Existe um certo consenso de que os que fazem críticas severas a projetos elaborados por técnicos e pseudotécnicos de governo devem apresentar alternativas. Outros julgam, entretanto, que cabe aos governantes reconhecer os erros de seus incompetentes “planejadores” e, de sua própria iniciativa, à custa de outros pesquisadores, encontrar alternativas para (re) direcionar projetos. Preferimos o encontro de alternativas por intermédio de cidadãos esclarecidos.

Tais meditações nos vêm à mente devido às inauditas controvérsias que vem ocorrendo em nosso país pelo destino que se pretende dar às florestas nacionais da Amazônia (Flonas). A partir do ideário primário das reservas extrativistas, que em certo momento encantou o mundo com a garra de Chico Mendes ma guerrilha dos “empates”, podem-se fazer acréscimos notáveis e socialmente introduzidos pelos acreanos na fronteira com Rondônia (Nova Califórnia).

A alternativa que julgamos mais adequada para defesa das Flonas biodiversas da Amazônia centra-se no uso de setores bem selecionados da borda das florestas para atividades agroecossistêmicas e silviculturais. Usando a umidade exalada pela borda da mata, combinada com o calor e a forte luminosidade regional, podem-se plantar culturas de variadas espécies amazônicas ou de outras procedências.

Rente à floresta, renques de bananeira, pequenas áreas de açaí, cupuaçu e pupunha, intercalados com mandiocas mais extensos. E, em alternância, pequenos canaviais. Plantações de abacaxi e hortaliças de uso familiar. Nas rebordas e reentrâncias da florestas, plantação superposta das castanheiras de enxerto produzidas pela Embrapa de Belém do Pará. Em acréscimo, algumas experiências com o plantio de cacau e guaraná, em porções sombreadas da margem das florestas mais contínuas e biodiversas.

Na presente sugestão alternativa, está a idéia de um desenvolvimento socioeconômico com o máximo de mata em pé, com o máximo de proteção possível para a biodiversidade regional. É um esquema que protegeria o corpo integrado do ecossistema florestal, desenvolvendo atividades agrárias e eventualmente silvestres na borda das matas, aproveitando o conjunto de fatores favoráveis: umidade derivada dos “cabelos” da floresta, sombreamento diurno flutuante, luminosidade e taxa de calor. Para tanto, há que progredir no cultivo de espécies de interesse para a alimentação familiar e agronegócios complementares. Entre as culturas de ciclo curto, a mandioca é a mais importante. Pode-se iniciar o cultivo dos retalhos da borda da mata e, depois, amplia-los para melhoramento do solo já degradado. Identicamente, a castanheira deve ser plantada nos retalhos mais alterados das rebordas das Flonas.

Falta prever e detalhar muitas implantações indispensáveis: escolas de ensino fundamental, ramais e pequenas estradas para o transporte de produção. Nada impede que, complementarmente, seja possível continuar o extrativismo no coração da floresta, concentrando-se no látex e na coleta de ouriços de castanha. Mas será sempre na periferia das Flonas que o desenvolvimento socioeconômico e cultural poderá constituir um dos melhores exemplos de “economia ecologicamente auto-sustentada”.

Como disse alguém: para os dias de hoje queremos a plantação de mandioca e cereais; em cinco ou seis anos, o açaí e o cupuaçu; as castanheiras ficarão para os nossos filhos e netos; agora, vamos continuar o extrativismo, enquanto tudo estará crescendo na beira das florestas. Ignorantes são os proprietários vindos de longe que nada sabem fazer de prático. Assim falou o amazônida, que merece governantes mais sensíveis e fazendeiros menos arrogantes e agressivos.

Muitas meditações e idéias ainda deverão ser feitas para salvar florestas e ajudar os representantes de uma geografia humana sofrida. Cabe a todos os que conhecem a Amazônia trabalhar um pouco mais, com inteligência, dedicação e ética. Por último queremos registrar – para todo o sempre – que consideramos um crime histórico a idéia absurda de alugar as Flonas para empresas exploradoras de madeira e outras espécies da biota vegetal.

Quanto à idéia de conceder o gerenciamento das mesmas para ONG`s estrangeiras que desconhecem os problemas da Amazônia, não queremos nem falar, pelo absurdo internalizado nessa sugestão. (Aziz Ab`Saber)

EDIÇÃO 83, FEV/MAR, 2006, PÁGINAS 22