A experiência do PcdoB no governo de Olinda
Olinda é uma cidade com forte tradição cultural e de lutas libertárias. Nesse terreno fértil para mudanças desde janeiro de 2001 desenvolvemos um modelo de gestão em que se busca estimular a participação popular, o debate de idéias, a relação direta do governo com o povo e a elevação do nível de consciência política e social da população. Uma gestão comprometida com o desenvolvimento e o progresso, a universalização das políticas de garantias de direitos e a transparência administrativa, articulada e participante na luta nacional para fazer vingar no Brasil um novo projeto de desenvolvimento econômico e social, que supere o neoliberalismo e nos aproxime do socialismo. Tudo isso, aliado à forte convicção de que é preciso governar incorporando amplas forças políticas e sociais e a cultura local; convicção essa que perseguimos com muita determinação.
Para isso, o PCdoB tem envidado esforços no sentido de desenvolver políticas de frente ampla que nos levem a um acúmulo de forças cada vez maior, o que já pode ser percebido hoje, não só em Olinda, mas em todo o estado de Pernambuco. Essa trajetória teve início com a vitória eleitoral de 2000, quando o PCdoB conquistou a Prefeitura de Olinda, a vice-prefeitura do Recife – com a eleição de Luciano Siqueira – e elegeu um vereador no Recife.
A partir desse êxito, dessa vitória, passamos a conquistar outros espaços concretos na política pernambucana, um avanço significativo para o partido que antes contava com apenas uma deputada estadual. Na eleição seguinte, em 2002, o PCdoB elegeu Renildo Calheiros, candidato a deputado federal mais votado de Olinda, e reelegeu Nelson Pereira, deputado estadual, vindo do PT para nosso partido. Agora, em 2004, esse êxito consolidou-se quando, em Pernambuco, nos reelegemos em Olinda, elegemos 23 vereadores e passamos a administrar mais três cidades, enquanto, até então, tínhamos apenas Olinda.
Também realizamos avanços importantes no que se refere à correlação de forças na Câmara Municipal, garantindo ainda mais a governabilidade. Em 2005 passamos a contar com nove dos 16 vereadores eleitos, graças as nossas coligações, tornando a situação atual muito diferente. Hoje, em Olinda, o PCdoB é o maior partido do município e, na eleição do ano passado, conquistou, sozinho, 30 mil votos. Elegemos três dos 16 vereadores que nos dão sustentação na Câmara, a bancada do PCdoB; os comunistas participam ativamente do movimento popular da cidade e têm papel importante no município em todos os aspectos da vida social e cultural. Todavia em nenhum momento buscamos impor qualquer tipo de hegemonismo.
Além de ampliar nosso leque de forças e aumentar nossa influência no município e no estado, também superamos preconceitos. E isso foi muito importante. A campanha de 2000, por exemplo, foi marcada por um anticomunismo muito ferrenho, que relacionava o comunismo ao terror, ao medo. Outro aspecto desse preconceito se referia a nossa capacidade administrativa, a nossa capacidade de gerir o poder local, o governo. E nós quebramos esses preconceitos. Um exemplo de que o nosso partido consegue ter êxito administrativo é o fato de, após quatro anos, continuarmos governando uma cidade tão difícil como Olinda. Essa é uma grande vitória, que consolida a superação de preconceitos em relação à possibilidade, à capacidade de um partido comunista governar uma cidade, ou até mesmo o país.
Vimos ainda desenvolvendo esforços no sentido de atrair para nosso governo técnicos e pensadores identificados com nossa proposta de governo e dispostos a mergulhar fundo na realidade do município ou que já a conheçam bem, de forma a poderem enfrentar o desafio de formular políticas públicas capazes de responder às reais demandas da população. Isso porque acreditamos somente ser possível formular políticas públicas capazes de responder a esses desafios, quando passarmos a vivenciá-los e a aprender como superá-los. Também buscamos desenvolver um modelo próprio de administração pública que contribua para a formação de uma corrente de pensamento que reflita a política e os objetivos estratégicos do PCdoB.
Outra disposição do nosso governo é exercitar um forte debate com a população para que ela entenda as causas da crise em que vive. Esse é um grande desafio, que sempre nos motivou a debater a realidade, a falar a verdade e a nunca praticar demagogia com o povo – ainda hoje vivendo o drama do desemprego e da falta de perspectiva, cujo principal responsável é o modelo econômico e social perverso e injusto que ainda vigora no país. Por isso, nós sempre relacionamos a possibilidade de satisfazer as necessidades da população às mudanças, à alteração dos rumos dos modelos econômicos e sociais que sempre imperaram no Brasil. O debate de idéias é exercitado em todos os espaços, inclusive nas escolas públicas municipais, onde procuramos elevar o nível cultural e de consciência política da população.
No âmbito do Poder Público, buscamos também criar mecanismos de participação popular, como os conselhos representativos de segmentos sociais: da mulher, da criança e do adolescente, dos idosos e da juventude, e realizar conferências e seminários setoriais, além de instituir o Orçamento Participativo, uma experiência inédita na cidade, que tem oportunizado um exercício muito positivo de participação popular. Além disso, hoje em Olinda cresce o número de associações de moradores, de artistas e de empresários. Ou seja, a cidade fervilha com iniciativas que demonstram a retomada da organização popular, da sua intervenção na vida cotidiana da cidade. Esse é um setor no qual nós temos alcançado também bastante êxito.
O desafio de administrar
Outro aspecto importante da nossa experiência no governo de Olinda, é nosso trabalho árduo no sentido de melhorar as condições de vida do nosso povo e avançar nas políticas públicas que promovam a inclusão social e a melhoria da qualidade dos serviços básicos para a população, como saneamento, saúde, transporte e infra-estrutura urbana.
Isso porque, como sabemos, a maioria das cidades brasileiras vive basicamente da captação de recursos externos, seja junto ao Banco Mundial ou ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ou de emendas do Orçamento Geral da União (OGU), sendo as capitais as únicas cidades com alguma capacidade de investimento para criar um ambiente propício ao desenvolvimento econômico e social.
Em Olinda, a situação não é diferente e, da mesma forma, para fazermos investimentos de fôlego em infra-estrutura urbana tivemos de nos empenhar na captação de recursos junto a bancos internacionais e do Orçamento Geral da União, tarefa na qual temos obtido êxito. Como exemplo podemos citar o investimento de R$ 16 milhões obtidos junto ao governo federal, no primeiro ano do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um salto significativo para uma cidade como Olinda, que tem uma capacidade de investimento inferior a R$ 3 milhões por ano.
Esses recursos, captados junto aos ministérios ou fruto de convênios desses ministérios com bancos internacionais, foram investidos em obras importantes para a melhoria da qualidade de vida da população do município, como a urbanização da orla marítima, o saneamento do Bairro Novo, as intervenções em encostas, reduzindo, em 113, as áreas de risco nos morros e revitalizando o Sítio Histórico.
Nesse esforço, também nos habilitamos a implantar em Olinda o Prometrópole, o principal programa de investimentos que a cidade terá nos próximos cinco anos. Recursos da ordem de R$ 55 milhões, captados junto ao Banco Mundial, e de R$ 45 milhões, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), serão investidos na implantação de redes de esgotamento sanitário, abastecimento de água e drenagem, pavimentação, construção de escadarias, equipamentos sociais e áreas de lazer, programas de educação ambiental e desenvolvimento comunitário, bem como o reassentamento de famílias em condições de risco, em comunidades localizadas na Bacia do Rio Beberibe, onde estão concentrados 60% das pessoas de baixa renda do município.
É sem dúvida o programa de maior impacto a ser realizado no município, em médio prazo, que vai melhorar, de maneira significativa, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da cidade. Isso, principalmente, em virtude da execução das obras de saneamento básico, previstas no projeto, que, quando concluídas, significarão um aumento de 19,45% na área saneada do município.
Em relação ao patrimônio histórico, Olinda foi, em 2001, a cidade que mais apresentou projetos ao programa Monumenta/BID, entre eles o do Parque do Carmo – uma área de lazer com 4,5 hectares – que será o maior conjunto paisagístico da cidade. Iniciativas como essas livraram Olinda da ameaça de perda do título de Patrimônio da Humanidade, que pairava sobre a cidade até 2001. Hoje nós presidimos a Organização das Cidades Patrimônio Nacional.
Em termos culturais, três grandes iniciativas marcam nossa gestão: a “revitalização do Carnaval”, com o resgate de seu caráter democrático e popular; o “Cinema na Praça”, projeto premiado nacionalmente, que nos últimos quatro anos leva diversão e inserção cultural a milhares de pessoas de baixa renda; e o “Olinda, Arte em Toda Parte”, que abre ao público mais de cem ateliês localizados no Sítio Histórico, democratizando o acesso às artes plásticas.
Também buscamos desenvolver políticas públicas voltadas à melhoria da qualidade de vida de crianças e jovens, com a implantação de diversos programas sociais em convênio com o governo federal, empresas privadas e organismos internacionais, como a Unesco e o Unicef. Isso nos garantiu a instalação em Olinda do primeiro Espaço Criança Esperança do Nordeste e o título de Prefeito Amigo das Crianças, concedido pela Fundação Abrinq em 2004.
Também aumentamos os investimentos nas áreas de Saúde e Educação, com a reforma e ampliação de unidades de saúde e escolas e a contratação de mais médicos, agentes de saúde e professores. Desenvolvemos, ainda, um programa de construção de casas populares, que, até agora, beneficiou 359 famílias com moradias construídas em lotes urbanizados. Uma conquista significativa, se considerarmos que há sete anos não se construía nenhuma casa popular na cidade.
Ao assumir o governo, em janeiro de 2001, encontramos uma dívida no valor de R$ 68 milhões referentes a salários atrasados, dívidas com fornecedores e prestadores de serviço, repasses ao Fundo de Pensão dos servidores atrasados, e as contas bancárias do município bloqueadas. Hoje as finanças públicas estão em melhor situação, aumentamos as receitas próprias e reduzimos as despesas de custeio, com a modernização da máquina administrativa. Também iniciamos um processo de resgate do funcionalismo público, implantando medidas saneadoras, algumas delas representando conquistas históricas da categoria, como a fixação de data-base, a realização de concursos púbicos e a instituição do Regime próprio de Previdência Social. Os salários dos servidores são pagos em dia e dentro do mês. No início de ano divulgamos o calendário de pagamentos, inclusive do 13º salário.
Apesar desse desempenho, administrar Olinda não é uma tarefa fácil, haja vista sermos uma cidade com uma das maiores densidades demográficas do país, cerca de 9.800 habitantes por quilômetro quadrado, com arrecadação de cidade pequena e problemas de cidade grande. Problemas causados, particularmente, pela falta de crescimento econômico que paralisou o país por mais de 20 anos e pelas limitações impostas pelas políticas tributária e fiscal ainda vigentes no país.
Para 2005, a estimativa é de uma receita de R$ 169 milhões. Além dos recursos do Prometrópole, a expectativa é de que sejam captados recursos externos da ordem de R$ 16 milhões a serem investidos em obras de infra-estrutura urbana, saúde, cultura, turismo e preservação do Sítio Histórico.
Esses são, portanto, os dois grandes esteios do governo popular de Olinda: de um lado, a mobilização e participação popular em torno de uma coalizão ampla de forças políticas e sociais, que governa a cidade lutando por um novo Brasil, e, de outro, um trabalho muito duro para poder atender, minimamente e nos limites do poder local, às necessidades da população, dotando a cidade de um ambiente estimulador do desenvolvimento econômico e social.
Este tem sido o nosso projeto político de administração municipal, reforçado a partir de 2003 com a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um governo comprometido com o desenvolvimento econômico associado à inclusão social e com a proposta de fazer do Brasil um país cada vez mais soberano, democrático e socialmente justo que todos nós tanto queremos.
Luciana Santos é prefeita reeleita de Olinda (PE), cidade Patrimônio Cultural da Humanidade.
EDIÇÃO 78, ABR/MAI, 2005, PÁGINAS 27, 28, 29, 30