Se me chamasse Raimundo…
O mundo se surpreenderia com que teria para falar. Nem saberia como começar. Talvez pelos detalhes, para depois chegar ao principal. Assim, iria progressivamente intensificando o suspense, valorizando com isso o assunto.
Ou então, entraria de chofre na conversa, causando pasmo geral. Depois do silêncio, profundo e regulamentar, daria detalhes, faria rodeios, compondo a imagem mais nítida do fenômeno.
Mas ninguém quer ouvi-la. Ninguém acredita que ela seja portadora de um grande segredo; de algo capaz de abalar o mundo.
Também, fora nascer assim: pequena, pálida, nervosa. Quando menina, chegava numa roda, a dita logo ia se desfazendo e se recompondo mais ao lado, deixando-a de fora do círculo. Se insistia, mais uma vez o anel se desmanchava para se refazer mais adiante meio passo.
Na escola, não arrumava namorado. Mirrada, sem bunda e nem peito, cabelo louro gasto, nenhum dos garotos chegava junto. Exceto o Beto, o enjeitado.
Seu mistério era simples, embora indecifrável para os não-iniciados. Consistia num esquema trivial, mas tão perfeito, que não haveria quem não se deslumbrasse. Ah, se o tivesse descoberto antes, tudo teria sido mais fácil e ela, menos infeliz.
A questão é: como dizer isso ao mundo? Como fazê-lo crer?
E se fizesse plástica, injetasse silicone no seios, nos quadris, nos lábios? Alisava o cabelo, fazia bronzeamento, comprava lentes de contatos azuis e malhava na academia mais badalada da cidade. Depois, posaria para revistas masculinas e viraria apresentadora de programa infantil.
Conquistada tamanha credibilidade, poderia finalmente revelar seu tesouro perfeito e iluminar o mundo…
– Sabina! É pra hoje? Tem gente precisando usar o banheiro, pô!