Absolutamente ineficaz o apelo de Fernando. Marta rompeu o vaso no chão, puxou com força a porta da sala e saiu, batendo-a atrás de si. Os meninos ficaram ali, amuados e espantados, olhando o pai com uma interrogação expectante.

      No meio da escada, Fernando olha a porta fechada. Pensamentos muitos e sentimentos vários. Pra onde foi aquela maluca?

      Lembrou do telefone. Não, não deu tempo de ela chegar a lugar algum… Mas chegaria. Ligou pra sogra.

      – Saiu daqui enfurecida, dona Maria. Nem quis me escutar. Nada. Quebrou tudo e bateu a porta. O vaso. Aquele que fica na saída. Não, dona Maria, esse é o da sala. É aquele com folhinhas verdes. Ramagens, que seja. É, caro sim. Compramos naquela feira lá em Santa Catarina. Olha, dona Maria, se ela chegar aí, pede pra ligar praqui. A senhora sabe, os meninos, enfim. Tá, tá bom. Dou sim. Um abraço. Té logo.

      Foi até a cozinha. Os meninos tinham almoçado?

      – Cês almoçaram, Renato? Renato? Qué isso, filho? Não precisa ficar assim. Olha… foi um… desentendimento, entende? Foi uma discussão. Todo o casal tem disso. Quando você casar… enfim… O que você quer comer? Lógico que eu sei cozinhar! Magina. Olha aí: temos… ovos! Você gosta de ovos, que eu sei. Como detesta? Cê sempre gostou de ovo, meu filho. Não? Olha aí o Reinaldo. E aí, Nado, vamos comer aquele ovo mexido especial? Vão lá; vão lavar as mãos pra gente almoçar. Mamãe? Ela volta logo. Não, tava só zangada. Ééé… como direi… com a vida, meu filho, com a vida. Não, nada a ver com vocês. Ah, é verdade, vocês são a vida dela. Mas eu tô falando de outra vida. Do céu?! Nãão – ô meu deusinho – não, meu príncipe, não é do céu onde a vovó fica, não. Outra vida é a vida dela. Isso, isso, ela não tá feliz, é isso. Agora vão lá lavar a mão. Mas eu só sei fazer ovo mexido, Renato. Não senhor: isso também é saber cozinhar. Agora vai lá.

      Pegou três ovos… não, é melhor quatro. Mas mexido, será que fica pouco? Então seis. Pô, se meia dúzia não der… Frigideira. Onde ela põe a frigideira? Aqui não; aqui também não. Ô, diacho. Cadê? Olha ela aqui no forno. Êba, já tá com óleo. Beleza. Agora, acender o fogo. Fósforos, fósforos, onde estão os fósforos?…

      – É automático.

      – Quê?

      – É automático. Vira o botão e ele acende, ó.

      Olha pro filho com uma cara de incógnita. Quando foi que ele cresceu desse jeito? Estava com aquela mesma sensação que o paralisava diante de uma caixa de mensagem nova do computador: indeciso, tomava-lhe um sentimento difuso de incompetência.

      – Brigado, filhão. Cê chama o Nado?

      – O nome dele é Reinaldo.

      – Eu sei.

      – Ele detesta que chama ele de Nado.

      – É?

      – E.

      – Eu não sabia.

      – Você vive chamando ele de Nado.

      – Desculpe, eu não…

      – Cê nunca sabe de nada, pai.

      – Ô!

      – Por isso é que a mamãe foi…

      – Dá pro senhor sabe-tudo esperar lá na sala?

      – O óleo tá queimando.

      – Putaqueopariu!

      – E é de peixe, não dá pra fritar ovo. E, depois, é muito óleo pra ovo mexido. A mamãe…

      – Renato, vá… para… sala.

      Senta na banqueta. Enquanto os meninos vêem tv, fica assim, cotovelo na mesa, rosto apoiado na mão. E Marta, onde andará?