Anteontem, falei de vinte anos de comunismo. Permitam-me continuar, mesmo correndo o risco de ser enfadonho. É que vinte anos de militância não se faz todos os dias.

      Não foram anos ininterruptos, como os do velho João, mas, mesmo me afastando por um tempo das atividades militantes, permaneci filiado, contribuindo e acompanhando a imprensa partidária.

      Portanto, são vinte mesmo.

      Neste tempo todo posso me dizer um brasileiro realizado: derrubei uma ditadura, escrevi uma constituição, depus um presidente corrupto e entreguista, elegi um operário para o mais alto cargo da República. Tudo isso, participando e, mais importante, organizando e convocando manifestações de milhões. Sujeito anônimo, coletivo, agente de um futuro combustível de inúmeras gerações.

      Ser comunista deixou de se configurar mais um aspecto de minha vida. A essa altura de meu campeonato existencial, ser comunista incorporou-se como minha mais íntima natureza.

      Falo isso por considerar um fenômeno curioso: aos quinze, dezesseis anos, costumava me definir como poeta. Decorrido certo tempo, o comunista passou a pautar o escritor, o amante, o estudante, o professor e, atualmente, até o pai.

      Sim, porque os valores que transmito à minha filha são os sempre renovados valores proletários: o sentido da solidariedade com os explorados, o sentimento de luta contra as injustiças, a concepção de que tudo relaciona-se com tudo e que o mundo sempre muda. E essas coisas, a gente não transmite por discursos. Mas por posturas, por atitudes diante dos fatos da vida. Meu modo de ser e de estar no mundo tem na militância sua referência e isso as pessoas sentem, percebem – sobretudo os filhos.

      Uma camarada nossa, que hoje, infelizmente, não está mais no Partido, afirmou uma vez que um revolucionário verdadeiro é revolucionário em todas as esferas de sua vida. Não sei se sou. Mesmo porque, há que se definir e caracterizar o que é um revolucionário em toda linha. Mas de qualquer forma, concordo com ela.