A carta – capítulo 33
Ulisses chegou na recepção do hospital e perguntou por Jorge de Oliveira. A enfermeira quis saber quem era. Apresentou-se com o nome de Rafael e se disse amigo do doente. Glória foi consultada pelo ramal. Depois de alguns segundos, a enfermeira pousa o fone no gancho e pede um instante.
Ulisses fica pelo saguão, apreciando o movimento. Súbito, é abordado por uma moça alta, cabelos cacheados em rabo de cavalo, olhos que ele já viu em algum lugar, mas de que não lembra bem.
– Pois não?
Fica sem saber o que dizer por uns instantes. Franze o cenho e sorri constrangido:
– Pois não o quê, dona?
– O senhor é quem? – questiona Glória, em tom agressivo.
– E a senhora, é quem?
– Filha do homem que o senhor veio procurar.
Ulisses sorri simpático.
– Ah, sim… Eu sou Rafael, amigo de seu pai.
– Presumo que de Saco das Varas.
Vixe, que a mulher já sabe é tudo? Não era pra ser de lá. E quem foi que disse que tem que ser?
– Não, dona, sou daqui mesmo.
– E de onde o senhor conhece meu pai?
– Oxente! Se eu sou daqui, é daqui mesmo, de Sumpaulo.
– Sei. Por que o senhor nunca foi nos visitar lá em casa, em Santana?
A bicha tá armando é arapuca.
– Olhe, moça, eu vim ver o senhor seu pai. Não vim aqui pra prestá depuimento. Diga se eu posso vê-lo ou não.
– Não, não pode vê-lo. Não o conheço e sei bem que o senhor não é seu amigo. Diga ao senhor Argemiro que desista de estar nos atormentando. Peço que o senhor se retire.
O cachorro do Argemiro já veio estragar a trempe. Mas deixe estar…
– Olhe, moça, não conheço nenhum Argemiro e não sei por que a senhora tá me tratando assim. Vim ver meu amigo Jorge. Se não é possível, só posso lamentar. Té logo.
Glória não tirou os olhos do desconhecido até que ele sumisse pelo corredor. Assim que desapareceu, distensionou os músculo e soltou, baixinho:
– Cadê a merda do reforço que não chega?
Já na rua, Ulisses amaldiçoa Argemiro. Vai no rumo da pensão ali perto. Acende um cigarro. Na segunda baforada, já tem uma nova estratégia armada.