A década de 1930, no Brasil e no mundo, caracteriza-se como um dos períodos mais complexos da nossa história recente. A grande crise do capitalismo e, conseqüentemente, de sua ideologia liberal; a decadência da hegemonia do capitalismo da Inglaterra e a ascensão dos Estados Unidos; a experiência de socialização na URSS; e o totalitarismo do nazismo e do fascismo na Europa, acirraram as contradições entre as potências mundiais. Como decorrência dessa situação, o Brasil enfrenta um momento decisivo em sua demorada transição ao capitalismo.

Com o sucesso do Movimento de Outubro de 1930, finalmente as diferentes frações da burguesia conquistaram o poder político do Estado, mesmo sem realizar as mudanças estruturais de que o país necessita. Os conflitos internacionais estavam gestando a II Guerra Mundial, iniciada em 1939. Nesse contexto, o Partido Comunista do Brasil participou da ação política no país; por um lado, influenciado pela direção da III Internacional, mas, por outro, procurando entender a realidade sócio-econômica e política em que atuava. É nessa conjuntura que devemos entender os avanços e recuos de sua atividade revolucionária.

O Movimento de 1930 e a posição do Partido

Ao iniciar o ano de 1930, os efeitos da Crise econômica de 1929 aumentam as divergências entre aqueles que apóiam politicamente os fundamentos da Republica Velha, baseada no modelo monocultor de exportação, e os que defendem um novo modelo econômico.
Essas divergências políticas ganham uma bipolaridade no seio das classes dominantes brasileiras que disputaram eleitoralmente a Presidência da República, divididas entre as que apoiavam a manutenção da Primeira República e a dissidência oligárquica do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraíba. As candidaturas dividiram-se, respectivamente, entre as propostas de Julio Prestes e de Getúlio Vargas.

Com a derrota deste último, cujos apoiadores buscavam explicar o desenlace eleitoral pela fraude, não aceitando o resultado, iniciou-se a preparação de um movimento civil-militar que culminou, em outubro desse ano, no chamado Movimento de 1930, levando ao poder Getúlio Vargas.

No entanto, a tática de “classe contra classe”, decidida pelo VI Congresso da Internacional Comunista (IC), fez com que o Partido Comunista do Brasil, como seção brasileira daquela associação, apresentasse uma avaliação equivocada do Movimento que colocou em contradição forças políticas diferenciadas das classes dominantes. Em editorial de outubro de 1930, A Classe Operária, órgão central do Partido, divulga a opinião de que as dissidências remascararam os dois bandos da política coronelista, pois a guerra civil seria uma ação reacionária dos generais a serviço dos imperialistas em luta. Ou seja, o Movimento de 1930 não teria passado de uma luta local entre as oligarquias que apoiaram ou o imperialismo inglês ou o imperialismo norte-americano. Nesse sentido, o Partido conclama as massas exploradas para a conquista do poder operário e camponês baseado nos Conselhos de Operários, Camponeses, Soldados e Marinheiros. Não entendeu o Partido que “o movimento vitorioso desaloja do poder importantes agrupamentos de forças reacionárias e adota medidas de caráter democrático-burguês”, mesmo sendo dirigido pela “burguesia em aliança com setores de latifundiários” ou sem tocar “no monopólio da terra” nem “impedir a penetração do capitalismo”. (1)

Esse erro de avaliação deriva de uma deficiência estrutural do Partido, caracterizada por uma limitada interpretação da realidade brasileira e do processo de luta de classes em curso – aliada ao pouco conhecimento do marxismo pois O Capital sequer havia sido publicado no Brasil. Completa esse quadro, a pequena organização do Partido nos estados, seguida de uma análise generalizante e uniforme, a partir da indicação da IC, que considera países como o Brasil, e o restante da América Latina, “semicoloniais”. O sectarismo prevalece tornando-se uma forma idealista de estabelecer a realidade, levando à defesa estreita de uma mudança revolucionária apenas com o operariado, os soldados e os marinheiros. A precária organização das massas para uma mudança rumo à revolução do modo de produção, combinada com a inexistência de um Partido coeso politicamente, leva o Partido Comunista a uma visão mecânica sobre o Movimento de 1930.

Decidido que o Partido Comunista do Brasil não apoiaria esse Movimento, um dos resultados foi a instalação, em Itaqui, no Rio Grande do Sul, de um Soviete (Conselho) local, o qual teve duração efêmera pois os seus líderes foram fuzilados pelas forças da Aliança Liberal, base de apoio a Getúlio Vargas. Ainda em 17 de abril, A Classe Operária publica uma resolução da Internacional Comunista, de fevereiro desse mesmo ano; resolução essa que entendia como oportunistas as resoluções do III Congresso do Partido, ao mesmo tempo em que afirmava que o Bloco Operário e Camponês havia sido organizado para colocar o proletariado a reboque da burguesia.

A conjuntura política, descrita acima, coincide com o lançamento, em 3 de maio de 1930, de um Manifesto de Luiz Carlos Prestes, no qual define sua posição antiimperialista e antilatifúndio. Esse manifesto constitui-se como resultado do amadurecimento político do principal líder tenentista da década de 1920 e, conseqüentemente, a sua maior aproximação ao marxismo e às teses do Partido Comunista do Brasil.

Prestes, que havia sido convidado por Vargas para ser o comandante militar da revolução em curso, declina do convite e rechaça a orientação política da Aliança Liberal. Entretanto, o extremo antiprestismo, na direção central do Partido, impede a aproximação efetiva de Prestes; tanto que, em maio de 1930, a Conferência do Secretariado Sul-Americano da IC propõe novas relações entre os comunistas e o líder revolucionário brasileiro. Mesmo assim, a filiação do mesmo ao Partido não acontece, fazendo com que ele, de Buenos Aires, funde a Liga de Ação Revolucionária (LAR), de duração momentânea.

Entretanto, a tática de classe contra classe, implementada pela direção do Partido desde o III Congresso de 1928-29, coloca em prática uma política de oposição aos “elementos pequeno-burgueses” – resultando no afastamento de Paulo Lacerda, Basbaum, Fernando de Lacerda e Astrojildo Pereira de sua direção –, incluindo a crítica ao “prestismo”. O obreirismo, em aplicação na política cotidiana do Partido, impediu por largo tempo a aproximação de Luiz Carlos Prestes, e outros “tenentes”, ao Partido, apesar da defesa de tal líder das suas principais teses. Por outro lado, aumentavam os desentendimentos no interior do Partido, tanto em sua composição social quanto em sua direção política, que analisa a realidade de forma empírica, conseqüentemente dogmática.

Se é certo que o Movimento de 1930, iniciado em 3 de outubro, ao transformar-se em Governo Provisório, não havia rompido de forma revolucionária com a estrutura sócio-econômica desse mesmo ano, ele começava a colocar em prática medidas de reformas do sistema eleitoral e da legislação trabalhista e sindical. Reivindicações que estavam na linha de frente das lutas operárias das décadas anteriores. Essa situação fez com que, rapidamente, as grandes massas trabalhadoras e setores importantes da pequena burguesia passassem a apoiar o novo governo, isolando politicamente as posições do Partido.

Em novembro de 1930, um dos fundadores do Partido em 1922, e seu secretário-geral, é afastado da direção, acusado de resistir à “proletarização”. Nesse quadro, o Partido não consegue construir uma direção efetiva; tanto que em janeiro de 1930, Heitor Ferreira Lima torna-se o novo secretário-geral. Mas, este logo seria substituído por Fernando de Lacerda, em junho.

A posição de Prestes evolui para a carta aberta de março de 1931, na qual critica os participantes dos movimentos de 1922 e 1924, e também os da Coluna Prestes que aderiram a Vargas, acusando-os de se terem colocado no campo do inimigo. Simultaneamente, proclama sua fidelidade aos princípios do internacionalismo proletário, chamando as massas a se organizarem nas fileiras do Partido.

A tática sectária e esquerdista do Partido, por sua vez, além de impedir que crescesse a consciência das massas rumo a mudanças mais avançadas, contribuía para que, uma vez consolidado o governo de Vargas, este continuasse a reprimir as manifestações organizadas pelo Partido, ainda na clandestinidade. A repressão policial prende centenas de trabalhadores e comunistas, muitos enviados para as prisões da Ilha Grande e de Fernando de Noronha, além de assassinar outros, ainda em 1931.
No interior do Partido, a política de “proletarização” continua; tanto que em janeiro de 1932, assume a secretaria geral o operário José Vilar (“Miguel”). Mas, este não resiste muito tempo. E, em maio, uma Reunião Ampliada do Comitê Central reorganiza a direção do Partido, tornando-se secretário-geral Caetano Machado.

Em 9 de julho de 1932, eclode em São Paulo a revolta dos alijados do poder político em outubro de 1930. Sob o pretexto da reconstitucionalização, os paulistas vão à guerra civil contra o governo central. Getúlio Vargas, agora fortalecido com o apoio político do Tenentismo – a maioria dos “tenentes” que o apoiaram em 1930 tornaram-se interventores estaduais, ou outros cargos importantes do governo –, reprime rapidamente o movimento.

O Partido, mantendo sua linha política, critica, ao mesmo tempo, o governo de Getúlio e os golpistas de São Paulo, clama às massas a lutarem por suas reivindicações imediatas: contra o imperialismo e o latifúndio e, novamente, pela transformação da luta armada, entre os grupos das classes dominantes, numa luta pela instauração de um governo operário e camponês.

Como um dos resultados dessa posição esquerdista, após o “Movimento Constitucionalista”, e, como nova estratégia de governo, Vargas começava a se afastar dos “tenentes” progressistas, organizados em torno do Clube 3 de Outubro, aproximando-se das lideranças conservadoras de São Paulo. Com vistas a barganhar na Assembléia Constituinte, eleita em 3 de maio de 1933, e, ao mesmo tempo, consolidar o poder de seu Governo Provisório, Vargas e seus aliados atuaram na Constituinte com vistas a elaborar uma Carta que, promulgada em 19 de julho de 1934, tornou-se uma mescla de antigas reivindicações dos trabalhadores, com características reformistas dentro de posições liberais e populistas do governo. Nesse momento, a tática do governo foi uma aliança com a oposição paulista, na busca do abrandamento da luta de classes e da ascensão dos movimentos sociais, então em curso. Essa estratégia levou Vargas a ser eleito Presidente da República, de forma indireta, em 1934.

Parte do campo do tenentismo que aliara-se a Vargas em 1930, passou a tomar posições mais radicais, dividindo-se entre os que tomaram o rumo conservador – aliados à Ação Integralista Brasileira (AIB), criada em 1932, que tinham a complacência do governo –, e aqueles que, aos poucos, aderiram ao antifascismo.

Em 1933, o Partido passa a apoiar e incentivar as manifestações contra a guerra e o fascismo, afastando-se um pouco de seu isolamento político da formação social brasileira. Concomitante a isso, concorre às eleições para a Constituinte, a partir das legendas “União Operária e Camponesa”, no Rio de Janeiro, e “Trabalhador ocupa o teu posto!”, no Recife. Álvaro Ventura, integrante do Partido, é eleito à Constituinte, como representante classista.

Entretanto, as divergências na direção central do Partido continuavam. Em julho de 1933, novamente ocorre uma reorganização da direção nacional, quando Duvitiliano Ramos, também operário, assume a Secretaria Geral. Nessa nova escolha, Antônio Maciel Bonfim (“Miranda”), passa a fazer parte do secretariado.

Nova ascensão dos movimentos populares

No início de 1934, as greves e os movimentos sociais passaram a ganhar mais espaço na luta social brasileira, resultando em um ascenso do movimento operário. Às greves da Leopoldina e da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, em abril, seguiu-se a greve geral dos bancários, dos marítimos, dos telegrafistas, dos operários da City em Santos, da Cia. Força e Luz em Belo Horizonte, da São Paulo Railway, em Belém, etc.. Nessa época foi realizado um Congresso Sindical Nacional, quando organizou-se a Confederação Sindical Unitária do Brasil (CSUB).

No Primeiro de Maio desse ano, apesar da proibição da polícia, realizaram-se manifestações em todo o país. No Rio de Janeiro, os operários reagiram à bala à intervenção policial, havendo diversos feridos e presos; e em Recife, dois trabalhadores foram mortos e mais de vinte feridos devido a um ataque a uma passeata, a tiros, por parte da polícia.

Nesse contexto de ampliação dos movimentos sociais, o Partido Comunista do Brasil mais uma vez sofria mudanças em sua direção. Antônio Maciel Bonfim despontava como liderança, enquanto seus principais críticos – Heitor Ferreira Lima, Corifeu de Azevedo Marques e Mário Grazini – eram afastados.

Comício da ANL

Logo após, o Partido realizava, entre 8 e 10 de julho, a sua I Conferência Nacional, com o objetivo de reestruturar a sua direção e eleger os delegados brasileiros ao VII Congresso da IC. Essa Conferência fez um apelo aos comunistas a fim de promover em todo o Brasil manifestações contra a guerra, a reação e o fascismo, entre 1º e 23 de agosto desse mesmo ano; e, ao mesmo tempo, conclama para o fortalecimento do Partido. O documento dessa Conferência foi publicado no jornal A Classe Operária, edição de 1 de agosto de 1934.

A delegação brasileira, que foi a Moscou para participar do Congresso da IC, teve em sua composição Antônio Maciel Bonfim – o Miranda –, eleito como secretário-geral do Partido. Pelo fato de o VII Congresso da IC ter sido adiado, foi realizada, na capital da União Soviética, uma Conferência dos representantes dos Partidos Comunistas da América Latina. Lá, os representantes brasileiros transmitiram dados idealizados, e não condizentes, sobre a realidade brasileira, afirmando que o Brasil encontrava-se às portas de um movimento revolucionário, o qual contava com apoio maciço das Forças Armadas. As lideranças da Internacional passaram a se interessar mais especificamente, a partir dessas informações, sobre as possibilidades revolucionárias do Brasil.

Por decisão da IC, no primeiro dia de agosto, Prestes, que neste momento residia em Moscou, ingressava ao Partido. O fato foi noticiado pel’ A Classe Operária. Ao mesmo tempo, ampliavam-se os comícios, promovidos por inúmeras organizações proletárias e populares, contra a guerra e o fascismo. Preparava-se, então, o I Congresso Nacional de Luta contra a Guerra, a Reação e o Fascismo, realizado no Rio de Janeiro, no Teatro João Caetano, em 23 de agosto, como resultado das inúmeras conferências em todos os estados. Comandou a organização desse Congresso, entre outras entidades, a Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), que chamava para um grande comício diante da Central do Brasil. Os participantes, após a reunião, dirigiram-se ao Teatro João Caetano, com faixas e palavras de ordem contra a guerra e o integralismo, por pão, trabalho, terra e liberdade.

Participaram, do mesmo, representantes do Socorro Vermelho do Brasil, da Juventude Comunista e do Partido. Depois do comício, a Polícia Especial, a Polícia Militar e investigadores da Ordem Política e Social atiraram contra os manifestantes, na Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro, havendo dois mortos e dezenas de feridos. Esse episódio resultou do recrudescimento da luta de classes; tanto que dois dias após esse incidente, iniciava-se a greve dos trabalhadores da Cantareira, com a participação de três mil operários, em protesto contra a chacina do João Caetano. O movimento foi acompanhado por uma generalização do movimento grevista, com a adesão de caixeiros e pedreiros de Niterói, padeiros do Distrito Federal, Cia. Circular da Bahia e marceneiros. Em conseqüência, a polícia fechava a Federação Proletária do Rio de Janeiro.

A luta antifascista e a criação da Aliança Nacional Libertadora

A participação política do Partido nesses movimentos ampliou sua base de apoio na sociedade; tanto que, em setembro de 1934, ingressava ao Parlamento Federal um representante do Partido Comunista do Brasil, tomando a posição de desmascaramento dos representantes das classes dominantes e do imperialismo. Ao mesmo tempo, o Partido trabalhava para organizar uma frente única de luta de todos os trabalhadores e de todo o povo contra a guerra e o fascismo. Nesse momento, surgia o Jornal do Povo, órgão de massas do Partido, que teve vida efêmera, sendo logo fechado pela polícia.

Ainda em setembro, de 23 a 29, foi realizada a I Semana Nacional Antiguerreira, promovida pelo Comitê Nacional de Luta contra as Guerras Imperialistas, a Reação e o Fascismo. Em 7 de outubro, o Partido dirigiu as forças populares antifascistas que dissolveram uma manifestação armada dos integralistas, no Largo da Sé, em São Paulo. No restante do país, os comunistas tomavam a frente na luta contra os integralistas, particularmente no Rio de Janeiro, Petrópolis, Campos, Pernambuco, Espírito Santo e Rio Grande do Sul. Ao mesmo tempo, era organizada a Comissão Política e Popular de inquérito para a luta contra os crimes da reação, multiplicada por todo o Brasil. São esses movimentos antifascistas e antiimperialistas que culminaram na formação da Aliança Nacional Libertadora (ANL), em 1935; em grande parte, impulsionada pelo Partido.

Alguns integrantes do Partido, entretanto, temiam que o mesmo pudesse ser incorporado por uma frente da dimensão da ANL, caracterizada por muitos como organização pequeno-burguesa, a exemplo do que havia acontecido entre 1927 e 1928, na experiência do Bloco Operário e Camponês (BOC), quando os comunistas praticamente foram dissolvidos nessa organização. Em um artigo para A Classe Operária, Lauro Reginaldo da Rocha (“Bangu”), referia-se aos “perigos do nacional-reformismo da Aliança Nacional Libertadora”. (2)

A necessidade de um jornal de massas retornou em 1935, com a publicação de A Manhã, logo no início do ano. A retomada das greves e um novo ascenso do movimento de massas exigia dos comunistas a criação de meios mais abrangentes para a defesa de suas idéias e para sua propaganda política e ideológica. Assim, um periódico de amplitude externa ao Partido possibilitaria sua inserção em camadas mais amplas da população.

Em seguida, em 30 de março, era lançada oficialmente a ANL e seu Manifesto-Programa. Este fato marcou o surgimento da maior frente antifascista, antiimperialista e antilatifundiária que até então havia existido na formação social brasileira. No Manifesto, surgiu a defesa do cancelamento das dívidas externas; a nacionalização das empresas imperialistas; a liberdade em toda sua plenitude; a entrega dos latifúndios ao povo que neles trabalha e a libertação dos camponeses; o fim da exploração dos tributos “feudais” pelo aforamento, pelo arrendamento da terra, etc; a defesa de pequena e média propriedade contra a agiotagem e contra qualquer execução hipotecária; pela exploração das riquezas nacionais; pela diminuição dos impostos; pelo aumento dos salários e ordenados; e por medidas efetivas de amparo social ao trabalhador.

As forças conservadoras, apoiadas em ampla campanha da imprensa, acusavam a ANL de ser uma organização comunista “a serviço de Moscou”. Na verdade, a Aliança não era uma criação exclusiva do Partido, nem contava com uma direção exclusivamente comunista. A sua amplitude política contava com o apoio de socialistas, anarquistas, trotsquistas e, até, de liberais democráticos, com uma composição social que abrangia desde o proletariado, passando por militares, pequenos empresários, comerciantes e proprietários de terras e outros setores da pequena burguesia. Isso fez com que em apenas três meses de organização legal, o movimento aliancista conseguisse organizar mais de 1.600 diretórios em todo o Brasil, abrangendo desde os núcleos políticos; como os núcleos específicos de trabalhadores e estudantes. Seu conteúdo programático – amplo para o contexto da época, apesar de ter pontos em comuns com o do Partido Comunista do Brasil –, na verdade, representou mais um conjunto de propostas de reformas democrático-burguesas para a dinamização do capitalismo, do que qualquer proposta de socialização do país.

Entretanto, tais mudanças, continham uma radicalidade para o momento. Isto fez com que a oposição à Aliança também crescesse, rearticulando as classes dominantes, principalmente o empresariado, os legislativos e executivos, a parcela majoritária da imprensa e da Igreja Católica. O governo preparou uma Lei de Segurança, criticada pelo Partido, em artigo assinado por “Bernardo”, em A Classe Operária, na sua edição de 11 de março de 1935. Como resultado das articulações conservadoras, em 4 de abril, foi aprovada no Congresso a famigerada Lei de Segurança Nacional (LSN), que procuraria evitar a ascensão em curso dos setores populares e democráticos.

Em abril, de forma clandestina, Luiz Carlos Prestes, acompanhado de Olga Benário, chegava ao Brasil. Juntamente com eles, o argentino Rodolfo Ghioldi, o alemão Arthur Ernst Ewert e sua esposa Elise Ewert, o belga Leon Julles Vallé e o norte-americano Victor Allan Barron; todos integrantes da IC que vinham ao país para apoiar o movimento revolucionário.

Através da ANL, o Partido aparecia para amplas massas da população, em um momento de efetivo êxito da organização partidária, tornando-se linha de frente no combate ao fascismo e seu similar nacional, o integralismo. Ao mesmo tempo, ampliava-se o relacionamento com amplas camadas da população. Na prática – apesar de não ter havido, oficialmente, mudança na tática “classe contra classe” –, essa abertura fez com que o sectarismo, o antiprestismo e o obreirismo perdessem espaço, resultando em nova aproximação de intelectuais, militares e outros setores oriundos da pequena burguesia ao Partido.

Logo após, em abril, através de carta à direção da ANL, Luiz Carlos Prestes aderia à organização, tornando-se logo seu Presidente de Honra. Por seu prestígio adquirido perante a sociedade brasileira, a Aliança logo passou a ter a adesão de milhares de integrantes por todo o Brasil. Ao mesmo tempo, depois de um longo período de afastamento das grandes massas da população, a frente formada em torno da ANL proporcionava maior visibilidade ao Partido Comunista do Brasil, que crescia junto com o aliancismo, por meio da luta antifascista.

Mas, em 5 de julho de 1935, Prestes lançaria outro Manifesto, conclamando todos os brasileiros a “se unirem contra o fascismo e o governo odioso de Vargas”. Dessa forma, propunha a composição de um “Governo Popular Nacional Revolucionário”, com a palavra de ordem “Todo Poder à ANL!”. É o argumento que faltava para o governo Vargas colocar em prática medidas repressivas contra a Aliança. Baseado na Lei de Segurança Nacional, recém-criada e batizada pelos setores progressistas como “Lei Monstro”, imediatamente era decretado o fechamento da Aliança, que passaria a viver na ilegalidade. Em seguida, era fechada a União Feminina do Brasil (UFB) e a CSUB.

Entre o final de julho e o início de agosto, foi realizado, em Moscou, o VII Congresso da IC, que, sob a liderança de Dimitrov, mudava a tática da III Internacional e a orientação aos Partidos Comunistas a ela filiados, propugnando a mudança da tática “classe contra classe” para a de “formação de frentes amplas contra o fascismo”. Nesse Congresso, o exemplo da ANL foi utilizado como forma desenvolvida de combate ao inimigo maior dos povos nesse momento: o fascismo. E, ainda, Prestes passava a fazer parte da direção da IC; situação essa que possibilitou sua eleição, em novembro de 1935, como membro do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil.

Diorge Konrad é doutorando em História Social do Trabalho da Unicamp e Professor do Departamento de História da Universidade Federal de Santa Maria (RS).

Notas
(1) POMAR, Pedro. “O povo conquistará a verdadeira independência”. In: A Classe Operária n. 68, setembro de 1972.
(2) VIANNA, Marly de Almeida Gomes. Revolucionários de 1935. Sonho e realidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p. 135.

EDIÇÃO 62, AGO/SET/OUT, 2001, PÁGINAS 57, 58, 59, 60, 61, 62