No corredor, esperava, aflita. Macas iam e vinham. Médicos e enfermeiros, atendentes e policiais, vigias e acompanhantes, todos circulavam entre pacientes acidentados, gripados, febris. Macas encostadas nas paredes brancas. E um cheiro permanente de medicamentos e esparadrapos.

      Da sala onde estava seu menino, nenhuma notícia. Nenhuma notícia também do pai, que não sabia onde havia se metido. Parente nenhum fora encontrado. Uma prima distante disfarçou uma desculpa e pediu licença. Certamente estava querendo terminar sua novela.

      A fila de desvalidos era imensa: tinha gente ali que aguardava há mais de cinco horas. Num dos bancos, uma moça desfiava lágrimas pelo menos desde que havia chegado. Enquanto sua mãe lhe falava, ela só balançava a cabeça e dizia que "ele vai morrer, mãe, eu sei". "Não diga isso, minha filha" era o que a senhora sabia responder.

      Num dos guichês próximos, uma funcionária de olhar mortiço anotava coisas num formulário, enquanto um senhor moreno de chapéu buscava palavras para explicar o braço machucado. A partir dele, estendia-se uma fieira de estropiados, cada qual com seu gemido, e todos com aquela expressão de santo em martírio.

      Lembrou de padre Jaime e da paróquia de São Benedito – pobrezinha, pequena, paredes quase nuas, altar escuro sempre. Na sacristia, um quadro da santa ceia recriava aquelas filas: todos expectantes, no aguardo de remissão ou de alguma revelação. Em cada apóstolo, uma dúvida, uma ira contida, um pensamento. Diante do Cristo, a traição consentida do Iscariotes.

      A enfermeira chamou. Subtraída da memória, descruzou os braços e foi ao encontro do inesperado. "Ele vai ter que ficar na UTI. A senhora assine aqui, por favor" foi o que saiu dos lábios pálidos que lhe falavam. Olhou para o papel sem entender tantos quadrinhos. "No xis, faz favor". Assinou. Não, ainda não poderia vê-lo. Assim que fosse transferido, poderia acompanhá-lo na ambulância. Por enquanto, era aguardar. Aí mesmo onde estava.

      Só depois que a enfermeira se foi é que se deu conta: "Como transferido? Pra onde?". Invadiu a sala. A enfermeira já entrava em outra porta. Tocou-lhe o braço. Indagou. "Ali não havia vaga na UTI" foi a informação que recebeu. "Estamos aguardando o retorno da ambulância" foi o complemento. E "tenha paciência" foi o máximo que obteve ao perguntar se só havia uma ambulância.

      O desespero começou a ganhar volume. Lembrou de novo do padre Jaime. Onde andaria o marido? Ai, meu deus, o que vai ser? O que vai ser? Pelo translúcido das lágrimas, tentou reencontrar a saída. E se o levasse de táxi. "Enfermeira, e se eu levasse ele de táxi?". Não podia. Estava entubado, tinha o soro. E depois, o hospital não autorizava.

      Voltou para o corredor. Na parede em frente, a foto de uma enfermeira, indicador nos lábios, pedia silêncio. Debaixo da foto, uma evangélica orava. Lembrou da crisma do filho: todos em fila, aguardando o chamado. Não suportando mais, caiu em choro convulsivo. Um residente que passava pediu-lhe calma. Mandou-o para o inferno, junto com padre Jaime e seu sermão sobre a santidade da pobreza.