no período de transição dessa lei) terão acesso a apenas 1% do fundo partidário (isso para todos conjuntamente – hoje seriam 23 partidos que juntos ficariam com 1%; sendo que 7 partidos ficariam com 99% dos recursos do fundo partidário). Eles também não terão acesso a funcionamento parlamentar, ou seja aos recursos disponíveis para atuação das bancadas nos âmbitos do Senado, Câmara, assembléias e câmaras de vereadores; e o tempo de televisão será restrito a 2 minutos por semestre. A legislação partidária em vigor já é, portanto, extremamente rigorosa com os pequenos partidos. Ela está em fase de transição e a partir da próxima eleição todos os quesitos aqui relacionados estarão funcionando, dificultando enormemente sua representação parlamentar.
Dessa enorme agenda política aqui enumerada é importante chamar atenção para o fim do voto obrigatório (que já parece distante dos debates atuais) e a cláusula de exclusão de 5% – esta sim parece ser o ponto mais letal e perigoso para operação da democracia brasileira. É o ponto que deve ser combatido de maneira intensa pelos setores democráticos e preocupados com a operação da democracia em nosso país”.
* Professor e Pesquisador do Instituto Universitário de Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (IUPERJ).
Luis Werneck Vianna
“Ouvimos e lemos todos os dias proclamações sobre o “fim da Era Vargas”, a “crítica ao patrimonialismo”, a substituição da idéia se um “Estado cartorial, mastodonte leviatanesco” pela idéia de uma reforma objetivando “liberar a sociedade e a economia dos enclaves cartoriais” – tudo indicando um caminho: a descentralização política e administrativa, tal como na dogmática neoliberal. Mas o que temos assistido, na verdade, é cada vez mais centralização política e mais centralização administrativa.
Vamos comentar alguns exemplos, a começar pelos cortes e mais cortes em todos os setores e sentidos por todos os brasileiros. Há também, o efeito vinculante da súmula, que diz respeito a uma outra seara, a do Poder Judiciário, e com a qual as decisões da cúpula do Poder Judiciário vinculariam todas as decisões de toda magistratura brasileira. Interrompendo com isso o riquíssimo processo em curso hoje no Brasil – em escala inédita em nosso continente e na história do próprio país – de um Poder judiciário que começa a se aproximar, por diversas razões e até mesmo corporativas, da sociedade civil; por iniciativas como as ações diretas de inconstitucionalidade – no plano da política – e os juizados especiais – no plano da sociabilidade.
Ao lado do efetivo vinculante da súmula, há ainda a própria reforma administrativa tal como nas emendas n. 18 e 19 de 1998. Havia e há a crítica liberal sobre a constitucionalização do Direito Administrativo no Brasil, uma especificidade nossa, dado que além de Portugal (pela última carta de 1975), somos o país que mais constitucionalizou o Direito Administrativo no mundo. Processo este que iniciou na Era Vargas em 1934 com a Carta do mesmo ano e que foi um pouco alavancado em 1946; preservado em 1967 (não foi a ditadura militar que aprofundou esse processo de constitucionalização do Direito Administrativo); “inflacionado” em 1988 com 65 dispositivos de Direito Administrativo constitucionalizados; e que a reforma de 1998, num contexto de liberalização, ainda introduziu mais 13 artigos – totalizando hoje 78 artigos em Direito Administrativo constitucionalizados no país. O que importa do ponto de vista da Federação é seu resultado: uma Federação imobilizada. O que, por exemplo, uma Assembléia pode deliberar hoje sobre legislação de trânsito de acordo com a cultura, os números e especificidades locais de seu estado? Sabemos que nada pode. Com isso temos um país engessado e tal situação, do ponto de vista do centro político e do centro administrativo, ao contrário do discurso, não é outra coisa senão o fortalecimento da tendência ainda mais para a centralização. É nesse processo que se situa a proposta da chamada reforma política.
Mas para que tanta centralização? Exatamente para promover o neoliberalismo, que precisa de controle político forte. E essa constatação é o reconhecimento de que o mercado precisa da violência política e da brutalidade da ação das instituições contra a sociedade; da docilidade das instituições (do Poder Judiciário, do Poder Legislativo); e do controle político para exercer o seu domínio, a sua primazia. Tudo isso para subsumir a vontade e ser instância determinante na vida social, porque ele – o mercado – por si só é incapaz, pela marcha natural dos acontecimentos, de tomar o controle e de ter esse controle vivo, decidido, sobre a vida social e política do país.
O efeito vinculante da súmula, a reforma administrativa e a chamada reforma política fazem parte dessa centralização intrínseca ao neoliberalismo. A reforma política especialmente na sua contraparte da desmobilização social, vista em particular na questão do voto facultativo e na cláusula de barreira dos pequenos partidos.
Nesse contexto há algo a ser identificado como matéria e que, em certo sentido, o processo em curso no país é o aprofundamento da Era Vargas para outros propósitos no que se refere à relação entre o Estado e a sociedade do ponto de vista das instituições. Esta é a “equação” que se apresenta à nossa frente: centralização política, centralização administrativa e neoliberalismo.
Isso é percebido também ao analisarmos as medidas provisórias. A coalizão majoritária que governa o país é o fator que tem permitido o caminho das e para as medidas provisórias; porque, se elas não são votadas, é que há um consenso tácito na maioria que, de algum modo, as endossa. Se houvesse alguma contestação, seriam então votadas. O caminho fácil da reedição e aprovação tácita é muito fácil para tal coalizão.
Ao adentrarmos à questão dos partidos vemos que o caminho da representação tem sido difícil para as oposições e, em tal contexto, a denúncia retórica tem aparecido com frequência. Uma percepção disso pode ser dada pela quantidade de vezes que os partidos de oposição, especialmente os de esquerda (dentre os quais principalmente o PT), procuram a judicialização da política. Isso acaba sendo feito com a expectativa de que o Judiciário exerça a função de ecoar a denúncia retórica apresentada.
De qualquer forma este governo, pela centralização política e administrativa necessária ao tipo de coalizão política que montou, vem exercendo uma verdadeira tirania da maioria sobre a minoria. Juntando nesse processo mecanismos políticos, e até mesmo políticos de velho tipo, ao mesmo tempo que faz a crítica da Era Vargas, dá continuidade a muito de sua metodologia.
Penso que diante de nós há outras possibilidades, desde que passemos a trabalhar com uma concepção mais rica do “teatro de operações”. Não basta pensar sociedade civil, formação de opinião, representação, maioria, mudança, transformação social. Há de se pensar, também, nas substituições e no jogo que está posto. Em primeiro lugar seria importante mencionar a questão da Federação, que é estratégica no Brasil. Não podemos compreender como a última ditadura que tivemos caiu sem compreendermos a crise da Federação – sem a eleição de 1982 de Tancredo em Minas Gerais, Brizola no Rio e de Montoro em São Paulo. Esse foi o eixo que acelerou, garantiu e deu sustentação ao processo de conquista da democracia política. Vê-se, assim, é tema que envolve a Federação.
Além disso, há outro encaminhamento a se fazer no âmbito de questões que envolvem o encontro entre o Estado e a sociedade civil organizada, neste momento em que a sociedade está esgarçada, fragmentada, em que a sociedade civil não consegue se “vertebrar” e se articular. Há várias iniciativas na atualidade que apontam para se trabalhar com esse tema. É bom relembrar que Vargas se aproximou do mundo do trabalho pela via corporativa e com o objetivo de controlá-la e constituir mercado para a burguesia emergente, mas – é importante ressaltar – também pensando na formação de uma cultura cívica que deu certo. Quando falamos em iniciativas cívicas na atualidade ( e podemos citar o orçamento participativo e os juizados especiais), estamos, 50 anos depois, em outro contexto mais favorável às forças democráticas, à autonomia cidadã, a uma cidadania ativa e não passiva como nos anos 30; diante de imensa possibilidade de estimular a sociedade civil e organizar essa sociedade para recuperar a idéia republicana da cultura cívica no Brasil”.
* Professor e pesquisador do Instituto Universitário de Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (IUPERJ).
Wanderley Guilherme dos Santos*
“Abordarei algumas preocupações recentes sobre este tema de reformas políticas – que já vem em pauta há 15 anos. Tudo o que se encontra na imprensa – hoje hegemonicamente – começou como minoria de alguns políticos e intelectuais numa comissão que queria preparar um anteprojeto de constituição para o governo Tancredo Neves. Todas essas medidas propostas aqui estavam lá contempladas e outra coisa não se fez nesse tempo senão reiterar, não só o diagnóstico das nossas mazelas políticas e a identificação das fontes que as causam, como a terapia para solucioná-las.
Tem-nos cabido uma missão extraordinariamente complicada, a começar pelo fato de que não aceito tal diagnóstico – de que nossa democracia seja doente. Nem aceito o diagnóstico de que nossas práticas e convivências democráticas sejam patológicas se comparadas com qualquer outra democracia. Não aceito a afirmação de que o número de partidos é o problema. Nem ser necessário haver um determinado número de votos a um partido para que ele tenha direito à representação. Não aceito nenhuma destas declarações e nenhum destes diagnósticos como sendo fundados em alguma teoria aceitável de convivência democrática. Eles não estão fundamentados em nenhuma teoria, pois não está provado em qualquer parte do mundo ou por qualquer pessoa que a democracia, tal como é praticada, deva qualquer coisa ao número de partidos e ao número de votos que se distribui entre eles, ou mesmo a qualquer coisa que envolva a forma de organização do sistema partidário.
Vou dizer de outra maneira: o número de vezes em que tentativas de construção democrática em continentes como a América Latina, a África ou a Ásia, sofreram dificuldades, problemas e, eventualmente, interrupções, em um momento sequer se pode atribuir, nesses casos, a origem de tais problemas àqueles agentes passivos apenas.
Por isso considero tais argumentos falsos e é preocupante o fato de sua repetição, não obstantes todas as evidências dos últimos 15 anos, pelos dados disponíveis, de que são falsos – rigorosamente falsos! Pergunto-me, então, porque é, hoje, hegemônica nos meios de comunicação de massa, a argumentação da necessidade de tais reformas políticas?
Alguns aspectos recentes têm trazido preocupação adicional. É o fato de que começamos a aceitar alguns dos termos até um certo ponto, dificultando argumentar contrariamente aos termos hegemônicos.
O primeiro ponto que foi bem vendido e difundido é a tese de que a democracia implica no problema da governabilidade. Sabemos que isto é falso, pois a democracia é um sistema para organizar e resolver pacificamente conflitos de interesses. Já a questão da governabilidade é problema de quem está no governo. Não faz parte do processo eleitoral resolver ou fortificar posições para o governo governar sem problemas, porque o processo eleitoral significa a escolha e o processo de seleção daqueles que vão representar esta maioria, que não pode falar diretamente com o poder. Portanto a eleição não é processo de criar condições para um governo ter facilidade para governar; e para o eleitor, antes de tudo, o importante é que governo e oposição e as instituições do Executivo, Legislativo e Judiciário cumpram decentemente seu papel, de acordo com os interesses majoritários da Nação e com a proteção das minorias. Isso porque desde o século passado, o conceito de democracia vem a ser expressão da maioria com respeito da minoria.
Portanto pouco importa que sejam 20, 25 ou 383… os partidos que constituem nosso sistema partidário, pois não está provado em lugar nenhum do mundo que esse é o fator responsável pelo que acontece no Brasil. Em nenhum estudo, livro ou análise está provado que a nossa distribuição de renda, nosso problema de desemprego, dificuldade de retomada de desenvolvimento econômico – todos os problemas de uma agenda substantiva real – sejam dependentes do número de partidos existentes no Brasil. Reduza-se a um só partido e o desemprego, a dívida externa e interna, ou seja todos os problemas concretos continuarão existindo. Mas, alguns setores passaram a aceitar a tese que o problema é o número de partidos e temos de dar solução porque senão a oposição é acusada de não ter proposta.
Há ainda outro argumento que começamos a aceitar acerca dos partidos existentes com votação aquém daquilo que, agora, alguns iluminados supõem ser o limite a partir do qual os “partidos são partidos”. Dizem que seria preciso respeitar porque em algum momento isso será modificado, gerando-se argumentos como “o PT e outros partidos fortes atualmente em 1982 não chegaram a esse limiar”. Temos uma série de exemplos de argumentação em relação à necessidade de dar tempo ao tempo aos que atualmente estão na mesma condição. Estes podem até ser argumentos interessantes, só que isso dizem muito pouco, porque não importa se um partido dado permanecerá o resto da sua existência com um número X de votos, e sim, o que importa é que os eleitores têm o direito à sua representação – sem ser obrigados a, num futuro de 5, 10 ou 20 anos, se ter de multiplicar por 10, 15 ou 20 o número de votos, sob pena de não se ter mais representação. Não obstante, já aceitamos esse argumento de que o direito de existência de partidos menores se funda nas tentativas, quase na obrigação, de no médio ou longo prazo virem a ser grandes. Afirmo que não temos nenhum compromisso com isso. Os partidos têm direito de estar no Congresso porque eles representam seus eleitores. O que interessa, mesmo, é ter essa representação do eleitor e a eleição é feita para escolher representação e não para criar condições para o governo governar sem problema, nem para criar condições para o partido pequeno virar grande. É feita, sim, para representar eleitores da melhor forma possível.
Esse problema se coloca com clareza e intensidade cada vez maiores na medida em que as sociedades ficam mais complexas. Quanto mais democráticas, por um lado, mais complicadas e concentradas elas ficam, por outro, porque o tamanho da representação não pode acompanhar o crescimento da participação dentro do sistema político. A proporção entre o número de representantes e representados tende a ficar extraordinariamente diluída ao longo do tempo. As formas de representação, manifestação e participação nas sociedades contemporâneas não só exigem a necessidade de todos os que estão lá continuar, se assim conseguirem voto, como também se tornar legítimas e abertas a outras formas de participação daquelas tradicionais na vida republicana.
Nesse contexto, é necessário debatermos o fato de que a democracia contemporânea não nasceu por conta de uma abstração de poder, nem por parte de algum convencimento intelectual de quem detinha o poder. Ela nasceu por conta do fato de que, em seus inícios, tratava-se de uma democracia armada, isto é, aqueles que participavam do poder não detinham supremacia em termos de armas em relação àqueles que eram governados e participavam da vida política. No século XVII era complicado para o poder tornar-se tirânico sem temer aqueles que participavam da vida política, que podiam possuir os argumentos. Era simples, assim, resistir pela força legítima em relação aos desmandos do poder. Foi ao longo do tempo que a força do poder foi colocando uma força reagente e se mantendo dentro dos limites permitidos. E isso é um dos aspectos importantes para entendermos porque temos de ter a representação de todas as correntes de opinião. Porque o corpo representativo não exerce representação só para dizer o que deve ser dito, mas fundamentalmente para impedir o que não pode ser feito. E para impedir, caso seja feito contra os interesses e contra a agenda popular, é preciso ter força. Essa força foi, então transformada de pólvora em votos e durante muito tempo o voto foi suficiente.
Mas, hoje, parece que a força do voto já não é mais suficiente. A capacidade de controle e de penetração do poder contemporâneo na vida – de condicionar, impor e submeter, a exemplo dos meios de comunicação de massa – e o modo pelo qual nós cidadãos estamos absolutamente à exposição do atual poder político é algo inusitado na história da democracia. Isso nos leva a refletir sobre alguns conceitos clássicos importantes na história da democracia por imposição de limites à força do poder – a desobediência civil e a resistência passiva. Percebemos, hoje, seus limites e insuficiências. Acho necessário democraticamente pensar e reconsiderar quais são as relações efetivas entre o comportamento e a participação política e o exercício do poder. Parece que chegou a hora de debatermos o direito de resistência ativa, um tema complicado, mas considero que chegou mesmo o momento de se discutir nosso direito de resistência ativa!”.
Wanderley Guilherme dos Santos é professor e pesquisador do Instituto Universitário de Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (IUPERJ) e da Faculdade Cândido Mendes.
EDIÇÃO 54, AGO/SET/OUT, 1999, PÁGINAS 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19