Novela latino-americana
Ele chamava-se Abel.
Alma era no nome dela.
Conheci o par, tarde da noite,
Num beco da cidade do México.
Em busca de trabalho e dólares,
Abel e um amigo, a nado,
Cruzaram a fronteira.
Antes de partir, da moça em lágrimas,
Ganhou uma fotografia
E um juramento: Irei esperá-lo por toda vida.
A miséria, o meio, a fragilidade do caráter,
O certo é que, em dois meses e meio,
Tornou-se uma puta.
Abel limpou chão,
Consertou eletrodomésticos,
Vendeu pizza, assaltou,
E também foi roubado.
Depois de um ano retornou barbeado
E no bolso um punhado de dólares.
Abel bateu de porta em porta
Procurando sua Alma.
Coube a Diego, primo e amigo,
A amarga narrativa.
Abel bebeu garrafa e meia,
A cada gole, entre soluços, lamuriava:
Perdi minha Alma!
Mas para o espanto de todos, gritou:
Ela se tornou uma puta, mas eu a perdôo!!
Navalha no bolso, foi ao cabaré.
Chegou a riscar o pescoço
Do cafetão que escravizara sua noiva.
Mas levou a pior.
Com sua própria navalha
Foi muitas vezes perfurado.
Foi atirado porta afora, em sangue.
Alma socorreu Abel.
Sentou-se no meio-fio,
E o rosto do amado ao colo.
E ela disse que o levaria a um hospital;
que ele ficaria bom; que então se casariam.
Graças a orações de Alma
E à destreza de um cirurgião
Abel foi salvo.
Ele abriu uma barbearia.
Ela mudou de vida.
Tiveram filhos, um casal.
É esta história que deu
Àquele lugar imundo,
Da cidade do México,
O nome de Beco dos Sonhos.
Adalberto Monteiro, Jornalista e poeta. É da direção nacional do PCdoB. Presidente da Fundação Maurício Grabois. Editor da Revista Princípios. Publicou três livros de poemas: Os Sonhos e os Séculos(1991); Os Verbos do Amor &outros versos(1997) e As delícias do amargo & uma homenagem(2007).