Para ler o Brasil
Um filósofo do jornalismo, o americano Charles Dana, cunhou em 1882 a mais famosa definição de notícia: “Quando um cachorro morde uma pessoa, isto não é notícia. Mas quando uma pessoa morde um cachorro, isto é notícia”. Fica claro que uma das principais características do fato jornalístico é a exceção, o acontecimento incomum, em geral negativo, que suscita curiosidade e interesse do público. Outra máxima do filósofo: “O jornalista separa o joio do trigo. E publica o joio”.
Dana (1819-1897) não era nenhum Doutor Pangloss, a personagem otimista do romance Cândido, de Voltaire. Socialista na juventude, no final da vida hostilizou os sindicatos e tomou-se de um nacionalismo exagerado a ponto de defender uma política externa imperialista para os Estados Unidos, mas foi um atencioso editor do correspondente Karl Marx no jornal The New York Daily Tribune.
As notícias acerca do Brasil exageram as duas sentenças de Dana. A garimpagem da exceção tem conduzido ao negativismo autofágico, parceiro da autoflagelação, alternado com prazer de nirvana em focalizar só o que dá errado. Grande parte da produção jornalística e acadêmica é processada numa usina de ódio ao país. Depois do futebol, o esporte mais popular é o chute no orgulho nacional. País magnânimo, o Brasil merece ser tratado com generosidade e respeito pelos que escrevem sobre ele.
A revista Bonifácio surge com a linha editorial de salientar o Brasil profundo, cheio de problemas e soluções, de excelências e exceções, uma civilização que encerra, como qualquer outra, dificuldades que exigem não só denúncia ou diagnóstico, mas transformação renovadora. Situando-se num ponto de equilíbrio entre o pensamento que constrói sua reputação destruindo a do país, e a visão cor-de-rosa que ao longo da história recebeu o carimbo de áulica e chapa-branca.
Bonifácio instala-se como uma voz de divulgação das grandezas nacionais, a destacar com ênfase tudo o que o país tem de bom.
A revista é uma publicação do Instituto José Bonifácio, homenagem ao brasileiro que, segundo o romancista Machado de Assis, honrou a Humanidade. Recém-fundado por uma ampla frente de ativistas empenhados em incentivar o debate acerca da reconstrução nacional, mediante a retomada do projeto de um país altivo e próspero, o Instituto José Bonifácio acredita no Brasil e prega um modelo de desenvolvimento autônomo que garanta o bem-estar material e espiritual do povo brasileiro. A postura positiva de Bonifácio não se confunde, no entanto, com doutrinas de restrição nativista, nem com a xenofobia caolha que fecha as fronteiras físicas e espirituais de um país às conquistas da Humanidade. Mas acreditamos que só quem gosta do Brasil pode mudá-lo – para melhor.
EDIÇÃO 71, NOV/DEZ/JAN, 2003-2004, PÁGINAS 78