Caso de amor
O amor firmou-se-lhe nas retinas. Desceu depois corpo abaixo e veio se instalar no meio das pernas, nítido, aceso como uma lembrança. Fosse ao trabalho, ou dele retornasse, sentia-se. Corpo intumescido, bastava apalpar-se em busca da chave ou do bilhete de metrô, arrepios lhe subiam.
Ao pé da noite, já não mais se suportando, tentou alívio com a primeira pessoa que encontrou na livraria. Chegou-se, roçou o braço no braço alheio, lançou um olhar intenso e, em poucos minutos, estava se enroscando no quarto do motel modesto.
De pouco adiantou: o amor dilatou-se e veio tomar o ar circundante. A cada gesto seu, uma onda se propagava no entorno e ia tocar os transeuntes. Certas pessoas, sentido-se violadas, passavam ao largo. Idosos persignavam-se. Adolescentes paravam em fascínio. Cães ladravam. Gatos se arrepiavam.
Na primeira lanchonete minimamente decente, perguntou pelo banheiro. Masturbou-se até quase o corpo se romper. Seus urros eram ouvidos nas calçadas. No balcão, comensais de olhos arregalados paravam de mastigar.
Quando arrombaram a porta, só encontraram roupas e uma agenda. Fizera-se mil partículas disseminadas pela cidade.