A carta – capítulo 30
Tenório desembarca. No saguão do aeroporto, já o aguarda um motorista. Do carro, faz algumas ligações pelo celular. Ajeita seus negócios:
– Não demoro. Só o tempo de resolver uns assuntos de família. (…) Tá querendo saber muito! (…) Não diga nada! Diga só que não estou. (…) Quem disse que viajei? (…) Pois pensou errado. Vou resolver umas coisas de mãe e ponto final. Té.
Desliga. Olha o trânsito, o relógio. Terra enganchada essa.
– Mestre, não tem como fugir disso não?
– Assim que passar a ponte, a gente pega outro caminho, doutor.
Doutor. Cada uma. Bastou ter um dinheirinho, o cabra vira doutor. Aqui é que era bom de montar uma empresa. Com esse tanto de assalto que tem, o que não ia faltar era cliente.
– Muito roubo aqui, mestre?
– Muito, doutor. A gente liga a tv e só dá roubo, morte. É uma coisa.
– O povo aqui deve viver de segurança pra cima e pra baixo, não?
– O povo, não. Mas os bacana, anda. De vez em quando a gente vê carro acompanhado de outro com os segurança.
Os olhos de Tenório brilham. Quem sabe um dia? Quem sabe?
Chega ao hotel. Bagagem na mão, dá instruções ao motorista e se dirige à recepção. Tudo acertado, pergunta:
– A Santa Casa, fica muito longe daqui?
– De carro, é um instante. O senhor desce a Consolação, pega a Amaral Gurgel. – responde a galega de olhos claros detrás do balcão.
– Obrigado.
– Disponha.
Mede a moça. Ela retribui com um sorriso protocolar. Sobe pro quarto. Já no banheiro, arrumando os apetrechos de barbear, se encontra no espelho. Pensa em sua missão. Olha o relógio.
– Hoje ainda. Hoje ainda…