Saco das Varas, interior de Sergipe. Emerenciana mexe o feijão na panela e observa a filha à mesa da cozinha.

      – Qué que tu tanto rabisca aí, menina?

      – Nada não senhora. 

      – De hoje que escreve neste papel. Vai me dizer que é bilhete pra namorado?

     – Ixe, mãe! E eu lá tenho namorado?…

      Emerenciana ri:

      – Arria a trouxa no chão e conte essa história direito, sujeita!

      – Irra, que a senhora tem cada u’a! 

      – Oxente. E precisa ficar assim braba? Vá, vá lá dentro e chame seu irmão, que tá quase pronto.

      A mulher observa a filha se indo pelo corredor. Uma moça, pensa. Doze anos. Daqui um pouco menstrua. Já tem até uns babujé rondando a casa, puxando prosa, derramando os olhos. Bando de cabra safado.

      – Chega, que já tá é bom demais.

      Tirou a panela do fogo e pôs na mesa. Pegou no armário a farinha, os pratos e foi torrar a jabá. De passagem, pousou os olhos na folha sobre a mesa. Não sabia ler, mas gostou da cor do papel e da tinta. Pra quem a filha escrevia? Que aquilo tinha todo o jeito de carta, ah, isso tinha. E com aquele capricho… Hum, aí tinha coisa. 

      Emerenciana ia nestas conjecturas, sua filha, depois de avisado o irmão, se sentava à porta da casa ver o movimento. Lá de dentro, já vinha o cheiro e o chiado da carne na frigideira. Lembrou-se do escrito sobre a mesa, mas não se apoquentou.

      – Mãe não sabe ler, tadinha…

      De repente, o susto:

      – Virgem santíssima! Leonardo!

      Correu até a cozinha. O irmão lavava-se no tanque, nos fundos. Recolheu a carta e os papéis e foi pro quarto. Guardou tudo sob o colchão.

      Antes que a carta cumprisse seu destino, carecia que tudo ficasse em segredo. Aí, quem sabe, a vida – esse estirão de poeira e sol – pudesse um dia valer a pena…