Muito se comenta – e pouco se leva a sério – sobre o que realmente acontece com a economia chinesa. Seus índices de crescimento acelerado e sustentado assustam analistas no mundo inteiro. Porém, de 1998 para cá fatos novos em política econômica têm garantido a manutenção de tais índices. O crescimento econômico chinês alcança novo patamar.

Macroeconomia chinesa: o país em condições de crescer para dentro

Desde 1978, ano inaugural de sua nova política econômica, baseada na reforma da estrutura da economia e na abertura ao exterior, a China vem experimentando um verdadeiro frenesi de crescimento acelerado e sustentado:
A média anual, entre 1978 e 2003, é de 9,3%. Seu comércio exterior cresceu quase 30 vezes em 25 anos. Em 1978, seu volume foi de US$ 20,6 bilhões, ocupando o 30º lugar no mundo e, no ano de 2003, foi de US$ 851,2 bilhões – sendo US$ 438,37 bilhões correspondentes às exportações e US$ 412,84 bilhões às importações, com aumento verificado de 34,6% e 39,9%, respectivamente (1), em relação ao ano anterior, passando a ocupar, assim, o 5º lugar no mundo.

Voltando à questão dos altos índices de crescimento, 2003 foi marcado pelo maior índice de crescimento econômico dos últimos 6 anos para o período: 9,1%, certamente alavancados pelos enormes investimentos em infra-estrutura, pela notável performance de sua indústria automobilística, e por um corajoso sistema de crédito.

Seus índices macroeconômicos são bem satisfatórios, pois sua taxa de câmbio real parece satisfazer todas as condições de equilíbrio interno e externo; suas reservas cambiais alcançaram a impressionante cifra de US$ 410 bilhões no final de 2003; sua taxa de juro real é de 6% para as empresas; suas exportações são dinâmicas; sua taxa de inflação mantém-se próxima da mundial (de 2% a 3%) e sua dívida externa corresponde a 15% do PIB (2).

Sua receita fiscal em 2003 ultrapassou os US$ 250 bilhões, com aumento verificado de 21,5% com relação ao ano anterior, mantendo, assim, um aumento da arrecadação fiscal maior que o índice de crescimento econômico.

Somando-se a tudo isso, sabe-se que a China – com aproximadamente 1 bilhão e 250 milhões de habitantes – possui o maior mercado potencial do mundo. Aliado a esse dado, o país conta com uma estrutura política e social altamente estável e com um governo que provou ao longo de 25 anos ter o efetivo controle sobre sua economia. A junção de tais fatores o credencia à condição de Net Capital Importer, ou seja, uma praça tomadora de recursos produtivos internacionais para todos os setores de sua economia.

Tendo as colocações e dados expostos, podemos sem nenhuma sombra de dúvida adjetivar a China como um ponto de equilíbrio na conturbada economia mundial e em especial do Sudeste asiático – como muito bem demonstrou o prosseguir da recente crise financeira asiática. E mais: a partir dos índices macroeconômicos demonstrados, podemos, subjetivamente, sugerir que a China tem condições suficientes para alavancar seu crescimento pela expansão interna, sem criar problemas externos. A não desvalorização do yuan, por ocasião da crise financeira asiática em 1997, é razão suficiente para acreditarmos na implantação de tal política.

Assim posto, com índices macroeconômicos favoráveis e apreciando as profundas transformações no campo da economia-mundo, a partir de 1998 o governo chinês lança o maior projeto de obras em infra-estruturas em andamento no mundo, sobretudo nos campos relacionados a energia e transportes com a finalidade de empreender a formação de um mercado de massas, como maneira de manter, em um ambiente externo marcado por crises de ordem financeira e de superprodução, um crescimento econômico sustentado, entre 2001 e 2020, de 7,2% e de 5,4 até 2050.
Dessa forma, a China passa a ter seu crescimento elevado a um novo patamar, sólido e de profundo significado para o êxito de seu sistema socialista.

Além do econômico: por que investir em infra-estrutura, energia e transportes?

Podemos afirmar que a política de reforma e abertura é um produto de criatividade e uma forma de enfrentar os crescentes desafios internos e externos postos pela vida aos governantes chineses. O principal desses desafios no campo interno é dar soluções práticas à principal contradição, no interior da China, existente entre as grandes necessidades materiais e espirituais de uma nação – que, em 1978, beirava a casa dos 1 bilhão de habitantes – e as por demais atrasadas forças produtivas e os meios de produção à disposição.

Ainda hoje, essa contradição é grande, pois para se desenvolver sustentadamente, a China necessita de 1.000 kw per capita de energia elétrica e conta atualmente com apenas 300 kw per capita instalados (3). E não há programa de industrialização e desenvolvimento que dure sem o devido respaldo em capacidade energética. Por outro lado, podemos vislumbrar que a política do governo chinês em financiar o consumo de energia elétrica às famílias camponesas, aliada ao empenho de total eletrificação do país até 2010, viabilizará encerrar no próprio mercado interno a produção e o consumo de produtos eletrodomésticos e eletro-eletrônicos.

Do ponto de vista da geografia econômica, os investimentos em infra-estruturas trazem em seu bojo as condições objetivas para a estruturação de uma indústria com peculiaridades próprias; servem à proteção ecológica; delimitam e jogam a outro patamar o papel estratégico do mercado interno nacional; e geram renda, produto e novas necessidades. Transformam o território e a vida das pessoas com o aumento da taxa emprego e da renda, entre outras coisas.

Voltando – e pincelando –, à questão geopolítica, justificamos que investimentos maciços em energia e transportes, além da importância em matéria de desenvolvimento econômico, para um país de dimensões continentais – que almeja ser a nação mais desenvolvida do planeta em 2050, com 1,25 bilhão de habitantes de 56 nacionalidades diferentes, fronteiriça com 22 países – têm alto valor geopolítico, tanto doméstico quanto internacional.

Já sob uma ótica social, tais investimentos estão na ordem do dia, pois no país aumentou consideravelmente o desemprego urbano que, em 2000, fechou em 3,1% da população economicamente ativa e, em janeiro de 2003, já atingia 4%.

Substanciando essa problemática, prevê-se a perda de 500 mil postos de trabalho na indústria automobilística nos próximos sete anos. Na agricultura, afetada pelo fim dos subsídios estatais e pela queda das tarifas alfandegárias, serão perdidos outros 9,6 milhões – número que pode ser acrescido aos 8,5 milhões de camponeses que têm deixado o campo e procurado emprego nas cidades. Já as estatais, com a reforma de sua estrutura, deixarão desempregados cerca de 3 milhões e a indústria metalúrgica, por força da restruturação produtiva, poderá perder em 2 anos cerca de 1,1 milhão de postos de trabalho.

Configura-se, assim, outra justificativa para a viragem de sua política econômica pós-crise asiática em favor de investimentos em infra-estruturas: a maior parte destes investimentos abriga mão-de-obra intensiva e barata, diminui a capacidade ociosa em indústrias correlatas, como as de aço, cimento, areia, asfalto, madeira, petroquímica, pedra, de locomotivas, entre outras. Estima-se, ainda, nos primeiros 9 meses de 1998, terem sido gerados mais de 3 milhões de empregos diretos e indiretos em construção de estradas; número que chegou a 10 milhões em junho de 2002 (4).

O crescimento rápido e sustentado da economia chinesa nos últimos 22 anos – acrescido do caráter distributivo que regula tal crescimento –, torna-se por si só uma justificativa para o empenho do governo chinês em construir milhares de quilômetros de estradas, ferrovias, metrôs, anéis viários (Pequim e Xangai) e usinas geradoras de energia (5). Com o crescimento econômico, milhares de cidadãos passam a ter no automóvel um sonho de consumo. Inúmeras pessoas conseguem empregos cada vez mais distantes de suas residências e muitas desfrutam de feriados prolongados, que as levam a atravessar, em muitos casos, milhares de quilômetros.

Também em razão do crescimento econômico, estão ficando cada vez mais estranguladas as grandes avenidas de cidades como Pequim, Xangai, Guangzhou, Naning, Chongqing, onde fica cada vez mais clara a necessidade de pesados investimentos em projetos, como o de metropolitanos e suburbanos interligados que absorverão, durante o 10º Plano Qüinqüenal (2001-2005), US$ 98,5 bilhões na construção de linhas inaugurais e de alongamento em 20 cidades. Somente na cidade de Xangai, neste mesmo período, serão investidos US$ 8,8 bilhões em três novas linhas e em cerca de 50 novas estações (6).

Planificação descentralizada, otimização espacial e um salto qualitativo

As desigualdades regionais na China têm raiz: são herança das épocas anteriores à proclamação da República Popular da China (1949), marcadas, sobretudo durante o século XIX, pela utilização das franjas litorâneas por parte dos imperialismos inglês e japonês para o embarque de matérias-primas provindas do interior e pelas incipientes instalações de indústrias manufatureiras de Xangai e Guangzhou, que ajudaram a demarcar a linha da desigualdade facilmente perceptível entre um litoral rico e um interior pobre.

Durante o período maoísta, ao lado do caráter desenvolvimentista empregado no sentido de reduzir tais desigualdades, o jogo geopolítico – fator objetivo –, colaborou para diminuir as desigualdades regionais: como se sabe, a República Popular da China teve assento garantido na ONU apenas em 1971, o que a fez viver por 22 anos num isolamento diplomático, agravado em 1962 pelo rompimento com a URSS. Isso levou as autoridades chinesas a transferirem as unidades industriais chinesas para o interior a fim de diminuir a vulnerabilidade do país a ataques do exterior.

Concomitante com essa política investimentos eram feitos no sentido de buscar petróleo e carvão nessas localidades, obrigando o governo a despender grandes somas de capital para esse fim; e, por outro lado, também contribuindo para radicalizar a divisão social do trabalho interno, pois a acumulação primitiva socialista a partir da agricultura (modelo soviético adotado pela China) gerava demasiada dependência industrial e estatal dos rendimentos agrícolas e, conseqüentemente, de seus excedentes.

Logo, entender a política de reforma e abertura como um rompimento com o antigo modelo soviético é uma verdade, desde que se perceba tal política como um esforço de maximizar o crescimento econômico, fazendo da descentralização espacial uma forma de dinamizar as iniciativas locais e mobilizar amplamente os recursos materiais e humanos. Sob tal ponto de vista e pela definição das reformas econômicas na China, aos geógrafos marxistas abre-se um campo de pesquisa e entendimento da construção do socialismo em formações sociais periféricas. Desde já colocamos as seguintes indagações: 1) Como tratar e trabalhar contradições inerentes à divisão social do trabalho na etapa primária de edificação socialista? 2) Sendo o modo de produção socialista dominante qual o impacto sobre o território e a sociedade das políticas públicas da transferência de recursos de zonas ricas às zonas rurais pobres? 3) Qual o papel do mercado de capitais em uma economia socialista em estágio inicial e principalmente na alocação de recursos no sentido da concreta diminuição das desigualdades regionais? 4) Transformada a China em potência financeira, como se configura a geografia econômica em âmbito mundial e a respectiva transição ao socialismo nas demais formações sociais periféricas?

Voltando ao cerne da proposta inicial, a China procura, desde 1978, tirar partido das vantagens comparativas: busca fazer com que as regiões interioranas chinesas sustentem a edificação da indústria energética, dos transportes e das matérias-primas, de maneira inclusive a sustentar o desenvolvimento das regiões costeiras.

Toda essa dinamização espacial pós-1978 teve como pressuposto a redução da planificação central, que ainda existe para gerenciar grandes projetos estratégicos; porém, passou a conviver com os planos regionais, provinciais e interprovinciais. Assim sendo, o interior do país deixou de ser um mero repassador de bens e riquezas ao centro dinâmico econômico chinês, assumindo o estatuto de gerenciador de seu próprio desenvolvimento sustentado.

Dessa forma, a partir de 1992 o governo chinês buscou fazer uma abertura em várias direções, no sentido de atrair as zonas interioranas para investimentos, com a participação de capitais nacionais e estrangeiros na construção de infra-estruturas e na exploração de recursos naturais; verifica-se, no decorrer de algumas leituras e conseqüente análise, que desde 1992, as capitais de províncias e regiões autônomas interioranas – uma a uma – se transformaram em áreas abertas: instalou-se no país como um todo 47 zonas nacionais de desenvolvimento econômico e tecnológico e 53 zonas de desenvolvimento de altas e novas tecnologias.

A Região Autônoma de etnia uigur do Xinjiang, por exemplo – fronteiriça com Rússia, Índia, Cazaquistão, Tadjiquistão, Mongólia, Afeganistão e Paquistão –, até 1978, era uma atrasada região de pastores, com alguns poços de petróleo perfurados. Em 22 anos, conheceu desenvolvimento vertiginoso com o aperfeiçoamento de sua infra-estrutura a partir do desenvolvimento tecnológico, possibilitando otimizar a descoberta e conseqüente extração de petróleo e gás natural (7). Estima-se que 25% das reservas em petróleo e gás da China encontram-se no Xinjiang e suas reservas de gás são suficientes para abastecer Xangai por 30 anos. Enormes somas foram investidas pelo governo central em 23 estradas de rodagem – 11 delas interprovinciais –, somando 33.020 km de estradas abertas, sendo que 25.200 foram construídas nos últimos 22 anos.

Atualmente, o Xinjiang possui 6 cidades abertas que contam com 113 empresas investidoras originárias de Hong-Kong e 14 de Taiwan. A região autônoma mantém relações comerciais com 73 países do mundo, sendo que os produtos mecânicos gozam de enorme prestígio no mercado internacional.

E mais: com a implementação na primavera de 1999 do “Projeto Para o Desenvolvimento Oeste”, espera-se que num espaço de 20 a 30 anos se produza um verdadeiro salto quantitativo que elevará a China à condição de uma economia pós-fordista de dimensão continental a exemplo da integração territorial norte-americana na segunda metade do século XIX: um país continental interligado por imensas ferrovias, rodovias, gasodutos e linhas transmissoras de energia e de informação.
Neste contexto de desenvolvimento de uma economia continental, vale ressaltar o projeto de modernização da municipalidade autônoma de Chongqing. Tal municipalidade (elevada a tal condição em 1997) situada no curso médio do rio Yang-tsé, que compreende um território três vezes maior que a Bélgica, receberá cerca de US$ 200 bilhões até 2010, com a intenção de transformá-la na “Chicago chinesa”. Naquele momento, Chicago transformou-se no centro dinâmico do meio-oeste americano como grande entroncamento ferroviário e mercado distribuidor agrícola (8).

Restruturação energética e otimização dos transportes viabilizam nova onda de crescimento
Para o 10º Plano Qüinqüenal, em andamento desde 2001, é patente a ênfase em megaprojetos de infra-estruturas ligadas à restruturação energética e à otimização ferroviária, metroviária e rodoviária, além de mais de 50.000 projetos de auxílio em infra-estruturas às zonas pobres, que buscam favorecer a demanda interna e o reajustamento estrutural, acarretando em resistência ao impacto gerado pelo desaceleramento econômico mundial.

Enquanto o Brasil continua em marcha à ré em relação aos investimentos em infra-estruturas o Estado chinês destinará à viabilização de tais projetos cerca de US$ 800 bilhões, a serem divididos em investimentos estatais diretos, concessões de serviços públicos a empresas públicas, emissão de bônus do tesouro, participação estrangeira em forma de joint-ventures, financiamento externo tanto de governos estrangeiros quanto sob forma de empréstimos de instituições financeiras e cotização de ações em bolsas de valores, como nas obras da Hidrelétrica de Três Gargantas e do Gasoduto Oeste-Leste.

Entre os megaprojetos, podemos destacar a construção da Usina Hidrelétrica de Três Gargantas (1993-2009); a primeira ferrovia a cobrir o território tibetano, que ligará Lhasa a Golmut, na província de Qinghai (2001-2007); o gasoduto Oeste-Leste de 4.221 km (2002-2005); e o projeto de transferência de energia hidrelétrica do centro-oeste chinês ao leste do país, com a construção em andamento de 13 novas hidrelétricas de médio porte (2001-2005).

A construção da usina hidrelétrica de Três Gargantas teve início em 1993 e será entregue em 2009. Contudo, já em 2003, quatro geradores entraram em funcionamento e no presente ano outros quatro também serão disponibilizados. Quando for posta em total funcionamento, gerará energia elétrica para 9 províncias do país. O maior projeto hidrelétrico do mundo tem investimentos previstos da ordem de US$ 22,5 bilhões, sendo importante salientar que tal custo teve decréscimo de US$ 2,5 bilhões de seu valor original, pois, entre outros fatores, a mão-de-obra chinesa relativamente barata e a prática do método licitatório para todos os estágios da obra fizeram com que o custo médio de construção caísse para US$ 1,2 mil por kw – metade do custo de projetos desenvolvidos em países do centro do sistema, como os EUA e o Canadá.

Do início da construção até 2002 foram firmados 6.187 contratos, com valor total de US$ 6,3 bilhões, sendo aproximadamente US$ 4,1 bilhões sob métodos licitatórios (9).

Sobre a ferrovia que interliga a capital do Tibet (Lhasa) a Golmut (capital de Qinghai), destacamos tratar-se da maior obra em andamento no mundo moderno. Tal ferrovia, de 1.125 km, terá 80% de seu trajeto a uma altitude média de 4.000m (o ponto mais alto será de 5.072m), com 50% sob “permafost”, ou seja, sob terra coberta com gelo permanente e ar rarefeito. Terá túneis a serem perfurados em até 100m de profundidade. Cento e cinco pontes serão construídas e 75 km de túneis, tendo de ser removidos para isso 8 milhões de m3 de rochas.

Tal empreendimento, que teve início em junho de 2001, terá fim em 2007 e consumirá US$ 3,2 bilhões. A importância se deve ao fato de o Tibet (região mais atrasada da China) não contar com nenhuma ferrovia que a ligue ao restante do país. Desse modo, ela fomentará o comércio do Tibet com outras regiões do país. Esse é, portanto, o maior projeto entre outros 103 desenvolvidos a partir de 1998, com investimentos de US$ 10 bilhões; o que tem propiciado ao Tibet crescimento econômico anual de 12,1% nos últimos 4 anos (10).

Entrando na questão da restruturação energética cabe lembrar que a China tem 70% de sua capacidade energética supridos por carvão e petróleo. Não é preciso falar sobre os prejuízos financeiros e ambientais de tal estrutura. Por outro lado, foram descobertas as maiores reservas de gás natural do mundo na província de Xinjiang. Assim sendo a substituição de petróleo e carvão por gás natural tornou-se estratégica e, após 5 anos de estudos, ficou pronto o projeto, que consiste num grande gasoduto que ligaria os ricos campos do Xinjiang a Xangai, num trajeto de 4.221 km, atravessando o rio Huang-ho por três vezes e as montanhas de Luliang, Taiye e Taihang.

A construção de gasodutos, além de todos os aspectos relacionados com a utilização industrial do combustível, compreende a prospecção e a exploração dos recursos de gás. A primeira vantagem econômica está no preço do metro cúbico de gás natural importado (US$ 0,20). Já para o consumo interno o gás natural de Tarim terá um custo de US$ 0,15. Esse preço, por ser aceitável aos consumidores, permite garantir benefícios de 12% para o projeto e outros 12% para impostos em transporte. Há previsão de os lucros surgirem quando o volume de gás transportado chegar a 8,4 bilhões de m3 – o que deve ocorrer em 2006 (11).

O custo avaliado para o projeto é de US$ 22 bilhões e há a perspectiva de serem empregues milhões de toneladas de aço laminado. Há necessidade de capital e tecnologia dada a incapacidade tecnológica do país para produção de tubos de aço. Para isso, tornou-se sem efeito a antiga norma que não permitia a nenhuma empresa estrangeira participar de todos os níveis de um projeto de tal ordem. Portanto, foi firmado um acordo para a constituição da maior joint-venture da história do processo de reforma e abertura (12).

Assim, em julho de 2002, firmou-se a joint-venture, com capital 55% chinês (Sinopec, PetroChina e Hong-Kong China Gás) e 45% estrangeiro, representado pela Rússia’s Gasprom (15%); anglo-holandesa Royal/Dutch Shell (15%); e ExxonMobil (15%). Os lucros são aguardados para 2006.
Segundo perspectivas de mercado, espera-se que o projeto acelere o reajuste da estrutura econômica, da produção e da tecnologia das indústrias relacionadas. Até então, várias cidades litorâneas e as localizadas em torno do rio Yang-tsé têm firmado cartas e contratos da ordem de US$10 bilhões com a finalidade de concretizar projetos de engenharia para obras públicas e de renovação energética de suas indústrias.

Invertendo a proposta e adentrando os setores ferroviário e rodoviário, em geral, descrevemos estarem sendo investidos US$ 40 bilhões em 63 projetos, sendo US$ 30 bilhões para a construção ferroviária e US$ 10 bilhões para desenvolvimento de novos trens e locomotivas. Os atuais 70.000 km de linhas passarão a 75.000 km em 2005. E 52% de tais investimentos serão centrados no centro-oeste do país, atualmente com 25.000 km de trilhos que, em 2005, chegarão a 27.500 km (13).

A velocidade máxima dos trens que ligam Pequim a Harbin, Xangai e Guangzhou passará a 160 km/h em 2003 e 200km/h em 2005. E a linha leste-oeste Lianyungang-Lanzhou, a 210 km/h (14), juntamente com a construção de 900 km de trilhos de alta velocidade, interligando todos os centros industriais da rica província de Guangdong.

As obras no setor rodoviário tiveram início em 1998 e foram continuadas durante o 10º ano do Qüinqüenal a reforma e a construção de 8 estradas troncais nacionais e mais 8 interprovinciais, somando 28.000 km (15).

Em longo prazo, espera-se que até 2050 toda a rede rodoviária chinesa esteja de acordo com as necessidades de um país altamente desenvolvido. Os 1,75 milhões de km se transformarão em 4 milhões, em 2050.

Nas regiões ricas do litoral estão em construção auto-estradas enquanto que as rodovias novas destinam-se ao oeste do país. Para tanto, 251 obras rodoviárias no oeste estão em andamento desde 1998. As estradas troncais já citadas serão interligadas por uma rede de 5 corredores norte-sul e 7 leste-oeste, conectando completamente o interior pobre e o litoral desenvolvido. Nos âmbitos das províncias, está em andamento a construção de estradas de cimento, que ligarão as capitais provinciais a distritos, vilas e aldeias.

O valor estimado para a conclusão de todos os projetos previstos é de US$ 62,5 bilhões, já tendo sido utilizados até 2002 US$ 22,6 bilhões.

A atual política econômica implantada na China após a eclosão da crise asiática, baseada na formação de um mercado interno de massas e tendo como meio o alavancamento infra-estrutural, é mais uma prova da capacidade chinesa de enfrentar seus desafios tanto internos quanto externos.
A este lado do mundo coloca-se como tarefa imediata desmistificar falsos desafios (inflação) e enfrentar nossos verdadeiros desafios.
Os comunistas chineses são exemplo para tão árdua tarefa.

Elias Jabbour é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana da USP. Este artigo é extrato da dissertação de mestrado, a ser apresentada, “Infra-estruturas em energia e transportes, crescimento econômico e construção do socialismo na China”.

Notas
(1) “China’s total trade volume hit US$ 851,2 billion last year”. People’s Daily. 12/1/04.
(2) Delfim Netto, em artigo publicado na Gazeta Mercantil em janeiro de 1998, faz uma interessante comparação entre os casos chinês e brasileiro, apontando com competência as diferenças em matéria de política econômica entre os dois países.
(3) “Electricity generated in Southwest China Has Huge Market”. People’s Daily. 3/7/2002.
(4) Zhongyun, Luo “Sectores ferroviario e rodoviario impulsan crescimento econômico”. Beijing Informa n. 33, 16 a 23/10/2002.
(5) Relatórios da ONU indicam a China como o país do mundo que mais contribuiu para a eliminação da pobreza, acrescidos de dados demonstrando que para o ano de 2005 as pessoas com renda anual acima de US$ 10 mil aumentarão para 400 milhões no mundo, sendo que metade delas será de chineses.
(6)“Comunicaciones sobre rieles de Shangai: Uma longitude total de 400 km en los próximos cinco anos”. China Internet Information Center. 24/11/2002.
(7) Overholt, Willian H.: “The Rise of China. How economic reform is creating a new superpower”. p. 88, 1993.
(8) Cliford, M. & Roberts, Dexter.: “Westward Ho!”. Business Week. October, 2004.
Dolven, Ben.: “Building it – But will they come”. Far Eastern Economic Review. Sebtember 4, 2003.
Oliveira, Amaury Porto de.: “O salto qualitativo de uma economia continental”. Política Externa. Vol. II, n° 4, março/abril/maio, 2003.
(9)“Three Gorges firm seeks listing”. China Daily. 26/2/2002.
(10) “Qinghai-Tibet Railway kicks off”. People’s Daily. 6/6/2002.
(11) “Gás natural runs over 4,000 across China”. People’s Daily. 4/7/2002.
(12) “Foreign giants take gas pipeline stake”. China Daily. 2/7/2002.
(13) Zhongyun, Luo.“Sector ferroviario impulsa crecimiento economico”. Beijing Informa. n. 47, 15 a 22/12/2002.
(14) “China’s railway to initiate two more speed-increeses in 2003 and 2005”. China Daily, 13/6/2002.
(15) “Construcción vial en China entra en pleno apogeo”. Beijing Informa, n. 29, 7 a 13/6/2002.

EDIÇÃO 72, FEV/MAR/ABR, 2004, PÁGINAS 28, 29, 30, 31, 32, 33